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Um campo de modificações: a escrita como instrumento de modernidade

3 O ensino da escrita no Brasil: um estudo diacrônico

3.3 Um campo de modificações: a escrita como instrumento de modernidade

Como vimos, anteriormente, até o início do século XIX a escrita era vista como uma atividade profissional, e o seu ensino estava reservado a poucas pessoas. A partir das primeiras décadas desse mesmo século se inicia um movimento de desprofissionalização da escrita e o seu ensino torna-se obrigatório nas escolas, sob a responsabilidade do Estado. Esse movimento de desprofissionalização da escrita ganha ainda mais força no século XX com a instauração de uma nova demanda social: a universalização da escola.

Com a proclamação da Republica, em 1889, a educação ganha destaque e passa a ser vista como um instrumento de modernização e de progresso. Com o intuito de reverter o quadro de atraso do império em relação à educação, marcado essencialmente pelo analfabetismo (MORTATTI, 2004, p. 53), a escola se torna o local institucionalizado para formar essa nova geração, e concomitantemente a leitura e a escrita, que até então eram práticas cuja aprendizagem se restringia a poucos, tornam-se aspectos fundamentais da escola obrigatória, gratuita e moderna.

E assim, para alcançar a sua grande missão de educar a todos, a escola deveria passar por uma ampla reforma, e o ensino da escrita, nesse contexto, passa por questionamentos e

modificações. Tal ensino estava diretamente relacionado à caligrafia, prática que exigia condições específicas com relação ao tempo e espaço, porém a modernidade trazia consigo a escassez do tempo, resultante da redução da carga horária pensada como solução para atender o aumento do número de alunos nas turmas; e deste modo, as discussões vão girar, sobretudo, em encontrar um tipo ideal de escrita adaptado à modernidade, apoiados em preceitos higienistas que ditavam as normas para esse ensino, tomando-se como base uma preocupação com a saúde dos alunos (VIDAL, 1998; VIDAL e GVIRTZ, 1998, FARIA FILHO, 1998).

A partir das propostas de higiene para o ensino da escrita vai se fazer necessário também uma escolarização do corpo do aluno, com indicações de uma posição adequada à escrita e uma forma correta de escrever. Desse modo, as práticas de ensino, vigente no Brasil, baseadas na escrita inclinada, passam a ser criticadas, apesar de ―elegante, graciosa e pessoal‖ são apontadas como a causa para os problemas de miopia e escoliose encontrados nos alunos (FARIA FILHO, 1998). Em vista disso, é proposta a escrita vertical, justificada como a escrita mais higiênica, mais adequada à vida moderna e como o melhor ―tipo‖ de letra a ser utilizada na escola primária.

A discussão a respeito dos dois tipos de letras parece ter começado, conforme ressalta Faria Filho (1998) por volta de 1881 quando a Revue Scientifique publica, na França, um texto sobre o aumento da miopia entre escolares e sugere que a fórmula de George Sand – ―uma escrita direita, sobre papel direito, corpos direitos‖ – resolveria o problema da escoliose e da miopia (FARIA FILHO, 1998, p.3-4). E assim, atenderia a todas as prescrições de higiene para uma boa saúde e uma escrita perfeita.

Deste modo, não demora muito para que comece a ser adotada nas escolas a escrita ―mais rápida‖ e promotora de escrita mais legível, a escrita que preservaria a saúde das crianças e que garantiam as prescrições higienistas, como mostram os estudos de Faria Filho (1998) sobre as escolas mineiras, e Vidal (1998) sobre as escolas paulistas.

Nesse contexto de reformulação da educação para a modernidade, disseminaram-se também os princípios e prática escolanovistas que aparece no Brasil, em 1920. As propostas da Escola Nova estavam centradas numa concepção diferenciada de infância e ensino (MORTATTI, 2004), segundo a qual o aluno assumiria um papel ativo no processo de aprendizagem e o professor deveria estar atento às necessidades e interesses dos alunos. O ensino da escrita deveria ser orientado com o objetivo de ―despertar o interesse da criança, além de proporcionar um aprendizado eficiente e funcional, garantindo clareza, legibilidade e rapidez à escrita‖. (MORTATTI, 2004, p. 64)

