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6. RESULTADOS 1 Etiologia

7.1 TNF, sTNFr1 e sTNFR

O TNFα é uma citocina polipeptídica, pleiotrópica, produzida pela

estimulação de monócitos, macrófagos e alguns linfócitos T, que age na modulação

da resposta imune, tanto em situações normais quanto patológicas52. Sua regulação

é aumentada nas crises de modelos animais, mas também em outras situações

clivada pela enzima conversora alfa de TNFα (TACE) libera sua forma solúvel, o sTNFα (que é a forma avaliada nesse estudo, aqui sendo denominada como TNF). As duas formas podem se ligar aos seus dois receptores de membrana: o TNFr1,

também chamado de p55 devido à sua massa molecular, e o TNFr2, ou p7552; 53. O

TNFr1 é mais expresso por células com maior susceptibilidade a ação citotóxica e por isso está mais relacionado com a morte celular. Já o TNFr2 é preferencialmente expresso por células de origem mielóide, principalmente células B e, assim, tem uma

ação mais protetora52. Apesar disso, a maioria dos tipos celulares expressa ambos

receptores52. Tais receptores também se apresentam na forma solúvel: sTNFr1 e

sTNFr2, que são as formas avaliadas nessa tese52-54. Para melhor compreensão, a

figura 15 exemplifica esses marcadores.

Figura 15: Esquema demonstrando a interação entre o TNF, seus receptores e suas formas solúveis- Adaptado de Tracey D et al,54.

O papel das formas solúveis do TNFα e seus receptores não é bem

estabelecido, uma vez que estes não atuam diretamente na membrana celular.

rapidamente eliminado da circulação, e por isso os receptores circulantes seriam

melhores marcadores da atividade do TNFα do que a concentração sérica deste54; 55

. Apesar de não traduzirem os sinais por não estarem na membrana, acredita-se que os receptores solúveis sejam capazes de modular a atividade do TNF, podendo ter três ações distintas:

- Agindo como antagonistas ou inibidores, uma vez que podem competir com os receptores de membrana na ligação com o TNFα;

-Como proteínas de ligação apenas transportando o TNFα para longe de

seu local de ação;

- Ter papel de estabilizar a estrutura trimérica do TNFα reduzindo o

clearance que ocorre após sua clivagem em estrutura monomérica52; 54; 55.

O TNFα e seus receptores já foram relacionados com epilepsia. Em

estudos com modelos animais demonstrou-se que crises geradas por indução

elétrica aumentam o TNFα em hipocampos de ratos56. Além disso a injeção de TNFα

em amígdala de ratos pode induzir a atividade epileptiforme56 e prolongar crises

convulsivas57. Curiosamente, as crises também podem ser prolongadas em ratos

que sofreram mutações e não apresentam qualquer receptor de TNFα57, o que

indica que algum dos receptores tem ação no controle de crises, sendo mais provavelmente o sTNFr2, uma vez que um estudo observou que o aumento

excessivo de TNFα pode inibir crises quando a ação deste é mediada pelo sTNFr2 53

e que durante as crises há aumento de sTNFr1 no hipocampos e redução do

sTNFr258. Tal padrão pode ser compatível com os comportamentos opostos que

notamos nos níveis séricos desses receptores no nosso estudo - TNFα e sTNFr1 são reduzidos nos pacientes (ELT e outras epilepsias) em relação aos controles, enquanto que o sTNFr2 é aumentado nos pacientes. No entanto, estudos que

avaliaram o nível sérico de TNFα em humanos apresentam resultados conflitantes.

Um estudo com 48 pacientes com epilepsia e 30 controles, não observou diferença nos níveis séricos de TNF59.

Talvez a maior concentração de sTNFr1 e TNFα no hipocampo durante as crises, reduza a circulação sérica desses e aumente a do sTNFr2, fazendo os pacientes apresentarem o padrão descrito. Corroborando com essa hipótese, um

estudo avaliando o tecido de humanos, comparando o hipocampo ressecado de pacientes com ELT e controles (autópsia), mostrou queo TNFα está aumentado nos pacientes60.

Em relação à etiologia, em um estudo com 75 pacientes com epilepsia focal, 26 com epilepsias generalizadas e 36 controles, o TNFα não foi diferente entre pacientes, controles ou diferentes etiologias de epilepsia61. Pacientes com ELT, com ou sem AH, também não apresentaram diferenças em relação aos níveis

séricos de TNF62. Nosso estudo observou o sTNFr2 também é aumentado e o TNFα

diminuído nos pacientes com epilepsia secundária a malformações do desenvolvimento cortical, naqueles com patologia dupla e ainda nos pacientes com epilepsias genéticas generalizadas, sendo que o sTNFr1 foi diferente entre os grupos nessas mesmas comparações. Também não observamos diferenças entre os pacientes com e sem evidências de AH.

