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Capítulo 3 Metodologia de autoconfrontação de Yves Clot

3.1. A Primeira Geração

3.1.3. A Terceira Geração

A Terceira Geração busca fazer uma síntese sobre das propostas da 2ª geração, buscando unificar aspectos da Ergonomia e da Psicopatologia do trabalho para justificar seu surgimento.

Eu creio que a questão do coletivo merece ser aprofundada como uma tendência do lado do real do trabalho. Isso quer dizer que o coletivo não é qualquer coisa que deve ser defendido, mas algo que deve ser reencontrado; ele é algo que é solicitado e, ao mesmo tempo, interditado (CLOT, 2006, p. 103).

Para Schwartz (1998), o trabalho não é simples execução de tarefas, mas sim um lugar de "usos de si", em que o sujeito em todo o seu ser é convocado a agir, utilizando recursos muito mais vastos do que seu trabalho deixa aparecer, desenvolvida no enfoque ergológico do trabalho.

A Ergonomia tem seu foco na atividade observada em situação de trabalho, enquanto a Psicopatologia do Trabalho foca na subjetividade, usando a escuta, a palavra, o diálogo, a troca.

“Temos aí duas diferenças, de um lado, a atividade e, de outro, a palavra. Portanto, em resumo, atividade de um lado e subjetividade de outro. Observação em situação e escuta do outro lado” (CLOT, 2010 p, 220).

Eu creio que o que nós fazemos na psicologia do trabalho, na clínica do trabalho não é defender um valor antigo do coletivo; eu penso que nós estamos bem habilitados para saber que a organização do trabalho oficial tenta rechaçar o coletivo, mas esse coletivo é qualquer coisa que é demandada pelo real do trabalho interditado (CLOT, 2006, p. 105).

Assim, Clot (2010) aponta duas questões a serem consideradas: em primeiro lugar a concepção de ação, do método da ação, e em segundo lugar a conceituação de atividade e subjetividade. Para tratar do primeiro, o autor se apoia no trabalho de Tosquelles com a Ergoterapia, que é uma tentativa de olhar o trabalho como uma terapia. “Não se trata de fazer os doentes trabalharem, para diminuir tal ou qual sintoma. Trata-se de fazer trabalhar os doentes e o pessoal que os cuida, para cuidar das instituições psiquiátricas” (TOSQUELLES, 1987 apud CLOT, 2010 p. 222).

Segundo Silva (2016), Clot, ao citar Tosqueles, aponta como foco principal não o trabalho, mas sim a instituição na qual o sujeito trabalha. “Isso significa que não se trata, em

matéria de análise do trabalho, de cuidar do trabalhador, trata-se de, no método de ação, fazer trabalhar os trabalhadores para cuidarem do trabalho”. (CLOT, 2010, p. 222).

Seria possível convencer o sujeito que foi vítima de processos históricos que devastaram sua identidade com o trabalho, a colocar seu foco na instituição, que, de fato, não o representa? Le Guilland (2006 apud CLOT,2010) parece pensar que não! Clot (2010) parece acreditar que sim, afirmando que os trabalhadores têm condições de “transformar” as instituições por meio de “técnicas que transformem os trabalhadores’’.

Em entrevista dada em Florianópolis, em 2006, Clot revela que “trabalha para muitas instituições’’, e afirma:

Eu não creio que o mundo do trabalho atual esteja afetado por uma única tendência em direção à individualização. Eu trabalho com muitas empresas. Há uma verdadeira contradição na gestão profissional, na indústria e nos serviços, sobretudo na área de serviços. Certamente, a gestão tende a individualizar as questões e os sociólogos têm insistido muito nisso, mas o real do trabalho impõe, cada vez mais, um trabalho coletivo; para fazerem face ao real, os trabalhadores têm que fazê-lo juntos. (CLOT, 2006, p. 105)

Para compreender as dificuldades atuais que os professores de escolas bilíngues para surdos encontram, para se relacionarem e se posicionarem frente à problemática da criança surda é necessário conscientizá-los de que existe uma origem cultural comum, herdada de conflitos sócio-culturais, originados no passado, que determinaram uma série de condicionantes que orientaram, mesmo que de forma inconsciente, a vida e atuação desses profissionais.

Para que estes profissionais possam atuar de maneira transformadora deve-se lhes revelar as origens comuns dos problemas que assolam a vida dos trabalhadores, e ainda, mostrar as origens comuns dos próprios trabalhadores, reforçando um certo senso de “pertencimento’’, que foi sendo demolido no decorrer dos acontecimentos, desde o final do século XIX.

Torna-se necessário confrontar o professor com sua realidade sociocultural para que este possa atuar de maneira transformadora. Esta transformação deve, paradoxalmente, partir do professor e envolver o professor, pois este profissional é o pilar central dessa construção do conhecimento, já que a maioria dos futuros trabalhadores serão formados nas escolas por professores.

3.2 A Metodologia da autoconfrontação simples proposta por Yves Clot.

Tendo em conta as características do trabalhador, retratadas anteriormente, e

justificadas suas características e senso de não pertencimento, passa-se a refletir sobre as possibilidades do método de autoconfrontação simples, proposto por Yves Clot.

De modo que cuidar do trabalho é transformar a organização do trabalho. Essa é uma forma de abordagem de ação. Criar situações e encontrar técnicas nas quais se transformem os trabalhadores em sujeitos da situação, fazendo-os protagonistas da transformação. Eles é que são os autores da transformação e não os especialistas (CLOT, 2010 p. 222).

A metodologia de confrontação de Yves Clot se insere como uma tentativa de reintegrar as partes fragmentadas das relações profissionais, através da utilização de recursos áudio visuais, como filmes e gravações, entre indivíduos em situação real de trabalho, buscando-se criar consciência comportamental.

Clot (2006) recupera conceitos propostos por Vygotsky, apresentando a ideia de que o social não é simplesmente uma coleção de indivíduos, mas que o social está intrínseco em nós, sendo recurso fundamental para o desenvolvimento da subjetividade. Nesse sentido, o coletivo é entendido como um recurso para o desenvolvimento individual. Portanto, para o autor, a autorreflexão pode servir como mediadora para o desenvolvimento global da situação de trabalho.

Durante a autoconfrontação, o trabalhador, ao se deparar com sua atuação profissional e com os fazeres que eram realizados de forma automática, sem um pensar sobre o agir, o sujeito busca essa terceira pessoa, o coletivo, para responder às questões relativas à sua atividade. Clot (2010) observa que durante o diálogo com o pesquisador, o trabalhador ao expressar-se, através da fala, faz uso de “nós” ou “a gente”, procurando apoio para suas escolhas através das ações definidas para seu ofício.

No momento em que se deve justificar, junto do pesquisador, determinada maneira de fazer, quer isso seja para ajudá-lo a compreender o “difícil de dizer” ou para se proteger a si mesmo de um conflito surgido no momento em que ele faz tal tentativa, o sujeito dispõe dessa história coletiva com a qual, então, ele dialoga e que lhe fornece assistência para procurar proceder à análise do que ele se vê fazendo na tela (CLOT, 2010 p. 255).

A partir deste momento, Clot (2010) acredita-se que a observação não é mais feita somente com os próprios olhos do trabalhador, e não somente com olhos de um observador externo, que é o pesquisador, mas sim ele se observa com os olhos do ofício. Ele passa a se