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Capítulo 3 Torrefacção de peletes: efeito na composição aproximada

3.1.1 Torrefacção: Pré-tratamento da biomassa para fins energéticos

A biomassa pode apresentar diferenças consideráveis nas suas características físicas, químicas e morfológicas. Esta matéria-prima possui uma densidade energética relativamente baixa quando comparada a um combustível fóssil, e por conseguinte para fornecer a mesma energia é inevitável a utilização de uma maior quantidade de biomassa. O teor de humidade da biomassa é relativamente elevado o que favorece a sua biodegradabilidade. Outra limitação à competitividade da biomassa como combustível é a sua localização descentralizada, que aumenta os custos associados à sua utilização (Chew, et al., 2011). A conversão da biomassa em biocombustíveis sólidos com maior densidade, menor teor de humidade e maior poder calorífico do que as matérias-primas originais é uma estratégia que tem sido desenvolvida para obviar a alguns dos problemas indicados acima.

A torrefacção é um pré-tratamento térmico utilizado para o melhoramento de material linho- celulósico, conferindo-lhe melhor qualidade e tornando-o um biocombustível mais atractivo. Do ponto de vista químico, o objectivo da torrefacção é a remoção do oxigénio obtendo um produto final sólido, a biomassa torrefeita, que terá uma razão O/C inferior à biomassa original (Van der Stelt et al., 2011). Durante o processo de torrefacção, a biomassa perde água e uma parte do seu teor de voláteis, tornando-se seca, facilmente destroçável e mais escura. No entanto esta fragilidade não é tão elevada quando comparada à biomassa carbonizada (Felfi et al., 2005). A principal distinção entre os conceitos de carbonização e torrefacção encontra-se na gama de temperaturas utilizada em cada um dos tratamentos sendo que a torrefacção se situa numa gama entre 200 e 300 °C e a carbonização situa-se em temperaturas superiores (Park et al., 2012) A biomassa torrefeita é mais hidrofóbica, tem um poder calorífico mais elevado, e sofre uma redução de volume de 30 %, mantendo cerca de 90% do seu conteúdo energético comparativamente à biomassa original (Shang et al., 2012; Uslu et al., 2008).

O aumento da hidrofobicidade após a torrefacção é justificado pela eliminação de grupos hidroxilo (-OH), graças à exposição das amostras a temperaturas elevadas. Com a perda deste grupo funcional perde-se a capacidade de estabelecer ligações por ponte de hidrogénio (Bergman et al., 2005). Além disso, durante este processo termoquímico ocorre formação de estruturas insaturadas não-polares, propriedade que pode também contribuir para a diminuição da biodegradabilidade em amostras sujeitas a torrefacção (Patel et al., 2011).

Por norma, a torrefacção é realizada como pré-tratamento directamente na matéria-prima e posteriormente a matéria-prima é submetida a um processo de densificação, como por exemplo, a sua transformação em peletes. A densidade energética dos peletes de biomassa torrefeita atinge 18 GJ/m3. Embora esta densidade energética seja menor que a do carvão (20,4 GJ/m3), é 20 % mais

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oferece vantagens significativas quando é considerada a logística da biomassa, como por exemplo uma diminuição da pressão necessária para a densificação e do consumo de energia do processo (Uslu et al., 2008).

Diversos autores avaliaram o desempenho da biomassa quando sujeita a torrefacção, com diferentes variações nos parâmetros da operação. De entre os estudos realizados destacam-se o estudo dos mecanismos de reacção, a avaliação química e física da biomassa torrefeita no processo de combustão e gasificação, o estudo de balanços energéticos e de massa e a análise de custos do processo de torrefacção.

Bourgois e colaboradores examinaram o efeito da torrefacção a 260 °C em atmosfera inerte nas propriedades de biomassa de pinheiro.

