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SOCIEDADE CIVIL E PARTICIPAÇÃO

5 O DÉFICT DEMOCRÁTICO NO MERCOSUL

5.1 SOCIEDADE CIVIL E PARTICIPAÇÃO

Um dos debates envolvendo a integração é saber qual o papel da sociedade civil e os respectivos limites quanto à participação desta em um processo em que o executivo é preponderante nas discussões, inclusive, atua quase a subjugar o legislativo. Em um processo de integração, de acordo com Herz e Hoffman significa “um processo dinâmico de intensificação em profundidade e abrangência das relações entre os atores levando à criação de novas formas de governança político institucionais de escopo regional”.144

Então, não se pode perder de vista as sucessivas mudanças de cenas que podem acontecer, afinal, até mesmo o Estado cede parte de sua jurisdição para ver triunfar outros interesses, entre os quais, ampliação das redes comerciais. Mesmo assim, a sociedade civil não pode deixar de cumprir com uma de suas funções de realizar o acompanhamento das políticas públicas.

Primeiramente, cumpre discorrer o significado do que possa ser sociedade civil. Para Bobbio, uma definição positiva para sociedade civil será sempre difícil, pois se trata do “lugar onde surgem e se desenvolvem os conflitos econômicos, sociais, ideológicos, religiosos, que as instituições estatais têm o dever de resolver

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RIBEIRO, Eliza de Souza. Mercosul: sobre democracia e instituições. 2012. 102 f. Dissertação (Mestrado em Estudos Comparados) - Instituto de Ciências Sociais. Universidade de Brasília. Brasília, 2012. p. 29.

144

HERZ, M.; HOFFMAN, A. Organizações Regionais. Rio de Janeiro: Campus Elsevier, 2006. p. 168.

ou através da mediação ou através da repressão”.145

Bobbio trabalha com o conceito negativo do que possa ser sociedade civil. Este autor discorre sobre as interpretações marxistas, hegelianas e da tradição jusnaturalista sobre o conceito de sociedade civil, no qual atribui ser indispensável a análise o entendimento sobre a distinção entre relações sociais e relações políticas, que possibilite estabelecer um debate atual sobre o tema.146

Ainda no âmbito da sociedade civil se encontra a opinião pública que é a expressão de consenso e de dissenso com respeito às instituições, cujas ideias são transmitida através dos mais diferentes meios e acontecem nos mais diferentes locais.

Na dinâmica política moderna, temos a sociedade civil como responsável por produzir em seu espaço opiniões que são direcionadas ao Estado, que pode devolver a resposta na forma de políticas públicas. Uma função relevante exercida pela sociedade civil é a verificação e acompanhamento das ações estatais.147

A partir desses esclarecimentos iniciais não há dúvida de que a sociedade civil precisa participar do processo de integração seja acompanhando as ações do próprio Estado Parte, assim como de outro Estado e também propor questões que podem contribuir para o amadurecimento e o cumprimento das finalidades do Mercosul.

Entretanto essa participação é tímida e os canais que podem viabilizar a participação da sociedade civil são poucos. Ademais, a participação da sociedade civil requer que as organizações que a compõe tenham recursos financeiros. Nem sempre as deliberações e reuniões acontecem em uma mesma cidade e países, pelo contrário, visualiza-se uma forte rotatividade de fóruns nos Estados Partes de acordo com o Estado Partes que esteja exercendo a Presidência Pro Tempore, ademais, tem-se a complexidade das questões técnicas. Nessa linha de pensamento é o que defende Rodrigues.

Nas fases iniciais dos blocos econômicos a densidade institucional é muito baixa, sendo difícil se reconhecer um espaço de atuação para o setores sociais, que estejam afastados do poder governamental. Por outro lado, as tradicionais formas de pressão das quais se valem os movimentos sociais

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BOBBIO, Norberto. Estado, Governo, Sociedade: para uma teoria geral da política. Tradução de Marco Aurélio Nogueira. 12. ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 2005. p. 36.

146

______. O Conceito de Sociedade Civil. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1982.

147

______. Ensaios sobre Gramsci e o Conceito de Sociedade Civil. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

têm força mais limitada quando se referem a temas relacionados à integração econômica, em vista deste tipo de questão suscitar pouca mobilização bem como o baixo impacto das ações locais no núcleo decisório regional. Destarte, a inclusão as demandas por políticas públicas sociais na pauta da integração regional, ou até mesmo a consideração da oposição às políticas propostas é um significativo desafio para todos que estejam alijados do poder central dos governos. Não menos importante é a dificuldade de se conciliar os interesses dos cidadãos dos vários países integrados, uma vez que, em muitos casos, o que é prejudicial para uma população pode favorecer outra. Em suma, a intensificação das relações comerciais entre os países não é necessariamente acompanhada do surgimento de um senso de comunidade, o que dificulta a atuação conjunta dos movimentos nacionais, e enfraquece a sua posição como interlocutor das demandas sociais.148

A participação social é vista como muito importante para reduzir o déficit democrático na integração mercosulina. Assim sendo, estes autores consideram o estímulo e a participação da sociedade civil nos debates e nas tomadas de decisões do Bloco que independe de representações. É o que defende Mariano.

A explicação está no fato de que o déficit democrático nos processos de integração regional está muito mais vinculado à falta de participação dos grupos sociais nas instâncias decisórias regionais, do que à existência de representação formal das sociedades. Isto é, a crise de representação vivida hoje no âmbito doméstico, em que se questiona a efetividade dos Parlamentos em representar os interesses da sociedade, se translada para a esfera da integração: a mera existência de uma instituição representativa não é suficiente para garantir a democratização do processo: ela precisaria estimular e aumentar a efetiva participação social e permitir a contestação das decisões tomadas pelas esferas executivas.149

A partir dessas reflexões é possível inferir que participação social não é algo dado, mas uma prática construída e dialogada no seio da estrutura dos Estados e da sociedade internacional. A sociedade civil precisa se aproximar do debate sobre a integração regional e acompanhar as práticas do Executivo e as contribuições do Legislativo, especialmente, as dos membros que compõem a Comissão de Representação no Parlasul. A sociedade civil deve exigir do Parlamento o fim da letargia e decidir sobre o processo eleitoral para a escolha dos Parlamentares do Bloco, fixando data para o sufrágio. Esta discussão já se arrasta por mais de dez anos.

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RODRIGUES, Geisa de Assis. Anotações sobre o acesso a justiça das demandas individuais e coletivas no Mercosul. In: BAHIA, Saulo José Casali (Org.). A efetividade dos direitos

fundamentais no Mercosul e na União Européia. Salvador: Paginae Editora, 2010. p. 255.

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MARIANO, Karina Lilia Pasquariello. Parlamento do Mercosul, Integração e Déficit Democrático.

Então, compete ao Legislativo cumprir com a sua obrigação e a sociedade civil acompanhar de forma mais acentuada o processo de integração. Assim o Mercosul poderá avançar para acolher os cidadãos não só na arena da participação, mas também poderá melhor formular e orientar as políticas públicas com impactos nos indivíduos de sua abrangência.

Nesta divisão de obrigações, compete ao Parlasul quando estiver em funcionamento da forma devida (com os deputados eleitos diretamente pelo cidadãos) abrir as suas instalações para os debates e a presença constante da sociedade civil, bem como ir ao encontro dos cidadãos nos Estados Partes.