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3 A INCLUSÃO ESCOLAR E O TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS/LP:

6.1 RESULTADOS, ANÁLISES E DISCUSSÕES

6.1.1 Tradutores/Intérpretes Educacionais de Libras/LP

Concepções acerca do trabalho do tradutor/intérprete educacional de Libras/LP

Conforme os relatos feitos pelos participantes da pesquisa, TI-1, TI-2 e TI-3, ficou evidente o desconhecimento da corresponsabilidade pedagógica dos tradutores/intérpretes juntamente aos educadores e aos responsáveis pela administração escolar. As entrevistas com os tradutores/intérpretes demonstraram que eles compreendem a profissão apenas como uma atividade de apoio técnico. Ou seja, um instrumento de mediação comunicativa entre interlocutores de línguas diferentes, conforme pode ser observado em suas palavras: “Na verdade, nós estamos aqui „pra‟

poder mediar a comunicação.” (TI-3).

Ser um(a) tradutor(a)/intérprete é traduzir, de forma simultânea ou consecutiva, é, o que for passado, e, traduzir ou passar para o(a) aluno(a) surdo(a), ou uma pessoa com deficiência, ou o(a) DA, passar o conteúdo em uma palestra, e, ou se tratando, já, diretamente, num órgão público, nas escolas, então, é focar no(a) aluno(a), passar „pro(a)‟ aluno(a) […]. A minha função é isso mesmo, é ser […] a boca e o ouvido, na verdade, do(a) aluno(a) surdo(a). (TI-1).

„Pra‟ mim, o(a) tradutor(a)/intérprete educacional é aquele canal entre o(a) aluno(a) e o(a) professor(a), ele(a) é esse meio, esse, essa pessoa

74 que „tá‟ no meio, que faz com que o(a) aluno(a) chegue ao(à) professor(a) e que o(a) professor(a) chegue ao(à) aluno(a). E a função é ele(a) transmitir, sem omitir, sem tirar do contexto, transmitir tudo que o(a) professor(a) „tá‟ falando, tudo que o(a) professor(a), tudo que os alunos „tão‟ interagindo dentro da sala de aula, porque o(a) tradutor(a)/intérprete, ele(a) é a boca e o ouvido do(a) surdo(a), então, a gente tem essa função, não só com o(a) professor(a), mas, também, de interpretar as relações dele(a) ali dentro da sala de aula. (TI-2).

Verificou-se, também, que no relato de TI-1 não há compreensão a respeito da diferenciação de sua atuação enquanto tradutor(a)/intérprete educacional da atuação desse profissional em outros contextos, como uma palestra, por exemplo.

Essa forma em que os participantes identificam os tradutores/intérpretes educacionais, como um instrumento facilitador da comunicação, e/ou apenas como um técnico de apoio, pode contribuir para a manutenção de estereótipos em torno desses profissionais prejudicando a definição de seu papel e de sua função em sala de aula, pois não favorece que se estabeleça uma parceria com os regentes. Tais estereótipos podem contribuir para a discriminação do aluno surdo, no sentido de dificultar o seu processo de inclusão.

Para Lacerda (2015), os tradutores/intérpretes educacionais precisam estar envolvidos com as práticas educativas em parceria com os demais educadores. Assim, a atuação desse profissional, para a autora, deverá ser diferenciada de outros contextos de tradução/interpretação em Libras/LP, já que a sua função não se resume em traduzir/interpretar, mas, em fazer parte do processo de ensino e de aprendizagem dos alunos surdos.

TI-1 e TI-2 mencionaram que reconhecem a sua importância em sala de aula como um dos componentes que favorecem a inclusão educacional dos alunos surdos e a acessibilidade comunicativa entre esses e os demais envolvidos com o contexto escolar. Porém, apenas como um apoio técnico, conforme indicaram: “Então, a gente tem que „tá‟

junto dele(a) e transmitir, e fazer com que ele(a) tenha acesso integral a essas informações, sem que ele(a) fique lesado(a) por causa disso.” (TI-2).

