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CAMINHOS DA DIREÇÃO TEATRAL

1.2. Três barcos, três rotas e um capitão.

A escolha destes três trabalhos advém do fato de que eles localizam-se dentro da mesma perspectiva temporal, pois aconteceram no momento de consolidação de um pensamento artístico, e podem ser analisados como fruto do mesmo, com base num recorte histórico.

Os três processos apresentam características distintas, mas foram criados tomando como base os mesmos princípios: os da poética da direção teatral. Antes da sistematização destes princípios dirigi e conduzi mais de trinta processos criativos, porém, enquanto refletia acerca deste tema percebi que muitos dos conceitos que venho estudando já se faziam presentes em minha prática artística. Entretanto, agora posso me apropriar deles com maior clareza.

Antes de começar a desenvolver uma análise comparativa entre os processos de construção dos espetáculos: Carolinas, Alice Nonsense e A Terceira Margem do Rio, falarei sucintamente um pouco sobre a natureza de cada trabalho.

O primeiro deles: Carolinas, que estreou oficialmente em março de 2007, foi construído a partir de uma pesquisa sobre a vida da escritora e catadora de papel: Carolina Maria de Jesus. A montagem foi realizada com a Vidraça Cia. de Teatro6, grupo de teatro amador com o qual trabalho desde 2004 na cidade de Mogi Mirim.

O trabalho seguinte: Alice Nonsense foi o espetáculo de formatura dos alunos do Curso de Graduação em Artes Cênicas do Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto. A peça foi criada utilizando como base a obra literária Alice no País nas Maravilhas, do inglês Lewis Carroll e estreou em novembro de 2007.

Já A Terceira Margem do Rio, foi fruto de um processo desenvolvido no Curso Livre de Teatro de Campinas, que acontece desde 2003 em Barão Geraldo. O conto de Guimarães Rosa foi montado na íntegra com os alunos da turma de 2007 e estreou em dezembro do mesmo ano.

Em sendo assim, nosso objeto de pesquisa será estudado em três processos de naturezas distintas: Carolinas, grupo de teatro amador; Alice Nonsense, turma de formandos do Curso Graduação em Artes Cênicas; e A Terceira Margem do Rio, curso livre de teatro, permitindo com isso que os princípios da poética da direção teatral sejam identificados na prática teatral independentemente da natureza do processo.

Para iniciar nossa reflexão, traçaremos o perfil de cada um dos grupos citados nesta análise:

Os atores da Vidraça Cia. de Teatro de Mogi Mirim, com o os quais montei o espetáculo Carolinas vêm de uma realidade simples e há cinco anos se dispuseram a fazer

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A Vidraça Cia. de Teatro, é um grupo de teatro amador criado por mim na cidade de Mogi Mirim, após minha saída do Centro Cultural. O grupo existe oficialmente desde 2004 e foi parte integrante de minha pesquisa de Mestrado, atuando no espetáculo: “Pixei e saí correndo pau no cú de quem tá lendo...”.

um mergulho no universo do teatro, o que lhes proporcionou uma série de novas experiências. A Cia. atualmente é composta de cinco integrantes: um homem e quatro mulheres, e destes, três são negros. O grupo é bastante heterogêneo no que diz respeito às atividades que desenvolvem, temos: uma varredora de rua, uma funcionária pública, uma operária de fábrica, uma babá e um rapaz, que devido à influência do universo teatral, hoje trabalha como arte-educador numa instituição em Mogi Mirim.

O grupo vem passando por um processo de amadurecimento e tem trilhado um caminho consistente dentro das perspectivas oferecidas a um grupo de teatro amador. Em novembro de 2006 foi premido com PAC (Programa de Ação Cultural do Governo do Estado de São Paulo), e foi com esse apoio que o espetáculo Carolinas pôde estrear e circular.

A realidade dos atores do espetáculo Alice Nonsense já se revela de modo distinto. Os atores eram todos estudantes de teatro, que estavam no último ano do curso de graduação, e que viviam a expectativa da sua montagem de formatura. O grupo era composto de dez atores: dois homens e oito mulheres, todos jovens, cheios de sonhos e receosos com relação ao mercado de trabalho. Apesar das características comuns, algumas diferenças sócio-culturais marcavam fortemente a turma: alguns trabalhavam de dia para pagar os estudos e faziam faculdade à noite, outros contavam com a ajuda financeira dos pais que eram de outra cidade, e havia aqueles que não precisavam se preocupar tanto com as questões financeiras, pois eram totalmente subsidiados pela família que residia em Ribeirão Preto e arcava com todos os gastos. Além dessa questão econômica, outro fator que os diferenciava eram as aptidões físicas e as escolhas ideológicas.

Por último, temos os atores do espetáculo A Terceira Margem do Rio: pessoas que procuraram o Curso Livre para fazerem teatro e que se dispuseram a experienciar algo novo. Um grupo eclético, mas muito coeso no que dizia respeito às questões práticas, e todos respeitando as particularidades do outro, se permitiam o diálogo, a experimentação e proposição cênica. Um grupo que aparentemente seria muito difícil de ser conduzido pelas divergências ideológicas, pelas escolhas profissionais de seus integrantes e pela diferença de faixa etária, mas que se mostrou maduro para lidar com a pluralidade.

Consideradas, as particularidades de cada grupo, descreverei agora separadamente os três processos fazendo uma análise pontual e discorrendo um pouco sobre as escolhas de cada projeto.

Iniciarei minha análise falando sobre o processo criativo do espetáculo Alice

Nonsense, espetáculo este que nitidamente teve como foco o trabalho de formação de ator.

Depois falarei sobre o processo de montagem do espetáculo Carolinas, grupo que dirijo há cinco anos, e fecharei discorrendo sobre a montagem do curso Livre de Teatro de Campinas: A Terceira Margem do Rio.