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Títulos de utilidade pública e qualificações

No documento Terceiro setor: uma visão crítica (páginas 44-48)

CAPÍTULO I – CONTEXTUALIZAÇÃO DO TERCEIRO SETOR

4. Títulos de utilidade pública e qualificações

Primeiramente, vale ressaltar que cada ente federativo, União, Estado, Município e Distrito Federal deve ter lei específica para disciplinar o título de utilidade pública e as qualificações de organização social – OS e organização da sociedade civil de interesse público – OSCIP.

Interessa dizer que, a princípio, as entidades de interesse social constituídas sob a forma de associação ou fundação podem ser contempladas com o título de utilidade pública. Para José Eduardo Sabo Paes (2010, p. 687), “trata-se, na verdade, a declaração de utilidade pública como o reconhecimento de que determinadas entidades cumprem uma função que deveria ser exercida pelo Poder Público”.

O título de utilidade pública federal é conferido a entidades sem fins lucrativos pelo Ministério da Justiça, consoante disciplina da Lei Federal nº 91/35, desde que atendidos os requisitos legais. Alguns benefícios e isenções fiscais podem ser elencados em decorrência desse título, como, por exemplo: receber subvenções, auxílios e doações da União; realizar sorteios; isenção da cota patronal para o INSS, se observados os outros requisitos legais; doações de empresas, dedutíveis do lucro operacional da pessoa jurídica doadora, conforme disciplinamento legal.

Todavia, tem-se notícia de que os títulos de utilidade pública são concedidos, indiscriminadamente, tanto às entidades de benefício mútuo (interesses privados dos associados) como às entidades de benefício público, possibilitando a perpetração de fraudes.

Para Sílvio Luís Ferreira da Rocha (2003, p. 73):

Embora, a nosso ver, a exigência legal de servir desinteressadamente à coletividade represente motivo suficiente para se não outorgar o título de utilidade pública às entidades de favorecimento mútuo, visto que estas entidades não servem desinteressadamente a coletividade e, sim, a um círculo restrito de pessoas, o fato é que tal título foi dado indiscriminadamente a uma e a outra espécie de pessoa jurídica, possibilitando a ocorrências de fraudes.

Para Paulo Modesto (1999, p. 34) uma das desvantagens da concessão de título de utilidade pública é a sua certificação indevida, estimulando a fraude e retirando sua credibilidade:

[...] Assim, ligado à função de certificação surge a possibilidade de certificação indevida, realizada sem critério, por ato administrativo ou lei casuística, como perversão de muitas vezes difícil controle. A concessão graciosa e indevida do título pode revelar tanto a frouxidão dos critérios utilizados para reconhecimento do título pela autoridade competente quanto hipótese de clara fraude, violação intencional do modelo legal geral na matéria. A reiteração de certificações indevidas produz com o tempo uma erosão da credibilidade do título [...].

De observar-se que, com base na Lei do Estado de Sergipe nº 5.495/2004, pode-se conceder título de utilidade pública a sociedades civis e fundações, nos seguintes casos: (i) quando não houver distribuição de lucros, bonificações e vantagens a mantenedores ou associados, e que não sejam remunerados, a quaisquer títulos, os cargos de diretoria, salvo, neste último caso, para as fundações; (ii) que estimule a educação, desempenhe atividades de pesquisas científicas, de cultura, inclusive artísticas, atividades desportivas, filantrópicas ou religiosas, bem como que tenham por objeto a defesa de categoria profissional ou comunidade de bairros, povoados ou cidades; (iii) apresentação de certidão ou atestado de autoridades ou de organização competente com os seguintes requisitos: (a) informação de registro de

personalidade jurídica no Estado de Sergipe; (b) declaração de idoneidade moral dos diretores; (c) declaração de efetivo e contínuo funcionamento nos dois anos imediatamente anteriores ao pedido, contados a partir da data em que adquiriu a personalidade jurídica.

A primeira crítica que se faz à referida lei estadual é de que em lugar de sociedade civil, o legislador deveria utilizar o termo associação, que não tem fim econômico, consoante fora explicado em tópico anterior. A segunda diz respeito à possibilidade de ser dado título de utilidade pública a entidades privadas sem fins lucrativos para defesa de categoria profissional, o que também não se coaduna com a natureza das entidades do terceiro setor.

Afinal, ainda quanto ao título de utilidade pública federal, saliente-se que é condição prévia, sem a qual não é concedida a Certificação de Entidade Beneficente de Assistência Social.

4.1. Certificação de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS

Atualmente, a Certificação de Entidade Beneficente de Assistência Social está disciplinada pela Lei Federal nº 12.101/2009, que alterou sua expedição. É concedida a pessoas jurídicas de direito privado que possuam a finalidade de prestação de serviços de assistência social, saúde e educação pelo Ministério da área correspondente.