Se ele(a) precisar de alguma informação, eu estando aqui, estando naquele ambiente escolar, na sala de aula, então, eu vou passar „pra‟ o(a) professor(a), ele(a) vai erguer a mão, então, a gente vai ter esse „feedback‟ por causa da minha pessoa lá, como tradutor(a)/intérprete, traduzindo tudo, e, algo a parte. (TI-1).

Pode-se aludir que a compreensão da importância pedagógica a respeito desse profissional é limitada, pois, nos relatos, não houve menção de qualquer envolvimento prévio com os regentes e com o processo de ensino.

75 Na educação inclusiva, Crochík et al. (2011) falam da necessidade do trabalho em conjunto entre professores regentes e profissionais da educação especial. Mas, sem fazer referência à presença de um professor auxiliar em sala de aula desenvolvendo um trabalho isolado com os alunos com deficiência, por exemplo, e sim, ao trabalho em conjunto para favorecer a inclusão dos alunos em situação de inclusão, de acordo com as suas especificidades.

Sobre os tradutores/intérpretes de Libras/LP, Santos e Lacerda (2015) mencionam acerca da relevância desse profissional na escolarização dos alunos surdos, mas como parte da equipe e envolvido com toda a proposta escolar, e não apenas como apoio técnico.

Preparo pedagógico dos professores em relação à inclusão educacional do surdo

TI-1, TI-2 e TI-3 consideram que não existe preparo pedagógico dos docentes em relação aos alunos surdos. TI-1 acredita que a falta de preparo está na escola como um todo. Para ele(a), isso ocorre devido ao fato de a inclusão e a Libras serem “novas”, e a Libras ser desconhecida por muitos.

Esse tipo de argumento promove barreiras diante das possibilidades de reflexão sobre as ações de acessibilidade e de inclusão dos alunos surdos, tanto da parte dos docentes quanto dos tradutores/intérpretes, e de outros educadores. Seria importante que os profissionais da educação, como um todo, permanecessem em constante observância e análise crítica acerca dos movimentos da sociedade. Ainda que exista uma política inclusiva desde a década de 1990, o ideário predominante na sociedade é o da exclusão, e os educadores não escapam desse condicionante social.

Nesse sentido, Silva e Silva (2016, p. 34) questionam a política para a escola inclusiva:

A inclusão se concretiza com base na idealização de uma escola para todos, que prioriza a convivência com a diferença, porém imersa nas contradições do próprio sistema neoliberal, despreza as particularidades dos estudantes em prol da homogeneização em torno do padrão.

Para TI-2, o que ocorre é que muitos professores não buscam se preparar. O(A) participante compreende que a inclusão dos alunos surdos requer elementos que se referem a esses alunos em conjunto aos ouvintes, como a pedagogia visual, por exemplo, que pode ser acessível a todos. Para ele(a), alguns professores não têm o entendimento sobre as possibilidades de viabilizarem o processo de ensino de maneiras

76 diferenciadas, ou não se preocupam com o aprendizado desses alunos ou em incluí-los, conforme explica:

Então, às vezes, a falta de uma aula, em algumas matérias, assim, específicas, „duma‟ aula mais visual, de explicar alguns conceitos, „pra‟ mim é uma coisa, assim, que falta, ainda, nos professores, e faltam eles, ainda, ter essa, esse „feeling‟, assim, de: „Pô‟, tem um(a) aluno(a) surdo(a) ali, será que se eu trouxer uma imagem que vai explicar sobre isso, „num‟ vai ser melhor „pra‟ ele(a)?! Porque isso é inclusão, só não é chegar na sala e passar o conteúdo: Ah, ele(a) conseguiu tirar nota! (TI- 2).

Campello (2007) e Albres (2015) explicam acerca da importância da valorização da língua de sinais que é visual e do uso de recursos didáticos imagéticos para a construção de sentido no processo de aprendizagem dos alunos surdos. As estudiosas falam que a organização pedagógica, quando se tem alunos surdos, usuários de Libras, precisaria contemplar, também, os recursos visuais de forma planejada e sem diferenciação/individualização no ensino.

