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Teorema do Valor Intermedi´ario

No documento Cálculo 1 : versão 1/09 (páginas 102-106)

Uma outra consequˆencia do Teorema de Weierstrass e da Proposi¸c˜ao 4.9 ´e que as fun¸c˜oes derivadas sempre satisfazem `a denominada Propriedade do Valor Intermedi´ario. Uma fun¸c˜ao f satisfaz a PVI se dados a e b pontos no seu dom´ınio e um valor intermedi´ario d ∈ R entre as imagens f (a) e f (b), existe um ponto c entre os pontos a e b tais que d = f (c). Geomet- ricamente isto significa que toda reta horizontal entre as imagens f (a) e f (b) intercepta f entre os pontos a e b, como ilustrado pela Figura 4.14.

Figura 4.14. Propriedade do Valor Intermedi´ario.

Uma observa¸c˜ao imediata ´e que se f satisfaz a propriedade do valor intermedi´ario, ent˜ao sua imagem ´e necessariamente um intervalo, pois todos valores d entre f (a) e f (b) fazem parte da imagem, ou seja, s˜ao da forma f (c).

Este resultado, conhecido como Teorema de Darboux, ´e demonstrado a seguir. Teorema 4.13. Toda fun¸c˜ao derivada satisfaz a PVI.

Demonstra¸c˜ao. Seja [a, b] um intervalo contido no dom´ınio de uma dada fun¸c˜ao derivada f′. Vamos supor que f′(a) < d < f′(d), sendo an´aloga a demonstra¸c˜ao do caso em que f′(b) < d < f′(a) e deixada como exerc´ıcio. Consideramos ent˜ao a fun¸c˜ao g(x) = f (x) − dx. Temos que a fun¸c˜ao derivada g′ est´a definida no intervalo [a, b] e tamb´em que

g′(a) = f′(a) − d < 0 e g′(b) = f′(b) − d > 0.

Pelo Teorema de Weierstrass, existe um ponto de m´ınimo de g em [a, b]. Vamos mostrar que nem o ponto a nem o ponto b podem ser pontos de m´ınimo da fun¸c˜ao g em [a, b]. De fato, se a fosse ponto de m´ınimo, ter´ıamos que g(x) > g(a), para todo x ∈ [a, b], e ent˜ao

g′(a) = lim

x↓a

g(x) − g(a) x − a >0.

4.3. TEOREMA DO VALOR INTERMEDI ´ARIO 103 O argumento ´e similar no caso do ponto b e tamb´em ´e deixado como exerc´ıcio. Logo existe c ∈ (a, b) que ´e ponto de m´ınimo de g e, portanto, ´e ponto de extremo local. Pela Proposi¸c˜ao 4.9, temos que

f′(c) − d = g′(c) = 0, o que mostra que f′(c) = d.

No Cap´ıtulo 5 veremos que toda fun¸c˜ao cont´ınua ´e a fun¸c˜ao derivada de alguma fun¸c˜ao. Portanto obtemos o seguinte resultado, conhecido como Teorema do Valor Intermedi´ario e que ´e de fundamental importˆancia no C´alculo.

Teorema 4.14 (TVI). Se f ´e cont´ınua e seu dom´ınio ´e um intervalo, ent˜ao ela satisfaz a propriedade do valor intermedi´ario. Portanto sua imagem tamb´em ´e um intervalo.

Uma fun¸c˜ao f ´e denominada mon´otona se ela ´e crescente ou ela ´e decrescente, como ilustrado pela Figura 4.15.

Figura 4.15. Fun¸c˜ao f ´e crescente e fun¸c˜ao g ´e decrescente.

Se f ´e mon´otona, ent˜ao ela ´e uma inje¸c˜ao, pois claramente satisfaz o teste da reta horizontal. Entretanto existem bije¸c˜oes que n˜ao s˜ao sequer mon´otonas, como mostra o seguinte exemplo

f (x) = (

x + 1, se − 1 < x < 0 x − 1, se 0 6 x 6 1. ilustrado pela Figura 4.16.

Quando f ´e cont´ınua e seu dom´ınio ´e um intervalo, devido ao Teorema do Valor Inter- medi´ario, este tipo de situa¸c˜ao n˜ao pode ocorrer.

Proposi¸c˜ao 4.15. Seja f uma fun¸c˜ao cont´ınua cujo o dom´ınio ´e um intervalo. Ent˜ao f ´e uma inje¸c˜ao se e s´o se f ´e mon´otona.

Demonstra¸c˜ao. J´a observamos acima que se f ´e mon´otona, ent˜ao f ´e uma inje¸c˜ao. Resta portanto mostrarmos que se f ´e uma inje¸c˜ao, ent˜ao f ´e mon´otona. Se f fosse uma inje¸c˜ao, mas n˜ao fosse mon´otona, ent˜ao existiriam x < y < z, pontos no dom´ınio de f , satisfazendo a uma das seguintes possibilidade: (1) f cresce de x para y mas decresce de y para z ou (2) f decresce de x para y mas cresce de y para z, como ilustra a Figura 4.17.

Figura 4.17. Possibilidades (1) e (2).

Vamos analisar possibilidade 1). Neste caso, temos que f (x) < f (y) e tamb´em que f (y) > f (z) e ent˜ao ter´ıamos mais duas possibilidades: (A) f (z) < f (x) ou (B) f (z) > f (x), como mostra a Figura 4.18.