A escrita, pautada nessa concepção escolanovista, passa a ser entendida não mais como questão exclusiva de caligrafia, mas como ―um meio de comunicação e instrumento de linguagem‖ (LOURENÇO FILHO, 1950). Vidal e Gvirtz (1998) nos dizem que o objetivo dos escolanovistas ia além das preocupações higienistas de cuidado com a posição do corpo do escolar, do papel e da pena, ―pretendiam constituir uma didática racional da escrita que, respeitando o ato de escrever como expressão do pensamento, oferecesse ao aluno uma técnica de otimização do traçado da letra: legibilidade, clareza, velocidade e elegância‖

(VIDAL; GVIRTZ, 1998, p. 23). E é com base nisso, que Lourenço Filho, um dos principais

representantes da Escola Nova no Brasil, embasa a sua crítica feita a essas concepções de caligrafia da época:

O espírito do ensino continuava a ser o mesmo: a caligrafia era uma exigência de aulas especiais, e o seu fundamento didático, a repetição aborrecida e fatigante... A conservação dêsse espírito dá-nos expressivo exemplo do que é o ensino formal, trabalho da escola para a escola, despido de valor intrínseco ou de interêsse [...]. E a escrita bastarda, primeiramente, depois a vertical vieram a ter a sua época. O emprêgo desta última denunciava já um propósito funcional, o da clareza da leitura, e decorria também duma nascente preocupação nas pretendidas qualidade de boa higiene dêsse tipo de letra. ―Papel direito, corpo direito, escrita direita‖... No entanto, prevalecia ainda o processo de simples cópia e repetição. E se havia a preocupação funcional da letra, não havia ainda a das condições reais do aprendizado. (LOURENÇO FILHO, 1950, p. 6)

Assim sendo, o tipo de escrita ideal que reunia os novos preceitos de modernidade, defendido pela escola renovada, era a caligrafia muscular, que foi disseminada, em 1936, pela professora Orminda Marques, em sua obra A escrita na escola primária, a partir de experiências realizadas no Instituto de Educação do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, como defendido também por Lourenço Filho (1950, p. 7):

Graças à sua longa experiência, esclarecida pelo conhecimento das possibilidades e necessidades da criança, a professora Orminda Isabel Marques nos apresenta uma nova orientação para o ensino da escrita. Nova não só em relação à prática corrente em nossas escolas, cristalizada ainda na caligrafia dos modelos, mas nova também, no sentido de que se compôs, dia a dia, com a observação e a experiência e sob a inspiração dos verdadeiros princípios do ensino funcional.

Essas experiências deram visibilidade aos pressupostos escolanovistas (VIDAL; GVIRTZ, 1998), e contribuíram para a concretização de um novo modo de pensar e agir em relação ao ensino da escrita no Brasil. Neste sentido, com a intenção de refletir sobre o ensino da escrita nesse período, analisamos a obra A escrita na escola primária, da autora Orminda

Marques.

Orminda Marques com a intenção de divulgar entre os professores aquela que considerava a como sendo a ―boa escrita‖ para o ensino na escola primária, encontrada a partir de um experimento realizado no Instituto de Educação, do Distrito Federal, Rio de Janeiro, com base na caligrafia muscular proposta por Lister, Freeman e Palmer, publica o livro pela primeira vez em 1936, com segunda publicação em 1950.

Figura 7 – Capa do livro A escrita na escola primária

Fonte: MARQUES (1950)

É importante destacar que não foi Orminda Marques a responsável pela introdução da caligrafia muscular no Brasil. A própria autora aponta que os debates em torno de tal sistema

no Brasil aparecem em São Paulo, em 1926, no Colégio Mackenzie, com o professor Alfredo A. Anderson.

No entanto, as experiências e ideias de Anderson não foram adotadas nas escolas de São Paulo, e nem em outras escolas (MARQUES, 1950, p 63), e por isso, a autora transfere o papel de disseminação da caligrafia à experiência adotada pelo Instituto de Educação do

Distrito Federal, no Rio de Janeiro, sob sua direção, dado que no momento da introdução

dessas experiências ela era diretora da escola primária do Instituto, e à influência de Lourenço Filho que nesse período era diretor do Instituto de Educação16, e já demonstrava interesse nos estudos referentes à caligrafia muscular (VIDAL; GVIRTZ, 1998, p.22).

