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2. APORTES TEÓRICOS

3.2 SUBSÍDIOS PARA A PESQUISA – OS TUTORES DE 2011

Em março de 2011, a Fundação CECIERJ lançou um edital público para seleção de tutores para o Curso de Aperfeiçoamento. O edital previa 72 vagas para início dos trabalhos em agosto do mesmo ano. A seleção dos tutores ocorreu em duas etapas: a primeira, caracterizada por análise curricular e, a segunda calcada em uma formação teórico-prática em tutoria para Educação a Distância.

Para se inscrever na seleção, o candidato deveria atender aos seguintes requisitos: ser licenciado em Matemática, ser especialista, mestre ou doutor em áreas afins à Matemática ou Educação Matemática, possuir coeficiente de rendimento acumulado igual ou superior a sete na graduação, ter domínio de navegação na internet e uso de e-mail. Dessa forma, esperávamos atrair profissionais que tivessem sólida formação matemática, alguma formação pedagógica e habilidades com o uso da Internet. Entretanto, estávamos cientes de que esses conhecimentos precisariam ser potencializados ou direcionados para o que se esperava da atuação dos tutores no Curso de Aperfeiçoamento.

As atribuições do tutor que figuravam naquele edital eram:

- acessar diariamente o ambiente virtual de aprendizagem sob sua responsabilidade e responder às dúvidas postadas pelos alunos; - atuar diariamente como mediador nos fóruns realizados no ambiente virtual de aprendizagem, motivando os alunos, utilizando linguagem clara e objetiva, e ainda observando as normas de cortesia;

- avaliar as tarefas dos cursistas dentro dos prazos estabelecidos pela coordenação, e sugerir aos cursistas as correções a serem efetuadas; - após as correções enviadas pelos cursistas, reavaliar as tarefas. (Fundação CECIERJ, 2011a, p. 2)

Os critérios de pontuação para análise dos currículos dos candidatos priorizavam, nesta ordem: professor da rede pública estadual ou federal com mestrado ou doutorado; professor da rede pública estadual ou federal com especialização; professor com mestrado; professor com especialização;

professor com experiência comprovada em tutoria a distância; maior coeficiente de rendimento acumulado da Licenciatura.

Professores da rede estadual foram priorizados porque o Curso de Aperfeiçoamento é destinado a professores do estado, e isso poderia ser um componente importante para seu envolvimento com o Curso. Professores da rede federal foram também priorizados, porque a SEEDUC entendeu que eram professores mais preparados, uma vez que foram aprovados em concursos, em geral, mais rigorosos e concorridos.

O primeiro edital recebeu inscrição de 150 profissionais, sendo apenas 100 classificados para a segunda etapa, que consistiu de um curso de formação inicial para tutores a distância. Esse curso teve duração de quatro semanas e foi realizado na modalidade semipresencial.

Ao longo de cada semana foi discutido um dos seguintes temas, nesta ordem: fundamentos da EaD, o papel do tutor em cursos a distância, estratégias de mediação pedagógica e a metodologia do Curso de Aperfeiçoamento. Dessa etapa participaram efetivamente 80 classificados, dos quais 72 assumiram turmas com cerca de 30 professores cursistas cada, e com carga horária semanal de 20h de trabalho, cumpridas remotamente.

A primeira semana do curso de formação de tutores se desenvolveu online, por meio da plataforma Moodle. Os candidatos a tutores foram introduzidos ao ambiente virtual e a noções de EaD. Além disso, foram estimulados a aprofundar o estudo de tecnologias educacionais, a fim de melhor orientar o cursista a utilizar multimeios atraentes para o desenvolvimento de processos cognitivos autônomos.

Ao fim da primeira semana ocorreu um encontro presencial com os coordenadores e conteudistas do Curso de Aperfeiçoamento. O objetivo foi apresentar o Programa de Formação Continuada aos candidatos, a fim de que compreendessem em detalhes a proposta, e, também, para que pudessem tirar suas dúvidas a respeito do uso da plataforma Moodle.

Na segunda semana, foi proposto um fórum de discussão sobre a qualidade da comunicação e o exercício da tutoria como mediadora e incentivadora da aprendizagem individual e coletiva, a partir da leitura de textos que foram disponibilizados.

O objetivo da terceira semana foi dar formação aos tutores para confeccionarem um plano de trabalho (plano de aula estendido, envolvendo todo um conteúdo) semelhante ao que seria desenvolvido pelos cursistas, com foco nos conteúdos bimestrais do Currículo Mínimo. Com isso eles puderam conhecer e se apropriar de parte do material didático produzido para o Curso, além de vivenciar as eventuais dificuldades pelas quais os cursistas poderiam passar.