A esse respeito, Crochík (2011b) elucida que, na educação inclusiva, para se possibilitar a igualdade de condições para todos, deve-se considerar as especificidades de cada um. Dessa forma, o autor afirma que a pessoa com deficiência, por exemplo, pode precisar de recursos distintos para fazer atividades escolares. No caso específico da surdez, os recursos visuais podem contribuir com o aprendizado, pois são acessíveis, também, aos alunos ouvintes.

Como se pode observar, ainda na fala de TI-2, outro aspecto por ele(a) levantado se refere ao caráter sistemático da educação, especialmente sobre o conteúdo e as notas. Para ele(a), muitos regentes não se preocupam com a formação e o conhecimento, e sim, em passar todo o conteúdo curricular e em obter boas notas.

Adorno (1967/2000) esclarece que a educação escolar se condiciona para atender aos ditames da sociedade, e esta tem sua dinâmica pautada, principalmente, no aparato técnico-científico. Assim, a escola tem repetido essa dinâmica, quando, na verdade, poderia ser o espaço propício para formação ética e a emancipação da consciência. Maar (1967/2000) ressalta a importância de uma educação voltada para a formação político- social, lembrando que o fundamento técnico-científico, por si só, não conduz à emancipação, pelo contrário, conduz a uma racionalidade produtiva vinculada às bases materiais da sociedade administrada.

Do ponto de vista de TI-3, o despreparo da maioria dos docentes ocorre devido ao fato de os mesmos se eximirem da responsabilidade e do compromisso com o ensino e a aprendizagem dos alunos surdos, deixando-os inteiramente a cargo dos tradutores/intérpretes: “[…] na maioria das vezes, eles […] acham que a responsabilidade

77 é nossa, sempre é nossa, pensam que é nosso(a) aluno(a) e nós não somos… „Pra‟ ser nosso(a) aluno(a)...” (TI-3).

Isso mostra que alguns professores, além de não terem se aproximado dos tradutores/intérpretes – e dos alunos surdos –, não compreendem a função desse profissional, e não têm promovido uma educação, de fato, acessível e inclusiva.

Para TI-3, além da falta de responsabilização e do compromisso com os alunos surdos, há professores que se incomodam com a sua presença bem como a presença dos tradutores/intérpretes. Conforme suas experiências, associadas com relatos de seus colegas de profissão, a(o) entrevistado(a) disse: “[...] em outras escolas, com colegas

intérpretes, tem professor(a) que não aceita, fala que nunca viu esse tipo de coisa, que antigamente não tinha essas coisas dentro da sala de aula, como se o(a) aluno(a) fosse um estorvo dentro da sala.” (TI-3). No relato de TI-1, também, ficou evidente que não há

envolvimento entre ele(a) e os demais profissionais e não há relações de trabalho. Para ele(a), o desconhecimento da Libras, por parte de todos os membros da escola, se torna o grande entrave das relações, pois deixou claro que os constituintes da escola o(a) isolam juntamente do(a)aluno(a) surdo(a): “[...] eles não sabem [Libras], então, isso

dificulta muito porque eu me vejo numa bolha, eu e o(a) aluno(a) [surdo(a)].” (TI-1).

A organização da sociedade mantém os estereótipos – base do preconceito – e a exclusão de indivíduos ou de grupos minoritários, conforme explicam Adorno e Horkheimer (1947/1985). Assim, a discriminação está muito presente nas relações sociais, inclusive nas relações estabelecidas no interior das escolas. De acordo com Crochík et al. (2013), a política de inclusão, que tem como proposta combater a desigualdade social, na realidade, tem aflorado uma contradição, isto é, os alunos em situação de inclusão têm sofrido discriminação nas escolas comuns.

