Tipos de Estruturas de Governança

Para Coase (1937) os custos de transação se restringiam aos custos de se utilizar o mercado como meio de transacionar bens. No entanto, atualmente, custos de transação definem-se num plano mais abrangente, na qual o mercado é apenas um dos casos particulares. Isto porque o grau de coordenação entre agentes econômicos localizados em diferentes estágios de uma cadeia produtiva pode ocorrer em diversos níveis de intensidades, que vão desde as transações em mercado livre, passando por contratos de suprimentos regulares, contratos de longo prazo com cláusulas de monitoramento, entre outros, até chegar à integração vertical de uma firma a outra. Dentre esta infinidade de possibilidades, Williamson (1985) aponta três tipos representativos:

i) a estrutura de mercado, que corresponde a um contrato clássico onde a transação se resolve em um ponto do tempo, não havendo compromisso de repetição no futuro. Neste caso, compradores e vendedores não estão envolvidos em uma relação de dependência, sendo o preço, estabelecido pela competição de mercado, a principal variável determinante das relações;

ii) as estruturas híbridas, em que as partes da transação são autônomas, havendo, porém, certo grau de dependência bilateral entre elas, baseada em contratos/acordos com diversos tipos de intensidade nas quais ambas interagem simultaneamente – este tipo é o mais comum no caso da comercialização de frutas, como detalhado no Capítulo 3; e iii) a estrutura hierárquica (ou de integração vertical), que corresponde à incorporação da transação para dentro dos domínios da firma, o que permite lidar com situações complexas que dificilmente poderiam ser especificadas nos contratos, limitando a possibilidade de problemas que possam vir a surgir com comportamentos oportunistas.

Dada estas três estruturas, à medida que se caminha de um extremo ao outro, ou seja, do mercado à integração, observa-se que os agentes buscam mais controle administrativo e burocrático nos contratos. Neste contexto, usando Peterson e Wysocki (1997 e 1998) e Webster (1992), é possível se propor uma classificação ainda mais detalhada das principais formas como podem ocorrer as negociações entre os agentes, cujas características principais são representadas na Figura 4, de acordo com as definições que se seguem:

i) negociação em mercado livre – a coordenação entre dois atores econômicos em diferentes estágios da cadeia produtiva baseia-se exclusivamente (ou quase que exclusivamente) em mecanismos de controle exógenos à relação entre esses atores. Ou seja, no mercado livre os atores não influenciam preços ou padrões genéricos, mas atuam de acordo com o que foi estabelecido pelo mercado. No mercado livre, os atores são livres para entrar e sair do mercado de acordo com as suas conveniências, não influenciando o andamento das transações.

ii) negociações em mercado repetidas – a coordenação entre os agentes é caracterizada por transações de compras frequentes do mesmo produto e ao mesmo fornecedor rotineiramente, o que torna mais conveniente e fácil, pois se economiza tempo e esforço por evitar o processamento de informações de várias outras possíveis alternativas. iii) negociação através de contratos – é o estabelecimento de relações de mercado entre agentes econômicos através de contratos. Esses contratos estabelecem as bases legais para a relação de troca estabelecida previamente – definindo-se preços, prazos, punições a um eventual não comprimento, etc.. Assim, com os contratos, os mecanismos da coordenação passam a ser, em parte, endógenos à relação entre os atores econômicos. Deve-se observar, no entanto, que o estabelecimento dos termos dos contratos é largamente governado pelas forças de mercado. Portanto, a negociação por contratos ainda é fortemente caracterizada pela influência de fatores exógenos ao processo de coordenação entre os atores.

iv) negociações através de alianças estratégicas – esse tipo de coordenação vertical é caracterizado por uma troca em que os objetivos mútuos são identificados e os riscos e benefícios oriundos do relacionamento entre as partes são compartilhados. Peterson e Wysocky destacam que para uma relação de troca ser considerada uma aliança estratégica, é necessário: a) identificação de objetivos mútuos; b) controle mútuo no processo de decisão; e c) compartilhamento de risco e benefícios. Assim, na aliança

estratégica, os parceiros concordam em trabalhar juntos e próximos, e encontrar meios de resolver preocupações e diferenças internas.

v) negociação através de cooperação formal – o que diferencia essa forma de organização das alianças estratégicas, de acordo com Peterson e Wysocky, é a presença de uma organização formal que tem uma identidade distinta dos agentes. Esses agentes realizam o processo de troca, a qual é destinada a ser um agente conjunto no processo de troca. Nesse caso, políticas e procedimento são estabelecidos para governar a troca entre as partes. As cooperativas agrícolas e as joint ventures cabem como exemplos dessa forma de coordenação.

vi) integração vertical – nesse caso, o produto não é vendido no mercado, mas transferido entre unidades dentro das fronteiras de uma firma individual. Ou seja, a integração vertical ocorre quando uma firma individual passa a realizar processos produtivos, anteriormente realizados por outras firmas em estágios diferentes da cadeia produtiva. Peterson e Wysocki, no entanto, alertam para o fato de firmas de mesma propriedade, mas que interagem como unidades autônomas em estágios diferentes da cadeia produtiva, não constituem um caso de integração vertical.