As entidades contempladas com essa certificação devem ser de benefício público, em obediência ao princípio da universalidade do atendimento; suas atividades estão voltadas para prestação de serviços coletivos, não podendo ficar circunscritas aos associados ou à classe profissional, com base no art. 2º da Lei nº 12.101/2009.

Igualmente, além de outros benefícios prescritos em lei, a certificação de entidades beneficentes permite a isenção da cota patronal, nos moldes definidos pelos arts. 22 e 23 da Lei nº 8.212/1991.

4.2. Organização social – OS e organização da sociedade civil de interesse público – OSCIP

A qualificação como Organização Social consiste na habilitação necessária para criação de vínculos jurídicos mediante o contrato de gestão, com o escopo de administrar

órgãos ou entidades pertencentes ao Poder Público, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, com fundamento na Lei Federal nº 9.637/98.

A organização social realmente assume a administração de bens, equipamentos e pessoal do Estado. O contrato de gestão estabelece metas de desempenho para assegurar a boa qualidade dos serviços prestada. Ademais, as organizações sociais, ao serem qualificadas, também são declaradas de interesse social e de utilidade pública.

Anote-se a exigência legal de que os estatutos das organizações sociais instituam um conselho de administração como órgão de deliberação superior, composto por representantes do poder público entre 20% a 40% da sua composição, não remunerados, o que lhe confere um caráter quase governamental, seguindo o padrão das organizações inglesas chamadas “quangos” (quase non-governamental organizations). Portanto, parte da doutrina entende que tais entidades não pertenceriam ao Terceiro Setor, posto que controladas diretamente pelo Estado.

Em termos comparativos, o título de organização da sociedade civil de interesse público – OSCIP autoriza à entidade celebrar termos de parcerias, auxiliando o Estado na prestação de serviços sociais, com fundamento na Lei nº 9.790/99 e no Decreto nº 3.100/99.

A qualificação de organização da sociedade civil de interesse público pelo Ministério da Justiça geralmente ocorre posteriormente à constituição do ente social; inclusive seu funcionamento não está adstrito a qualquer vínculo com o Estado. Entretanto, as organizações da sociedade civil de interesse público – OSCIPs não podem cumular outras qualificações ou títulos de utilidade pública.

Note-se que, através do termo de parceria, precedido de concurso de projetos e consulta ao conselho de políticas públicas, a entidade não assume a gestão de órgão, empresa ou entidade de origem estatal, apenas colabora com o Estado para o desempenho de atividades sociais.

A qualificação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, através da sobredita lei, ampliou a área de atuação das entidades de interesse social, que antes se restringia à assistência social, educação e saúde.

O legislador federal foi taxativo e excludente no art. 2º da lei nº 9.790/99, vedando que algumas entidades recebam a qualificação de OSCIP. Todavia, com arrimo no princípio da universalização do serviço, aumentou consideravelmente o espectro de sua atuação,

podendo laborar em áreas como a promoção da assistência social, cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico, educação e saúde gratuitas, meio ambiente e desenvolvimento sustentável, dentre outras atividades.

Aliás, os serviços de educação e de saúde, como atividade fim da organização não governamental, devem ser totalmente gratuitos para a população, com base no art. 6º do decreto nº 3.100/99. Os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência devem ser inseridos nos atos constitutivos da OSCIP.

Cumpre dizer que o regime jurídico das OSCIPs é especial, pois pode receber bens e recursos públicos, para fins de entabular com o Poder Público negócio jurídico, denominado termo de parceria, visando o desempenho de atividades nas áreas sociais prescritas em lei.

Luis Eduardo Patrone Regules (2006, p. 160) se manifesta na forma adiante:

Existem, por conseguinte, alentadas referências legislativas no sentido de se aplicar regime jurídico especial às Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, consubstanciado na adoção de normas de direito privado com derrogações originárias do regime de direito público, fundamentalmente em razão da: (a) observância aos princípios de direito público como o da legalidade, impessoalidade, publicidade, entre outros; (b) adoção de instrumentos internos que instituem regras a estas organizações do terceiro setor, originários dos distintos ramos do Direito (Direito Privado – Direito Público), como os estatutos e o regulamento; (c) reconhecimento do Poder Público (qualificação) e controle especial voltado, se necessário, para a perda do título jurídico; (d) outorga de vantagens especiais (recursos públicos), compatíveis com os encargos específicos, e também de controle peculiar, como o exercido pelos Conselhos de Políticas Públicas, em regra, exercido em consonância com a participação da sociedade.

O Estado de Sergipe editou a Lei nº 5.217/03, que disciplina as organizações sociais, e a lei nº 5.850/04, que dispõe sobre a organização da sociedade civil de interesse público – OSCIP, com idêntico teor das leis federais citadas nesta dissertação.

No documento Terceiro setor: uma visão crítica (páginas 44-48)