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Suspensão condicional do processo

3. JUSTIÇA CONSENSUAL PENAL NO BRASIL

3.2 Institutos representativos do modelo consensual na Lei n.º 9.099/1995

3.2.3 Suspensão condicional do processo

Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia98, poderá propor a suspensão do processo, desde que o acusado preencha alguns requisitos legais, por força do artigo 89 da Lei 9.099/199599.

Antes da análise da estrutura jurídica da suspensão condicional do processo, cumpre destacar o conceito, a natureza jurídica, os fundamentos e as finalidades desse instituto.

Em termos conceituais, esse instituto jurídico é a “paralisação do processo, com potencialidade extintiva da punibilidade, caso todas as condições acordadas sejam cumpridas, durante determinado período de prova.”100. Verifica-se que é o processo, ab initio, que se suspende.

Com relação à natureza jurídica, embora não seja um entendimento pacífico101, a maioria da doutrina e da jurisprudência102 entende que a

98 A proposta de suspensão condicional do processo acompanha a inicial acusatória.

99 Artigo 89: Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (artigo 77 do Código Penal).

§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:

I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; II - proibição de frequentar determinados lugares;

III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz;

IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.

§ 2º O juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado.

§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano.

§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta.

§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o juiz declarará extinta a punibilidade. § 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.

§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.

100 GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional do processo penal (...) p. 127.

101 Pedro Henrique Demercian e Jorge Assaf Maluly entendem que a suspensão condicional do processo é um ato discricionário do Ministério Público, adotando a doutrina do facultas agendi, em DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Juizados Especiais Criminais –

Comentários. Rio de Janeiro: Aide Editora, 1996, p. 109. Já a jurista e professora Ada Pellegrini

Grinover, acompanhada por Scarance Fernandes e Magalhães Gomes Filho, tem entendimento diverso, defendendo ser um ato consensual bilateral, como ocorre na transação.

52 suspensão condicional do processo é um direito público subjetivo do acusado. Logo, quando estiverem presentes todos os requisitos legais da medida alternativa, cabe ao Ministério Público a obrigação de formulá-la, constituindo um poder-dever. Tal questionamento também diz respeito ao instituto da transação penal, analisada no tópico anterior.

Como fundamentos da suspensão condicional do processo, destacam- se o princípio da oportunidade, o princípio da autonomia da vontade e o princípio da desnecessidade da pena de prisão de curta duração.

Quanto às finalidades pretendidas com esse instituto, ressaltam-se a agilização, a economia e a celeridade do aparelho de justiça formal. Porém, o objetivo mais marcante é evitar a estigmatização causada pelo processo e, consequentemente, esquivar-se também daquela que traz a sentença condenatória.

Ao se observar a estrutura jurídica da suspensão condicional do processo e, mais especificamente, o âmbito de admissibilidade, verifica-se que o marco principal é a pena mínima cominada (igual ou inferior a um ano) pelo legislador, podendo o instituto ser aplicado para os crimes militares, eleitorais, ecológicos e todos os outros delitos previstos em leis especiais. Nas palavras de Luiz Flávio Gomes, “é um instituto de ampla e geral aplicação”103.

Preenchido o critério objetivo (pena mínima cominada), deve-se observar também o critério subjetivo, ou seja, a culpabilidade, os antecedentes, a motivação, a intensidade das lesões, a reparação e consideração com a vítima, dentre outros.

O artigo 89 da Lei 9.099/1995 aponta alguns requisitos de admissibilidade: inexistência de processo em curso; inexistência de condenação anterior por crime; presença dos demais requisitos do artigo 77 do Código Penal: que o condenado não seja reincidente em crime doloso; que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício.

O referido artigo, ao determinar como requisito de admissibilidade a inexistência de processo em curso, viola o princípio constitucional da 102 O Superior Tribunal de Justiça, em recente decisão sobre a matéria, entendeu que a suspensão condicional do processo é um direito público subjetivo do acusado (STJ - Habeas

Corpus n.º 131.108-RJ (2009/0044973-5), Relator Jorge Mussi, julgado em 18/12/2012). 103 GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional do processo penal (...) p. 281.

53 presunção de inocência. De acordo com a doutrina e a jurisprudência majoritária, cabe ao juiz, nessa circunstância, realizar um exame mais aprofundado das condições judiciais, não podendo somente esse requisito ser óbice à aplicação da suspensão condicional do processo.

Segundo o preceito legal, o oferecimento da denúncia é o momento adequado para elaborar a proposta de suspensão do processo. É no ato da proposta ou iniciativa do Ministério Público que se dá o princípio da oportunidade.

Ao acusado, assistido por seu advogado, cabe aceitar ou não as condições e o conteúdo da proposta e, aceitando-os, concretiza-se o consenso. Cabe ressaltar que não se discute a culpabilidade do acusado.

O juiz, ao receber a denúncia, além de homologar a suspensão, deverá fiscalizar a espontaneidade da aceitação, estando a atuação do Ministério Público subordinada ao controle judicial.

Verifica-se que o instituto jurídico da suspensão condicional do processo possui natureza processual e também penal, pois acarreta o sobrestamento do processo e pode levar à extinção da punibilidade.

Com relação à fase executiva, a fiscalização e o controle das condições fixadas no ato da suspensão do processo são de competência do juízo processante, e não do juízo das execuções, tendo em vista que a Lei de Execuções Penais (artigos 105, 147 e outros da Lei 7.210/1984) possui competência somente após o trânsito em julgado da sentença e, em se tratando de suspensão do processo, não existe pena e nem sentença de mérito transitada em julgado.

3.3 Perfil da justiça consensual no projeto do novo Código de Processo