Formas de Negociação Características típicas da negociação em mercado livre Mercado Livre (Controle externo via preço de padrões) Mercado com Repetições (Controle externo via reputação) Relações de Contratos (Controle externo via especificações e apelo legal) Alianças Estratégicas (Controle Mútuo) Cooperação Formal (Controle interno via estrutura de decisão descentralizada) Integração vertical (Controle interno via estrutura de decisão centralizada) Características típicas da integração vertical Interesse

próprio Interesse mútuo

Relações de

curto prazo Relações de longoprazo

Oportunismo Compartilhamento_{de benefício}

Informação

limitada Compartilhamentode informação

Confiança é

importante Independe deconfiança

Flexibilidade e

independência Estabilidade eindependência

Figura 4. Características gerais das formas de negociação*

Fonte: adaptado pelo autor com base Peterson e Wysocki (1997 e 1998) e Webster (1992).

*A linha diagonal representa o mix de características entre a coordenação em mercado livre e a vertical encontradas em cada uma das seis formas de negociação. A área acima da linha representa características mais próximas ao tipo de negociação em mercado livre; enquanto a área abaixo da linha representa características mais próximas à integração vertical.

Vale destacar que as formas de negociação (ii), (iii), (iv) e (v) podem ser consideradas inerentes às estruturas híbridas de coordenação, já que estão situadas no continuum existente entre os dois extremos, ou seja, entre a estrutura de mercado e a integração vertical. Ademais, conforme destacado por Laprano (2005), estas três diferentes formas de negociação em estrutura híbrida podem se distinguir de acordo com o tipo de contato, dentre os quais se destacam:

i) contratos com cláusulas condicionais: são contratos que especificam no presente uma ação futura, porém condicionada a acontecimentos pré-definidos que possam vir a ocorrer. Estes tipos de contratos enfrentam dificuldades no que diz respeito à sua redação, à medida que a complexidade aumenta, em virtude da racionalidade limitada dos agentes, o que impossibilita antecipar ações futuras e suas respectivas providências. Outro ponto crítico que este tipo de contrato enfrenta é garantir seu cumprimento, ou seja, exige-se certo grau de precisão numa avaliação prévia do contrato.

ii) contratos de curto prazo sequenciais: são contratos de curta duração, realizados somente no momento em que as condições necessárias para a realização da transação efetivamente se concretizem. Estes contratos ocorrem quando o comprador e o vendedor não possuem um vínculo duradouro, as ofertas são feitas a cada instante em mercados à vista, cada comprador adquirindo o que deseja somente no momento em que ocorre a necessidade. Deste modo, este tipo de contrato reduz problemas de adaptação entre as partes.

iii) contratos com relação de autoridade: são contratos estabelecidos no presente com o direito de selecionar no futuro um desempenho específico dentro do conjunto de performances estipulados previamente. Nestes tipos de contratos, a relação de autoridade ocorre quando um agente faculta ao outro o que deverá ser executado. Essa relação possibilita a vantagem de não ser necessário antecipar todas as ações futuras, não trazendo problemas diante da racionalidade limitada dos agentes. Outro benefício deste tipo contrato diz respeito à não-necessidade de contratação sucessiva, reduzindo os custos de transação, representando uma vantagem comparativa diante dos outros contratos.

Deve-se ainda ressaltar que, afora dessa classificação proposta por Laprano (2005), existem os casos dos contratos informais, em que o acerto ocorre de forma tácita entre as partes, que preferem não formalizar o acordo. Assim, o que garante o cumprimento do acordo é o interesse das partes em estabelecer uma relação de transações econômicas estáveis no longo prazo.

Em suma, como pôde ser observado ao longo de toda esta seção, cada um dos diferentes tipos de alinhamentos estratégico e contratual busca desenhar um continuum de soluções eficientes de coordenação das transações entre os agentes. Deste modo, dado os diferentes tipos de estruturas contratuais descritos, a estratégia dos produtores agrícolas individuais neste trabalho será discutida a partir de suas escolhas referentes ao nível de coordenação que esses têm com o elo à jusante. Neste sentido, no próximo item serão discutidos os principais motivos e determinantes para que os agentes escolham determinado tipo de estrutura de governança ou o grau de coordenação vertical.