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3. R UMO AO D ESENVOLVIMENTO DE C OMPETÊNCIAS

3.2. Intervenções de enfermagem em contexto de internamento

3.2.4. Treino de competências básicas

O treino de competências básicas foi realizado na sessão do dia 6/11/2017. Estiveram presentes 8 utentes no total.

A atividade teve início pelas 10h45 na sala de Terapia Ocupacional. O plano de sessão desta atividade encontra-se no Apêndice 5.

Como critérios de exclusão consideraram-se: - Utentes com agitação psicomotora;

- Utentes com psicopatologia com sintomas positivos em fase ativa para quem o manipular dos ingredientes pudesse potenciar o quadro produtivo;

- Utentes com síndrome demencial ou défice cognitivo que impossibilitasse o seguimento de indicações simples.

A sala foi organizada por mim em colaboração com alguns utentes de maneira a que a mesa ficasse mais encostada à parede, facilitando o acesso ao lavatório/bancada.

O objetivo para esta atividade era confecionar um salame de chocolate. A escolha recaiu no facto de não necessitar de forno ou fogão, podendo ser utilizada a sala de Terapia Ocupacional do Serviço para o efeito. Esta dispõe de uma mesa larga, lavatório, micro-ondas e cafeteira.

A finalidade desta atividade era facilitar a atenção/concentração e a autorregulação emocional, demonstrando e levando o grupo a experimentar uma estratégia de coping saudável, através da culinária.

Num processo de reabilitação psicossocial a vertente da culinária surge associada a uma melhoria das funções cerebrais (atenção, memória, observação da seleção dos alimentos e das etapas a seguir), melhoria das relações sociais, oportunidade de trabalhar em grupo, pela partilha, pela descentralização do sintoma, diminuição da psicossintomatologia, ajuda com respeito e eventualmente a alguma remuneração (Pinto & Moreira, 2010). Contribui para um aumento do bem-estar da pessoa e da recuperação da sua saúde mental, em oficinas terapêuticas ou grupos terapêuticos, em contexto comunitário ou de internamento.

O ateliê de culinária permite criar um “espaço terapêutico estimulando hábitos saudáveis e propicia aos pacientes um momento para desenvolver a sua perceção sensorial e o prazer em cada fase da preparação do alimento” (Alflen & Nunes, 2016, p.xx).

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Favorece “uma melhor comunicação com o paciente, maior expressão de emoções e sentimentos e certeza de promoção e reabilitação possibilitando a construção subjetiva de afetos e de ferramenta terapêutica” (Sousa & Medeiros, 2017, p.28), indo ao encontro do objetivo e da finalidade da atividade. Proporciona trabalhar a autoestima, potencia a inserção social e possibilita que a pessoa desenvolva as suas capacidades. A atividade, ao ser em grupo, não cria demasiada pressão sobre um indivíduo em particular, mas sim estimula a cooperação grupal e intrinsecamente a interação social.

Esta atividade de confeção de uma sobremesa vai ao encontro das atividades de vida diárias, no espetro social, aproximando as pessoas que estão em contexto de internamento à realidade e à vida fora do contexto de internamento, evitando a inércia institucional (Farias et al, 2016). Valoriza os aspetos saudáveis e incentiva o formato de grupo, a sua interação e inclusão social, até o estabelecimento de relações sociais com aumento do diálogo, favorecendo o respeito entre os membros do grupo.

Para além de supervisionar a atividade, tive a preocupação de empregar como intervenção o reforço positivo dos comportamentos de entreajuda e estimular a colaboração das pessoas, valorizando a iniciativa de cada um e/ou as suas capacidades – por exemplo, quando um utente com destreza conseguiu rapidamente dar uma forma cilíndrica ao salame, o que o fez estabelecer contacto visual comigo e sorrir, e o grupo também o parabenizou.

O reforço positivo “aumenta a auto-estima e encoraja a repetição de comportamentos desejáveis” (Costa et al, 2009, p.77).

Phaneuf refere que “motivar a pessoa cuidada a retomar a esperança, a querer curar-se e a tomar conta de si é com frequência muito difícil” (2005, p.140). Os utentes envolveram-se na atividade, o que vai ao encontro dos níveis de motivação de Phaneuf (2005), e pressupõe a continuação da implicação pessoal, ou seja, que ela seja “capaz de se tomar a cargo” (p.211) de si mesma e do desempenho das suas atividades diárias.

Nesta atividade foi incentivado um momento de culinária e partilha em grupo. A escolha e seleção da receita e da sobremesa a confecionar foram realizadas previamente de acordo com os objetivos acima referidos. Para facilitar a atividade culinária, facultaram-se os ingredientes já nas medidas corretas. A função dos utentes era assim selecionar e juntar os ingredientes (bolacha maria, açúcar, manteiga,

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chocolate em pó e ovo) na ordem correta, misturar bem e deixar a refrigerar. A organização dos utentes foi supervisionada e por vezes mediada por mim.

Assemelhou-se a uma proposta de trabalho, não muito criativa, mas com a consideração de se produzir saúde ao produzir-se o salame (Farias et al, 2016).

O ambiente que se gerou em grupo foi de boa disposição. O grupo já se conhecia e eu já conhecia melhor o grupo, pelo que me sentia confortável e tranquila, e penso que também eles sentiam assim, de forma geral. A atividade teve a duração de cerca de 40 minutos, sendo que o bolo (salame) ficou posteriormente no frigorífico a refrigerar para ser servido no lanche da tarde.

No fim da atividade os utentes prepararam café para o grupo, e foram convivendo, enquanto discutiam como tinha corrido a atividade e como se sentiam, indo ao encontro da avaliação da sessão.

Referiram gostar da atividade e do facto de ser algo diferente face às atividades existentes em contexto do internamento. Consideraram positiva e original a ideia de se fazer uma sobremesa. Alguns destacaram o facto de fazê-la ter proporcionado um sentimento de calma e de atenção focada, sentindo-se bem.

Propuseram, sobretudo utentes mais jovens, que esta atividade fosse proporcionada com maior frequência, nos mesmos moldes ou mesmo a seguir uma receita com a necessidade de pesar os ingredientes – complexificando a tarefa. Outros sugeriram que se fosse uma atividade mais regular, podiam-se confecionar doces ou comidas para venda, sendo que os utentes poderiam beneficiar desse dinheiro para cafés, por exemplo.

É complicado em contexto de internamento confecionar refeições. Não havendo acesso a forno ou fogão, o mais exequível são refeições que só necessitam de frigorífico e micro-ondas. Neste sentido, os utentes foram convidados a implicarem- se no seu processo de reabilitação, refletindo proativamente e sugerindo aos técnicos do serviço o que gostariam de efetuar, num processo de ganhos de autonomia e autodeterminação.

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