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Secção I – Correferência: informação linguística e processamento

2.3. Teoria da Centralidade

A Teoria da Centralidade (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995) foi desenvolvida no âmbito da linguística computacional, e prevê que fatores como o foco de atenção no discurso contribuam para a coerência do mesmo.

De acordo com os autores, a coerência do discurso está na possibilidade de retomar num enunciado entidades que foram introduzidas anteriormente. Os autores denominam essas entidades de centros. Num discurso, identifica-se dois tipos de centros: os centros antecipatórios, que correspondem ao conjunto de entidades semânticas introduzidas num enunciado, suscetíveis de serem retomados posteriormente; e os

centros retroativos, que correspondem à entidade do centro antecipatório que é retomado

no enunciado seguinte.

19.

a) John went to his favorite music store to buy a piano. b) He had frequented the store for many years.

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d) He arrived just as the store was closing for the day.

20.

a) John went to his favorite music store to buy a piano. b) It was a store John had frequented for many years. c) He was excited that he could finally buy a piano. d) It was closing just as John arrived.

Exemplos retirados de Grosz, Weinstein & Joshi (1995:206)

Ambos os discursos transmitem a mesma informação, mas a carga de processo de correferência é maior no discurso (20) que no discurso (19). Isso ocorre porque o discurso (19) é intuitivamente mais coerente do que o discurso (20). O discurso (19) centra-se em torno de um único centro retroativo, ao passo que o discurso (20) apresenta dois centros retroativos, e a constante mudança entre os dois torna o processo de inferência mais custoso. No segundo discurso (20) no enunciado (a), o interlocutor tem a entidade John como foco de atenção, em (20b) nota-se uma mudança de atenção direcionado à entidade local loja, em (20c) o interlocutor é conduzido, novamente, à retoma da entidade John, e uma outra mudança verifica-se em (20d), o foco na entidade loja. O facto de o centro retroativo dum enunciado não corresponder ao centro antecipatório proeminente do enunciado anterior torna o discurso incoerente e custoso. Pode mesmo conduzir ao retrocesso, caso o interlocutor engendre a inferência errada. De acordo com Grosz, Weinstein e Joshi (1995), quanto maior a coerência, menores os custos inferenciais, “Underlying these claims is the most fundamental claim of centering theory, that to the extent a discourse adheres to centering constraints, its coherence will increase and the inference load placed upon the hearer will decrease.” (Grosz, Joshi e Weinstein, 1995: 210).

Os autores examinam as relações existentes entre os locais específicos que geram coerência e as expressões referenciais utilizadas. Ora veja-se os seguintes discursos:

21.

a) Terry really goofs sometimes.

b) Yesterday was a beautiful day and he was excited about trying out his new

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c) He wanted Tony to join him on a sailing expedition. d) He called him at 6 AM.

e) He was sick and furious at being woken up so early.

22.

a) Terry really goofs sometimes. Terry really goofs sometimes.

b) Yesterday was a beautiful day and he was excited about trying out his new

sailboat.

c) He wanted Tony to join him on a sailing expedition. d) He called him at 6 AM.

e) Tony was sick and furious at being woken up so early. f) He told Terry to get lost and hung up.

Exemplos retirados de Grosz, Weinstein & Joshi (1995:207)

Tal como nos exemplos anteriores, 19 e 20, neste exemplo verifica-se, também, que um dos discursos é mais coerente do que o outro. No enunciado (21e), verifica-se que o foco de atenção mudou de Terry para Tony de forma inesperada, ou seja, no enunciado (21d) Terry era o centro antecipatório saliente, e no enunciado (21e), Tony é retomado como centro reativo com recurso à forma pronominal. No entanto, no enunciado (22e), a mudança de foco é feita pela introdução do nome próprio Tony na posição de sujeito. No enunciado seguinte (22f), como Tony é o centro antecipatório saliente do enunciado anterior, a retoma sob a forma pronominal não causa rutura de coerência, pelo facto de o centro antecipatório e o centro retroativo coincidirem. Este mecanismo de retomar como centro retroativo o foco de atenção do enunciado anterior, torna o processamento mais fácil e, consequentemente mais coerente.

De acordo com os autores, as formas pronominais indicam proeminência, por isso, são completamente aceitáveis para indicar a continuidade de foco; e o centro retroativo é, preferencialmente, o sujeito do enunciado anterior.

As entidades são organizadas numa hierarquia de centralidade em função do papel sintático. A entidade que ocupa a posição mais alta na hierarquia é aquela que se encontra na posição de sujeito, em seguida as entidades na posição de objeto, e por fim as restantes. Contudo, os autores não descartam a relevância de outros fatores no processo

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de inferência, como a subordinação, a informação léxico-semântica, assim como a interação entre todos estes fatores.

A TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995) não exclui a possibilidade de outras entidades menos salientes serem retomadas por um pronome, apenas estipula que o centro retroativo também o deve ser. Este princípio corresponde à regra 1 da TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995). As razões são óbvias, se as formas pronominais são marcadores de proeminência, então antes de um centro antecipatório menos saliente ser pronominalizado, o centro reativo tem de o ser também. Como se pode observar no enunciado (21d), no qual Tony é retomado pelo pronome him (centro antecipatório), mas antes Terry já tinha sido retomado pelo pronome he (centro retroativo). Quando essa regra é violada há uma rutura de coerência no discurso.

A TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995) estabelece três tipos de relações entre os centros dos diferentes enunciados:

(i) Continuação do centro retroativo: o centro retroativo mantem-se ao longo

de vários enunciados e é a entidade mais saliente;

(ii) Retenção do centro: quando o centro retroativo se mantem no enunciado

seguinte, mas já não é a entidade mais saliente;

(iii) Mudança do centro: quando o centro retroativo não é nem retido nem

continuado, ou seja, não é referido.

A coerência discursiva é determinada pelo tipo de relação estabelecida entre os centros dos enunciados. Esta teoria determina uma sequência preferencial para uma boa coerência discursiva. Então, a continuação do centro deve ser preferida sobre a sequência de retenção, esta última deve ser preferida sobre a sequência de mudança. Este princípio corresponde à regra 2 da TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995). Quanto maior o número de inferências, menor a coerência.

Esta teoria não prevê o processamento de cadeias referenciais, ela apenas explica a coerência discursiva. Do mesmo modo, a TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995) não prevê princípios de obrigatoriedade. A TC (Grosz, Weinstein & Joshi, 1995) apenas estabelece normas que facilitam o processamento da informação.

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