Figura 4.18. Possibilidades (A) e (B).

No caso (A), ter´ıamos que f (z) < f (x) < f (y). Pelo TVI, existiria c ∈ dom(f), onde y < c < z e tal que f (c) = f (x). Mas isto seria uma contradi¸c˜ao com o fato de supormos que f ´e uma inje¸c˜ao. No caso (B), ter´ıamos que f (y) > f (z) > f (x). Pelo TVI, existiria c ∈ dom(f), onde x < c < y e tal que f(c) = f(z). Novamente isto seria uma contradi¸c˜ao com o fato de supormos que f ´e uma inje¸c˜ao. Analisando a possibilidade (2) de maneira

4.3. TEOREMA DO VALOR INTERMEDI ´ARIO 105 an´aloga, o que ´e deixado como exerc´ıcio, obter´ıamos mais uma vez uma contradi¸c˜ao. Portanto conclu´ımos que se f ´e uma inje¸c˜ao, ent˜ao f s´o pode ser mon´otona.

Vamos encerrar esta se¸c˜ao demonstrando que se uma inje¸c˜ao ´e cont´ınua, sua inversa tamb´em ´e cont´ınua. Para isso precisamos de dois resultados preliminares.

Proposi¸c˜ao 4.16. Seja f ´e uma fun¸c˜ao mon´otona, ent˜ao sua inversa tamb´em ´e mon´otona. Demonstra¸c˜ao. De fato, vamos mostrar que se f ´e crescente, ent˜ao a inversa f−1 tamb´em ´e

crescente. O caso em que f ´e decrescente ´e an´alogo e deixado como exerc´ıcio. Se f fosse uma fun¸c˜ao crescente, mas sua inversa f−1 n˜ao fosse crescente, ent˜ao existiriam c < d, pontos do

dom´ınio da inversa f−1 tais que f−1(d) 6 f−1(c). Como f ´e crescente, ter´ıamos que

d = f (f−1(d)) 6 f (f−1(c)) = c

o que seria uma contradi¸c˜ao. Portanto conclu´ımos que se f ´e uma fun¸c˜ao crescente, ent˜ao sua inversa f−1 s´o pode ser uma fun¸c˜ao crescente.

O segundo resultado preliminar ´e de grande relevˆancia no C´alculo e sua demonstra¸c˜ao se encontra na Se¸c˜ao A.6.

Proposi¸c˜ao 4.17. Se f ´e uma fun¸c˜ao mon´otona cujo dom´ınio ´e um intervalo aberto, ent˜ao os limites laterais existem.

Uma inje¸c˜ao cont´ınua cuja inversa tamb´em ´e cont´ınua ´e denominada homeomorfismo. A seguir vamos mostrar que toda inje¸c˜ao cont´ınua ´e de fato um homeomorfismo.

Proposi¸c˜ao 4.18. Se f ´e uma inje¸c˜ao cont´ınua cujo dom´ınio ´e um intervalo aberto, ent˜ao sua inversa f−1 tamb´em ´e cont´ınua.

Demonstra¸c˜ao. Pela Proposi¸c˜ao 4.15, temos que f ´e mon´otona, o que, pela Proposi¸c˜ao 4.16, implica que a inversa f−1 ´e tamb´em mon´otona. Para mostrar a continuidade num ponto a

do dom´ıno de f−1, pela Proposi¸c˜ao 2.20, basta mostrar que os limites laterais s˜ao iguais a

f−1(a). Pela Proposi¸c˜ao 4.17, o seguinte limite existe

l = lim

x↓af −1(x).

Por defini¸c˜ao, se xn↓ a, ent˜ao f−1(xn) → l. Como a fun¸c˜ao f ´e cont´ınua, segue que

xn= f (f−1(xn)) → f(l).

Pela unicidade do limite, temos que a = f (l). Portanto l = f−1(a). No caso do limite lateral

esquerdo, o procedimento ´e an´alogo e deixado como exerc´ıcio.

Este resultado ´e extremamente ´util no estudo da continuida das fun¸c˜oes inversas. Por exemplo, como as fun¸c˜oes potˆencias e as fun¸c˜oes trigonom´etricas s˜ao cont´ınuas, temos ime- diatamente que as fun¸c˜oes ra´ızes e as fun¸c˜oes arco-trigonom´etricas s˜ao tamb´em cont´ınuas.

4.3.1

Exerc´ıcios

1) Em rela¸c˜ao `a demonstra¸c˜ao da Proposi¸c˜ao 4.15, analise a possibilidade 2) de maneira an´aloga `a an´alise feita da possibilidade 1) e conclua que obter´ıamos mais uma vez uma contradi¸c˜ao.

2) Complete a demonstra¸c˜ao da Proposi¸c˜ao 4.16, considerando o caso em que f ´e decres- cente.

3) Complete a demonstra¸c˜ao da Proposi¸c˜ao 4.18, considerando o caso em que o limite lateral esquerdo de f−1 no ponto a faz sentido.

4) Mostre que as imagens do seno em hπ 2,

π 2 i

e do cosseno em [0, π] s˜ao iguais ao intervalo [−1, 1]. Conclua que os dom´ınios do arco-seno e do arco-cosseno s˜ao dados pelo intervalo [−1, 1].

No documento Cálculo 1 : versão 1/09 (páginas 102-106)

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