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O toxicômano na perspectiva das identificaçõesO toxicômano na perspectiva das identificaçõesO toxicômano na perspectiva das identificações

No documento Toxicomanias: uma abordagem psicanalítica (páginas 65-71)

O toxicômano na perspectiva das identificaçõesO toxicômano na perspectiva das identificações

O toxicômano na perspectiva das identificaçõesO toxicômano na perspectiva das identificações

A identificação é a mais remota forma de laço com o Outro e, desde as formulações de Freud, ela recai sobre o pai, como neces- sidade lógica para a constituição do sujeito e para a inauguração do campo da significação. A identificação se correlaciona, tam- bém, com o buraco real na estrutura, modo da falta próprio da privação. O toro topológico fornece o suporte para o buraco da privação, a partir do que a questão da identificação recai sobre o traço unário, identificação formadora de sintomas. A dimensão social do sintoma pode se apresentar na forma da identificação histérica, como uma das formas de distribuição dos gozos, assim como por identificação ao Supereu.

Em Freud, o Supereu aparece como herdeiro do Édipo. Em Lacan, o Supereu é anterior à passagem pela lei. Em Freud, o Supereu implica a lei, porque ele não diferencia claramente o Ideal do Eu do Supereu: são diferentes aspectos de uma mesma instância psíquica. Lacan faz a diferença mais formalizada entre Ideal do Eu e Supereu. O Supereu, para ele, é obsceno e feroz: manda. O Ideal do Eu é a possibilidade de se identificar, não a uma imagem terrível, mas, ao significante do Nome-do-Pai. Para Freud, a função paterna é normalizadora (do ponto de vista da inscrição do sujeito na estrutura do Édipo), mas o Supereu é instância de exigência absoluta, enquanto que é, predominante- mente, da ordem do Imaginário e do Real.

Na perspectiva lacaniana do supereu, a identificação ao modo de distribuição dos gozos se alia à pulsão. O supereu é parceiro da pulsão, porquanto implica a civilização enquanto modo co- mum de gozo, uma “distribuição sistematizada de meios e de maneiras de gozo” (MILLER, 1998, p. 10); a mistura de gozos, corolário de um “relativismo cultural” (LAURENT, 2000, p. 18). A

toxicomania inaugura uma produção subjetiva ligada a um laço com o Outro que vai além do pai, visto que a procura, agora, está do lado do objeto, na forma do imperativo superegóico de gozo. A procura da consistência do lado do objeto tem como corolário a prevalência do objeto e não dos ideais. O efeito disso é a pluralização dos sentidos, visto que o mais-de-gozar aponta para o excesso.

A identificação, conforme já assinalamos, se faz ao modo de laço de amor societário, como mais-de-gozar, formando socieda- des de gozo. Esse aspecto não deixa de instituir, por outro lado, um jeito do toxicômano identificar-se com um x, que corresponde ao seu próprio lugar nessa comunidade.

Notas

NotasNotas

NotasNotas

4 Trecho de uma entrevista da autora à Estação de Rádio France-

Culture.

5 Editado em português sob o título de Mais, ainda. Ver LACAN, 1982.

6 Seminário, Livro 21: os não-tolos erram (1873-1974). Inédito.

Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

7 LACAN, J. Em Seminário, Livro 16: de um outro ao Outro. Aula de 27

de novembro de 1968. Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

8 No Seminário, Livro 9: a identificação. Aula de 21 de março de 1962.

Inédito. Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

9 Cf. De una cuestión preliminar a todo tratamiento posible de la

psicosis. 1955/1956, p. 242. Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

10 Id., ibid., p. 243, grifo do autor.

11 Alingua – Esta apresentação aglutinada da expressão “a língua” serve

para marcar a diferença entre o campo da linguistica, esta que tem como objeto “a língua”, a qual assegura a comunicação e os pactos sociais e a psicanálise, quando propõe que existe “alingua” no inconsciente e que o saber é “alingua em função” (Jacques Lacan,

Seminário 17, O avesso da psicanálise, 1959-60), se expressando nos lapsos, nas homofonias e outros eventos extraídos da fala de um sujeito. As dimensões da fala e da linguagem ficam aí realçadas em suas estruturas e leis, como por exemplo, a possibilidade de pensarmos a separação do significante do significado, conduzindo-nos a pensar cada significado em função do significante que o produz, além do reflorescimento da produção de sentidos.

12 LACAN, Jacques. Seminário, Livro 18: d’un discours qui ne serait pas

du semblant (1970-1971). Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

13 Id., Ibid.

14 Ver LACAN, Jacques. Seminário, Livro 11: os quatro conceitos

fundamentais da psicanálise (1964). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1979. Capítulos XVI e XVII.

15 Ver LACAN. Seminário, Livro 14: a lógica do fantasma. Aula de 21 de

dezembro de 1966. Consultado na versão espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

16 Ver Lacan, ibid.

17 Id., ibid. Aula de 18 de janeiro de 1967. 18 Id., ibid.

19 ________. Os Nomes do Pai. Seminário inédito. Consultado na versão

espanhola (de circulação no meio psicanalítico) da Escola Freudiana de Buenos Aires.

Não tem como explicar, é uma coisa que passa pela gente como se o corpo naquele momento desaparecesse, como se a gente transcendesse do corpo. Tudo acontece muito ligeiro e quando passa o efeito é como se começasse de novo a vontade, a procura da droga, a urgência de usar, a impossibilidade de esperar muito. Nisso a gente passa horas, dias, até o organismo pedir para parar; aí a gente pode ficar pela rua ou, se conseguir, voltar para casa.

(Usuário de crack atendido no CETAD)

Do gozo

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