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CAPÍTULO 1: ASPECTOS GERAIS

1.5 TRATAMENTOS COM TEMPERATURA NA MADEIRA

Tratamentos que usam a temperatura na madeira ou térmicos são processos de aplicação de calor com o objetivo de modificar a estrutura da madeira de modo a melhorar o desempenho em uso, alterando a composição química e, consequentemente, alterando as propriedades em função do processo aplicado (DEL MENEZZI, 2004). Assim, quando a madeira é aquecida, ocorrem mudanças na natureza de seus componentes (celulose, hemicelulose, lignina e extrativos), o que pode modificar sua higroscopicidade, estabilidade e permeabilidade (HILLIS, 1984).

Inúmeros tipos de tratamentos foram desenvolvidos para alterar as características comportamentais da madeira. Em 1936, Kollmann desenvolveu um processo chamado Lignostone, usando calor e pressão para densificar a madeira e na mesma época, na Alemanha, foi desenvolvido um processo semelhante, denominado Lignifol.

Na década de 1940 foi desenvolvido ainda os processos Staypack e

Staybwood, utilizando madeiras mais leves sem densificação, com o intuito de

apenas melhorar a estabilidade dimensional e a higroscopicidade. Estes processos não tiveram aplicação em larga escala, provavelmente pela grande disponibilidade de madeiras consideradas nobres naquele período (ESTEVES e PEREIRA, 2009).

Atualmente, tratamentos que usam temperatura (térmicos) são largamente aplicados na indústria de produtos florestais, tais como: Processo de Plato® (Proving

Lasting Advanced Timber Option); Processo Retification®; Processo Le Bois Perdure

(Perdure®); Processo de tratamento óleo quente (OHT); Processo Thermowood® (MILITZ, 2002) e o processo VAP HolzSysteme® (BATISTA, 2012). Demais tratamentos, como termomecânicos e termo-hidro-mecânicos têm sido amplamente estudados e aplicados para melhorar as propriedades da madeira (DIOUF et al., 2011; FANG et al., 2012a; BEKHTA et al., 2012; CANDAN et al., 2013).

As madeiras tratadas termicamente adquirem uma coloração escura, semelhante a algumas madeiras tropicais, considerada como uma vantagem estética para algumas aplicações (MITSUI et al., 2001; BEKHTA e NIEMZ, 2003). Esta alteração de cor agrega valor à madeira tratada (ESTEVES et al., 2007), justificando a aplicação em escala industrial, principalmente na Europa (SANDBERG et al., 2013). A aplicação em escala industrial, segundo Boonstra (2008), justifica-se pela falta de madeiras duráveis no mercado, bem como a demanda por materiais sustentáveis de origem controlada e às restrições na aplicação de produtos químicos tóxicos na madeira.

O interesse em estudos com tratamentos térmicos aumentou após observações de aspectos positivos na madeira, como modificação de cor, menor higroscopicidade e maior estabilidade após secagem a altas temperaturas (SANDOVAL-TORRES et al., 2010; FANG et al., 2011). AYADI et al. (2003) evidenciaram que a madeira tratada termicamente apresenta maior homogeneidade de cor com a ação do tempo em comparação à madeira não tratada, o que para Zauer et al. (2016) é um efeito colateral do tratamento térmico aceitável, uma vez que torna a madeira mais escura, aumentando o valor econômico de espécies de cor clara após o tratamento térmico (MILITZ e ALTGEN, 2014; SANDBERG e KUTNAR, 2016).

Demais características da madeira são alteradas com aplicação de tratamento com temperatura, nomeadamente a resistência biológica, propriedades físicas e mecânicas, umidade de equilíbrio e alteração estética superficial (XING et al., 2016). Além destas alterações citadas, Cademartori et al. (2013) citam que os tratamentos térmicos até 220°C alteram também as propriedades químicas da madeira, resultando em elevação da hidrofobicidade.

