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2.1.4. DIFICULDADES/LIMITAÇÕES ASSOCIADAS À IMPLEMENTAÇÃO DO

TRABALHO EXPERIMENTAL

Estudos acerca da implementação do trabalho experimental e/ou laboratorial, Cruz (2000), Marques (2005), Ramalho (2007) e Kim e Tan (2011), revelam que muitos professores justificam a não realização de mais actividades experimentais, e sobretudo de actividades de índole mais aberta, com a falta de tempo e de condições (materiais, equipamentos, espaço, …). Alguns acrescentam também o elevado número de alunos por turma.

A gestão do tempo, condicionada pela extensão dos programas e as limitações manifestadas por muitos alunos, é uma das maiores dificuldades dos professores que tendem a concentrar a sua prática lectiva na exposição dos conteúdos programáticos e em actividades demonstrativas quando sentem que este lhes escapa. A falta de laboratórios adequadamente equipados é ainda uma realidade muito limitadora em muitas escolas do país que leva a que não se realizem algumas actividades propostas nos programas ou que estas se realizem mais tarde e em condições menos favoráveis do que seria desejável, muitas vezes um pouco desenquadradas com os conteúdos a leccionar. Tendo em conta estas limitações, Matos e Morais (2004) apelam à criatividade dos professores para substituírem o material de laboratório em falta por material do quotidiano tornando possível a implementação do trabalho experimental.

Alguns estudos revelam também que para os professores a ausência de actividades de boa qualidade e atractivas para os alunos nos manuais escolares é um elemento que constrange a qualidade das actividades experimentais implementadas nas aulas. Segundo Leite (2008), as actividades propostas nos manuais que analisou são maioritariamente ilustrativas e em alguns manuais estão pouco de acordo com as orientações programáticas. Ainda a propósito das actividades experimentais nos manuais escolares, Silva (2009) fez uma análise exaustiva a um

grande número de estudos realizados essencialmente em Espanha e Portugal, muitos deles já nos anos 2000 e no ensino secundário, concluindo que, maioritariamente, as actividades laboratoriais são apresentadas para ilustrar conceitos, leis, … e confirmar a teoria e que são raras as que promovem o envolvimento dos alunos em tarefas de investigação. No seu estudo de manuais de Física de 10º, a autora concluiu que nos três manuais mais adoptados nas escolas portuguesas o grau de abertura das actividades propostas se pode considerar médio e mais de acordo com as ideias expressas pelos investigadores em ciência.

Apesar de não serem tão facilmente identificadas pelos professores, as limitações associadas à implementação do trabalho experimental relacionam-se com mais variáveis para além do tempo, das condições de laboratório e dos manuais. Por exemplo, a familiaridade com que os professores e os alunos manipulam os equipamentos; as expectativas que os professores têm acerca da realização das actividades; estratégias de ensino; papel atribuído aos alunos na realização das actividades.

Hodson (1990) refere que a maioria do trabalho experimental conduzido em muitas escolas era de concepção pobre, confuso e não produtivo. O mesmo autor, em 1994, concretiza as consequências impostas por algumas destas variáveis na eficácia do trabalho experimental:

− muitas vezes os objectivos das actividades são mal explicados aos alunos, estes não sabem porque é que estão a seguir determinado procedimento;

− algumas actividades são mal planificadas, desadequadas para a concretização de determinadas competências nos alunos;

− algumas das competências que se pretendem treinar não são interessantes, dificilmente serão transferíveis para o quotidiano dos alunos;

− muitas das actividades propostas não constituem desafios cognitivos para os alunos, algo que eles valorizam particularmente, estes não participam na planificação das actividades e não lhes é dada liberdade para investigarem.

Muitos professores usam o trabalho experimental sem uma adequada reflexão, pensam que ele melhora as aprendizagens e ajudam os alunos a adquirirem metodologia científica sem perceberem o real efeito que essas actividades têm no desempenho dos alunos. A mesma constatação é apresentada por Almeida (2001) e Praia et al. (2002) segundo a qual o trabalho experimental que se realiza na sala de aula, não é analisado nem se reflectem os seus resultados com base no quadro teórico e das hipóteses levantadas, apenas se verifica o que se esperava que acontecesse. As experiências surgem episodicamente, desligadas dos contextos sociais, tecnológicos e culturais da produção científica.

