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As tripanosomíases são causadas por hemoflagelados do gênero Trypanosoma e infectam membros de todas as classes de vertebrados. Pertencem à família Trypanosomatidae, ordem Kinetoplastida, e podem ser dividos em duas sessões, de acordo com seu desenvolvimento e modo de transmissão dos vetores. A Sessão stercoraria se desenvolve no intestino posterior do vetor e transmitidos pelas fezes, e a sessão salivaria é transmitida pela glândula salivar do vetor (Losos 1986).

Na América do Sul, na sessão salivaria, T. vivax e T. evansi são transmitidos mecanicamente por artrópodes hematófagos, transfusão sanguínea ou fômites, não ocorrendo desenvolvimento cíclico no vetor. No hospedeiro mamífero o ciclo é iniciado pela introdução de metatripanosomas pelo artrópode (Silva et al. 2002). Na América do Sul também há relatos de transmissão de T. evansi através da alimentação do morcego hematófago

Desmodus rotundus (Hoare 1972).

Trypanosoma vivax (Ziemann 1905) é o agente etiológico da tripanosomíase bovina. Esse

parasito apresenta um amplo espectro de hospedeiros, infectando um grande número de ungulados domésticos e silvestres. Surtos causados por esses parasitos em regiões não endêmicas provocam sintomatologias como alta parasitemia, aborto, anemia, queda de peso, sinais nervosos, letargia e alta mortalidade. Já em regiões endêmicas, a infecção é geralmente assintomática (Osório et al. 2008; Cuglovici et al. 2010; Galiza et al. 2011). Esse parasito diminui a produção animal, além de causar perdas econômicas pelos sinais clínicos da infecção, tais como crescimento restrito, anemia, aborto, custo do tratamento, e a morte dos animais afetados (Batista et al. 2011).

Trypanosoma evansi (Steel 1885) causa uma doença em animais domésticos e silvestres

conhecida como “mal das cadeiras” ou “surra”. Em equinos, a doença é caracterizada por anemia, imunossupressão, emaciação, sintomas nervosos e morte de animais não tratados. Perdas econômicas ocorrem devido à debilidade e morte desses equinos, já que em algumas

regiões endêmicas são frequentemente usados no manejo do bovino criado extensivamente (Silva et al. 2002).

A região do Pantanal brasileiro representa uma área endêmica para esses tripanosomatídeos, por apresentar condições ideais de temperatura e umidade para o desenvolvimento dos vetores, além de possuir uma gama de animais domésticos e silvestres capazes de carrear esses parasitos (Franke et al. 1994; Silva et al. 2002; Davila et al. 2003; Herrera et al. 2004; Osório et al. 2008; Madruga et al. 2011).

Stuth (1977) relata a presença de três espécies de Trypanosoma em cervídeos (T. vivax, T.

evansi e T. mazamarum), sendo que T. evansi foi considerada a espécie que causa patogenia

nesses animais. Foram isolados tripanosomas de cervos-da-cauda-branca capturados em vários locais de Michigan, EUA. Dos animais examinados, 72% estavam infectados com tripanosoma, sendo que os animais mais velhos e os machos foram significativamente mais infectados. Morfologicamente, os tripanosomas apresentavam cinetoplasto marginal localizado anteriormente e próximo ao núcleo. A presença desse parasito foi muito frequente nesses animais, sendo que todas as amostras examinadas de cervos com idade superior a um ano encontraram-se positivas, por isso os autores sugerem que a elevada taxa de infecção em animais mais velhos pode ser um sinal de que esses cervídeos não desenvolvem uma imunidade capaz de debelar a infecção ou que proteja contra novas infecções. Entretanto, podem desenvolver uma forma de proteção imune ou têm uma resistência inata que previne infecções letais. Os tripomastigotas desse estudo mostraram-se morfometricamente similar ao T. theileri e morfologicamente similares ao T. mazamarum.

Deane (1961), em um estudo dos hemoflagelados em animais silvestres da Amazônia brasileira, observou, no sangue de um espécime de Mazama simplicornis, tripanosomas grandes, de núcleo submediano, cinetoplasto pequeno, redondo e muito afastado da extremidade posterior que é afilada. Também possuía membrana ondulante bem pregueada e flagelo livre e relativamente curto. Essa espécie de hemoparasito foi classificada como

Trypanosoma mazamarum.

Trypanosoma vivax e T. evansi podem parasitar cervídeos na América do Sul (Soulsby

1986). Trabalhos na região do Pantanal brasileiro mostraram uma gama de animais silvestres parasitados por T. evansi, dentre eles alguns ungulados como catetos e queixadas (Herrera et al. 2008). Porém, a consequência do parasitismo para a saúde desses animais e seu papel

como reservatório ainda é pouco conhecido. Ungulados silvestres podem servir como reservatórios para T. vivax, porém nenhuma prova conclusiva foi encontrada de que os cervídeos representem um reservatório epidemiologicamente importante para a infecção por esse parasito em bovinos (Desquesnes & Gardiner 1993).

Herrera et al. (2010) avaliaram o padrão da infecção por T. evansi e T. vivax em veado- campeiro na região do Pantanal da Nhecolândia e a saúde dos animais parasitados. O diagnóstico parasitológico molecular foi realizado utilizando-se como alvo para T. evansi regiões satélites e para T. vivax o gene ribossômico. A prevalência de animais positivos para

T. evansi foi de 68,9% (51/74), e para T. vivax, de 21,6% (16/74). A coinfecção foi registrada

em nove animais (12,2%), e 16 veados (21,5%) estavam negativos para as duas espécies de tripanosomas. Nesse estudo, nenhum animal apresentou parasitemia patente e sexo e peso não influenciaram na presença nem na severidade das infecções. As análises hematológicas indicaram uma anemia do tipo microcítica, leucocitose por linfocitose e eosinofilia nos animais parasitados apenas por uma espécie de Trypanosoma e co-infectados. Os animais mostraram um padrão subclínico com baixas parasitemias, mas a anemia encontrada pode indicar que os Trypanosoma poderiam estar causando prejuízo à saúde dos veados. Além disso, a eosinofilia observada nos animais infectados poderia ser um indício de que a presença dos Trypanosoma estaria promovendo um aumento da suceptibilidade às infecções concorrentes.

Em uma infecção experimental por T. evansi realizada em cervo-rusa (Cervus timorensis

russa), em Papua, Nova Guiné, foi observado o máximo de 25% de redução do volume

globular no início do pico da parasitemia. Entretanto, o hematócrito se normalizou próximo ao final do experimento e não houve alterações visuais da doença. A grande persistência e os altos níveis de parasitemia indicam que esse cervídeo é um bom reservatório de T. evansi (Reid et al.1999).

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