Na quarta semana os temas das discussões foram os fundamentos que sustentam conceitual e metodologicamente o Curso de Aperfeiçoamento, passando por recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais e por uma breve apresentação da metodologia de design e redesign de projetos (MION e ANGOTTI, 2005), utilizada para construção e reconstrução dos planos.

Ainda na quarta semana, os candidatos a tutores tiveram a oportunidade de analisar as atividades dos colegas, por meio de documentos não identificados. O objetivo foi mostrar a relevância e a qualidade do feedback dos tutores, o uso das regras de polidez na formulação de críticas construtivas e o papel do incentivo na superação de fragilidades e na redução da evasão. O encerramento da formação se deu em um encontro presencial, em que toda o curso foi consolidado por meio de palestras e grupos de discussão.

A formação dos tutores foi realizada inicialmente por um grupo de cinco professores convidados, experientes em formação continuada de professores de Matemática e em formação de tutores para a modalidade a distância. Esses professores são licenciados em Matemática e têm titulação mínima de mestrado em área a fim. Posteriormente, foi realizado um edital que selecionou dez professores com a formação e experiência citadas, dos quais nove assumiram a coordenação de grupos com cerca de oito tutores.

A formação em serviço dos tutores ingressantes em 2011 foi realizada por meio de um fórum permanente, com lançamento de tópicos debatendo as dificuldades/soluções encontradas durante a prática da tutoria, discussão sobre os conteúdos do Currículo Mínimo que são ministrados ao longo do Curso de Aperfeiçoamento, em paralelo, e textos selecionados sobre mediação pedagógica e ensino de Matemática.

Ao fim do curso de formação inicial de tutores, os candidatos selecionados para o cargo foram convidados a preencher um questionário com catorze

expectativas em relação à atuação como tutor, dificuldades esperadas, experiências formando outros professores, com EaD e, por fim, sobre a formação recebida.

Dos 72, apenas 50 tutores responderam ao questionário, que figura no Apêndice 1. Nosso interesse com esse questionário era conhecer o perfil profissional dos professores que se candidataram à tutoria e, ao longo de alguns meses, verificar, por meio da observação de suas práticas no ambiente virtual, de sua avaliação por parte dos professores cursistas e dos relatórios gerados pelos coordenadores de tutoria, se o perfil desejado pelo edital era de fato compatível com as demandas do Curso de Aperfeiçoamento.

A cada dois meses os professores cursistas faziam uma avaliação objetiva do Curso, incluindo a mediação pedagógica e o papel do tutor em sua formação. Essa avaliação ocorria de maneira anônima por meio de um formulário desenvolvido no aplicativo online Google Spreadsheet. As perguntas que os professores cursistas respondiam sobre seus tutores eram:

1. O tutor promove o debate amigável e construtivo?

2. O tutor diminui o sentimento de isolamento comum em cursos na modalidade a distância?

3. O tutor responde suas perguntas em menos de 24 horas?

4. O tutor encoraja aos cursistas para que participem e desenvolvam a autonomia no processo de ensino-aprendizagem?

5. As postagens do tutor auxiliam na compreensão dos textos base e dos roteiros de ação?

6. No Fórum “Fale com o seu Tutor”, todas as suas dúvidas foram respondidas? 7. O tutor possui capacidade de análise e síntese?

8. O tutor é “presente” e interativo?

9. O tutor indica novas fontes de pesquisa?

10. O tutor dá feedback das tarefas justificando os critérios de correção utilizados?

Já os coordenadores avaliavam os tutores semanalmente, por meio de um relatório com informações quantitativas e qualitativas, pontuando a

de prazos, qualidade no feedback que acompanhava as notas dos cursistas e outros quesitos que julgassem relevantes. No Anexo 1, apresentamos o modelo do relatório semanal, e no Anexo 2, o modelo do relatório bimestral.

A partir do cruzamento dos dados gerados a partir das avaliações dos cursistas, coordenadores de tutoria e das respostas ao questionário aplicado ao fim do curso de formação inicial em tutoria, foram selecionados 32 tutores para terem seu trabalho acompanhado por seis meses. Esses tutores foram os mais bem avaliados a partir dos critérios supracitados e que registraram, em suas respostas ao questionário, o desejo de crescimento profissional por meio da possibilidade de formar outros professores na modalidade a distância.