Cachapuz et al. (1989) estudaram a implementação do trabalho experimental em escolas de todo o país e concluíram que este é essencialmente do tipo demonstrativo, muito centrado no professor, sem que os alunos tivessem sequer a oportunidade de realizar as actividades em pequenos grupos onde se criariam mais oportunidades de discussão de ideias. Afonso e Leite, em 2000, referem que esta situação ainda se mantinha, apesar da importância que se atribui, por todos os agentes educativos, à implementação do trabalho experimental.

Será por estas razões que, como refere Gomes (2007), muitos trabalhos de investigação concluem que o contributo do trabalho experimental para a aprendizagem dos alunos não é tão importante como o que professores poderão pensar. Quando os alunos realizam actividades do mesmo tipo, planificadas com o objectivo de ilustrar, verificar ou mesmo “descobrir” determinado conteúdo científico não poderão atingir a grande diversidade de objectivos a que se propõe a realização dessas actividades. Os alunos, envolvidos num processo estruturado e repetitivo de realização de actividadesescolhidas e organizadas pelo professor para pôr em evidência determinado conteúdo teórico, estão mais preocupados em seguir o protocolo experimental para obter a resposta correcta do que em adquirirem conhecimentos e desenvolverem competências.

Na maioria das situações, a acção dos alunos limita-se essencialmente a seguir “receitas” (Hodson, 1994; Hodson, 1998; Nadeau & Désautels, 1984, citado por Hodson, 1998), muitas vezes sem perceberem com que objectivo e com pouca compreensão dos conceitos subjacentes. Desta forma, e apesar de estarem fisicamente envolvidos na realização das actividades, é colocada em causa a possibilidade de os alunos desenvolverem capacidades técnicas e laboratoriais básicas e outras capacidades processuais, de realizarem uma abordagem científica das situações e de se interessarem pela ciência e a sua aprendizagem. Por outro lado, poder-se-á justificar a fraca contribuição das actividades experimentais para a compreensão dos conceitos científicos com a passividade intelectual com que os alunos realizam essas actividades onde está ausente o debate e exploração das ideias, não se têm em conta os seus saberes, os interesses e as experiências prévias. Peixoto (1996) refere mesmo que, e ao contrário do que os professores pensariam, o aumento da utilização das actividades experimentais não se repercute num maior interesse e satisfação dos alunos na sua execução.

Peixoto (1996: p. 42) acrescenta outras razões que constrangem a eficácia do trabalho experimental:

− os professores não conhecem as bases epistemológicas dos diferentes tipos de trabalho experimental;

− os professores podem não perceber as perspectivas que os alunos têm e que significado atribuem à realização das tarefas;

− os alunos podem não compreender a relação entre os objectivos da experiência e o procedimento a seguir;

− os alunos não têm tempo nem possibilidade para assimilarem as conclusões, compreenderem e reconstruírem as suas concepções sobre os fenómenos;

− as actividades podem ser percebidas pelos alunos como actividades descontextualizadas das restantes experiências de aprendizagem.

Almeida (2001) acrescenta ainda que os alunos podem fazer observações e recolher dados conducentes à obtenção de uma explicação cientificamente correcta, mas isso não quer dizer que consigam interpretar os dados e elaborar uma explicação alterando as concepções que tinham dos fenómenos. A experiência do investigador revela outras, como a dificuldade em lidar com possíveis erros, que não são aproveitados para criar conhecimento mas são tidos como um entrave à realização de determinadas experiências, sobretudo com um cariz mais investigativo; a forma de avaliação (é complexa e não pacífica a avaliação do desempenho dos alunos num processo de trabalho experimental investigativo).

Num estudo realizado em 2009, Silva, concluiu que a maioria das aulas laboratoriais observadas não tinha muitas das características emanadas da actual investigação em ciências e que estão referidas no programa. Notou-se uma reduzida implementação de actividades mais abertas, que envolvessem os alunos de forma mais activa; deficiente análise crítica das propostas apresentadas nos manuais; baixas espectativas relativamente ao efeito das actividades no ensino aprendizagem.

Apesar de todos as limitações apresentadas, reconhece-se a importância da realização de trabalho experimental, de qualquer tipo, devendo-se promover a sua implementação, por exemplo através da formação dos professores com base nos resultados da investigação realizada na área.

2.2. ESTUDOS CENTRADOS NAS PRÁTICAS DE IMPLEMENTAÇÃO DE