Figura 8 – Experiência com a caligrafia muscular

Fonte: MARQUES (1950)

16 Nome dado ao conjunto das Escolas Normal, Primária, Secundária e Jardim de Infância, responsável pela formação docente de todo o magistério carioca. (Cf. VIDAL e GVIRTZ 1998)

Lourenço Filho, um dos maiores representantes da Escola Nova no Brasil, no ano de 1929, demonstrando interesse pela escrita muscular, efetuou uma tradução manuscrita de Muscular movement writing — elementary book, de C.C. Lister (VIDAL; GVIRTZ, 1998, p.22). Pouco depois de assumir a direção do Instituto de Educação a convite de Anísio Teixeira dá início as experiências com caligrafia muscular na escola primária (VIDAL; GVIRTZ, 1998, p. 22). A influência das ideias de Lourenço Filho no trabalho de Orminda Marques fica evidente não só na escolha por este autor para escrever o prefácio do livro, mas, sobretudo pelas palavras da autora, de agradecimento pelas contribuições por ele oferecidas:

Ao Professor Lourenço Filho, Diretor do Instituto de educação, o meu reconhecimento, como orientador e animador que sempre tem sido dêste trabalho, e a êle devo também a leitura dos originais dêste livro. Que seja dado ao leitor reconhecer nas páginas a seguir tôda a influencia de suas

sugestões. (MARQUES, 1950, p. 10)

Por isso também são atribuídas a esta experiência realizadas no Instituto de Educação do Distrito Federal a responsabilidade de dar ―visibilidade às discussões escolanovistas sobre o ensino da escrita‖. (VIDAL; GVIRTZ, 1998, p. 22)

O trabalho realizado por Orminda partiu da queixa/preocupação dos professores de que ―as crianças escreviam pior que em outros tempos‖ (MARQUES, 1950, p. 11), fato que a autora atribuiu à máquina de escrever e à estrutura do ensino moderno. Assim, para solucionar esse problema da letra ―má‖ dos alunos, a escola renovada não poderia recorrer a bases pedagógicas ultrapassadas, mas a ―novas bases, com atenção a uma finalidade social, e adaptada às necessidades e interesses da criança‖. (MARQUES, 1950, p.14)

Para atender às condições modernas da sociedade, a escrita também deveria ser moderna, deveria, portanto, ser clara, legível, rápida, elegante e com certa liberdade de execução, como salienta Marques (1950). Essa escrita, portanto, segundo a autora, só poderia ser realizada através da técnica da caligrafia muscular, um ―método de escrever que emprega

o músculo do ante-braço, deixando a mão livre para escorregar sobre o papel‖, como define Anderson (apud VIDAL; GVIRTZ, 1998, p.22).

Nessa perspectiva, o ensino da escrita numa perspectiva moderna não estaria voltado à caligrafia, pois como elucida Lourenço Filho (1950, p. 6-8) ―o ensino da caligrafia, pròpriamente dita, não tinha mais sentido, [...] a escrita deixa de ter, por isso mesmo, o seu caráter de ritual para tornar-se uma atividade natural, agradável e interessante‖. A ―boa escrita‖ não estaria mais ligada ao seu traçado, e, sim, com a relação necessária entre

movimento e escrita, pois como afirma Orminda Marques (1950) é da ―harmonia dêsses movimentos que depende uma escrita legível e rápida‖. (MARQUES, 1950, p. 56)

Ainda de acordo com Orminda Marques (1950), o sistema muscular ―não se preocupa com o tipo de letra nem se ela deve ser vertical ou inclinada, dá-se à criança a liberdade de

criar e desenvolver a sua própria escrita‖. (MARQUES, 1950, p. 54) Através desse trabalho o

aluno deixaria de lado as atividades de cópias propostas pelos manuais caligráficos, de repetição de modelos para se alcançar uma escrita perfeita, e desenvolveria uma escrita natural, que seria proveniente do ritmo da criança, uma letra própria de cada aluno.

No entanto, pode-se observar que isso não significou o fim dos exercícios de repetição, de imitação de modelos, pois como adverte a própria Orminda Marques todos os especialistas do assunto ―recomendam o ―modêlo‖ apresentado à criança, não para uma cópia mecânica, mas para ser imitado inteligentemente. São recomendados modelos de formas simples e de

fácil execução‖. (MARQUES, 1950, p. 56-57) Ou seja, o que estava aqui posto por ela não

era uma crítica às atividades de cópias, mas as exaustivas repetições desses modelos para se alcançar a ―escrita perfeita‖.

