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Sheldon Cooper (Jim Parsons), protagonista da série Big Bang: A Teoria (The Big Bang

Theory), ao questionar sua namorada Amy (Mayim Bialik) se deveria ou não assistir à série The Flash, diz: “Começar a assistir uma série de televisão que pode ir ao ar durante anos não é uma

aqui”15. Apesar de Amy não gostar do assunto, a fala de Sheldon é legítima, pois uma série de

televisão pode ocupar a grade de uma emissora durante anos, e também tomar o mesmo tempo do público para acompanhar a trama.

Um filme ou uma série de TV requer tempo do espectador para estar a par do que acontece na narrativa. Apesar de um programa seriado demandar mais tempo para ser assistido do que um filme, ambos os formatos de audiovisual partilham da mesma divisão temporal que Campos denomina, o tempo da estória e o tempo da narrativa:

Tempo da estória é aquele que uma estória percorre. [...] Tempo da narrativa é aquele que uma estória leva para ser narrada. Ao ignorar ou omitir incidentes que lhe parecem desimportantes ou não pertinentes, o narrador torna o tempo da narrativa mais curto do que o tempo da estória que narra. Em contrapartida, ao esmiuçar a estória ou incidentes seus, o narrador torna o tempo da narrativa mais longo do que o tempo da estória que narra. [...] O que nos leva a concluir que o que dita o tempo da narrativa é a atenção que o narrador dedica aos seus pontos de foco. (CAMPOS, 2007, p. 210).

Sendo assim, um seriado de televisão possui o tempo de narrativa muito mais longo do que um longa-metragem, e pode ou não ter um tempo de estória maior. Campos acrescenta que há filmes em que o tempo de estória e o tempo de narrativa coincidem, e exemplifica esse caso com o filme Matar ou Morrer (High Noon, 1952). Gaudreault e Jost classificam a narrativa ficcional em tempo de projeção e tempo diegético:

Se o tempo de leitura de um romance é aleatório, o do ato de assistir a um filme é fixo e quantificável. O tempo da tela, conforme Souriau (1953), ou seja, o tempo da projeção – o tempo do significante – é um dado objetivo que os espectadores dividem igualmente (ao menos nas condições habituais de consumo de filmes nas salas de cinema) e que pode ser comparado paralelamente, com este outro dado, tão importante na narratologia: o tempo diegético (ou seja, o tempo do significado, o tempo da história, ou ainda, o tempo do que é contado). (GAUDREAULT; JOST, 2009, p. 148).

No caso de filmes em que os dois tempos são iguais, Gaudreault e Jost usam o termo designado por Genette, a cena. Neste caso, eles propõem que filmes com esta fórmula respeitam a ordem cronológica dos eventos narrativa:

O evento que é narrado dura, na diegese, tanto tempo quanto o necessário para narrá- lo. [...] Daí a fórmula seguinte: TN = TH, fórmula muito simples, que evidentemente, ser lida como se segue: o Tempo da Narrativa equivale ao Tempo da História. (GAUDREAULT; JOST, 2009, p. 150).

15 Na fala original do episódio The Commitment Determination, o vigésimo quarto da oitava temporada da série:

Starting to watch a television show that might run for years isn't a decision to take lightly. I'm wrestling with a big commitment issue here.

Em outra fórmula, nomeada por Genette de sumário, Gaudreault e Jost colocam que o tempo de narrativa é menor, e é o mais usual. Quando o tempo da narrativa é menor do que o tempo da estória, o objetivo é omitir informações desnecessárias ou apressar a ação. Campos dispõe recursos que facilitam indicar a passagem ou aceleração do tempo e localizar a época em que se está, como inserção de legendas que informam quantos anos se passaram, exibição do envelhecimento dos personagens ou utilização de referências culturais, como moda e modelos de carro.

Segundo Campos, narrar uma estória requer atenção no ritmo de exposição dos eventos e personagens:

Ritmo é a constante que emana de uma repetição no tempo. [...] Num sentido mais largo, ritmo é a velocidade com que se narra. Numa narrativa dramática canônica, a apresentação do mundo posto em sossego pede ritmo lento, o surgimento e a complicação do problema pedem aceleração do ritmo, até o ponto máximo, o clímax da narrativa, depois do qual o ritmo desacelera. (CAMPOS, 2007, p. 217).

O autor propõe que o ritmo da narrativa tenha variação e que esta mudança deve ser motivada. Ao deixar explícito a razão de acelerar ou diminuir o ritmo, o espectador é mais aberto a aceitar o que ocorre, sem se assustar e pode se sentir mais livre para crer no que é mostrado. A diversificação do ritmo afasta a monotonia da narrativa, e esta variação é classificada por Campos como gradação. Quando aplicada, a gradação traz mais dinâmica na narrativa acelerando ou pausando-a de acordo com o efeito a ser emitido.

Gaudreault e Jost refletem sobre a temporalidade na narrativa e as preferências do que mostrar nela em relação ao tempo. Neste aspecto, o narrador é quem escolhe o momento em que irá exibir os fatos. Dos dois tempos disponíveis, o que ocorre dentro da narrativa e o tempo que ela é contada frente ao espectador, existem os eventos em sua determinada ordem, dentro da massa da estória. O narrador pode explicar minuciosamente cada fenômeno ou mostrá-los com antecedência ou não mencioná-los ou, ainda, torná-los recorrentes conforme sua seleção. Deste modo, aquilo que o narrador escolhe contar no tempo de sua escolha, é diferente da narrativa sem sua seleção.

Mesmo o narrador tendo liberdade de escolher a partir de onde quer contar sua estória, é importante colocar que essa escolha, de alguma forma, deve reter a atenção de quem assiste. Sobre a partir de quando, na vida do protagonista, a estória contada deve começar, McKee recomenda que seja em um momento próximo do Incidente Incitante:

Após localizar a data do evento climático da vida do protagonista, começamos o mais perto possível do tempo. Esse design comprime a duração da narrativa e aumenta a biografia da personagem anterior ao Incidente Incitante. (MCKEE, 2011, p. 319).

Se a narrativa começa muito distante do incidente essencial, ela pode expor de forma desnecessária a vida em equilíbrio do personagem, o que pode não ser interessante para manter o espectador atento. McKee (2011, p. 341) aborda a questão temporal relacionada com o personagem: “Quanto mais tempo você gasta com uma personagem, mais oportunidades você tem de testemunhar suas escolhas. O resultado é mais empatia e envolvimento emocional entre público e personagem”. Desta maneira, quanto maior o tempo usado para mostrar as seleções que um personagem faz, maior é o conhecimento que o espectador tem dele, o que fortalece a relação de empatia.