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Capítulo 2 – A Fronteira e a Vizinhança: conflitos entre vizinhos nos entornos da

3) Terras particulares e apropriação de bens: estratégias de valorização da propriedade na

Segundo o tratado agrícola de Francisco Peixoto de Lacerda Werneck (Barão de Pati do Alferes) uma fazenda de café não podia ser construída em qualquer localidade e sob qualquer circunstância; alguns cuidados deveriam ser tomados pelos agricultores que quisessem fundá-la e bem administrá-la no Vale do Paraíba. Era necessário que o fazendeiro soubesse manipular a natureza de maneira que o empreendimento agrícola desejado extraísse o máximo de proveito daquele ecossistema, aproveitando-se tanto do clima quanto do solo fértil para a plantação de gêneros.430

A sede da unidade de produção e a planta da fazenda deveriam ser localizadas num lugar estratégico para que, distinguindo o “bom do mau terreno”, o lavrador pudesse cultivar pomares, hortas e complementar a produção comercial do café com a plantação de milho, feijão, arroz, mandioca, favas e outros gêneros alimentícios nos terrenos adjacentes. As terras deviam ser próximas também a regiões por onde se poderia ter acesso à água e era aconselhável que a fazenda entroncasse com alguma estrada para fins de escoamento da produção.

Com a fronteira aberta no início do século XIX, as disputas pelas melhores oportunidades locais para formar fazendas nas matas foram acirradas. Neste ínterim, os litígios entre vizinhos poderiam ser materializados também não pela posse e/ou propriedade da terra como vimos até agora, mas sim pelas benfeitorias e pela localização mais estratégica

430 WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória sobre a fundação e costeio de uma fazenda na Província do Rio de Janeiro. 3ª edição. Rio de Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert, 1878 [1847]. Disponível

em: <http://obrasraras.sibi.usp.br/xmlui/handle/123456789/1959?show=full>. Acesso em: 13/07/2018. Para uma análise deste tratado agrícola, ver: SILVA, Eduardo. Barões e Escravidão: três gerações de fazendeiros e a crise da estrutura escravista. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1984. Flávio dos Santos Gomes analisou os códigos morais contidos neste tratado que circularam entre os senhores da época, interessados na promoção de uma boa administração dos cativos para evitar revoltas escravas. Ver: GOMES, Flávio dos Santos. Histórias de

Quilombolas: Mocambos e Comunidades de Senzalas no Rio de Janeiro, século XIX. Edição revista e ampliada.

São Paulo: Companhia das Letras, 2006. Sobre a circulação atlântica de tratados morais e de manuais agrícolas que prezavam pela boa administração das fazendas para capitalizar o controle dos escravos nas Américas, ver: MARQUESE, Rafael de Bivar. Feitores do corpo, missionários da mente: senhores, letrados e o controle dos escravos nas Américas, 1660-1860. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

para tirar o máximo de proveito econômico. Até porque o terreno da fazenda não se restringia somente ao solo para plantio: nele, podemos encontrar também lagoas, açudes, estradas, matas virgens, árvores, animais e, obviamente, homens e mulheres que aí trabalhavam para ganhar seu sustento.

Portanto, a luta pelo exercício dos direitos de propriedade da terra também era acompanhada da luta pela apropriação destes outros recursos. Isto foi a principal causa de alguns conflitos na vizinhança de Valença. Acreditamos que a “situação de fronteira”431 adicionou um fator dinâmico nas relações entre vizinhos que interpretavam a existência destes recursos como fundamental para a proteção de seus direitos de propriedade. Vejamos alguns casos.

a) A reserva de água na vizinhança

Ora, de todos os motores conhecidos, é sem duvida a água o mais econômico e maneável. Por isso o primeiro cuidado do fazendeiro, que de novo vai fundar um estabelecimento rural, deve ser procurar aguada, e, encontrando-a, tirar o nível dessa, com a direção à mais vantajosa localidade.432

