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Teoria Clássica dos Testes (TCT) e Teoria de Resposta ao Item (TRI)

Desde o surgimento da Teoria Clássica dos Testes (TCT), entre o final do século XIX e início do século XX, seus fundamentos têm sido amplamente empregados na construção e validação dos testes psicológicos (Pasquali, 1999; Urbina 2007). Entretanto, apesar de sua vasta aplicação, o modelo clássico apresenta limitações teóricas e práticas: (a) na TCT, o resultado da medição de uma variável depende do instrumento/teste utilizado, assim, o resultado da medição de um construto depende do teste usado; (b) os parâmetros dos itens de um teste dependem da amostra utilizada para sua construção, por exemplo, a dificuldade do item varia de um estudo para o outro em função da amostra utilizada; (c) o cálculo da discriminação do item é realizado com base no escore total do teste. Isso configura uma contradição lógica uma vez que a discriminação de cada item é testada contra o escore total, que é composto por todos os itens do teste, inclusive o item em análise; (d) o cálculo da fidedignidade é também afetado já que os testes paralelos (escores verdadeiros idênticos e variâncias iguais) não são empiricamente verificáveis; (e) o erro-padrão de medida é o mesmo

para todos os testandos; e (f) os testes são direcionados para sujeitos com habilidades medianas, por conseguinte, pouco apropriado para sujeitos fora dessa faixa (Pasquali & Primi, 2007).

Para solucionar essas questões, surgiu um novo modelo matemático, denominado por Teoria de Resposta ao Item (TRI). De acordo com retrospectiva de Muñiz e Hambleton (1992), a TRI foi desenvolvida, após os anos 50 do século XX, para resolver as limitações da TCT, a partir dos trabalhos pioneiros de Lord em 1952, de Birnbaum em 1957 e 1958, e de Rasch em 1960. Posteriormente, vieram as contribuições de Birnbaum, na obra de 1968, publicada por Lord e Novick, somada à publicação do livro de Frederic Lord, em 1980, intitulado “Applications of Item Response Theory to Practical Testing Problems”. Juntamente com o avanço tecnológico, possibilitando o uso de computadores, visto como ferramenta essencial para aplicação do modelo matemático complexo que compõe a TRI, esses reforços foram importantes para a consolidação e expansão desse novo modelo.

De forma geral, a TRI preocupa-se com a probabilidade de um sujeito emitir uma resposta correta a um item do teste em função dos parâmetros do item (dificuldade, discriminação e resposta ao acaso) e de sua habilidade (traço latente) e não do escore final total da prova, como ocorre na TCT (Andrade, Tavares & Valle, 2000; Pasquali, 2009). Assim, sujeitos com diferentes habilidades apresentam probabilidades distintas para emitirem uma resposta correta ao item; essa relação funcional é representada na Curva Característica do Item (CCI) (Baker, 2001; Muñiz, 1997).

A CCI é uma função matemática monotônica crescente, tendo em sua abscissa os valores relativos à variável habilidade (teta; θ) e na ordenada à probabilidade de acertar o item P(θ) (Baker, 2001; Muñiz, 1997; Pasquali, 2007). A CCI tem utilização ilimitada para a representação de modelos matemáticos, no entanto apenas três são mais aplicados, a saber: (1)

Modelo Logístico de Um Parâmetro (1LP), que avalia somente a dificuldade do item (b); (2) Modelo Logístico de Dois Parâmetros (2LP), que vai se ocupar com a dificuldade (b) e discriminação do item (a); e (3) Modelo Logístico de Três Parâmetros (3LP), que se compromete em avaliar a dificuldade (b), a discriminação (a) e a resposta correta dada ao item por acaso (c) (Muñiz, 1997; Pasquali & Primi, 2007). Na Figura 1, pode-se observar a CCI e os parâmetros do item (Andrade et al., 2000).

Figura 1. Curva característica do item na Teoria de Resposta ao Item (Andrade et al., 2000, p.11).

Os parâmetros descritos em cada modelo podem ser observados na Figura 1:

(I) a dificuldade ou parâmetro de posição “b” localiza-se na abscissa, na mesma escala de habilidade (Ɵ), é o ponto de curvatura no qual a inclinação da curva é máxima e, nesse exemplo, varia entre -4 a +4. Assim, para a probabilidade P = 0,60, têm-se b = 1,20;

(II) a discriminação “a” é dada pela inclinação da CCI no ponto de inflexão com P = 0,60, de forma que, quanto maior a discriminação do item, maior será o crescimento abrupto na seção mediana do “S” da curva; e

(III) o parâmetro “c” corresponde à probabilidade de acertar o item ao acaso, no exemplo em questão c = 0,20 (Andrade, Tavares & Valle, 2000; Pasquali, 2007).

O Modelo Logístico de Três Parâmetros (3LP) é o mais completo. Nele, os três parâmetros apresentados, anteriormente, são considerados como variáveis que podem influenciar a probabilidade do indivíduo acertar o item. Sua representação matemática é dada e descrita abaixo (Vendramini, Silva & Canale, 2004, p.491):

com i = 1, 2,..., n e j = 1, 2,..., m, sendo:

Xij Variável dicotômica que assume os valores 1(correta) ou 0 (incorreta), de acordo com a resposta do indivíduo j ao item i; Ɵj Habilidade do indivíduo j;

P(Xij =1|Ɵj) = Pi(Ɵ) Probabilidade de um indivíduo j com habilidade Ɵj acertar item i; ci Probabilidade de acerto ao acaso;

bi Índice de dificuldade (ou parâmetro de posição) do item i; ai Índice de discriminação (ou parâmetro de inclinação) do item i; D Constante de ajuste = 1 ou a 1,7 (quando se deseja que a função

logística se aproxime da ogiva normal); e Constante matemática cujo valor é 2,718; n Número de itens;

m Número de indivíduos.

Nas últimas décadas, a TRI tem sido aplicada na criação de bancos de itens (Andriola, 1998); no desenvolvimento e/ou avaliação de propriedades psicométrica em instrumentos de medidas (Chachamovich, 2007; Flores-Mendoza, Abad & Lelé, 2005; Guewehr, 2007; Nunes & Primi, 2005; Nunes et al., 2008; Primi, 2004; Santos et al., 2002); em sistemas de avaliação educacional - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e Exame Nacional de Cursos (ENC) (Conde & Laros, 2007; Francisco, 2005; Klein, 2003; Vendramini & Dias 2005); e no desenvolvimento de testes assistidos (Muniz, 2008). Também foram verificadas aplicações em grande escala no teste TOEFL (Test of English as a Foreign Language) e no teste GRE (Graduate Record Examinations) (Pasquali & Primi, 2003).

Para Pasquali e Primi (2003), cabe ressaltar que a TRI não entra em contradição com a Teoria Clássica dos Testes - ela prega complementaridade e oferece vantagens importantes: (a) o cálculo do nível de aptidão do sujeito independe da amostra de itens utilizados, de forma que a habilidade do sujeito independe do teste; (b) o cálculo dos parâmetros dos itens independe da amostra, pois os parâmetros são independentes dos sujeitos; e (c) a TRI permite emparelhar itens com a aptidão do sujeito, ou seja, os itens podem ser selecionados conforme

a aptidão do sujeito.

A avaliação psicológica tradicional, por sua vez, também difere da AA quanto aos seus objetivos, método, administração, tipo de avaliação e comparação. Essas distinções são apresentadas no próximo tópico.

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