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Capítulo 4- A imagem do Brasil no turismo e no esporte

4.2 Um Brasil de todos

A história do Brasil começou a ser traçada no momento que a civilização europeia entra em contato com a América, período histórico nomeado como descobrimento. A chegada dessa civilização no país não se deu somente pelos homens, mas também pela vinda de uma nova cultura, língua, raça e religião (BIGNAMI, 2005).

O Velho Continente foi impondo a civilização ao Novo Mundo, dando sentido e construindo uma nova história, delimitando a si próprio como superior e modelo ideal de sociedade (BIGNAMI, 2005). “Pode-se dizer que a América foi sendo desenhada e descrita por pensadores, artistas, navegadores durante um longo processo de conhecimento e estabelecimento de identidades”

(BIGNAMI, 2005, p.79).

Todo esse período foi marcado também pela busca da sociedade idealizada, a busca do paraíso, que se encontraria em terras estrangeiras. As grandes navegações tinham como objetivo a exploração de matérias-primas e a disseminação do cristianismo. “Os massacres indígenas, a catequização, o sistema escravista, foram alguns dos fatores que denunciam a imposição de um sistema e de uma ideologia para beneficiar o continente europeu”

(BIGNAMI, 2005, p.80).

Uma das grandes responsáveis na construção da imagem do Brasil foi a Igreja, que na sua concepção de paraíso e inferno, refletiu o imaginário da época voltado para esse dualismo. As representações artísticas, políticas e religiosas do período eram voltadas para essas duas visões. Por outro lado, o índio foi representado como selvagem, ingênuo e inferior habitante das novas terras (BIGNAMI, 2005).

A imagem de paraíso adquire a sua síntese na palmeira projetada contra um céu azul e calmo, que protege animais e populações em perfeita harmonia. Por outro lado, criaturas monstruosas, mulheres canibais e rituais antropofágicos se difundiram e dominaram uma outra parte do imaginário.

(BIGNAMI, 2005, p.80).

Em 1808, período marcado pela vinda da Família Real e a Abertura dos Portos, o Brasil ainda fechado a estrangeiros, possibilitou uma maior presença

47 de viajantes. “(...) muitos foram os viajantes ou visitantes que começaram a descrever as terras brasileiras pelos seus aspectos urbanos, as condições de vida, o cotidiano, as atividades, o progresso e o atraso das localidades visitadas” (BIGNAMI, 2005, p.86). São exemplos: M.Von Neuwied, que estudou os povos indígenas entre 1815 e 1817; e A.P. Saint-Hillaire, que viajou pelo sertão mineiro até Montevidéu entre 1816 1821 (BIGNAMI, 2005).

O final do século XIX e o século XX também foram momentos importantes na história do Brasil, pois eles se caracterizam pelo começo das ciências sociais do país, fato que impactou na formação da autoimagem nacional, por meio de teorias europeias. Tais teorias reinterpretaram a visão do século anterior, eliminando canibais e monstros, misturas de raças, voltando-se o olhar para as cidades e atividades humanas. Foi formando-se uma imagem mais complexa do Brasil e do seu povo, sendo assimilada pelo exterior, e pelos brasileiros (BIGNAMI, 2005).

A imagem do Brasil irá gradualmente passar do simples Paraíso-Inferno ao país cada vez mais relacionado com o lugar do exótico na cidade e na cultura, da floresta e das paisagens naturais também urbanas, do bom selvagem, da fertilidade e fecundidade (natureza e população), da beleza e alegria, lugar de palmeiras, bananas, serpentes e vegetais, uma espécie de paraíso ou Éden pitoresco, reino dos vegetais e animais exóticos(incluem-se homens), misturado à cultura da Corte.

(BIGNAMI, 2005, p.92).

A ideologia da miscigenação democrática é um produto recente na história brasileira. Até a abolição, o negro não existia enquanto cidadão. A ideologia do Brasil relata a epopeia das três raças que se fundem nos laboratórios das selvas tropicais (ORTIZ, 1994). Segundo DaMATTA (1986, p.37), “O Brasil é um inferno para os negros, um purgatório para os brancos e um paraíso para os mulatos”.

Sobre essa questão escreve Ortiz (1994, p.41):

A ideologia da mestiçagem, que estava aprisionada nas ambiguidades das teorias racistas, ao ser reelaborado pode difundir socialmente e se tornar senso comum, ritualmente celebrado nas relações do cotidiano, ou nos grandes eventos como o carnaval e o futebol. O que era mestiço torna-se nacional.

48 Tais características e acontecimentos históricos formam a identidade nacional, sendo ela o conjunto que qualificam uma nação, que é composta por seus territórios, suas misturas de raças, seu idioma, sua cultura, sua religião, suas crenças, sua geografia e seus interesses, além da sua composição histórica (BIGNAMI, 2005). “A sua identidade é o conjunto de elementos que lhe conferem uma personalidade ou que lhe dá uma imagem” (BIGNAMI, 2005, p.41). Ortiz (1994, 127), por sua vez, diz que “só é nacional o que é popular”, vinculando a cultura popular à identidade nacional.

