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3. METODOLOGIA

3.2. Recolha de expressões

3.2.1. Tipologia

De entre um elevado número de expressões que obedecem ao critério acima mencionado, foram inicialmente seleccionadas trinta. Tendo em conta as suas características, podem ser agrupadas segundo três tipos linguísticos: nomes, verbos e construções predicativas.

No que diz respeito às construções predicativas, considera-se que se trata de construções analíticas, cujos verbos estão fortemente marcados do ponto de vista aspectual. As construções ‘estar de ressaca’ e ‘estar em maré de’ sugerem o aspecto de progressão, exprimindo um evento, isto é, uma situação dinâmica que Mateus et alii (1983) classifica como télica, porque tende para um fim; a estes eventos é atribuída uma duração indefinida, mais curta no primeiro caso e mais longa no segundo. Estas construções são habitualmente expressas através de estar a + infinitivo (ou estar + gerúndio). Já ‘estar quilhado’ parece enquadrar-se melhor no que, nesta gramática, surge denominado como estado, uma vez que não é uma situação dinâmica. Este é um estado não faseável, quer dizer, não é expresso por uma construção progressiva. Quanto à construção ‘ser marinheiro de água

doce’, parece corresponder ao aspecto de um estado habitual, no contexto em que se

apresenta.

As construções com verbo leve, por sua vez, também não correspondem à estrutura acima considerada perifrástica. No entanto, tal como nas anteriores, podemos encontrar factores aspectuais que as tipificam. Diria que todas elas se enquadram no mesmo grupo dos eventos, sendo que ‘ir por água abaixo’, ‘meter água’ e ‘pôr-se na alheta / na

retranca’ podem ser consideradas como eventos atélicos, quer dizer, processos. As outras

expressões, ao contrário, são eventos télicos, processos culminados, isto é, é-lhes atribuída uma duração razoavelmente longa, que tende para um fim. No que diz respeito a ‘remar

contra a maré’, trata-se também de um evento télico, processo culminado.

(em itálico, o significado que foi usado neste estudo) e a indicação da sua raiz.

Quadro 3 - Nomes:

Lexias simples Significado Origem

borrasca

Temporal de vento e chuva que sobrevém repentinamente, de

curta duração, e que levanta muito mar. (DLMAA) Acesso ou ímpeto de mau humor

ou de cólera, acompanhado de movimentos e palavras desordenadas. (GDLP)

Do italiano burrasca. Tormenta repentina e furiosa de vento e chuva; de ordinário dizemos que

sobrevém no mar. (GDLP)

escarcéu

Grande monte de água em mar revolto; encapeladura. Diz-se também do ruído feito pelo mar

quando rebenta sobre baixos, praias, rochedos, etc. (GDLP) Gritaria, algazarra. (GDLP)

Embora de etimologia obscura, em todos os dicionários consultados este termo surge, em

primeiro lugar, associado a um fenómeno marítimo.

aselha Desajeitado, desastrado. (DIM)

Do latim ansicula, “pequena asa”. (DELP) Nome de um nó náutico. (DIM)

Lexia complexa

cabo das tormentas Difícil, penoso. (HDP)

Por extensão de Cabo das Tormentas, ponto geográfico, de

forte significado histórico e cultural em Portugal. Tormenta: forte temporal, com ventos muito violentos e grandes

Quadro 4 - Verbos:

Verbos lexicalizados Significado Origem

abordar

Abalroar um navio para o tomar de assalto. Atracar. Assaltar o

navio. (DIM, DLMAA) Iniciar conversa sobre determinado assunto. (GDLP)

De borda, ou, talvez antes, do francês aborder (de “bordo”).

(DELP)

arrancar

Obrigar a âncora a desprender-se do fundo em que estava unhada. Avançar com ímpeto. (DLMAA)

Obter, conseguir.

Embora de origem obscura, o vocábulo está bastante espalhado

pela România; o Dizionario di Marina cita até um sentido documentável em português:

“vogare di forza”. (DELP)

embarcar Entrar em um navio ou embarcação. (DLMAA) Acreditar. (DLMAA) De barco. (DELP) emproado (particípio de emproar, em posição atributiva)

Com a proa a um determinado rumo. (DLMAA). Empertigado, arrogante. (DLMAA) De proa. (DELP) enfunar Encher de vento. Comer em grande quantidade.

