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Capítulo I Revisão bibliográfica

3. O Silenciamento gênico

3.4. O silenciamento de RNA como um mecanismo de defesa da célula contra vírus

3.4.1. Supressores virais do silenciamento gênico

A importância do silenciamento como mecanismo de defesa antiviral em plantas se reflete na evolução dos genomas virais, que adquiriram, ao longo do processo evolutivo, proteínas com função de supressão de silenciamento gênico (Ding et al., 2004).

Em contrapartida aos mecanismos celulares do hospedeiro que impedem a multiplicação viral (Llave et al., 2000; Ding et al., 2004; Li e Ding, 2001; Roth et al., 2004), muitos vírus de plantas codificam proteínas que interferem em um ou em vários aspectos da via de silenciamento.

Tais proteínas virais têm a capacidade de suprimir o silenciamento (Lichner et al., 2003; Vance e Vaucheret, 2001; Waterhouse et al., 1998; Waterhouse et al., 2001). Algumas dessas proteínas, descritas inicialmente como fatores de virulência ou determinantes de patogenicidade, são necessárias para a infecção sistêmica do hospedeiro (Kormelink et al., 1991; Anandalakshmi et al., 1998; Vanitharani et al., 2003).

Os supressores virais de silenciamento têm como alvo a maquinaria de RNAi desde a geração dos siRNAs até depois de sua incorporação ao RISC, permitindo, assim, replicações e acúmulos virais mais altos (Franz et al., 2006; Bouloy et al., 2001; Lindbo e Dougherty, 1992; Pruss et al., 1997; Ullman et al., 1993; Billecocq et al., 2004; Yokotaa et al. 2005; Ikegami et al., 2005).

A seguir, será feito um breve relato de algumas das proteínas relacionadas à supressão do silenciamento gênico.

A proteína AC2, encontrada em todas as espécies do gênero Begomovirus, foi identificada como um fator de transcrição requerido para ativar a expressão de genes virais tardios (Sunter e Bisaro, 1992, 1997, 2003) como por exemplo, dos genes que expressam a proteína capsidial e a proteína de movimento BV1, e, por isso, é chamada também de proteína ativadora transcricional – TrAP (transcriptional activator protein). Usando o vetor Potato virus X (PVX) contendo os transgenes GFP e AC2 de African cassava mosaic virus (ACMV), Voinnet et al. (1999) mostraram que AC2 foi capaz de inverter o silenciamento para GFP, em plantas de Nicotiana benthamiana. Esse dado foi corroborado por estudos similares com o tipo-selvagem e o mutante da proteína AC2 de Tomato yellow leaf curl virus (TYLCV), que confirmaram a supressão (Dong et al., 2003; Van Wezel et al., 2002). Entretanto, a AC2 dos vírus TYLCV e ACMV não se liga a siRNA ou miRNA (Chellappan et al., 2005; Wang et al., 2005). Assim, sugere-se que aquela

proteína atue no núcleo por um mecanismo dependente da interação com DNA e da atividade de ativação transcricional.

O perfil transcricional de protoplastos de Arabidopsis, após a expressão transiente de AC2 de ACMV e de Mungbean yellow mosaic virus-Vigna (MYMV), mostrou que essa proteína induziu a expressão de aproximadamente 30 genes, incluindo o WEL1 (Werner exonuclease-like 1). Análise posterior indicou que a proteína WEL1 é capaz de suprimir o silenciamento de RNA em linhagens transgênica de N. benthamiana contendo GFP (Trinks et al., 2005). Conclui-se, então, que AC2 suprime o silenciamento indiretamente, ativando a expressão de uma proteína celular que funciona como um regulador negativo endógeno do sistema (Bisaro, 2006).

Recentemente, foi reportado que AC2 de Tomato golden mosaic virus (TGMV) forma um complexo com o PPD2, um fator de transcrição de Arabdopsis, e o promotor da capa protéica (CP). Essa interação conduz a ativação da expressão do gene CP (Lacatus e Sunter, 2009).

A NS1 do vírus Influenza A é uma proteína não estrutural, expressa em altos níveis em células infectadas, que tem sido relacionada à inibição da defesa antiviral mediada por interferons α e ß (Garcia et al., 2001), à regulação da tradução viral (Aragon et al., 2000; Enami e Enami, 2000) e à inibição do RNAm do hospedeiro por mecanismos de supressão de RNA (Qian et al., 1994; Lu et al., 1995; Krug et al., 2003). Bucher et al. (2004) demonstraram que, em plantas, a proteína NS1 tem atividade de supressão de silenciamento de RNA, por se ligar ao siRNA.

Segundo os relatos de Takeda et al. (2002), a proteína NSs de TSWV foi o primeiro supressor de silenciamento gênico encontrado em um vírus de RNA fita-negativa, de plantas de N. benthamiana. No trabalho, sugere-se que a ação de supressão de silenciamento de RNA pela proteína NSs de Tomato spotted wilt virus (TSWV) pode ocorrer na etapa Dicer, durante a geração de dsRNA, ou posteriormente, na etapa Risc, ligando-se ao siRNAs. Em experimentos de co-infiltração com Agrobacterium contendo os genes NSM, NSS, G1 e G2 de TSWV, apenas o NSs

suprimiu o silenciamento por GFP em plantas de N. benthamiana transgênicas (Bucher et al., 2003).

