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4   QUESTÕES LEXICAIS 30

4.3   TRADUÇÃO LITERAL VS TRADUÇÃO POR EQUIVALÊNCIA 41

4.3.2   TRADUÇÃO DE COLOCAÇÕES E FRASEOLOGIAS 44

Segundo Bevilacqua (2004), as unidades fraseológicas correspondem a expressões relativamente fixas, que “se caracterizam por ter o seu significado derivado do conjunto e não de cada um dos elementos que a compõem.”

Nem sempre é muito clara, na literatura sobre a questão, a distinção entre fraseologias e outras unidades do mesmo tipo que envolvem algum grau de lexicalização, como, por exemplo, as colocações. A este propósito, Bevilacqua (2004) refere que, de acordo com vários autores, “as colocações ou unidades fraseológicas são combinações sintagmáticas determinadas, principalmente, pela relação semântica que se estabelece entre seus elementos, por suas estruturas morfossintáticas e pela frequência” (op. cit.: 80). Com efeito, alguns autores não distinguem estes dois conceitos, usando um ou o outro termo para designar este tipo de unidades. Assim, por exemplo, Hausmann (1990) - apud Bevilacqua (2004: 77) - designa-as sempre por " colocações e estabelece que estão

 

formadas, basicamente, por dois elementos, um dos quais é considerado como base e o outro, o colocado ou o elemento co-ocorrente”.

Após a leitura de vários textos, podemos concluir que é, na verdade, difícil distinguir uma fraseologia de língua comum de uma colocação. Menos difícil, no entanto, será a identificação de fraseologias de especialidade, que se distinguem pela frequência da sua utilização em textos de especialidade e que “transmitem conhecimento especializado e caracterizam o discurso de determinada temática específica” (Bevilacqua, 2004: 79). Para todos os efeitos, e uma vez que a discussão das várias propostas e definições destas unidades sai do alcance do presente trabalho, usaremos a designação colocação para os casos que seguem a definição de McKeown (1999: 1): “a group of words that occur together more often than by chance”. A propósito das colocações, o autor faz a seguinte afirmação, em que salienta a frequente dificuldade de reconhecimento e uso destas unidades por falantes não nativos:

“Because of their widespread use, a speaker of the language cannot achieve fluency without incorporating them in speech.” (idem)

Durante o trabalho de tradução realizado no âmbito deste projeto, foram identificados alguns casos nos quais ocorrem expressões na língua de partida que diferem das correspondentes na língua de chegada. Concretamente, trata-se de situações em que, por questões de frequência de uso, certas combinatórias de palavras se tornam mais naturais do que outras, ilustrando, desta forma, as referidas colocações. Por outro lado, encontrámos também alguns casos de expressões, no texto de partida, que não puderam ser alvo de uma tradução literal pelo facto de corresponderem a expressões fixas, ou mais concretamente a fraseologias. Nestas situações, foi necessária a procura de uma expressão equivalente na língua de chegada.

 

4.3.2.1 COLOCAÇÕES  

Nos casos que apresentamos nesta secção, a tradução de certas expressões implicou a realização de alterações, sobretudo relacionadas com a escolha do verbo em função dos restantes elementos que as constituíam.

Em primeiro lugar, apresentamos casos em que é possível verificar que o verbo utilizado na expressão no espanhol não é utilizado na expressão equivalente em português, embora tudo o resto da se mantenha igual. Trata-se de uma questão à qual o tradutor deve estar atento, de forma a que o texto de chegada contenha combinações de palavras usuais na respetiva língua. A este propósito, Bevilacqua (2004: 79) afirma que, nestas situações,“o tradutor deve saber que verbo acompanha determinado termo”.

No caso ilustrado abaixo, em (38), a palavra “impartir” poderia ser traduzida para “transmitir” ou “partilhar”. No entanto, considerámos que, em português, é mais usual associarmos à palavra “sistema” o verbo “ensinar” do que qualquer um dos verbos referidos. Assim, foi decidido traduzir a expressão usando este verbo.

(38)

El sistema que se imparte en Australia... (pág. 4, Nível 1)

O sistema que é ensinado na Austrália...

No caso apresentado em (39), constata-se que a expressão "leva-nos a" podia ser utilizada para a tradução, no entanto, a imagem dessa expressão parece mais forçada e involuntária, enquanto a ideia por detrás da expressão que ocorre no texto de partida é a de ter uma oportunidade de seguir o Reiki por vontade própria, pelo que nos pareceu mais adequada a opção pela expressão "conduz-nos por".