Manoel Jacinto Soares Vivas433 abriu um processo de Força Nova, em 1848, contra seu vizinho, Custódio do Nascimento de Jesus, por este ter construído uma casa no sítio dele para retirar a água que ali existia.434 Vivas afirmou que aquele pedaço de 250 braças de terras de testada com 750 de fundos havia sido arrematado em praça pública, pertencendo anteriormente à irmã do acusado, Gertrudes do Nascimento de Jesus. Para evitar problemas com seus vizinhos, Vivas demandou uma medição judicial para limitar suas terras com as dos herdeiros de Manoel do Nascimento de Jesus, os irmãos Custódio e Hipólito435, logo depois que adquiriu as terras da irmã deles em hasta pública. Foi apresentada a sentença de divisão, datada do mês de novembro de 1847. Em virtude da demarcação, ficou Vivas proprietário

431 Sobre a “situação de fronteira”, ver: MARTINS, José de Souza. Fronteira. Op. Cit.

432 WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória sobre a fundação e costeio de uma fazenda na Província do Rio de Janeiro. Op. Cit., p. 1.

433 Em 1848, ele ocupava o cargo de Juiz Municipal e de Órfãos na Freguesia de Nossa Senhora da Glória de

Valença e era conselheiro renomado da Santa Casa de Misericórdia, instituição na qual a “boa sociedade valenciana” se reunia. Ver: Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1848/1849. Município de Valença. Disponível em: <www.crl.edu/brazil/almanak>. Acesso em: 19/01/19.

434 AMJERJ/CCPJ: Nome da parte 1: Custodio do Nascimento de Jesus, Nome da parte 2: Manoel Jacintho

Soares Vivaz e sua mulher. Ação: Cível – Reintegração de Posse (Ação de Força). Ano do Processo: 1848. Comarca: Valença. Caixa: 1463. RG: 013862/A. Códice: 14653.

435 Em 1850, Custódio e Hipólito do Nascimento de Jesus apareceram, respectivamente, enquanto alferes e

tenente do 1º Batalhão de Infantaria da Vila de Valença. Ver: Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1850. Município de Valença. Disponível em: <www.crl.edu/brazil/almanak>. Acesso em: 19/01/19.

destas parcelas de terras e que eram contíguas à sua antiga propriedade, a fazenda de São Manoel da Passagem.

Findo esse trabalho, se encetará em seguida o do rego que deve trazer a água para mover as futuras máquinas. O rego deve ser feito com perfeição e cuidado, observando-se bem o nivelamento, porquanto é na boa execução do traço primitivo que se estabelece a permanência e segurança das obras (...)436

Aconteceu que os irmãos Custódio e Hipólito “perturbaram” as terras de Vivas, quando foram ao sítio e construíram um “rego”, espécie de sulco ou vala utilizado em escoamentos, para levar a água ali existente. Na medição anterior, os funcionários responsáveis pela demarcação já haviam descrito a existência de uma lagoa, nada desprezível, próxima às terras em questão. Além do rego, construíram uma casa e arrancaram as marcas da divisão para confirmar suas posses e ter acesso irrestrito à lagoa. Retiraram também madeiras das árvores que se encontravam nos matos virgens e nas capoeiras que existiam por lá, sinal de que já havia uma ocupação produtiva na época em que sua irmã aí morava. Por todas essas atitudes, a ação de Força Nova foi requerida para a reintegração da terra “usurpada” e que devia ser restituída a Vivas, estimando-se os danos em 400$000 réis.

A arrematação pública das terras da irmã foi bastante estratégica. Com ela, Manoel Jacinto Soares Vivas teve acesso não somente aos matos virgens que garantiriam a reprodução de suas atividades produtivas nos anos seguintes, mas também teria como usufruir da água provinda da lagoa e das madeiras das árvores nas adjacências. Valorizava, assim, suas terras, ainda mais se tivesse em mente vendê-las posteriormente.

Embora a terra tenha sido apropriada legalmente pelo vizinho, os irmãos acreditavam que aquela terra, por ter sido de uma familiar, legitimava a prática de continuar retirando água da lagoa. Construir uma casa e o rego, para escoamento desse bem natural, e retirar as madeiras das árvores foram as respostas encontradas pelos posseiros para reiterarem que mesmo depois de perderem as terras da irmã, continuariam usufruindo daqueles bens materiais naquela localidade estratégica que foi notada por seu vizinho. De outro modo, o juiz caracterizou aqueles fatos como “turbatórios”. Os posseiros tiveram que se desfazer das terras possuídas, que foram restituídas a Vivas, devendo-lhes pagar a quantia estimada pelos danos causados.

436 WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória sobre a fundação e costeio de uma fazenda na Província do Rio de Janeiro. Op. Cit., p. 3.