Células de carrapato (Arachnida: Ixodidae) co-infectadas com um Semliki Forest virus recombinante expressor de luciferase (SFV-Luc) e outro SFV recombinante expressor de NSs de TSWV (SFV-TSWVNSs) também mostraram atividade de supressão do silenciamento gênico, ao aumentar a atividade de luciferase nessas células (Garcia et al., 2006). De acordo com Blakqori et al. (2006), células U4.4 de Aedes albopictus co-infectadas com os mesmos recombinantes

descritos acima (SFV-Luc + SFV-TSWVNSs) também resgataram, mesmo que pouco, a atividade de luciferase. No inseto vetor Frankliniella occidentalis, a NSs é indicadora da infecção viral, uma vez que essa proteína não-estrutural foi detectada em células e em tecidos infectados do inseto (Ullman et al., 1993). Porém, a função dessa proteína no inseto vetor ainda não foi elucidada. Assim, estudos com a NSs de TSWV poderão fornecer mais informações sobre sua função e esclarecer os mecanismos de defesa na infecção viral de plantas e animais.

A proteína helper HC-Pro do vírus Tobacco etch foi identificada como o primeiro supressor de PTGS (Lindbo e Dougherty, 1992). Essa proteína reduz, nas plantas, a degradação do RNA alvo e o acúmulo de siRNAs (Anandalakshmi et al., 1998; Brigneti et al., 1998; Kasschau e Carrington, 1998; Llave et al., 2000). Há relatos de que HC-Pro inibe parcialmente o dsRNA processado pela Dicer e interfere na desnaturação do siRNA (e do miRNA), impedindo, desse modo, a incorporação do RNA alvo ao RISC (Chapman et al., 2004; Dunoyer et al., 2004). A mesma ação foi atribuída à proteína p19 do Cymbidium ringspot virus, que tem a capacidade de se ligar aos siRNA, impedindo sua incorporação ao RISC (Lakatos et al., 2004; Silhavy et al., 2002; Vargason et al., 2003).

A proteína B2 do Flock House Virus, isolado do coleóptero Costelytra zealandica (Coleoptera: Scarabaeidae), suprime o silenciamento de RNA em células de planta (Dasgupta et al., 2001) e Drosophila (Li et al., 2002). Prova de que vírus de animais também possuem a capacidade de suprimir o silenciamento de RNA como estratégia de elevar sua concentração em diversas células hospedeiras.

Em síntese, há cada vez mais evidências da conservação do silenciamento gênico tanto no reino animal quanto no reino vegetal.

Figura 1.10: Esquema que mostra a ação da proteína NSs de TSWV no mecanismo de silenciamento de RNA (Adaptado de Prins, M., Universidade de Wageningen, comunicação pessoal). A proteína supressora NSs se liga aos RNAs curtos de interferência (siRNA), impedindo, desse modo, a formação do complexo RISC e consequentemente o silenciamento gênico.

HIPÓTESE CIENTÍFICA

As proteínas virais supressoras de silenciamento gênico, quando expressas nas células de inseto infectadas por baculovírus recombinantes, atuariam bloqueando etapas do silenciamento gênico e aumentando, pois, a capacidade infectiva e o efeito patogênico desse vírus contra seu hospedeiro.

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OBJETIVOS

Objetivo geral:

Produzir baculovírus recombinantes contendo genes supressores de silenciamento gênico provenientes de diferentes vírus, para avaliação do efeito na replicação viral em insetos e na capacidade bioinseticida.

Objetivos específicos:

a) Clonar os genes NSs de TSWV, AC2 de Tomato severe rugose virus (TSRV) e NS1 de Influenza A virus, em vetores de clonagem e vetores de transferência; b) A partir dos vetores de transferência recombinantes, construir os baculovírus

recombinantes vAcNSs, vAcAC2 e vAcNS1;

c) Avaliar, inicialmente, em ensaios pilotos, o efeito citopático dos baculovírus recombinantes (vAcNSs, vAcAC2 e vAcNS1) nas linhagens BTI-Tn-5B-1-4, permissiva ao AcMNPV, e UFL-AG-286, semipermissiva. Dentre os recombinantes, selecionar, para experimentos posteriores, aquele capaz de induzir um maior efeito citopático nas linhagens de células analisadas;

d) Avaliar a replicação viral do recombinante selecionado nas linhagens hospedeiras BTI-Tn-5B-1-4 (permissiva), UFL-AG-286 (semipermissiva) e BM-5 (não- permissiva) e em hemócitos de A. gemmatalis;

e) Detectar a expressão e a localização intracelular nas três linhagens estudadas da proteína expressa pelo recombinante selecionado;

f) Avaliar a atividade dessa proteína como supressora de silenciamento gênico por ensaios de RNAi;

g) Avaliar a atividade bioinseticida do baculovírus recombinante selecionado em larvas de Spodoptera frugiperda, hospedeiro permissivo, e A. gemmatalis, hospedeiro semi-permissivo ao baculovírus AcMNPV.

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