• Nenhum resultado encontrado

3 Análise dos ajustes criados

3.2 Tac “Fazenda União”

Além da área ambiental, o ajustamento de conduta também poderá ser celebrado em outras áreas, tais como a do direito consumerista, empresarial e do trabalho, que será tema do presente tópico.

3.2.1. Partes

Atuou como compromissário do ajuste o Ministério Público do Trabalho (Coordenadoria Nacional de Erradicação ao Trabalho Escravo) representado por seu Procurador. Como compromitente, atuou Agenor Batista dos Santos, proprietário da Fazenda União.

3.2.2. Objeto

O ajustamento de conduta foi firmado em outubro de 2010, após a constatação da existência de trabalho em condições análogas às de escravo dentro da fazenda de propriedade do compromitente. Foi exigido o cumprimento de medidas tanto preventivas quanto reparatórias.

Com relação às medidas preventivas para a não reincidência do ilícito, foram estabelecidas as seguintes obrigações: (i) não admitir funcionário sem a CTPS, (ii) pagamento de salário mediante recibo assinado e datado pelos próprio empregados até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido, (iii) instalações dignas para os trabalhadores que se alojarem em sua propriedade, (iv) fornecer gratuitamente a todos os trabalhadores as ferramentas necessárias ao desempenho se duas tarefas, (v) fornecer equipamentos de proteção individual, responsabilizando-se pela higienização, manutenção, substituição e treinamento dos trabalhadores para a correta utilização, (vi) fornecer água potável em condições higiênicas e não permitir a utilização de copos coletivos para o consumo (vii) disponibilizar instalações

sanitárias adequadas aos trabalhadores e (viii) manter no estabelecimento rural material necessário à prestação de primeiros socorros.94

Quanto às obrigações reparatórias, o fazendeiro teve que pagar, a título de verbas rescisórias, a importância de R$ 10.977,34 no prazo de 5 (cinco) dias contados da assinatura do termo.

3.2.3. Cominações aplicadas em caso de descumprimento

O ajuste estabeleceu que, em caso de descumprimento, aplicar-se-á multa no valor de R$ 3.000,00 para as obrigações previstas nos tópicos (i), (ii) e (iii), e no valor de R$ 20.000,00 para as demais obrigações.

Na ausência de pagamento das obrigações reparatórias, haverá o valor acrescido da multa em 100%, cumulada com o valor principal.

Vale ressaltar o disposto pela Cláusula Décima Terceira que previu que os sucessores ficariam igualmente responsáveis pelas obrigações pactuadas, respondendo todo o patrimônio do compromitente pelas obrigações e multas avençadas no documento.

Foi ainda disposto no compromisso, que as multas seriam reversíveis ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), podendo ainda ter seus valores convertidos para outras ações que tenham por objetivo erradicar o trabalho escravo ou em condições análogas às de escravo.95

3.2.4. Início da vigência

Restou previsto pela Cláusula Décima Terceira do ajuste que o mesmo passaria a ter vigência imediata a partir da data de sua assinatura. Tal determinação demonstra, ainda de forma mais clara do que o TAC da Ilha Grande, a ausência de formalidade do instituto

94 Tais obrigações estão previstas na cláusula primeira à oitava do termo de ajustamento de conduta, que se encontra anexado ao presente trabalho.

95

Vale ressaltar que o destino das multas obtidas através do TAC ainda é tema de discussão pela doutrina e jurisprudência. Isso porque muitos defendem que os valores deverão ser repassados para atividades de mesma natureza daquela prevista no TAC. No REsp 802060, por exemplo, o Ministro Luiz Fux entendeu ser “nulo o Termo de Ajustamento de Conduta in foco, por força da inclusão de obrigação de dar equipamento de informática à Agência de Florestal de Lajeado”. STJ, REsp 802060/RS, Rel. Min. Luiz Fux,, 1ª Turma, DJe 22/02/2010. Disponível em http://www.stj.gov.br, acessado em 25 de maio de 2013.

3.2.5. Resultados

Não foi possível obter informações acerca do cumprimento do ajuste ora analisado. Contudo, percebe-se que, diferentemente do TAC da Ilha Grande, as obrigações impostas ao compromitente não foram abusivas, mas sim simples e possíveis de serem cumpridas no prazo determinado. Ademais, mesmo após a assinatura do TAC, o negócio ou atividade empresarial da fazenda continuou a ser exercido regularmente, gerando benefícios não só para a economia, mas também para os próprios trabalhadores que puderam continuar trabalhando, agora em condições dignas.

Cumpre ressaltar ainda, que o ajuste não exclui a hipótese de responsabilidade criminal conforme já tratado no tópico 2.4 do presente trabalho. 96 Além disso, tendo em vista ser o TAC uma garantia mínima e não máxima de responsabilidade, nada impede que os trabalhadores prejudicados ajuízem uma ação individual de indenização por danos morais, ou ainda, se beneficiem por uma ação de dano moral coletivo proposta por algum representante legitimado.97

96

O STJ já entendeu que as esferas de responsabilização são autônomas. STJ, RHC 24499/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe: 03/10/2011. Disponível em http://www.stj.gov.br, acessado em 12 de março de 2013.