TI-1 reitera a relevância da Libras como elemento de interação, mas, também, de acessibilidade e de garantia de inclusão dos alunos surdos. Contudo, se esquece de diversos outros aspectos necessários ao processo educativo que, objetivamente, possam incluir os alunos surdos:

E a escola, em si, […] não está preparada, não tem cartazes [em Libras], […] a sala dos professores não „tá‟ sinalizada, não tem sinalização no banheiro. Então, o ambiente, em si, já não „tá‟ ajudando muito nessa questão da acessibilidade. E, aí, contando com os funcionários, vêm os professores, [...] eles não sabem Libras, praticamente, a maioria, não sabe, […]. E os demais, os alunos [ouvintes] não sabem Libras, o(a) professor(a) não sabe Libras, então, isso fica bem complicado. (TI-1). TI-2, também, mencionou a falta de envolvimento dos professores lembrando-se de que os mesmos não observam aspectos diferenciados para promoverem um ensino

78 acessível e a inclusão dos alunos surdos. Ademais, destacou que muitos professores esperam que esses alunos correspondam ao processo educativo com os mesmos meios utilizados para os alunos ouvintes, mas que nem sempre são acessíveis aos alunos surdos.

Os resultados obtidos neste item da pesquisa estão em consonância com os estudos de Quadros (2004) que mostram que há tempos se observa a falta de envolvimento ou de compromisso de muitos educadores em relação aos alunos surdos e aos tradutores/intérpretes, inclusive, atribuindo a eles a responsabilidade pelo ensino dos alunos surdos. Segundo a autora, desde a implantação da política da inclusão e da presença dos tradutores/intérpretes em sala de aula, esses profissionais têm sido percebidos isolados junto aos alunos surdos em um dos cantos da sala, sem que haja adequações no ensino em vista desses alunos por parte dos educadores, conforme pode se observar, também, nos relatos dos participantes desta pesquisa.

Alteração da prática pedagógica do professor em função do aluno surdo

Os três entrevistados declararam que a maioria dos professores não altera a prática pedagógica diante dos alunos surdos. TI-1 mencionou a respeito de ter tomado a iniciativa para oferecer sugestões aos professores em vista de alguma alteração da prática pedagógica. Contudo, para se referir à adequação pedagógica, utilizou a categoria adaptação que se baseia em metodologia de ensino exclusivamente – diferenciada/individualizada – aos alunos surdos, mesmo demonstrando conhecer e concordar com as orientações das instâncias superiores da educação especial a respeito da política inclusiva que são contrárias às adaptações individualizadas. TI-1 lembrou-se do atendimento educacional especializado em sala de recursos multifuncionais por meio da Libras, como forma de buscar outra solução para o impasse experienciado pela exclusão dos alunos surdos na sala de aula e que gera prejuízo para a sua aprendizagem.

Conforme elucida Mantoan (2003), o ensino diferenciado/individualizado seria uma solução imediata e discriminatória que não corresponde com os princípios da política de inclusão, pois não se pode diferenciar um aluno pela sua deficiência. A autora explica:

Os alunos aprendem nos seus limites e se o ensino for, de fato, de boa qualidade, o professor levará em conta esses limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada um. Não se trata de uma aceitação passiva do desempenho escolar, e sim de agirmos com realismo e coerência e admitirmos que as escolas existem para formar as novas gerações, e não apenas alguns de seus futuros membros, os mais capacitados e privilegiados. Eis aí um grande desafio a ser

79 enfrentado quando nos propomos a reorganizar as escolas, cujo paradigma é meritocrático, elitista, condutista e baseado na transmissão dos conhecimentos, não importa o quanto estes possam ser acessíveis ou não aos alunos. (MANTOAN, 2003, p. 36-37).