Observamos, então, o trabalho de 32 tutores ao longo de seis meses do Curso, com o intuito de identificar os tipos de mediação utilizados por cada um dos tutores, e categorizá-los a partir da frequência em cada fórum de discussão. Foram observados 12 fóruns com duração de 15 dias cada, e consideramos que o tutor exerceu um determinado tipo de mediação quando o tipo por nós identificado aparecia mais de duas vezes em pelo menos 9 dos 12 fóruns realizados, ou seja, pela recorrência de posturas e discursos utilizados pelos tutores nesses fóruns. Escolhemos acompanhar, estrategicamente, os fóruns entre o quarto e o décimo mês do Curso, para que os tutores tivessem tempo de se familiarizar com suas atribuições e os resultados fossem mais confiáveis.

Como técnica para a coleta de dados utilizamos a observação participante, que permitiu acompanhar as práticas dos tutores a respeito de questões específicas ao longo do tempo e categorizar os tipos de mediação mais frequentes entre os tutores melhor avaliados.

A condução de uma pesquisa social usando novas tecnologias e mídias de comunicação tem seus próprios desafios, e talvez o maior deles seja desenvolver categorias de análise que nos permitam capturar imbricações complexas de tecnologia e sociedade e, por isso, recorreremos à análise temática de conteúdo, com a categorização sendo realizada a partir dos dados, e não previamente (LAVILLE e DIONNE, 2008).

Com o objetivo de explicitar os tipos de mediação realizados em cada categoria que propomos, apresentamos abaixo uma breve descrição seguida de um exemplo de postagem realizada no Curso, com os tutores e cursistas

tutores não são os sujeitos desta pesquisa e são citados apenas para caracterizar os tipos de mediação recorrentes no Curso oferecido entre 2011- 2012.

(1) Mediação que gerencia o fórum: intervenções que iniciam os fóruns, propondo temas e formas de discussão; que organizam as discussões, a fim de facilitar a comunicação entre os cursistas; que encerram os fóruns, sintetizando as discussões.

Contexto do exemplo: a tutora Talita adverte os cursistas a respeito de se posicionarem sobre todos os tópicos propostos no fórum, quinzenal e dividido em três etapas subsequentes.

Olá, Pessoal,

Gostaria de lembrá-los da necessidade de atender aos três tópicos do fórum. Muitos responderam somente a primeira pergunta, outros não comentaram a postagem dos colegas e a maioria não realizou a terceira etapa. Ainda há tempo!

Por favor, não se sintam incomodados, esta postagem é apenas um lembrete para orientá-los. Alguns de vocês já cumpriram todas as etapas.

Abraços, Talita.

(2) Mediação que convida à reflexão: intervenções que buscam aprofundar as discussões a partir das falas dos cursistas, que são tratadas pelos tutores, que as transformam em novas perguntas de resposta não imediata.

Contexto do exemplo: o tutor Bernardo, conversando com professores do nono ano do Ensino Fundamental, os convida para uma reflexão sobre a introdução de trechos da história como elemento motivador para a construção de conceitos matemáticos, mostrando como, à época em que foram construídos, tais conceitos eram necessários; ele finaliza questionando sobre um trabalho interdisciplinar entre Matemática e História.

Olá Fred,

É isso mesmo que devemos fazer. Afinal de contas, não estudamos história sem algum motivo, correto?

Então, o que os matemáticos pensavam na época para

descobrir/inventar tais números e notações? Quais problemas eles estavam tentando resolver?

O aluno precisa saber o porquê de cada assunto! Mesmo que seja de maneira superficial e simplista, mas que poderá ajudá-lo a

compreender a importância do tema.

Pergunta: podemos aliar o estudo da Matemática com o da História? Como podemos fazer isso em nossas escolas?

Abraço, Bernardo.

(3) Mediação que mostra domínio do conteúdo: intervenções em que fica evidente o conhecimento do material didático utilizado no Curso, das releituras de conteúdos matemáticos e estratégias didático-pedagógicas propostas.

Contexto do exemplo: a tutora Carmen mostra conhecimento do texto base, citando-o em dois momentos de sua postagem, conversando com o cursista Miguel, professor da primeira série do Ensino Médio, sobre a falta de cuidado na definição de número irracional presente em grande parte dos livros didáticos.

Olá, Miguel!!

