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Criado por Shigeru Miyamoto e publicado em 1986 pela Nintendo, Super Mario

Brothers foi um dos primeiros videogames a aplicar um nível relativamente complexo

de simulação física a um personagem, não apenas a objetos. O personagem principal já havia aparecido em dois games de Miyamoto: Donkey Kong, de 1981, e

Mario Brothers, de 1983. Nesses primeiros games, o modelo de física limitava-se a

mapear, muitas vezes de forma direta, os botões do controle aos movimentos do personagem (por exemplo, ao pressionar-se o botão “esquerda”, o personagem movia-se a uma distância pré-definida naquela direção). Na versão de 1986, entretanto, um modelo mais elaborado de simulação física foi utilizado: Mario era submetido a aceleração quando comandado a se movimentar, desacelerava em virtude de fricção simulada quando o botão era solto, saltava em trajetórias características sob efeito de gravidade simulada e tinha sua velocidade limitada,

como que pelo atrito com o solo ou com o ar, tanto em movimentos horizontais como em saltos e quedas. Sempre achei que Super Mario Brothers diferia de outros games da época em aspectos importantes. O game era muito agradável de se jogar. Havia uma sensação fluida de controle, que ajudava a criar um forte vínculo com o personagem e seu ambiente, algo bem diferente dos comandos robotizados de outros games. Uma característica especial eram os saltos de Mario, o modo como se mantinha algum controle mesmo com o personagem no ar, a trajetória que podia ser modificada de acordo como o tempo em que se mantinha o botão de salto pressionado, detalhes que não se encontravam em tantos outros games similares que surgiram nos anos seguintes.

Figura 1.5. Super Mario Brothers, 1986.

Em seu livro Game Feel – A Game Designer's Guide to Virtual Sensation, Steve Swink analisa, define, apresenta exemplos e desenvolve métricas para um dos aspectos mais importantes da interatividade nos games: a mecânica que gera sensações reais a partir do virtual, característica que ele denomina game feel10. Particularmente interessante é a técnica por ele desenvolvida para medir tempos de respostas a comandos de games: A tela do game é filmada com uma câmera digital relativamente comum, em 60 quadros por segundo, com o controlador sendo

10 Significando literalmente “sensação de jogo”, game feel refere-se às sensações experimentadas pelo jogador

acionado na mesma imagem capturada pela câmera. Contando os quadros do vídeo entre um evento e outro é possível medir o tempo entre o acionamento de um comando e a resposta apresentada na tela com resolução de aproximadamente 17 milésimos de segundo.

O décimo terceiro capítulo do livro é dedicado a Super Mario Brothers. Swink analisa o game em detalhes, aplicando métricas desenvolvidas nos capítulos anteriores, e chega a resultados reveladores. Sobre a simulação de gravidade e os saltos característicos de Mario, por exemplo:

Mas essa força da gravidade é variável. No momento em que o botão de salto é pressionado, certa velocidade para cima é instantaneamente transmitida a Mario, neutralizando a atração constante da gravidade e lançando-o num arco flutuante, gracioso. A velocidade ascensional é gradualmente reduzida enquanto a gravidade atua novamente. No ápice do salto, quando a velocidade atinge zero, a gravidade é elevada artificialmente por um fator de três, puxando Mario de volta para o chão com uma força muito maior do que aquela que ele superou anteriormente ao decolar (SWINK, 2009, p. 211, tradução nossa)11.

Swink (2009) detectou um significativo aumento da aceleração de gravidade no ápice da curva, resultando na trajetória ilustrada abaixo.

Figura 1.6. A mecânica modificada de Super Mario Brothers: alterações no vetor de aceleração da

gravidade.

11But this gravity force is variable. At the moment the jump button gets pressed, Mario is instantaneously

imparted with a certain upward velocity, which counteracts the constant downward pull of gravity, launching him into a soaring, graceful arc. This upward velocity is gradually reduced as gravity takes hold again. At the apex of the jump, when velocity reaches 0, gravity is raised artificially by a factor of three, pulling Mario back to the ground with a much greater force than the one he overcame to get airborne in the first place (SWINK, 2009, p. 211).

Após atingir o ponto mais alto da trajetória, o personagem desce abruptamente. O resultado dessa manipulação da gravidade é um gameplay que prioriza o controle do jogador: como Mario pode ser levemente controlado durante o salto, na subida tem- se mais tempo para dirigi-lo ao seu objetivo, seja ele uma nova plataforma ou um bloco a ser quebrado. Com a descida abrupta, ganha-se novamente o controle mais efetivo, no solo, de forma muito mais rápida do que se respeitássemos a trajetória “correta” do salto. A descida acelerada facilita, também, o ataque a inimigos como os

Goombas. Esse é apenas um exemplo de como Shigeru Miyamoto foi capaz de

entender e explorar a mecânica de seus games, fator que em muito contribuiu para o estabelecimento de sua conhecida reputação como game designer.

Miyamoto compreendeu game feel não em termos de simulação, mas de simplificação. Primeiro, ele considerava a sensação de um game artisticamente, como experiência estética combinada. Numa época em que o campo era dominado por engenheiros que, na tradição de Steve Russell, baseavam-se em complexas metáforas literais, como a atração gravitacional dos buracos negros ou a alunissagem de uma nave espacial, Miyamoto trouxe uma perspectiva revigorante e ingênua. Ele queria simplesmente criar games divertidos e coloridos, sobre personagens extravagantes, que as pessoas se sentissem bem ao jogar. Segundo, ele projetou jogos de forma holística, levando em consideração tanto o software como dispositivos de entrada. (até hoje, Miyamoto projeta controladores assim como games, uma raridade entre os designers, especialmente agora, com a morte do

arcade). Finalmente, Miyamoto entendeu o poder da metáfora e como ela

afeta a disposição dos jogadores para aprender e dominar um sistema complexo, bem como seu apego emocional a ele (SWINK, 2009, p. 202, tradução nossa)12.

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