A fala de Mantoan (2003) esclarece o que disse o participante TI-2, ao afirmar que alguns professores não fazem alteração na prática pedagógica por não conhecerem ou não considerarem as especificidades dos alunos surdos: “Então, alguns professores se

preocupam com isso, [para] outros professores, é como se fosse um(a) aluno(a) „normal‟.” (TI-2). Para ele(a), quando fazem alguma alteração, esta não corresponde às

necessidades específicas desses alunos:

[...] alguns se preocupam. Alguns, às vezes, „tão‟ passando um conteúdo muito rápido, então...: Ah, vou pegar uma xérox e vou dar „pro(a)‟ seu(sua) aluno(a), porque enquanto eu „tô‟ passando ele(a) „tá‟ ali e olha, e enquanto eu for explicar, ao mesmo tempo que eu „tô‟ passando, você consegue explicar „pra‟ ele(a). (TI-2).

A impressão do material exclusivamente para o(a) aluno(a) surdo(a) aponta mera adaptação e mostra que, apesar de alguns professores tomarem uma iniciativa, os mesmos mantêm um sistema de ensino voltado para alunos ouvintes. Sobre a perspectiva do aluno padrão e das adequações na prática pedagógica, Mantoan (2003, p. 38) explica:

Ensinar atendendo às diferenças dos alunos, mas sem diferenciar [individualizar] o ensino para cada um, depende, entre outras condições, de se abandonar um ensino transmissivo e de se adotar uma pedagogia ativa, dialógica, interativa, integradora, que se contrapõe a toda e qualquer visão unidirecional, de transferência unitária, individualizada e hierárquica do saber.

Observou-se, também, no relato de TI-2 que o(a) professor(a) não assume o(a) aluno(a) surdo(a) como seu(sua), não se compromete com esse(a) aluno(a) e delega essa responsabilidade ao(à) tradutor(a)/intérprete, como se este(a) fosse um(a) professor(a) de apoio especializado. Esses aspectos foram reiterados diversas vezes durante as entrevistas com os três tradutores/intérpretes:

É como se eu fosse um apoio, a pessoa que fosse suprir tudo aquilo que ele(a) [o(a) aluno(a) surdo(a)] vai precisar, e o(a) intérprete não é isso, o(a) intérprete, ele(a) traduz. […]. Os professores acham que é o(a) meu(minha) aluno(a), é meu(minha) filho(a), como falam: Ah, „seu‟(„sua‟) filho(a), não sei o que… […]. Mas não é assim, a gente, eu não tenho formação pedagógica, eu não sou professor(a), eu sou intérprete, eu tenho formação de intérprete, se você me der uma palestra „pra‟ interpretar, eu vou interpretar. Agora, „pra‟ ensinar, não compete a mim, e, às vezes, é difícil eles entenderem isso. Assim, porque a gente „tá‟ perto do(a) aluno(a) ali, cinco tempos a gente „tá‟ com o(a) surdo(a), [...] então, eu acho que, às vezes, esse papel do(a) intérprete de „tá‟ junto, faz com que eles [os professores] confundam, às vezes, essa relação

80 que tem, sabe, eles acham que eles… Eu não sei o que que eles pensam (risos). (TI-2).

Mantoan (2003), se posicionando contra os professores de apoio especializado, diz que os professores regentes tendem a se acomodar quando existe um especialista com um aluno com deficiência. Para ela, os regentes não sentem a necessidade de buscar alterações no seu fazer pedagógico com a presença de um aluno com deficiência, justamente por haver alguém no qual ele entende ser um responsável pelo aluno. “Na maioria das vezes, esse serviço [especializado] impede que o professor [regentes] se defronte diretamente com a responsabilidade de ensinar todos os seus alunos.” (Ibid., p. 46).

Os tradutores/intérpretes não são professores especializados para os alunos surdos. Contudo, conforme as expressões de alguns professores, tais como “seu(sua)

filho(a)” e “seu(sua) aluno(a)”, ao se referirem aos alunos surdos em relação aos

tradutores/intérpretes, suscita-se o pensamento de que esses professores não entendem os alunos surdos como seus alunos, e sim, dos tradutores/intérpretes.