Percebemos ainda, que embora a autora enfatize que esse sistema não se preocupava com o tipo de letra a ser adotado, dado que cada criança de acordo como o seu ritmo desenvolveria um tipo de letra, ela defendia que o ensino da escrita deveria iniciar-se a partir da escrita inclinada, como podemos notar em sua fala:

[...] um tipo de letra deve ser adotado, como ponto de partida, não como môdelo absoluto, mas como norma que a criança deve esforçar-se para adquirir [...] Consideradas, porém, as condições sociais de aprovação ao tipo de letra inclinada, possibilidade de perfeita higiene [...] entendemos que deve ser dada preferencia ao tipo de letra inclinada, sem talhe (escrita por tração),

para a aprendizagem no ensino primário. (MARQUES, 1950, p. 58)

Percebe-se, que Orminda Marques ao justificar o uso desse tipo de letra, deixa claro que este dependeria dos cuidados com a posição do corpo, prescritos pelos higienistas, já que tal tipo de letra já havia sido indicado como um problema à saúde dos alunos. Ela acreditava que

a criança posta em ―posição correta produziria, normalmente, qualquer escrita‖. Ou seja,

Marques (1950), ao propor esse sistema para uma sociedade moderna demonstra também uma preocupação com a posição do corpo. Isso evidencia que embora se diga que na presente proposta que o foco não eram as atividades de caligrafia, como as propostas em manuais da época, mas uma escrita mais livre, percebe-se que essa ―liberdade‖ continuava regulada por

p. 53) essa preocupação da autora fica evidente nas imagens que estão inseridas em sua obra, como as que vos apresento nas figuras a seguir para apoiar os comentários.

Figura 9 – Boa posição para escrever

Figura 10 – Posição correta para escrever. Sala de aula do Instituto de Educação do Distrito Federal

Os procedimentos de boa posição para escrever, enfatizados por Orminda Marques

estão embasados no sistema muscular preconizado por Freeman e defendido por ela como

sendo aquele que mais atende as ―exigências dos verdadeiros objetivos da escrita, admitindo

perfeita sistematização da aprendizagem‖. (MARQUES,1950, p. 58) A recomendação era que:

o aluno se mantenha em frente à cadeira, estando o assento desta em altura suficiente para que os pés pousem no soalho, naturalmente. Os braços devem ficar sôbre o tampo da carteira, mantendo-se os cotovelos a dez ou doze centímetros do corpo. Devem se manter quase retos o corpo e a cabeça, com ligeira inclinação para a frente. Os antebraços, sôbre a carteira, devem estar voltados um para o outro; a mão esquerda manterá o papel e movê-lo-a

quando o ajustamento da posição o exigir. [...] (MARQUES,1950, p. 57)

Isso nos permite afirmar que ainda há aqui uma legitimação da cultura escolar por práticas de ―escolarização dos corpos‖. (FARIA FILHO, 1998) Mesmo propondo atividades que de certo modo davam mais liberdade ao movimento, dado que não se baseavam nos modelos de repetição de cópia dos modelos caligráficos, as técnicas continuavam prescrevendo as condutas mais adequadas para a bela letra.

O estudo foi desenvolvido, tomando-se como base os exercícios de seriação do modelo elaborado por Lister. As seqüências de exercícios tinham por objetivo desenvolver a

inclinação, espessura e leveza das linhas. Orminda Marques salienta, no entanto, que utilizou

o modelo do alfabeto de Palmer, ―por sua maior simplicidade‖ (MARQUES, 1950, p 63), cujo formato das letras se diferenciava, em algumas letras, do elaborado por Lister. Através desses exercícios de seriação propostos por Lister pretendia-se ter como resultado ―uma letra inclinada e sem talhe, uniforme no tamanho e nas ligações, obtida por tração e não por

pressão‖. (VIDAL, 1998, p. 129)

Figura 11 – Modelo de escrita

Os alunos conseguiriam a adequada inclinação, espessura, leveza das linhas e maior

habilidade da mão e do antebraço, logo após a apresentação da seriação dos exercícios, como

ressalta Orminda Marques (1950, p 63). Para isso, era indispensável que ―já ao iniciá-los, o professor deve fazer que os alunos sintam que todo traçado deve ser leve, sem talhe; e, bem assim, que êle próprio deve marcar o ritmo. A princípio lento; depois, pouco a pouco, convenientemente acelerado‖. (MARQUES, 1950, p. 63-64)

