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Técnica cordocentese

No documento Guia de Bolso de Obstetrícia (páginas 47-51)

Punção

Pode-se alcançar o cordão umbilical por técnicas diferentes, sendo que a transplacentária, com pun- ção do cordão em sua inserção na placenta, a mais indicada, pois evita a entrada da agulha na cavidade amniótica. A placenta posicionada anteriormente na parede uterina permite com maior facilidade este tipo de procedimento. Outro ponto de punção pos- sível é a inserção do cordão umbilical no abdome fetal, mas desta forma ocorre entrada da agulha na cavidade amniótica. Quando a placenta se posiciona posteriormente, especialmente em gestações mais avançadas, pode ser necessária a punção de outro segmento, inclusive os de alças livres do cordão.

O vaso a ser puncionado é de preferência a veia um- bilical por vários motivos, tais como parede mais fina, maior calibre e menor reflexo vagal (bradicardia fetal). Inicialmente posiciona-se a paciente em decúbito dorsal e com auxílio do ultrassom determinamos o local do abdome materno que será puncionado. Realiza-se neste local rigorosa antissepsia com po- vidine. O trajeto da agulha é anestesiado a partir da pele com xilocayna. Com agulha longa (15 cm) e ca- libre 20 tenta-se atingir o local desejado do cordão umbilical, sempre contando com o direcionamento ecográfico. A punção da veia umbilical é suspeitada pelo refluxo de sangue na agulha de punção e con- firmada ao ultrassom com a presença de fluxo do tipo turbilhão por injeção de soro glicosilado (1 a 2 ml) na agulha. Retira-se o volume de sangue preten- dido que terá a pureza do sangue fetal confirmada e a análise pretendida no laboratório indicado para o caso. Retira-se a agulha de punção e monitoriza-se o local puncionado do cordão umbilical para verificar parada de sangramento (menos de 1 minuto) moni- torizando a possível formação de trombos por eleva- ção da ecogenicidade dentro do vaso puncionado. Recomenda-se que a paciente permaneça no servi- ço de Medicina Fetal por mais uma a duas horas até que seja liberada para retorno ao seu domicílio. Nos casos de procedimentos terapêuticos que exi- gem troca de seringas repetidamente, como a trans- fusão intravascular pode ser necessária a conexão de uma borracha ao canhão da agulha com o objetivo de não manipulá-la durante a injeção de sangue ou fármacos e assim evita-se a necessidade de novas punções do cordão.

Confirmação do sangue fetal

A amostra colhida pela cordocentese deve ser con- firmada quanto a origem e pureza evitando-se que se examine inadvertidamente sangue materno. Esta situação é grave quando se pretende dosagens es- pecíficas e cariótipo fetal. O método mais seguro é a realização do teste de Kleihauer-Betke que por co- loração específica permite a visualização do núcleo das hemácias fetais, diferente das células maternas que são enucleadas. Também, a dosagem de gona- dotrofina coriônica no sangue fetal será negativa, ao contrário do sangue materno que apresenta elevada concentração deste hormônio. Um método bastan- te confiável e de fácil realização é a avalição hemati- métrica do sangue obtido: no caso de sangue fetal devido ao tipo específico de hemoglobina que pos- sui, os valores do Volume Corpuscular Médio (VCM) estarão acima de 108, contrariamente ao sangue do adulto cujo limite superior deste marcador é 98. A contaminação do sangue fetal pelo líquido amnió- tico é outra possibilidade que deve ser descartada através da coloração do esfregaço sanguíneo, que- da do hematócrito abaixo de 35% pela diluição e pela dosagem dos fatores de coagulação V e VIII que podem estar presentes nestes casos.

Dificuldades

Obesidade materna, oligohidrâmnio e movimenta- ção fetal excessiva podem ser cruciais na realização da cordocentese. Alguns recursos são utilizados para minimizar estas dificuldades: a amnioinfusão, pois restaura o volume de líquido amniótico e permi- ti a visualização de local apropriado para a punção. A sedação materna com benzodiazepínico pode redu- zir a movimentação fetal e facilitar o procedimento. Essas medidas são de maior importância quando se realiza a cordocentese com finalidade terapêutica, pois a punção será mais demorada.

Complicações

O procedimento pode apresentar complicações gra- ves inerentes e outras relacionadas à doença que motivou sua realização. A punção do vaso umbilical pode desencadear reflexo vagal (principalmente a artéria) com bradicardia reflexa, parada cardíaca e eliminação meconial. O local da punção pode apre- sentar sangramento persistente sem que a geleia de Warthon promova o tamponamento local, resultando em exsanguinação fetal (choque hipovolêmico). Esta complicação é mais grave em fetos trombocitopêni- cos por infecção aguda ou por doença hematológica específica. O surgimento de trombose do vaso pun- cionado, muito relacionado com os procedimentos terapêuticos demorados, são quase sempre fatais. A presença da agulha dentro do vaso é fator de desen- cadeamento do mecanismo de coagulação, principal- mente se ocorre alguma contaminação com líquido amniótico, rico em tromboplastina.

Estas complicações são ainda mais graves se exis- tem no feto fatores agravantes. Os cardiopatas res- pondem de forma pior e têm uma capacidade de recuperação comprometida. Os fetos em hipóxia crônica e com policitemia apresentam maior risco de trombose do vaso umbilical puncionado. Outras são comuns aos procedimentos invasivos: as infecções amnióticas e o desencadeamento do trabalho de parto prematuro, especialmente na técnica de cor- docentese que atravessa a cavidade amniótica e nos procedimentos terapêuticos com múltiplas punções. Embora a maior parte das complicações sejam autoli- mitadas, existe uma perda esperada, inerente ao pro- cedimento, que pode ocorrer até uma semana após a punção (4 a 5%). Portanto, o procedimento deve ter consentimento materno após as informações de ris- cos das complicações. Alguns cuidados podem mini- mizar os riscos, tais como operadores experientes e bons equipamentos de ultrassom, além da rigorosa avaliação da indicação do exame.

Comentários finais

a cordocentese representou para a Medicina Fetal o maior avanço das últimas duas décadas. O conhecimento da fisiologia fetal, o desenvolvimento da propedêutica e as novas opções tera- pêuticas são alguns dos ganhos obtidos a partir da incorporação da cordocentese na prática obstétrica atual.

No documento Guia de Bolso de Obstetrícia (páginas 47-51)

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