TI-3 disse que não ocorre o contato dos regentes com ele(a) para troca de informações ou sugestões sobre os alunos surdos, ou com intuito de formar uma parceria profissional pensando nesses alunos. Complementou afirmando que acredita que a maioria dos professores não busca tomar conhecimento das possibilidades de organizar a prática pedagógica acessível e inclusiva, conforme pode se observar em seu relato:

Não, não existe [alteração da prática pedagógica em função dos alunos surdos]. O(A) professor(a), ele(a) não „tá‟, nem tem essa preocupação de perguntar „pra‟ gente como que vai preparar a aula, de pedir alguma sugestão. Aqui na escola, nesta escola, alguns professores, mas dá „pra‟ contar, um ou dois que tem essa preocupação de pedir uma sugestão de como preparar a aula, mas é bem raridade. (TI-3).

Nas falas de TI-1 e TI-2, além da falta de adequação da prática pedagógica, observaram-se outros aspectos que têm causado barreiras na aprendizagem dos alunos surdos, como o preconceito.

Segundo Crochík (2011b), o preconceito tem sido aflorado na denominada inclusão nas suas diferentes formas: compensação do desejo de exclusão com atitudes de superproteção, por exemplo; hostilidade que prega a exclusão como forma de fortalecer a negação das próprias fragilidades; e frieza que implica na exclusão pela negação da presença da vítima do preconceito, no caso da denominada inclusão, dos alunos em situação de inclusão.

Na fala de TI-1, observou-se o preconceito pautado na ideia de incapacidade cognitiva dos alunos surdos, de modo que algumas escolas os aprovam, série a série,

81 sem o aprendizado. Conforme disse TI-2, há alguns professores que esperam dos alunos surdos o aprendizado a partir das mesmas práticas pedagógicas oferecidas aos ouvintes. Ocorre que muitas são inacessíveis aos alunos surdos, e mesmo não dando a resposta esperada, esses alunos têm sido aprovados.

Isso mostra discriminação e ausência de compromisso com o processo de formação desses alunos, além de que alguns docentes não procuram conhecer os seus alunos surdos. A surdez não se relaciona com a capacidade cognitiva, sendo, então, outros elementos de cunho social e educacional que promovem as barreiras para a aquisição de conhecimento dos surdos. Verifica-se, portanto, que alguns dos professores não têm refletido sobre os problemas do processo educativo e sobre as contradições concernentes à política social inclusiva.

Segundo Adorno (1967/2000), a educação da sociedade moderna se vinculou às condições materiais ligadas aos interesses progressistas e capitalistas em oposição à formação ética, moral e à emancipação da consciência. Conforme o autor, a formação se converteu em semiformação e colabora com a conformação dos indivíduos à sociedade da equivalência. Aqueles que não se enquadram nos padrões da equivalência sofrem preconceito e são excluídos – segregados ou marginalizados.

Nesse contexto, Crochík et al. (2011, p. 196-197) apontam que, apesar de a educação inclusiva ser importante:

Não devemos desconsiderar os limites da educação atual no que se refere à formação, devido às próprias condições objetivas. Isso implica a necessidade de mais do que somente a inclusão das minorias antes segregadas da escola regular, a necessidade de nos preocuparmos também com a qualidade da educação e com o quanto esta atualmente contribui para formar indivíduos efetivamente críticos. […] O papel do professor para essa formação é fundamental, pois não se trata unicamente de transmitir conhecimentos, mas como o faz e de sua relação com o saber. A forma de transmissão aqui entendida não se refere somente a técnicas, por mais que estas sejam imprescindíveis, mas ao engajamento do professor, à sua cumplicidade com o aprendizado do aluno, isto é, refere-se a princípios políticos e éticos. […] o modo como os professores incentivam a participação dos alunos em sala de aula, seus elogios e críticas ao desempenho e ao comportamento dos alunos está relacionado com a organização de grupos e, assim, a forma pela qual os professores possam atuar junto aos alunos com deficiência não é indiferente para o grupo de alunos. Dessa maneira, as relações dos alunos entre si, com maior ou menor grau de discriminação, também depende de como atuam os professores

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