Nos Registros Paroquiais, identificamos que Custódio437 e Hipólito do Nascimento de Jesus438, todavia, continuavam possuindo, cada um, uma “sorte de terras” que media 250 braças de testada com 750 de fundos no interior da Fazenda de Santa Cruz.439 As pequenas propriedades se confrontavam entre si e com alguns vizinhos, como a viúva Joaquina Maria Soares Vivas, mulher do falecido Manoel Jacinto Soares Vivas.440 A viúva, porém, não declarou a terra do seu finado marido. A fazenda de São Manoel da Passagem foi declarada por Antônio Ferreira da Rocha441, “a qual ainda está em comum com os herdeiros” e “que pertenceu ao finado Manoel Jacinto Soares Vivas”. As terras da irmã dos posseiros foram incorporadas a esta fazenda junto com uma reserva de água que valorizava o patrimônio desta família. Só não sabemos se, depois desta declaração, esta reserva de água foi estritamente utilizada por seus “proprietários” nos anos seguintes.

b) Estradas particulares ou públicas?

Os caminhos constituem uma das primeiras condições de uma boa fazenda (...) não só aceleram todos os trabalhos, como ainda tornam cômodos os serviços rurais, facilitando os transportes dos produtos e a locomoção das pessoas. Além de uma estrada central que atravesse a fazenda, deve haver várias que, cruzando-se com essa em diversos pontos, permitam ao lavrador percorrer a cavalo todos os cultivados, entrando por um lado e saindo por outro.442

Existiam, também, outras formas de valorização da propriedade. Ter estradas passando por sua posse ou propriedade era uma vantagem significativa, pois estava garantida a facilidade de escoamento da produção. Nos limites da fazenda de Campo Alegre, de propriedade de Manoel Pereira de Souza Barros443, declarada nos registros paroquiais444, três

437 APERJ: Livro 88 (1854-1857). Município de Valença: Freguesia Nossa Senhora da Glória. Registro 23,

Folha 15.

438 APERJ: Livro 88 (1854-1857). Município de Valença: Freguesia Nossa Senhora da Glória. Registro 42,

Folha 20.

439 No seu inventário, percebemos que Custódio do Nascimento de Jesus era um pequeno proprietário que

possuía 18 alqueires de terras de cultura, avaliadas em 3:600$000 réis, e 10 escravos (somente 5 em idade produtiva). Ver: AMJERJ/CCPJ: Nome da parte 1: Custódio do Nascimento de Jesus, Nome da parte 2: Dona Maria Magdalena do Nascimento. Ação: Cível – Inventário. Ano do Processo: 1861. Comarca: Valença. Caixa: 1580. RG: 014973/A. Para a caracterização de pequeno proprietário, ver: SALLES, Ricardo. E o Vale era o

escravo. Op. Cit., p. 155.

440 Manoel Jacintho Soares Vivas morreu em 1850, mas a sua viúva e filhos continuavam listados como

fazendeiros em Valença. Ver: Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1850. Município de Valença. Disponível em: <www.crl.edu/brazil/almanak>. Acesso em: 19/01/19.

441 APERJ: Livro 88 (1854-1857). Município de Valença: Freguesia Nossa Senhora da Glória. Registro 104,

Folha 36v.

442 WERNECK, Francisco Peixoto de Lacerda. Memória sobre a fundação e costeio de uma fazenda na Província do Rio de Janeiro. Op. Cit., p. 7.

443 Manoel Pereira de Souza Barros foi listado enquanto fazendeiro na Freguesia de Nossa Senhora da Glória de

indivíduos abriram uma estrada na região de Santo Antônio do Rio Bonito, a antiga Conservatória dos Índios, com o intuito de conectá-la à Estrada da Polícia.445

Pela Estrada da Polícia, podiam ser transportados gêneros até os portos de Iguaçu, Estrela e Porto das Caixas ou, então, seguir por estradas até atingir o centro da cidade do Rio de Janeiro.446 O capitão Floriano Leite Ribeiro447 e seus companheiros, José Francisco da Silva Dutra e Francisco Martins Pimentel Júnior, com certeza sabiam destas vantagens quando começaram a realizar esta empreitada.448 O que não esperavam era que o caso fosse levado à justiça por embargo de obras pelo proprietário da fazenda prejudicado.