Para o primeiro ano, Orminda Marques propunha que a escrita deveria desenvolver-se através da simples imitação. Ela destacava a importância dos exercícios preparatórios para a escrita, que deveria compreender a 1ª fase ou fase preparatória. Para Orminda Marques escrita era ―uma atividade predominantemente motriz‖, e por isso o seu ensino que ―reclama quanto ao movimento‖ (MARQUES, 1950, p. 26), exigiam exercícios para aprimorar a coordenação motora. Esse trabalho deveria ser associado com técnicas de motivação como músicas, histórias, palmas, versos, etc., pois a partir desses estímulos seria possível manter o interesse do aluno. Os alunos deveriam ser colocados em situações de ―desejar a própria atividade de aprender a escrever‖. (MARQUES, 1950, p. 27)

Figura 12 – Exercício de escrita para o 1º ano

Fonte: MARQUES (1950)

Orminda Marques acreditava que a partir dessas atividades conseguiria motivar, despertando o desejo de aprender a caligrafia, assim o professor alcançaria o êxito da aprendizagem. Ainda nessa primeira etapa do método, o aluno aprendia a fazer as letras

sugere que se dê atenção à forma das letras, que seriam aperfeiçoadas com o tempo. Figura 13 – Exercício de escrita para o 2º período do 1 º ano

Fonte: MARQUES (1950)

No segundo ano era previsto que o aluno tivesse uma boa atitude em relação aos trabalhos escritos, disciplinando-o para que mantivesse a postura conveniente durante os trabalhos escritos para a execução correta dos movimentos, além de desenvolver uma letra de tamanho normal, em uniformidade de inclinação e alinhamento, bem como maior desembaraço de movimentos e leveza de traços.

Figura 14 – Exercício de escrita para o 2 º ano

Fonte: Marques (1950)

No terceiro ano haveria uma complementação dos estágios anteriores, em relação à forma fundamental das letras no que diz respeito à regularidade em tamanho, inclinação e alinhamento, desenvolvendo posição adequada do corpo, da caneta e da inclinação do papel. Além disso, o aluno deveria habituar-se às boas normas de apresentação do trabalho escrito com relação às margens, parágrafos e cabeçalho. O aluno também deveria escrever com

desembaraço e leveza de traços, já se iniciaria o trabalho de se escrever à tinta.

Figura 15 – Exercício de escrita para o 3º ano

Fonte: Marques (1950)

Já nos quarto e quinto anos, a metodologia proposta por Orminda Marques previa que o aluno deveria ser capaz de escrever com o mais alto nível de desenvolvimento, (MARQUES, 1950, p. 117), obtendo maior leveza e velocidade da escrita, sem prejuízo das qualidades já obtidas, em especial a legibilidade, tendo maior controle, eficiência e economia de movimentos. Ao final do curso, os alunos poderiam dar ao traçado um cunho pessoal.

É possível constatar, portanto, que a obra de Orminda Marques, constitui um manual pedagógico para o ensino da escrita, especificamente da bela letra, no sentido moderno que assumiu frente às necessidades da sociedade em transformação. Ou seja, a ênfase dada ao traçado das letras e a ―arte de escrever‖ ainda permanecem aqui. As técnicas propostas por Orminda Marques para o ensino da escrita continuavam prescrevendo condutas mais adequadas para a bela letra e presas à necessidade de se seguir um modelo, e foram essas ideias que circularam até muito recentemente no Brasil. Segundo VIDAL e GVIRTZ (1998) o trabalho desenvolvido por Orminda Marques rendeu a publicação de cadernos seriados de caligrafia, entre 1940 e 1960. Esses cadernos chegaram a ter tiragem de 250 mil exemplares anuais.

Vale salientar ainda que, apesar de aparentemente alinhada com a política educacional do período e divulgada em todo o território nacional, a experiência com a caligrafia muscular não conseguiram impor um novo formato de letra, inclinada, mantendo-se o de escrita vertical

que atesta ainda mais que o ato de escrever se reduzia a um rigoroso trabalho de traçado das

letras. E desse modo, com as contribuições de Beltrão (2006, p. 126) podemos inferir ―que a

presença da escrita na escola venha se constituindo, historicamente, como um trabalho pesado‖.

3.4 O ensino da escrita: entres marcas de rupturas e