Pois é, estas definições são as mais encontradas nos livros didáticos e não é de se estranhar que nossos alunos encontrem tamanha dificuldade, a propósito, esta dificuldade não se restringe a nós brasileiros. ;-)

Esta definição me garantiria, então, que o número complexo i é um irracional, pois não pode ser escrito em forma p/q, com p, q inteiros e q diferente de zero, como verá em nosso material. O que acha disso? E a que se refere a representação decimal, já parte do pressuposto que existem tais números, neste caso os próprios irracionais são usados para defini-los, isso é mesmo esquisito não acha? Leia o “Saiba Mais” ao fim do texto.

Aguardo novas contribuições Abraços, Carmen.

(4) Mediação que incentiva a interação entre cursistas: os tutores vão além de convidar o grupo a opinar a respeito da postagem de um colega e relacionam postagens de diferentes cursistas, estimulando-os a se posicionarem a respeito. Contexto do exemplo: o tutor se vale de postagens anteriores de alguns cursistas, defendendo a importância do ensino de Conjuntos e os instiga a retomar a discussão e responder a uma nova pergunta.

Olá João Gabriel, Maria e Célio,

Como vocês bem comentaram, além de ser base para se trabalhar conteúdos posteriores e o raciocínio lógico, é nesse momento do aprendizado que o aluno poderá ter um maior esclarecimento a respeito das características dos conjuntos, como, por exemplo, a possibilidade de um conjunto ser infinito. Não acham?!?!

É muito bom ver que vocês estão em sintonia. Isso ajuda na interação e troca de saberes entre todos. Parabéns! Outros cursistas podem e devem se posicionar também.

Vale a pena falar de conjuntos infinitos na escola? De que forma? Um abraço,

Wendel.

(5) Mediação que incentiva o aprofundamento das discussões: intervenções nas quais os tutores enriquecem as discussões, indo além do proposto no fórum e no material didático, sugerindo outras fontes de estudo e pesquisa e relações com outros conteúdos matemáticos e áreas do conhecimento.

Contexto do exemplo: em uma discussão relacionada ao ensino de Números Reais, com professores do nono ano do ensino fundamental, a tutora Beth propõe o enriquecimento de seus conhecimentos, sugerindo tópicos que fogem ao currículo prescrito, mas que podem ser relacionados com o tema e propiciar diferentes abordagens em sala de aula.

“Olá professores,

Uma das coisas que precisamos mostrar aos nossos alunos, quando tratamos do assunto números reais, é o conceito de infinito.

Deixo dois tópicos onde vocês podem aprofundar e levar para sala de aula:

Paradoxo de Zenão: Vejam o paradoxo da dicotomia no link [...]. É geralmente usado em PA (Progressão Aritmética), mas encaixa-se aqui também.

Método Babilônico para raízes: é um algoritmo para achar raízes. Segue o link também [...].

Abraço, Tutora Beth.

Postos os tipos de mediação que caracterizam cada categoria, os resultados da observação são apresentados na Figura 16, e mostram que a maior parte dos tutores se preocupou em gerenciar os fóruns de discussão,

zelando pela organização das discussões e não permitindo conversas que não tratassem dos temas propostos. Percebemos também que, de maneira geral, os tutores se preocuparam em promover a reflexão dos cursistas, postando mensagens que os levassem a repensar ideias e posturas relacionadas aos conteúdos matemáticos e à própria atividade docente.

Por outro lado, apenas seis tutores explicitaram seu conhecimento sobre os conteúdos matemáticos discutidos no material didático. É possível que isso se justifique porque postagens mais “conteudistas” não se fizeram necessárias, mas, ainda assim, consideramos esse o principal ponto a ser melhorado em suas práticas, visto que apenas 14 tutores se preocuparam em fomentar o aprofundamento das discussões, o principal objetivo dos fóruns.

Figura 16: Frequência dos tipos de mediação identificados nos fóruns de discussão. Fonte: Esquincalha e Abar (2012).

Como observamos na Figura 16, poucos tutores mostraram domínio do conteúdo, um conhecimento fundamental para o bom desempenho da função, segundo o aporte teórico TPACK. Porém, as outras categorias indicam que os tutores manifestaram de maneira significativa o conhecimento pedagógico intrínseco a cada uma delas. Ressaltamos que o fato dos conhecimentos de conteúdo não terem sido manifestados nos fóruns de discussão não significa que os tutores não os têm desenvolvidos; apenas indica que precisam buscar estratégias para explorá-los na condução das discussões realizadas.

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Gerencia o fórum Convida à reflexão Mostra domínio de conteúdo Incentiva a interação entre cursistas Incentiva o aprofundamento das discussões N ú m e r o d e Tu to r e s