Segundo Stanley Stein, era um costume das autoridades municipais aumentarem a responsabilidade dos fazendeiros, exigindo que estes fizessem manutenção das estradas provinciais que, por ventura, passassem em suas terras.449 Isto aparecia até mesmo nos requerimentos da Câmara de Valença que aconselhava os fazendeiros a conservarem as estradas “da maneira que possam passar dois animais carregados a par um do outro sem obstruí-lo (...) principalmente que não haja ou admita desvio”.450 Como algumas delas se encontravam distantes de suas fazendas, eram os próprios fazendeiros que tinham que usar seus próprios recursos para construir e manter estradas vicinais até o ponto em que houvesse a junção destas com aquelas consideradas de interesse público.

Na sua ânsia de construir estradas rapidamente, sem contar com suficiente força de trabalho para obras públicas, as autoridades provinciais passaram para os empreiteiros a construção e manutenção de estradas. Esse sistema mobilizou dois interesses conflituosos, o desejo do empreiteiro de obter lucros maiores versus a boa manutenção das estradas. A luta era desigual, conforme registros provinciais

Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1851. Município de Valença. Disponível em: <www.crl.edu/brazil/almanak>. Acesso em: 19/01/19.

444 APERJ: Livro 88 (1854-1857). Município de Valença: Freguesia Nossa Senhora da Glória. Registro 139,

Folha 44v.

445 AMJERJ/CCPJ: Nome da parte 1: Manoel Pereira Souza Barros, Nome da parte 2: Capitão Floriano Leite

Ribeiro e outros. Ação: Cível – Embargo de Obras. Ano do Processo: 1851. Comarca: Valença. Caixa: 1807. RG: 017445/A. Códice: 18236.

446 SALLES, Ricardo. E o Vale era o escravo. Op. Cit., p. 140-141.

447 Floriano Leite Ribeiro foi listado enquanto fazendeiro na Freguesia de Santo Antonio do Rio Bonito no ano

de 1851. Ver: Ver: Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Laemmert, 1851. Município de Valença. Disponível em: <www.crl.edu/brazil/almanak>. Acesso em: 19/01/19.

448 Destes três indivíduos, nenhum apareceu como vizinho na declaração da fazenda de Manoel Pereira de Souza

Barros. Por outro lado, identificamos que Clara Maria Dutra, viúva de Francisco Martins Pimentel e mãe de Francisco Martins Pimentel Júnior, declarou sua fazenda de Santa Tereza que, por sua vez, litigava com a fazenda de Campo Alegre de Souza Barros. O irmão de Francisco Martins Pimentel Júnior, Joaquim Gomes Pimentel, declarou uma sorte de terras no interior da fazenda de sua mãe, apresentando-se como litigante de Souza Barros também. APERJ: Livro 88 (1854-1857). Município de Valença: Freguesia Nossa Senhora da Glória. Registros 179 e 192, Folhas 52v e 55.

449 STEIN, Stanley Julian. Vassouras: um município brasileiro do café, 1850-1900. Tradução de Vera Bloch

Wrobel. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990, p. 125-129.

informaram à Assembleia (…). Existia um pequeno policiamento nas estradas para impedir e corrigir o mau procedimento de tropeiros e carroceiros. Na verdade, a confiança da província na fé contratual sem garantias de supervisão durante a construção e manutenção forjou um círculo de irresponsabilidade. Desse lamaçal administrativo e financeiro, uma ferrovia parecia ser a saída imediata.451

Como podemos avaliar, as estradas eram locais de atração para aqueles indivíduos interessados tanto no escoamento da produção quanto na especulação de capital. Mas também eram locais bastante inseguros. Por elas circulavam tropeiros, carroceiros, comerciantes, escravos fugidos e indivíduos interessados em se apropriar do terreno alheio. Até mesmo a morte de animais era a causa de litígios entre vizinhos, como quando Carlos José dos Santos acusou Antônio Francisco do Carmo de ter matado, com duas facadas, seu burro na Estrada da Independência, quando o animal estava circulando nos matos próximos à região do vizinho.452

