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O que dizem os técnicos e gestores das políticas de emprego, renda e qualificação profissional sobre a realidade do emprego e desemprego em

9. A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NA AMAZÔNIA.

9.2. A precarização do trabalho no município de Parauapebas: desemprego e qualificação profissional.

9.2.1. O que dizem os técnicos e gestores das políticas de emprego, renda e qualificação profissional sobre a realidade do emprego e desemprego em

Parauapebas.

As informações expressadas pelos profissionais das instituições públicas que atuam com os trabalhadores desempregados em Parauapebas em relação ao perfil destes que podem teoricamente se enquadrar na categoria precariado permitem a seguinte configuração quanto: à migração, o mercado de trabalho, a qualificação profissional e a empresa Vale.

No que concerne à migração, os técnicos e gestores entrevistados assumem de maneira geral, como uma característica do município e reafirmam que a mineração é o maior atrativo para o trabalho. Essa população migrante compõe grande parte dos habitantes parauapebenses porque cerca de 80% permanecem e criam vínculos. Apesar disso, os informantes entendem que a migração na localidade não conduz ao trabalho degradante porque não assume as características do trabalho no ciclo da borracha. Importa sinalizar que, praticamente todos os profissionais entrevistados também são migrantes e só estão lá a trabalho. O fato de a migração não apresentar caráter provisório vai de encontro às afirmações de Standing (2014), pois revela que os migrantes não são itinerantes mesmo

94 GOVERNO DO PARÁ. Plano de Mineração marca novo relacionamento do Estado com empresas e

União. Disponível em: http://www.agenciapara.com.br/noticia.asp?id_ver=100623. Acesso em: 22 de abril de 2014.

estando submetidos aos empregos temporários, instáveis, com baixos rendimentos, etc., tais qual afirmam os estudos do autor.

Em relação ao mercado de trabalho, os profissionais entrevistados observam um crescimento do emprego no setor da construção civil, apesar da mineração ser o carro- chefe em contratações e o comércio ter dado cada vez mais sinais de ascensão no mercado de trabalho. Cabe ressaltar neste ponto, a fala de um gestor quanto à relação entre o Programa Bolsa Família e a inserção em um emprego. Conforme relatado na entrevista, aqueles que querem ficar somente com a quantia recebida pela transferência de renda e não saem em busca de trabalho é porque só tiveram a oportunidade de receber essa quantia. Por isso, “não é acomodação” e “não é cultura, mas mau costume” (informação verbal), pois é preciso oferecer qualificação e convencer que um trabalho é mais proveitoso que a renda do Programa. Também é reforçada nas entrevistas pelas instituições a importância da legalização do trabalho informal para a obtenção de outras fontes de renda e alternativas e desconcentrar o foco no trabalho formal95.

Ainda no que concerne ao mercado de trabalho é importante ressaltar as causas para o desemprego apontadas pelos profissionais. Conforme um deles, Parauapebas é uma cidade-dormitório por meses aonde muitos chegam para trabalhar, ficam um bom tempo e vão embora96. Nesse processo de migração, existem aqueles que chegam e permanecem desempregados, chegam e logo encontram emprego, mas também estão submetidos às grandes demissões em massa das empresas, consideradas na entrevista como falta de respeito. Ademais, culpabiliza o trabalhador pelo vício em alta-rotatividade, já que na busca de entrar para a empresa Vale não se fixa em um emprego. Também relata que antes da qualificação, o que mais gera desemprego é a exigência das empresas da comprovação de experiência por um determinado período na carteira de trabalho, o que têm se tornado mais difícil de alcançar. Soma-se a esses pontos, a ausência de uma política de primeiro

95 A análise da fala de “acomodação” (informação verbal) reporta a crítica de Francisco de Oliveira (2010), o

qual ao mesmo tempo em que expõe a importância do Programa Bolsa Família para a redução da extrema pobreza, provoca-se uma instrumentalização da pobreza e da desigualdade, transformando-as em uma questão administrativa. Como consequência, há grande despolitização das lutas sociais e uma individualização dos meios utilizados para as conquistas sociais. Ademais, a apreensão de Paulani (2010) permite elucidar o que tem significado as políticas de redistribuição de renda, tal como elas estão se configurando. Para a autora, tais políticas representam a distribuição de “uns poucos recursos àqueles que jamais conseguirão se integrar, para que se possa dar andamento tranquilo à usual política concentradora e excludente” (PAULANI, 2010, p. 128).