Tratamentos térmicos com temperaturas entre 95°C e 320ºC resultam em um material com menor higroscopicidade e consequentemente com maior estabilidade dimensional e teor de umidade de equilíbrio reduzida. Porém, normalmente ocorre uma perda de massa do material e uma redução de sua resistência mecânica devido à alteração química que ocorre na madeira durante o tratamento (ALTGEN et al., 2015; SANDAK et al., 2015; HERRERA et al., 2018a).

Por alterar negativamente as propriedades mecânicas, madeiras tratadas termicamente não são indicadas para uso estrutural, pois ocorrem reduções na faixa 10 a 30% da sua resistência (BAKAR et al., 2013). Estas modificações variam em função dos parâmetros temperatura, tempo e condição atmosférica utilizados no tratamento (ZAUER et al., 2016).

Temperaturas até 150ºC eliminam a água da madeira, realizando a secagem da mesma e na amplitude térmica usada em processos térmicos (180ºC – 250ºC) ocorrem as modificações significativas na madeira e acima desta faixa inicia-se a carbonização da mesma (ESTEVES e PEREIRA, 2009).

Sundqvist (2004) descreve as fases de modificações dos componentes químicos da madeira em função da temperatura, para celulose e lignina ocorrem de forma significativa acima de 220ºC; hemiceluloses a partir de 150ºC e extrativos acima de 100ºC. Porém a transição pode iniciar abaixo destas temperaturas, ocorrendo alterações e degradação dos componentes da madeira na faixa de 150ºC a 250ºC. A degradação das hemiceluloses é considerada mais acentuada a partir de 190ºC, já para a celulose inicia acima de 220ºC, quando sua parte cristalina passa a ser alterada (KACIKOVA et al., 2013).

As alterações na madeira estão normalmente ligadas ao comportamento viscoelástico dos polímeros hemicelulose e lignina (BORST et al., 2013). Este comportamento está associado à transição vítrea (Tg) dos polímeros, os quais passam de um estado desordenado rígido para um desordenamento maior quando submetidos a altas temperaturas, onde as cadeias poliméricas possuem maior mobilidade e no caso da celulose, hemiceluloses e lignina, o comportamento torna- se menos rígido devido à degradação dos mesmos, a qual ocorre em faixas de temperatura de 200°C a 250°C para celulose, 150°C a 220°C para hemicelulose e acima de 205°C para a lignina (FIGUEROA e MORAES, 2009; PAULA et al., 2014).

Há na literatura algumas divergências de valores, por exemplo, USDA (1999) cita a temperatura de transição vítrea da lignina em torno de 170°C e acima desta

temperatura pode-se moldar a lignina mantendo a deformação após resfriamento. A temperatura de 170°C é descrita como a temperatura de transição da fase vítrea para a fase elástica, porém pode variar conforme a espécie e teor de umidade da madeira (DEL MENEZZI, 2004; ARRUDA, 2012).

Del Menezzi (2004) cita que com o aumento da temperatura acima da transição vítrea os polímeros da madeira apresentam menor resistência à deformação, ocorrendo a liberação das tensões internas da madeira. Hill (2006) menciona que o tratamento térmico é tipicamente realizado em temperaturas que variam de 180°C a 260°C, e que temperaturas mais baixas não causam mudanças significativas nos constituintes da madeira, enquanto temperaturas mais altas degradam severamente a madeira.

Esteves e Pereira (2009) relatam processos industriais com temperaturas de tratamentos entre 160°C e 260°C e Alvira et al. (2010) indicam temperaturas na faixa de 160°C a 240°C para que ocorram mudanças na estrutura química e hidrólise dos polímeros da parede celular. Recentemente, métodos térmicos, termo-higro- mecânicos e termomecânicos aplicados à madeira e produtos à base de madeira intensificaram-se com o intuito de melhorar suas propriedades, especialmente em espécies de baixa densidade (BEKHTA et al., 2009; DIOUF et al., 2011; RAUTKARI et al., 2011; NAVI e SANDBERG, 2012).