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De acordo com Mantovani (2009), poderíamos entender como livro didático o “material impresso, estruturado, destinado ou adequado a ser utilizado num processo de aprendizagem ou formação” (MANTOVANI, 2009, p. 16).

A origem deste material remonta ao século XV e está pautada na cultura popular (FREITAS & RODRIGUES, 2007). Antes da invenção da imprensa, devido à raridade dos livros, os estudantes das universidades europeias produziam seus próprios cadernos de textos, mas, muito antes da Idade Contemporânea, ainda na Antiguidade, o homem sempre demonstrou a necessidade de registrar por escrito determinados conhecimentos vigentes. Fosse no interior de cavernas, como na Pré-história, fosse em papiros, como no Egito Antigo, ou em livros arcaicos (re)produzidos por monges copistas, na Idade Média, podemos dizer que o protótipo do livro remonta à própria existência do homem na Terra.

No entanto, de acordo com Souza (2011), teria sido somente a partir do século XIX, período em que foi implantado, no Ocidente, o modelo de escola como o conhecemos hoje, que “os primeiros livros didáticos surgiram nas escolas de elite como única forma autorizada pelas comunidades, com a função de complementar os, até então, hegemônicos e legítimos textos sagrados” (SOUZA, 2011, p. 94).

No caso específico do Brasil, por muito tempo, o ensino de Língua Portuguesa, bem como das demais disciplinas do currículo escolar, tinha como material didático as cartilhas e os livros de leitura para as séries iniciais e as antologias e gramáticas para as séries finais da educação básica (BUNZEN & ROJO, 2005).

A trajetória de chegada dos materiais didáticos às escolas brasileiras teve início, de acordo com Freitas e Rodrigues (2007), com a criação do Instituto Nacional do Livro

(INL), em 1929, cujo objetivo era firmar um livro didático nacional ou, pelo menos, o seu projeto, que pudesse viabilizar um aumento da produção de tal material. No entanto, apenas no governo de Getúlio Vargas, em 1934, o INL recebeu as suas primeiras atribuições que se resumiam a editar obras literárias e a elaborar uma enciclopédia e um dicionário nacionais.

Conforme Freitas e Rodrigues (2007) e Carmagnani (2011), em 1938, é instituída a Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) que tinha como funções primordiais legislar sobre a produção, o controle e a circulação das obras didáticas,  isto é, muito mais uma “função de controle político-ideológico do que uma preocupação didática” (CARMAGNANI, 2011, p. 46).

No início da década de 1960, ocorreu a assinatura do acordo MEC-USAID (acordo entre o Ministério da Educação e Cultura do Brasil e dos Estados Unidos) que “dentre outros objetivos, possibilitaria a distribuição de milhões de livros didáticos no Brasil gratuitamente” (CARMAGNANI, 2011, p. 46). Na avaliação de críticos da educação, como Saviani (1980), os resultados foram desastrosos, uma vez que foi intenso o controle ideológico norte-americano exercido nos vários níveis da escola brasileira. Somente em 1966 foi criada a Comissão do Livro Técnico e Didático (COLTED), também basicamente com as funções de produzir, editar e distribuir os livros didáticos (FREITAS & RODRIGUES, 2007).

Ressalvamos, contudo, que, de acordo com Bunzen e Rojo (2005), o livro didático, no formato como realmente o conhecemos hoje, só passou a ser implementado na escola brasileira na década de 1970, em decorrência das mudanças instauradas com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 5.692/71. É neste período que “as escolas ‘deixam’ de utilizar uma gramática e uma coletânea de textos (seleta, antologia) [em separado] e os conteúdos gramaticais e textos literários começam a conviver em um só gênero” (BUNZEN e ROJO, 2005, p. 75).

Foi também durante as décadas de 1960 e 1970 que, ao se firmar o processo de democratização, firma-se também o acesso das grandes massas à escola pública, antes privilégio das elites. Com isso, as condições de trabalho do professor são afetadas bruscamente: ele passa a ter muito mais alunos e turmas pelas quais se responsabilizar, e isso aumenta consideravelmente sua carga horária de trabalho.

O livro didático surge como um instrumento a fim de estruturar e facilitar o trabalho do professor, uma vez que passa não apenas a apresentar conteúdos, mas também atividades já prontas que o professor possa aplicar em sua sala de aula. O livro didático também passa a auxiliar o professor na organização do tempo de aula, bem como passa a dividir o tempo escolar em meses/bimestres/séries ou anos. Assim, a função do professor passa a ser

controlar o tempo de contato do aprendiz com o material previamente selecionado; definir o tempo de exercício e sua quantidade; comparar as

respostas do aluno com as respostas dadas no “manual do professor”, marcar o dia da “verificação da aprendizagem”, entregando aos alunos a prova

adrede preparada, etc. (GERALDI, 1997, p. 94; grifo do autor).

Em outras palavras, grande parte das atividades escolares começa a ser organizada e regida em função da própria estruturação do livro didático. De acordo com Bunzen e Rojo (2005), os livros escolares deixam de ser simplesmente coletâneas de textos ou conteúdos linguísticos, mas passam a ser compêndios com “orientações, exercícios, atividades, resumos, esquemas etc.” (BUNZEN & ROJO, 2005, p. 76). Os livros didáticos passaram a ser considerados como uma solução ao despreparo de alguns professores, já que trazia tudo o que era necessário à prática docente, servindo como verdadeiros “livros-roteiros” para os professores e contribuindo para a automatização docente e discente (GERALDI, 1997). Podemos perceber, então, que o livro didático surgiu em um momento de crise da profissão docente, sendo-lhe atribuída boa parte da responsabilidade da sala de aula, tornando-se um norte para o ensino básico.

No entanto, como aponta Geraldi (1997), o próprio livro didático teria contribuído para o desprestígio do professor, pois

[o livro didático] facilitou a tarefa, diminuiu a responsabilidade pela definição do conteúdo de ensino, preparou tudo – até as respostas para o manual ou guia do professor. E permitiu: elevar o número de horas-aula (com as tarefas do tempo anterior, seria impossível a um mesmo sujeito dar 40 a 60 horas de aula semanais, em diferentes níveis de ensino); diminuir a remuneração (o trabalho do professor aproxima-se, em termos técnicos, cada vez mais do trabalho manual e este, como se sabe, em nossa sociedade, sempre foi mal remunerado); contratar professores independentemente de sua formação ou capacidade, etc. Soma-se tudo isso e temos ao menos uma pista

para compreender o “desprestígio” social da profissão (GERALDI, 1997, p.

Na seção seguinte, passaremos a discorrer sobre a implantação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (PNLEM). Ressaltaremos as modificações trazidas pelos programas para a distribuição de livros didáticos na escola pública, em especial na escola pública de Ensino Médio.

3.2 A implantação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e do