Do latim infunare, de fune, “corda”. Enfunar seria propriamente retesar a vela com cordas para que o vento a encha.

(DELP)

sondar

Achar a altura da água do fundo à superfície. (DIM) Perscrutar, explorar, observar.

(GDLP)

Do francês sonde, que, por sua vez, parece provir do anglo- saxão sundgyrd, composto de

sund, “canal de mar” + gyrd, “vara”. (DELP)

Verbo não lexicalizado

singrar

Navegar à vela. (DLMAA) Progredir. (HDP)

Tal como o castelhano singlar, provém do francês cingler, antigamente sigler ou singler, que, por sua vez, tem origem no

antigo escandinavo sigla, “navegar”, derivado de segl,

“vela”. (DELP)

Quadro 5 - Construções predicativas (com verbo leve, auxiliar e pleno):

Construções com verbo

leve Significado Origem

andar (i) à deriva (ii) à toa

(i) Galicismo que, escusadamente, muitos empregam para significar “ir sem governo”, “ir ao sabor do

tempo”, etc. (DLMAA) (ii) A reboque; arrastado; sem

saber para onde. (HDP)

(i) Derivar: Do latim derivare, “desviar um curso de água” Deriva: Do francês derive.

(DELP)

(ii) Derivado regressivo de toar. Toar: Do francês antigo toer, que, por sua vez, provém

do antigo escandinavo toga, “tirar de algo”. (DELP)

dar água pela barba

Impedir o navio de andar tanto quanto seria natural. (DLMAA)

Atrapalhar; dar trabalho, problemas.

Barba: proa . (DLMAA)

fazer ondas Arranjar conflitos ou

complicações.. (DLMAA)

Do latim unda, “água agitada, onda, vaga.”. (DELP)

ficar com a borda debaixo de água

Ser alvo de infortúnio. (HDP) Andar a correr mal a vida.

(DLMAA)

Do frâncico bord, “amurada de barco”, talvez pelo francês bord.

(DELP)

ir (i) de vento em popa (ii) por água abaixo

(i) Estar qualquer pretensão ou negócio a correr

bem. (DLMAA) (ii) Perder-se o fruto de um

trabalho.

(i) Popa: Parte posterior do navio. Do latim puppe, com o

mesmo sentido. (DELP) (ii) Ao sabor da corrente, levado pela corrente. (DLMAA,

meter (i) água (ii) [não] prego nem estopa

(i) Pretender justificar-se com razões de pouco ou nenhum valor. (DLMAA)

Enganar-se, fazer asneira. (ii) Não ter nada a ver com determinado assunto.

(i) Abastecer o navio de água potável. (DLMAA) (ii) Não meter prego sem

estopa: ser cauto. (HDP)

pôr-se (i) na alheta (ii) na retranca

(i) Fugir. (DIM) (ii) Acautelar-se, pôr-se de

sobreaviso. (DLMAA)

(i) Origem obscura. A parte curva do costado, na popa,

a um e outro bordo. (DIM, DELP)

(ii) Verga disposta no sentido de popa à proa.

(DLMAA) Construções com verbo

auxiliar

estar (i)de ressaca (ii) em maré de (iii) quilhado

(i) O movimento de recuo de uma vaga, depois de se

espraiar ou de encontrar obstáculo que lhe impeça avançar livremente. (DLMAA)

A recompor-se; em convalescença. (ii) Oportunidade, ocasião

favorável. (DLMAA) (iii) Quilhar, assentar a

quilha. (DIM, DLMAA) Pôr alguém em situação desagradável; tramar.

(i) Encontro da vaga que recua com outra que avança para a praia, e que é chamada “saca”.

(DLMAA) (ii) Do francês marée, maré: movimento periódico das

águas do mar. (DIM, DELP) (iii) Do francês quille, de

origem germânica. (DELP)

ser marinheiro de água doce

Aquele que pouco tem navegado, inábil e inexperiente.

(DIM, DLMAA)

Do latim marinariu-, de marinu- “marinho, do mar”. (DELP) Construção com verbo

pleno

remar contra a maré Esforçar-se em vão por alcançar

o que pretende. (DLMAA)

Remar(1) com a proa da embarcação em sentido contrário

ao da corrente. (1) De remo. Do latim remu, com o mesmo sentido. (DLMAA, DELP)

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