96 Apesar de que as análises das falas dos sujeitos e de outros funcionários mostram o contrário, pois os

mesmos criam raízes e vínculos que os ligam ao município e deixa o sentimento de pertencimento a ele, como já relatado e como será visto mais adiante.

emprego no município. Assim sendo, de acordo com a entrevista com um dos gestores, esses fatores são primordiais pela alta solicitação de seguro-desemprego97.

A análise dessas falas revela certa dificuldade dos informantes de compreensão e definição de uma resposta concreta pelo crescimento do desemprego diante da responsabilização do trabalhador e também das empresas. Não há, por exemplo, um questionamento sobre como a inserção em um trabalho precário (baixo salário, instabilidade no emprego, insegurança, etc.) pode ser mais proveitoso que a certeza de receber determinada quantia mensalmente a fim de suprir, mesmo que minimamente, algumas necessidades? Noutras palavras, afirmações como “o trabalhador tem um vício em trocar de empregos” não levam em consideração que as necessidades sociais de um trabalhador podem leva-lo a submeter-se a qualquer tipo de trabalho que lhe dê um pouco mais de segurança, mesmo que ainda seja precário98.

Referente à qualificação profissional, as entrevistas com os técnicos e gestores das políticas de emprego, renda e qualificação profissional revelam o PRONATEC como uma alternativa, pois proporciona a região que pessoas possam se qualificar para alcançar o sonho de entrar na transnacional (mesmo que a imensa maioria só conquista vagas de trabalho nas empresas terceirizadas). Assumem ainda uma vertente diferenciada por ofereceram a orientação profissional com foco na empregabilidade para “empoderar sujeitos” (informação verbal). Cabe aqui uma maior explanação, tendo em vista a valorização que é dada pelos profissionais ao curso de orientação profissional. Analisando o material que conduz o curso, destacam-se as seguintes falas: “arrumar emprego não é um problema”, a questão é “adequar a profissão aquilo que se gosta de fazer” e “adquirir empregabilidade” (informação verbal) 99. Com isso, passam a imagem positiva e se tem

97 Ainda sobre o mercado de trabalho, nesse caso a inserção nele, é importante frisar as explanações dos

representantes do poder público municipal do SINE, em que se encontram dificuldades para abordar a temática da qualificação profissional, mesmo ao afirmar que só vão deixar os currículos aqueles já qualificados. Há uma exaltação da agilidade do processo de repasse do seguro-desemprego e no atendimento que chega a cerca de 300 (trezentas) pessoas por dia em média. Contudo, a agilidade e o alto número de solicitação de trabalhadores para o direito trabalhista somente reitera a alta rotatividade presente no município e como ela é ao mesmo tempo consequência e funcional para a expansão das empresas.

98 Levando em consideração o exposto na nota 22 e relacionando a precarização do trabalho e a transferência

de renda de determinados programas sociais, como o Programa Bolsa Família, a análise destas falas remontam o pensamento de Gorz (1996), o qual em consonância com o pensamento de Oliveira (2010) e Paulani (2010), também instiga a pensar que o recebimento da renda mínima em um programa de complementação de renda não está sendo um poder de barganha e vulnerabiliza o trabalhador à submissão a qualquer tipo de trabalho. Ou seja, esse potencial contingente de trabalhadores nem se acomodam e nem tem poder de barganha, estando, assim, subsumidos a uma forte e tendencial precarização.

99 De acordo com a orientação profissional, as habilidades e competências exigidas para ser empregável são:

visibilidade, já que a empregabilidade é compreendida pela instituição como “a capacidade de conquistar e de manter um emprego de maneira firme e valiosa” (SEMAS, 2014, p. 13). Em outros termos, expressam que ela significa

[...] o conjunto de competências e habilidades necessário para uma pessoa conseguir uma colocação ou manter-se colocada em uma empresa, dentro de uma área de atuação com a qual possui afinidade, implicando na sua visibilidade e na construção de uma imagem positiva e diferenciada. É o mesmo que manter-se sempre atraente aos olhos do mercado (SEMAS, 2014, p. 14).

