• Nenhum resultado encontrado

Fonte: TWAP, 2015, p. 16.

Em resumo os recursos foram pensados para serem inesgotáveis e com isso foram empurrados para o colapso pela sobrepesca que captura mais de cinquenta milhões de toneladas de peixes por ano em todo o mundo. E ao pescar cada vez mais, tentando atingir a demanda de captura, chega-se cada vez mais profundo nos mares e oceanos, alterando as profundezas; e cada vez mais aumentam as distâncias, provando que o “homem está transformando os oceanos do mundo em um deserto líquido” (CURY, 2009). O avanço tecnológico, neste caso da captura pesqueira, compromete a vida dos recursos haliêuticos. Deste modo, o colapso dos recursos pesqueiros não é mais uma hipótese fantasiosa. No entanto, deve-se enfatizar que a degradação dos recursos haliêuticos não se deve apenas à pesca, mas também à poluição e às mudanças climáticas (CORLAY, 2004).

De fato, a sobrexploração ou sobrepesca, além de atingir negativamente as questões biológicas e ecológicas, traz também problemas econômicos e sociais, incluindo uma percepção ruim para a pesca.

3.1.5 Dos conflitos provenientes do acesso ao recurso pesqueiro

O desenvolvimento tecnológico permitiu aos navios pescarem cada vez mais e mais perto das costas dos países estrangeiros, “levando ao mesmo tempo tensões e conflitos entre os Estados devido o compartilhamento de áreas de pesca” (EKOULA, 2013, p. 72). A produção pesqueira de captura estagnou nos últimos 20 anos (SPIJKERS et al., 2017; FAO, 2018a; PAULY et al., 2003). Enquanto isso, a demanda global por proteína marinha está crescendo (BÉNÉ; BARANGE; SUBASINGHE, 2015), particularmente em regiões vulneráveis que dependem de peixes para a segurança alimentar (SPIJKERS et al., 2017; BLASIAK et al., 2017).

Vários conflitos já foram impulsionados por disputas pela pesca e quotas marítimas, “incluindo ameaças, disputas contínuas e com uso militar” (MITCHELL; PRINS, 1999, p. 173). Observa-se que a tendência é que a ocorrência de conflitos se torne mais comum.

Diversos são os conflitos envolvendo a pesca, conforme pontuados por Corlay (2004): a rivalidade entre a pesca artesanal e o cultivo de salmão no Chile, desde 1990; os embargos do atum entre os Estados Unidos e o México em 1991; A guerra da anchova, em 1992, ocorrida no Golfo de Biscaia, na disputa entre pescadores franceses e espanhóis; A guerra dos pregões, em 1995, na costa de Terra Nova entre o Canadá e a Espanha; O conflito pelo camarão entre a França e Madagascar em 1997; O conflito entre a pesca profissional e a pesca recreativa na França, em 2005; Tensões em acordos de pesca entre os países da União Europeia (UE) e os países de África, Caraíbas e Pacífico (ACP). Além, de conflitos entre pescadores artesanais e industriais são relatados no Senegal, Gabão, Malásia, Brasil e até na Amazônia (EKOULA, 2013; ROUX; NOËL, 2007; LOUREIRO, 1985; FURTADO, 2004; SOBREIRO, FREITAS (2008); SILVA et al., 2016). Na costa de Senegal a exploração ocorre por frotas estrangeiras ou piratas, desde 1950 (ROUX; NOËL, 2007), etc.

Observa-se que, a circunstância de conflitos no setor pesqueiro não é uma situação nova e ocorre em níveis diferentes de exploração do recurso e de gestão. Ademais, em um contexto espacial global, onde a escassez do recurso pesqueiro é cada vez mais maior, as rivalidades tendem a aumentar, tanto em quantidade quanto em nível de violência. Spijkers et al. (2017), destaca questões que podem motivar o conflito marinho, a sobrepesca (maioria), condições climáticas, questões de segurança, questões sociais, econômicas e ecológicas. Ou seja, há outros fatores que propiciam o conflito e que vão além da pesca em si, envolve a gestão da pesca.

