• Nenhum resultado encontrado

Formas de administração e dosagem

O recurso mais antigo e simples de se prevenir e tratar a anemia é utilizando-se de compostos de ferro. A administração via oral é a forma preferencial, sendo a administração parenteral de ferro-dextran reservada a pacientes com impossibilidade de deglutição ou com síndromes de má-absorção. Os riscos associados com a terapêutica parenteral (agravamento de malária, risco de contaminação intravenosa, aumento de morbidade) e o alto custo dessa soluções restringem sua aplicação somente para quando houver supervisão médica (ACC/SCN, 1991). Apenas nos casos mais severos — Hb < 3g/dL — opta-se por transfusão sangüínea (DeMAEYER, 1989).

Existem diferentes tipos de sais de ferro a serem empregados para administração oral, tais como o sulfato, fumarato e gluconato, mas o sulfato ferroso (FeSO4) é o

mais barato e eficientemente utilizado pelo organismo. Na verdade, ele é um dos medicamentos mais baratos utilizados nos cuidados de saúde (ACC/SCN, 1991). Esses compostos são utilizados na forma de tabletes de ferro ou soluções líquidas. O tablete é a forma mais econômica de administração, contém cerca de 30% de ferro elementar e desintegra-se bem no estômago. As soluções usualmente são mais caras e contém menos ferro em sua composição, além de quimicamente mais instáveis, porém são muito úteis no tratamento pediátrico. Podem ser administradas na forma de gotas ou em colher ou medida-padrão. O ideal seria uma solução com alta concentração de ferro e boa palatabilidade, binômio que nem sempre se consegue atingir (USAID/UNICEF, 1997).

Uma nova forma de administração de ferro via oral foi criada, denominada Gastric Delivery System (GDS), baseada em estudos humanos desenvolvidos em laboratórios. Trata-se de cápsulas de ferro com liberação lenta do micromineral para o organismo. O objetivo do novo suplemento é reter o nutriente no estômago e liberá-lo lentamente, melhorando sua absorção e eliminado os sintomas gastrointestinais indesejáveis (COOK et al, 1990; SIMMONS et al, 1993). Resultados demonstram que uma única dose diária com 50 mg Fe provê a mesma quantidade de ferro absorvido que as tradicionais cápsulas de sulfato ferroso com igualmente 50 mg Fe ingeridas três vezes por dia (COOK et al, 1990). O custo desse medicamento parece não ser caro, especialmente se produzido em larga escala. Promete ser, no futuro, uma ótima opção para suplementação em adultos, especialmente gestantes, mas para uso pediátrico ainda não substitui os elixires, distribuídos às crianças pré-escolares ainda não capazes de deglutir cápsulas.

A dose recomendada de ferro para programas de suplementação em pré-escolares varia muito na literatura científica. A OMS (DeMAEYER, 1989) distingue a dosagem de ferro elementar direcionada para tratamento em crianças pré-escolares – 3 mg / kg / dia – daquela a ser utilizada em prevenção – 30 mg/dia a ser oferecida por 2 a 3 semanas várias vezes ao ano. Considerando que uma criança nessa faixa etária de 6 meses a 5 anos tem um peso variando entre 7 a 20 kg, essa dose preventiva acabaria ultrapassando a dose terapêutica para as crianças menores de 10 kg. Esse mesmo documento, no entanto, afirma que “em programas de larga escala,

particularmente em países em desenvolvimento, onde avaliação sistemática em laboratório é praticamente e financeiramente impossível, (...) a abordagem com melhor custo/benefício seria oferecer suplementos para a totalidade dos grupos de risco, (...). Com essa abordagem, a distinção entre prevenção e tratamento torna-se vaga e a suplementação atua tanto para reverter a anemia em alguns indivíduos como para prevenir o desenvolvimento em outros”*. Em outras palavras, as doses propostas para prevenção e tratamento seriam as mesmas, considerando áreas endêmicas de países em desenvolvimento.

Outro comitê das Nações Unidas a elaborar recomendações em pré-escolares, o ACC/SCN (1991), distingue doses preventivas de terapêuticas como 1 mg e 3 mg Fe / kg / dia, respectivamente. Ainda assim, da mesma forma que a OMS, admite a utilização de dose única diária de 30 mg Fe por 2 a 3 semanas, “várias vezes ao ano”, em áreas onde a deficiência em pré-escolares seja muito prevalente.

A posologia recomendada nos clássicos tratados de pediatria (NELSON..., 1983) é algo superior às recomendações propostas pelos organismos internacionais, variando de 4 a 6 mg / kg / dia de ferro elementar a ser oferecido por 3 meses. Talvez estejam procurando compensar nessa recomendação a baixa adesão ao tratamento.

Em uma reunião em 1996 organizada pela UNICEF (USAID/UNICEF, 1997), esses valores foram bastante discutidos, visto que até o momento não existe nenhum suplemento profilático com ferro que seja de baixo-custo, que possa ser aplicado em larga escala e direcionado para crianças que não são capazes de engolir ou tenham dificuldades para tal. Entendeu-se que uma dose diária de 12,5 mg de ferro elementar via oral, com 5% de absorção, atingiria 90% das recomendações de ingestão para uma criança entre 6 e 18 meses de idade, se for considerada a recomendação canadense para essa faixa etária de 0,7 mg/dia.

Conforme pode-se perceber nesses informes, existem muitas disparidades, o que reflete as mesmas diferenças observadas no estabelecimento das necessidades desse mineral para o organismo. Além disso, ao se estabelecerem as doses, há que se considerar a baixa biodisponibilidade do mineral, a fraca adesão ao tratamento, sem esquecer que uma elevada concentração acentuaria a cor e gosto da solução.

É inegável que o estabelecimento de uma dose única facilitaria a oferta do suplemento em programas de saúde em larga escala. Infelizmente, ao se estabelecer uma determinada dosagem para pré-escolares, pode-se conduzir a erros com algumas crianças anêmicas recebendo subdosagem e não corrigindo a carência. É preferível, portanto, estabelecer doses baseadas em peso médio de acordo com delimitadas faixas etárias.

Eficácia de programas de suplementação

A suplementação é ainda a melhor estratégia de tratamento a curto prazo. Envolve etapas contrárias à depleção de ferro, pois inicialmente repõe os componentes funcionais e depois os estoques de ferro. A maior quantidade de ferro absorvido ocorre nas primeiras semanas de tratamento. A reposição de estoques se dá lentamente e, portanto, a terapia deve continuar por várias semanas após os níveis de hemoglobina retornarem ao normal.

Tem sido utilizada primordialmente a nível clínico mas, a despeito de sua reconhecida eficácia em ensaios clínicos supervisionados, não mostra-se eficiente em nível populacional, como foi observado em muitos países em desenvolvimento (PALTI et al, 1987; ROMANI et al, 1991; TORRES et al, 1994; SZARFARC et al, 1996). Essa ineficiência tem sido atribuída a diversos fatores incluindo doses insuficientes, tempo de tratamento e baixa adesão. Para contornar, administram-se doses elevadas, o que tem se mostrado igualmente problemático, uma vez que acarreta aumento de efeitos deletérios.

A melhoria da eficiência dos programas que baseiam-se na recomendação de suplementos de ferro seria um importante passo para no futuro reverter a gravidade da situação.