Uma outra tese realizada do nosso grupo, avaliou alguns dos mesmos pacientes que a tese atual, porém em um outro momento e com outro método (imunoensaio multiplex -Luminex Xmap). Naquela avaliação foram incluídos 70 pacientes com ELT e 32 controles. Em uma das análises avaliou-se os níveis séricos de TNFα nos pacientes fármaco-resistentes (1,30 pcg/mL), fármaco-responsivos (1,2 pcg/mL) e controles (1,38 pcg/mL)63. Apesar de não ter sido evidenciada diferença estatística entre os grupos, podemos notar que os controles também apresentavam níveis séricos maiores que os pacientes, assim como no estudo atual.

O TNF, junto com seu receptor sTNFr1 estavam diminuídos nos nossos pacientes com maior quantidade de AEI ao EEG em relação àqueles com pouca AEI. O sTNFr2 não apresentou diferença. O sTNFr1 também estava reduzido nos pacientes que apresentaram crises no dia ou no dia anterior à coleta em relação aos pacientes que estavam há mais de 5 dias sem crises. Na literatura alguns estudos avaliaram especificamente a ação de citocinas no período pós ictal. Sinha et al, avaliou o nível sérico do TNFα em 16 pacientes logo após as crises e depois no período interictal e notou que o TNFα era mais elevado no período pós ictal31. Porém, Peltola et al e Gao et al não notaram tal comportamento, sendo que esse

último avaliou plasma e LCR59; 64. Nenhum desses avaliou os receptores solúveis do

inflamação do SNC, como em pacientes em relação aos controles, EEG com maior quantidade de AEI e crises recentes, a tendência é o sTNFr1 e o TNFα séricos estarem reduzidos e o sTNFr2 elevado.

O último achado em relação a esse grupo de citocinas se dá no fato do sTNFr2 ter concentrações séricas mais elevadas em pacientes com ELT e antecedente de crises febris. Sabe-se que a crise febril é a causa mais comum de

crises na infância e são muito frequentes em pacientes com ELT43, sendo inclusive

ponto de discussão se as crises podem gerar EH ou se os pacientes com EH apresentam maior incidências de crises durante os quadros febris. Em relação à expressão do TNFα nas crises febris, um estudo avaliou polimorfismos dos genes do TNF-308 e -238 em 137 pacientes de seis meses a seis anos com crises febris e 78 controles sadios e observou que tais polimorfismos eram mais encontrados em

pacientes65. Apesar de não haver estudos com os receptores, uma vez que

assumimos que eles expressam indiretamente a atividade do TNFα, este pode estar relacionado com o insulto inicial desses pacientes. Sabidamente, o TNFr2 atua não apenas com a ligação do TNFα, mas também é receptor de diversas outras citocinas e neurotrofinas, que discutiremos mais a frente, e dependendo da célula em que está sendo expresso, do ligante e do contexto celular, esta molécula pode ter

diversas ações, inclusive induzindo a apoptose66, o que poderia ocorrer nas crianças

com crises febris e EH secundária.

Na avaliação das imagens, o TNFα teve correlação inversa com a

espessura cortical do lobo frontal contralateral à EH e com o tálamo ipsilateral. Estudos de imagem já demonstraram que paciente com ELT apresentam redução volumétrica dessas regiões. Assim, possivelmente a concentração do TNFα está relacionada com uma alteração estrutural neuronal nesses pacientes.

Na análise ROC, a sTNFr2 foi o fator inflamatório com maior especificidade e sensibilidade para separar os pacientes com epilepsia dos controles, o que nos leva a crer que a sua concentração sérica realmente é capaz de refletir a atividade inflamatória do TNFα.

Assim podemos concluir que claramente o TNFα e seus receptores têm relação direta com a epilepsia. Podemos inferir que o TNFα e o TNFr1 são moléculas mais relacionadas com atividade inflamatória cerebral, uma vez que são

mais expressas no hipocampo em estudos experimentais; porém suas formas solúveis provavelmente apresentam menor circulação sérica nas situações com maior inflamação, como nos pacientes em relação aos controles, EEG com maior AIE e crises recentes. Já o sTNFr2 parece ter uma ação contrária, com sua forma solúvel mais facilmente detectada e sendo um melhor marcador de epilepsia. Além disso o TNFr2 e sua forma solúvel podem estar relacionados com a epileptogênese nos casos de pacientes com antecedente de crises febris. Os achados de imagem, em que se infere que maior o TNFα sérico, maior a perda neuronal, pode ser o resultado da dissociação entre a avaliação da lesão estrutural estabelecida e a inflamação atual.

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