97 “A possibilidade de indenização por dano moral está prevista na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso V. O texto não restringe a violação à esfera individual, e mudanças históricas e legislativas têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial. O dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de valores coletivos, atingidos injustificadamente do ponto de vista jurídico”. Disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao /engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=1 0 6083, acessado em 29 de maio de 2013.

Conclusão

Em meio à crise do Poder Judiciário, percebeu-se a necessidade de criação de novos institutos que garantam a efetivação dos direitos previstos no Ordenamento Jurídico Brasileiro. Isso porque apesar de o princípio do acesso à justiça estar amplamente previsto constitucionalmente, os mecanismos existentes não estão aptos a lidar com toda a demanda que chega ao judiciário. Diante desse cenário, surge o Termo de Ajustamento de Conduta.

Conforme demonstrado ao longo do trabalho, as características do TAC favorecem aos envolvidos o amplo acesso à justiça, e, ao permitir que órgãos públicos promovam a defesa dos direitos da sociedade, torna-se um importante instrumento na efetivação dos objetivos do Estado Democrático de Direito.

Dentre os benefícios do instituto, estão a (i) ausência de formalidade, (ii) reparação integral dos danos causados, (iii) eficácia imediata quando não há disposição em contrário, entre outros.

Ocorre que apesar de se apresentar como uma solução para a crise do poder judiciário, o ajustamento de conduta ainda apresenta algumas deficiências que precisam ser superadas.

No TAC da Ilha Grande, por exemplo, foi possível verificar que o mecanismo de fiscalização para o cumprimento das obrigações assumidas ainda é falho. Tal situação está provavelmente ligada à ausência de publicidade que é dada aos compromissos firmados.

Diante de todo o exposto, conclui-se que o TAC apresenta diversas vantagens quando comparado à via judicial, ainda mais diante da atual crise vivida por esse poder. Contudo, é preciso que se crie uma uniformização no que tange às regras e procedimentos do instituto, o que certamente propiciaria uma eficácia ainda maior desse mecanismo.

Bibliografia

RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação Civil Pública e Termo de Ajustamento de Conduta:

Teoria e Prática, 3ª Ed., Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2011.

ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES FEDERAIS DO RIO DE JANEIRO E ESPÍRITO SANTO. Rio de Janeiro. Disponível em: www.ajuferjes.org.br/PDF/Poderjudiciariobrasil.pdf , acessado em 07 de maio de 2013.

MOREIRA, Helena Delgado Ramos Fialho. Poder Judiciário no Brasil: crise de eficiência, 1ª Ed., Curitiba: Juruá Editora, 2004.

JOBIM, Nelson. Judiciário: Construindo um novo modelo. In: A Reforma do Poder

Judiciário no estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, S/N.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça, 3ª Ed.,São Paulo: Ed. Cortez, 2007.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO/TJRJ. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/web/guest/produtividade_pjrj/anuario2012, acessado em 30 de abril de 2013.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Brasília. Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/eficiencia-modernizacao-e-transparencia/pj-justica- emnumeros/relatorios, acessado em 30 de abril de 2013.

DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil, Vol. 1, 9ª Ed., Salvador: JusPODIVM, 2007, p.72.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Brasília. Disponível em:

http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/323-resolucoes/12243- resolucao-no-125-de-29-de-novembro-de-2010, acessado em 30 de abril de 2013.

MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo : meio ambiente,

consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses, 20ª Ed., São

Paulo: Ed. Saraiva, 2007.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Brasília. Disponível em: http://www.stj.gov.br, acessado em 10 de março de 2013.

JATAHY, Carlos Roberto de Castro. Curso de princípios institucionais do Ministério

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação civil pública: comentários por artigo (Lei nº

7.347, de 24.7.85), 7ª Ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2009.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil, 20ª Ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2010.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 11ª Ed., São Paulo: Ed. Malheiros, 1996.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO TOCANTINS. Tocantins. Disponível em: http://www.tjto.jus.br, acessado em 10 de abril de 2013l.

ASSEMBLÉIA PERMANENTE DE ENTIDADES EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE. Rio de Janeiro. Disponível em: http://apedema.org.br/inde x.php?option=com_remository &Itemid=15&func= showdo wn&id=20, acessado em 23 de maio de 2013.

REDE NACIONAL DE MOBILIZAÇÃO NACIONAL. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.coepbrasil.org.br/portal/publico/apresentarConteudo.aspx?CODIGO=C20083292 12822234&TIPO_ID=4, acessado em 23 de maio de 2013.

Documentos relacionados