Essa identidade constitui-se pela interação entre nações, e, principalmente, pelo processo de diferenciação entre elas. Quando os padrões de comportamento são aceitos como parâmetro de identidade nacional, passam a se reproduzir e incorporam a comportamentos individuais, agregando valor à imagem. Um exemplo é a relação que é feita entre o Brasil e o samba.

Em um dado momento na história, o Brasil adotou como padrão de cultura o samba, passando a constituir a identidade nacional. Sendo assim, no exterior, e até entre os brasileiros, é comum afirmar que todo brasileiro sabe sambar, mesmo não sendo o comportamento de todo brasileiro (BIGNAMI, 2005).

A cultura interna é um aspecto que pode trazer dificuldades das afirmações a respeito de cultura nacional. O Brasil, em seu extenso território nacional, possui uma diversidade de culturas que influenciam no momento da construção do seu estereótipo (LEITE, 1976).

A identidade nacional está intimamente ligada à imagem do Brasil no exterior. Isso acontece porque os brasileiros tendem a aceitar esse estereótipo negativo. O Brasil e os brasileiros tendem a se interessar muito mais pelo o que é dito fora do país do que pela própria formação interna. Entretanto, a imagem do Brasil também é projeção do próprio país. De certa forma, a imagem formada pelos estrangeiros foi sendo assimilada pelos intelectuais nacionais e projetada para a população (BIGNAMI, 2005).

É comum o brasileiro se estereotipar como um povo cheio de defeitos, incompetentes, sem história, sem cultura e sem raça, coincidindo com a opinião que o estrangeiro tem. Com isso, basta uma simples notícia para

49 desencadear comentários negativos (BIGNAMI, 2005). Segundo a opinião de BIGNAMI (2005, p.39):

Em geral, pensa-se que tudo o que é nacional ou não funciona ou não presta. Nessa linha de pensamento incluem-se: o que é bom para o Brasil é o que vem de fora, o povo brasileiro não é capacitado, não tem educação, não tem qualificação profissional, somos inferiores, somos decepcionantes, os únicos políticos corruptos são os nossos, só no Brasil acontecem acidentes naturais, enfim, aqui nada se salva.

Acredita-se que a imagem do Brasil é negativa, e muito dessa imagem é transmitida por meio de canções, filmes, produtos e arte nacionais, mostrando quanto o brasileiro pensa em dançar, cantar e se divertir. Devido a essa imagem, de miséria social, misturada com a sensualidade e vitalidade, que determinados turistas são atraídos em busca do turismo sexual. Por outro lado, o povo brasileiro também é destacado pela cordialidade, pelo acolhimento caloroso, pela simpatia, ou seja, pelo famoso jeitinho brasileiro (BIGNAMI, 2005).

É possível distinguir duas tendências fundamentais em relação ao grupo:

uma de admiração e aceitação, outra de desprezo e recusa. Quase todos os seres humanos apresentam essas tendências fundamentais. A participação no grupo conhecido provoca segurança e bem-estar, pois supõe entender que as pessoas que falam o mesmo idioma acabam por ter um passado em comum.

Por outro lado, o estrangeiro provoca desconfiança e medo, apesar do sonho do país distante ser frequente (LEITE, 1976).

Essas diversas características atribuídas ao Brasil não são frutos de um olhar estrangeiro, mas também o resultado de um processo interativo de comunicação formado do contato entre colonizador e colonizado, ou também, a própria visão do brasileiro. Acredita-se também que a imprensa estrangeira acaba por destacar somente os aspectos negativos da sociedade brasileira, portanto, entende-se também que, se o olhar estrangeiro vê a nação dessa forma, é porque a própria nação se vende como tal (BIGNAMI, 2005).

Chaui (2000) mostra outro lado da moeda, outra perspectiva do Brasil.

Afinal, o significado da bandeira brasileira é ensinado desde os tempos de colégio. Segundo Chaui (2000, p.5):

50 (...) o retângulo verde simboliza nossas matas e riquezas florestais, o losango amarelo simboliza nosso ouro e nossas riquezas minerais, o círculo azul estrelado simboliza nosso céu, onde brilha o Cruzeiro do Sul, indicando que nascemos abençoados por Deus, e a faixa branca simboliza o que somos:

um povo ordeiro em progresso.

É nas terras brasileiras que se encontra o maior rio do mundo, os mares mais verdes e a maior floresta tropical do planeta. O Brasil desconhece catástrofes naturais, como furacões, vulcões, desertos e terremotos. E quem disse que da mestiçagem não nasceu o samba, no qual se exprimem a energia índia, o ritmo negro e a melancolia portuguesa? A famosa ginga brasileira, marca dos campeões mundiais de futebol, pode muito bem ter nascido da mestiçagem (Chaui, 2000).

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