Na fazenda de Campo Alegre já havia uma antiga estrada, que passava pelo lugar denominado Chacarinha, no interior da propriedade de Manoel Pereira de Souza Barros. E, “compenetrada da desvantagem que se dá aos diversos proprietários de terras sempre que se lhes obriga a ter estradas públicas para o interior de suas Fazendas”453, foi peticionado à Assembleia Provincial um pedido para restabelecimento e restauração daquela antiga estrada. Entretanto,

os ditos habitantes, longe de se aproveitarem desta faculdade, abusaram completamente do que lhes foi concedido e acham-se mandando abrir uma nova estrada sem que dos proprietários das Fazendas para onde esta tem de passar [obtivessem] a indispensável faculdade.454

Para Manoel Pereira de Souza Barros, a restauração do velho caminho no lugar da Chacarinha deveria ser vista como uma medida que interessava a todos. Os habitantes de Santo Antônio do Rio Bonito deviam “aproveitar esta faculdade”, pois estavam sendo contemplados pelo restabelecimento de uma antiga estrada que passava por sua propriedade. Contudo, por trás da conquista do rumo restaurado, que seria de “interesse público” para os habitantes de Rio Bonito, havia interesses maiores por parte de Manoel Pereira de Souza Barros.

451 STEIN, Stanley Julian. Vassouras. Op. Cit., p. 132-133.

452 AMJERJ/CCPJ: Nome da parte 1: Antonio Francisco do Carmo, Nome da parte 2: Carlos José dos Santos.

Ação: Cível – Libelo. Ano do Processo: 1848. Comarca: Valença. Caixa: 1463. RG: 013859/A. Códice: 14650. Em seu inventário, identificamos que Carlos José dos Santos continuava possuindo 6 bois de carro e 2 cavalos de carga em 1863. Ver: AMJERJ/CCPJ: Nome da parte 1: Carlos José dos Santos, Nome da parte 2: Dona Henriqueta Mathildes de Todos os Santos. Ação: Cível – Inventário. Ano do Processo: 1863. Comarca: Valença. Caixa: 1646. RG: 015399/A.

453 AMJERJ/CCPJ: Processo cível de Embargo de Obras (Manoel Pereira de Souza Barros e Capitão Floriano

Leite Ribeiro), p. 3.

Ter uma fazenda com uma estrada própria era uma forma de privatizar os meios utilizados na hora do escoamento da produção na vizinhança. Não há dúvidas de que muitas pessoas que por ali passassem, teriam que pedir autorização de Souza Barros para transitar mercadorias e produtos. A hibridez da natureza dessa estrada – na interface entre o público e o privado – garantia a valorização de uma fazenda que, ao ter uma estrada própria em seu interior, nunca teria problemas no que tange ao transporte da produção comercial.455

Estrategicamente, outros indivíduos abriram por conta própria um caminho alternativo, no limite do terreno de Souza Barros que se conectava com a Estrada da Polícia, destruindo os matos virgens que aí existiam e tomando-os por atos possessórios. Neste caso, a destruição da mata servia para outra utilidade: os vizinhos não estavam somente interessados na reprodução das atividades agrícolas quando suas terras estivessem cansadas e improdutivas, mas sim na abertura de uma nova estrada que, além de assegurar o lucro pelo próprio ato de abertura e especulação, garantiria uma livre via de escoamento na vizinhança de Rio Bonito.

O caso aberto em 1851 não teve finalização na justiça. Passados 40 anos, identificamos naquela mesma estrada da Chacarinha, em Campo Alegre, um crime envolvendo roubo de dinheiro e outras sevícias, no qual dois homens agrediram Pacífico e Leocádio com um tiro disparado de espingarda e pauladas que foram dadas na intenção de roubarem algumas notas de mil réis. Os agredidos eram moradores daquela região localizada no interior da fazenda dos herdeiros de Manoel Pereira de Souza Barros. A agressão se deu por uma dívida que estes dois não pagaram a João de Lima e seu filho Manoel de Lima.456

455 Este foi também o caso de Joaquim José de Souza Breves – o famoso Barão do Café conhecido como

Comendador Breves – que construiu uma estrada até a região do Saco em Mangaratiba, onde tinha suas casas comerciais e armazéns. De outro modo, a estrada estava diretamente relacionada às práticas ilícitas de tráfico de africanos escravizados na Baía de Mangaratiba depois de 1831. Espertamente, o caminho criado por este Comendador entroncava-se nas suas fazendas de café. Ver: JUNIOR, Manoel Batista do Prado. Entre senhores,