(39)

El Reiki nos lleva sobre el camino del desarollo... (pág. 4, Nível 1)

O Reiki conduz-nos pelo caminho do

desenvolvimento... (pág. 5, Nível 1)

 

No exemplo que apresentamos em (40), ocorre, no texto de partida, uma forma do verbo “haber” que, à partida, corresponde ao verbo português “haver”. No entanto, neste caso, uma tradução literal conduziria a um resultado pouco adequado, já que a expressão “a causa que está por detrás da dor” é bastante mais usual do que “a causa que há por detrás da dor”. Assim, a frase difere simplesmente pela utilização mais habitual do verbo “estar” nesta expressão em português:

(40)

…la razón que hubiera detrás del dolor… (pág. 10, Nível 2)

…a causa que está por detrás da dor…

O seguinte caso, apresentado em (41), ilustra o mesmo tipo de alteração dos anteriores, dado que, também aqui, o verbo é substituído por outro. Com efeito, embora, em espanhol, seja usual a expressão “poner atención”, em português seria muito estranha a expressão resultante de uma tradução literal “pôr atenção”. Assim, a expressão equivalente em português implica uma alteração do verbo para “dar atenção” ou “prestar atenção”. Foi a primeira a opção seguida na nossa tradução:

(41)

Pon mucha atención… (pág. 2, Nível 2)

Dê muita atenção…

No exemplo (42), ocorrem, no texto espanhol, os verbos “subir” e “bajar” que, à partida, são equivalentes aos verbos portugueses “subir” e “baixar”, respetivamente. No entanto, se tivermos em conta o contexto em que ocorrem, nomeadamente o facto de estarem associados ao nome “maré”, podemos constatar que este nome é frequentemente combinado com os verbos “encher” e “vazar”, pelo que optámos pela sua utilização na

 

nossa tradução (note-se que os verbos “subir” e “baixar” também são usados, em português, neste contexto, no entanto num registo não especializado):

(42)

…la marea marítima sube y baja… (pág. 11, Nível 2)

…a maré enche e vaza…

Através dos exemplos que listamos em seguida, é possível notar a frequência com que se tornou necessário realizar alterações do verbo na tradução do espanhol para o português, já que as expressões em causa, se fossem traduzidas literalmente, não seriam usuais (ou mesmo possíveis) em português:

(43)

a. ...se ponen en acción... (pág. 19, Nível 1)

...entram em ação... b. ...manejar las ambiciones...

(pág. 25, Nível 1)

...lidar com as ambições...

c. ...hay que ponerles

sentimiento... (pág. 40, Nível 1)

...há que dar-lhes sentimento... d.…te tomará un poco más…

(pág. 3, Nível 2)

…demorará um pouco mais… e. Todo esto forma parte… (pág.

5, Nível 2)

Tudo isto faz parte… f. …conseguir un buen trabajo…

(pág. 32, Nível 2)

 

4.3.2.2 FRASEOLOGIAS  

Os exemplos que apresentamos nesta secção ilustram a ocorrência de sequências, neste caso associadas a expressões de natureza temporal, que não puderam ser alvo de uma tradução literal do espanhol para o português. Consideramo-las casos de fraseologias, no sentido em que correspondem a formas fixas associadas a um certo significado. Embora a frequência da ocorrência destas expressões não seja muito significativa no texto trabalhado, não quisemos deixar de referi-las.

(44)

a. Desde hace varios años... (pág. 39, Nível 2)

Há vários anos... b. Al poco tiempo... (pág. 6, Nível

1)

Pouco tempo depois... c. Al cabo de repitirlo... (pág. 52,

Nível 1)

Depois de o repetir...

Observando os exemplos apresentados, verificamos que as expressões em espanhol não poderiam, efetivamente, ter sido traduzidas literalmente para português. Em cada língua, existem formas específicas de exprimir relações temporais. Note-se que, no que diz respeito à expressão “al cabo de repetirlo”, em português é também possível a ocorrência da sequência “ao cabo de”. No entanto, esta sequência é normalmente seguida de uma expressão que indica um período de tempo, como em “ao cabo de dois anos”. Por aqui se nota a dificuldade que, por vezes, se coloca na distinção clara entre aquilo que é uma fraseologia e aquilo que corresponde a uma colocação.

 

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