Contudo, conforme observado no capítulo anterior, tornar um trabalhador empregável é na verdade moldá-lo as necessidades do capital. O fato de diferenciar vocação e profissão100 não dá aos trabalhadores a possibilidade ampla de escolha, já que o mercado determina as exigências necessárias e importantes a ele. Ou seja, nesse ponto o diferencial da profissionalização acaba, na realidade, por reiterar um discurso confortável às empresas locais. De fato, como será exposto nas próximas páginas, o conceito de empregabilidade executado nas políticas de emprego e formação profissional em Parauapebas não tem sido convertido em benefícios para os trabalhadores no município.

Em relação à transnacional Vale, os informantes se referem somente como o objetivo da grande maioria da população e ressaltam a crise vivenciada pela empresa nos últimos anos. Focam as críticas, sobretudo nas terceirizadas e contratadas da transnacional, no desrespeito cometido por elas quando há realização de demissão em massa. Também aqui se relembra uma discussão já apresentada teoricamente que permite apreender as vantagens conquistadas pela Vale no processo de delegação a outras empresas algumas de suas principais atividades, eximindo-a de qualquer responsabilização de cunho trabalhista, por exemplo101.

Além das entrevistas com representantes do poder público local, importa salientar a observação em campo e conversas com transeuntes do local, inclusive com funcionários da Vale, acerca da temática “mercado de trabalho” no município. Observou-se nessas conversas que a caracterização do empreendedorismo em Parauapebas como algo comunicação; dinamismo; orientação para o relacionamento e para a colaboração; idoneidade, etc. (SEMAS, 2014, p. 39).

100 Nesse sentido, destaca-se a grande dificuldade encontrada entre os sujeitos entrevistados, especialmente

em relação aos trabalhadores desempregados, em relação a diferença entre ocupação (relacionada às atividades e serviços realizados diariamente) e profissão (regulamentada por meio de leis, decretos, decretos- leis, etc.). Nota-se que tal confusão pode existir, principalmente, devido ao fato de que os cursos de qualificação profissional, ofertados no Centro de Inclusão Produtiva correspondem a ocupações ou ofícios e profissões não regulamentadas.

importante e forte, pois às vezes se torna mais fácil crescer e se manter com um negócio próprio, mesmo na informalidade, do que ir buscar algum tipo de qualificação e conseguir emprego de carteira assinada por um baixo valor (um salário mínimo, por exemplo). Ao mesmo tempo, muitos (inclusive aqueles que são funcionários da transnacional Vale) vivem sob uma constante insegurança ao saberem que podem ser demitidos a qualquer momento, pois nos dois últimos dois anos aumentou muito a rotatividade da empresa. Isso comprova, portanto, as análises feitas sobre os dados dos últimos relatórios de sustentabilidade102. Por isso, esses funcionários buscam também garantir uma vida (seja em Parauapebas ou em outra localidade) caso sejam demitidos. Por exemplo, buscam construir um negócio próprio.

É interessante também aqui relembrar a compreensão de Machado da Silva (2003) sobre o empreendedorismo como extensão da categoria empregabilidade, e o fato de ambos estarem incluídos como exemplo do processo de informalização recorrente atualmente. Ou seja, os argumentos proferidos acima se revelam contraditórios ao assinalarem o empreendedorismo como alternativa à informalidade. Percebe-se também na fala um entendimento restrito sobre o conceito de informalidade, ligado comumente à divisão entre setor formal e setor informal.

Essa leitura sobre a realidade é confirmada com as observações in loco, as quais revelaram ainda que o ano de 2013 foi o mais forte em número de demissões, diante de uma crise que afetou a empresa e provocou reestruturação interna. Ademais, notaram-se nas conversas com transeuntes munícipes, diversos fatos sobre dificuldades existentes na transnacional em cumprir os valores disseminados pela empresa, tal como a vida em primeiro lugar, colaboração de todos, entre outros. Pois esses valores são cobrados para e entre funcionários que estão subordinados. Entretanto, não é exercido em geral por gestores, gerentes e diretores, os quais sempre utilizam de seus cargos para aumentar a exploração de seus subordinados.

9.2.2. O perfil dos trabalhadores matriculados em cursos de qualificação profissional