Então, sabendo que os recursos pesqueiros são de fato uma riqueza potencial, acabam sofrendo de uma ganância múltipla de diferentes níveis e escalas (ROUX; NOËL, 2007), logo

exigindo a compreensão da estrutura espacial da pesca. Para este entendimento a abordagem multidisciplinar proposta por Corlay (1993) do geossistema haliêutico se destaca por apresenta os níveis e as escalas classificando a estrutura espacial pesqueira em três partes: espaços de produção (dentro da qual os recursos são tomados), de distribuição (onde ocorre a comercialização e o consumo de produtos) e de polarização (ponto de junção entre os outros dois espaços, onde ocorre o processamento do produto, administração, etc.). E com base nessa abordagem é possível analisar o sistema pesqueiro no contexto espacial globalizado, em permanente reorganização, e que está gerando rivalidades violentas pela escassez de recursos e pela degradação do ambiente marinho.

Com a globalização, a industrialização e a demanda constante e crescente por alimentos levou o setor pesqueiro à sobre-exploração pesqueira, a recomposições socioespaciais contraditórias em escala mundial e a processos de desterritorialização dessas atividades. Isto porque o setor agora é “dominado por multinacionais poderosas, tanto na produção - Pescanova na Espanha, quanto na distribuição - Findus do Grupo Suíço Nestlé, organizando o setor a partir de grandes plataformas - grandes pontos de polarização de pesca” (ROUX; NOËL, 2007, p. 70), repercutindo em todos os níveis e escalas da atividade.

Os conflitos territoriais são os mais violentos [...] em março de 1995, um destroier canadense embarcou em uma traineira espanhola em águas internacionais, a 260 milhas da costa de Terra Nova para proibir a pesca de turbot (Scophthalmus maximus), esse incidente naval causou uma grande tensão entre o Canadá e a UE. [...] Na Índia, em 1997, os pescadores tradicionais que trabalham com artes de pesca "passivas" (armadilhas, espinhel) opõem-se violentamente aos camaroeiros estrangeiros que utilizam artes mais "ativas" (redes de arrasto, redes de cerco). [...] em termos de comércio, um dos conflitos mais contundentes continua sendo o dos Estados Unidos e do México em 1991, quando os Estados Unidos impuseram um embargo às

importações de atum mexicano alegando falta de cumprimento das normas ambientais

para a proteção dos golfinhos pelos pescadores (ROUX; NOËL, 2007, p. 72).

A perspectiva histórica das atividades de pesca demonstra a natureza conflituosa em que se tornou, com potencial de aumento na quantidade de conflitos, em razão de diversos fatores: variabilidade climática, o rápido crescimento populacional, a desigualdade social e a expansão das zonas econômicas em torno das nações costeiras e principalmente a sobrepesca (SPIJKERS

et al., 2017). Todos esses fatores devem se manter ou se intensificar nos anos seguinte. Então

a compreensão mais profunda da complexa interação entre os condutores do conflito de pesca é importante para evitá-los ou mitigá-los.

3.2 A situação da exploração pesqueira no Brasil

A exploração pesqueira no Brasil ocorre dentro da plataforma continental brasileira, que se localiza na borda ocidental do Atlântico meridional, tem cerca de 8.400 km extensão e 5,5 milhões de hectares de reservatórios de água doce, e abrange diferentes zonas climáticas e diferentes capacidades de cargas sólida e líquida do sistema hídrico (MUEHE; GARCEZ, 2008; CARLSON, 2014). As “fronteiras marítimas são bem definidas com o Uruguai ao sul e da Guiana Francesa para o norte” (FIATIKOSKI, 2011, p. 1). Conforme a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) e a Plataforma Continental (PC) (Mapa 5) dão “ Brasil tem um domínio de cerca de 4,5 milhões de km² de bens econômicos marinhos (vivos e não-vivos)” (FIATIKOSKI, 2011, p. 1).