Os tempos de residência utilizados variaram entre 25 min e 4 h e os gases formados no processo foram analisados por cromatografia gasosa tendo-se determinado que os principais compostos não- condensáveis foram CO, CO2, O2, e N2. Os autores monitorizaram a perda da massa do produto

sólido durante a torrefacção e efectuaram a sua análise aproximada e elementar. Verificou-se que o processo de torrefacção provocou, uma diminuição dos teores de hidrogénio e oxigénio presentes na biomassa e um aumento do teor de carbono e de lenhina de forma proporcional ao tempo de residência. Em geral, o processo de torrefacção produziu um aumento no poder calorífico superior da biomassa de cerca de 44% e melhorou as características de hidrofobicidade da biomassa (Bourgois

et al., 1998).

Pentananunt e colaboradores avaliaram as características de biomassa torrefeita através de análise aproximada e elementar. Nos testes de torrefacção realizados a temperaturas entre 250 °C e 270 °C e tempos de residência entre 2 h e 3 h, observaram uma redução do teor de hidrogénio e oxigénio e um aumento do teor de carbono com o aumento do tempo e temperatura de torrefacção. Foram também realizados testes de combustão com a biomassa submetida a torrefacção e esta apresentou um melhor desempenho comparativamente à biomassa sem torrefacção, produzindo fumo menos denso, menos fuligem e apresentando uma maior velocidade de combustão (Pentananunt et al., 1990).

O processo de torrefacção foi avaliado por termogravimetria (TGA) utilizando quatro tipos de biomassa, com diferentes proporções de celulose, hemiceluloses e lenhina. Constatou-se que as hemiceluloses são quase completamente decompostas, mas a celulose e a lenhina são apenas parcialmente decompostas (Chen et al., 2010). Os mesmos autores também estudaram a cinética de decomposição da celulose, hemiceluloses e lenhina para diferentes temperaturas num processo de torrefacção isotérmico e propuseram um modelo de decomposição da biomassa através da combinação das equações que descrevem a cinética de decomposição de cada componente. (Chen

et al., 2011).

Mas nem sempre a torrefacção favorece as qualidades da biomassa para produção de biocombustíveis sólidos. Li e colaboradores estudaram a peletização de serradura submetida a torrefacção num reactor de leito fluidizado e concluíram que o consumo energético do processo de peletização foi superior para a biomassa torrefeita do que para a biomassa não tratada porque a

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biomassa. A densidade dos peletes produzidos foi inferior à dos peletes de controlo devido à perda de água quimicamente ligada e à perda dos compostos ligantes de baixo ponto de fusão. Este estudo comprovou que as propriedades dos peletes são afectadas pelo processo de torrefacção de uma forma significativa em termos de propriedades mecânicas mas nem sempre de forma favorável (Li et

al., 2012)

A torrefacção e densificação de diferentes espécies de coníferas foram estudadas por Peng e colaboradores que constataram que o poder calorífico se encontra directamente relacionado com a perda de massa que ocorre durante a torrefacção e que por sua vez aumentou com a severidade da torrefacção, isto é, das condições de temperatura e tempo. Este trabalho também demonstrou que a compressão da matéria-prima torrefeita é mais difícil de realizar e portanto consome mais energia que a peletização com matéria-prima sem pré-tratamento. As condições óptimas de torrefacção neste estudo levaram a uma perda de massa de 30% e a um aumento de 20% no poder calorífico superior dos peletes produzidos (Peng et al., 2013).

A torrefacção pode ter um impacto negativo nas propriedades mecânicas dos peletes, levando a problemas durante o transporte e o manuseamento. A afirmação anterior é verdadeira para um processo em que se realiza a torrefacção da biomassa e posteriormente se produzem peletes com essa matéria-prima, no entanto, ainda não existe literatura suficiente a respeito da utilização do processo de torrefacção após o processo de peletização (Shang, et al., 2012). Assim sendo, esta abordagem deve ser mais estudada para que se avalie o seu potencial no aumento da densidade energética dos peletes, (Felfi et al., 2005), sem os efeitos negativos no consumo energético da linha de produção ou nas propriedades mecânicas dos peletes.