• Nenhum resultado encontrado

Uma análise da pragmática da investigação

No documento Verdade e Investigação (páginas 160-200)

N

este capítulo, vamos esboçar as linhas gerais de uma análi- se da pragmática da investigação. Trata-se de um desenvol- vimento adicional à abordagem que apresentamos no capítulo precedente sobre a noção de acordo. Colocaremos em destaque a ideia de averiguação como aquilo que de maneira mais geral caracteriza a investigação. O ponto fundamental é mostrarmos que um relato ou análise geral da pragmática da investigação não é uma teoria do conhecimento ou, mais especificamente, uma teoria da investigação no sentido tradicional, mas uma aná- lise do processo de averiguação.

As seções iniciais revisam parte das teorias epistemológicas a respeito das noções de conhecimento – como crença verdadeira e justificada – e de investigação – como um processo de valida- ção de hipóteses. As seções finais visam detalhar as noções de pragmática da investigação e de sua análise. Em decorrência de 1

nossas críticas às teorias da verdade examinadas nos capítulos anteriores, vamos procurar apresentar uma análise da investiga- ção que não se comprometa com concepções metafísicas ou epistemológicas, mas que seja capaz de lidar com noções des- ses domínios em contextos específicos de investigação, contex- tos nos quais o processo de averiguação ocorre.

Algumas das discussões deste capítulo retomam aquelas apresentadas 1

em Dutra 1999 e Dutra 2000a, cap. 5, aprofundando-as e complemen- tando-as. Cf. ainda DUTRA, 2020a.

3.1 O conhecimento como crença verdadeira e justificada Segundo a epistemologia tradicional, o conhecimento é crença verdadeira e justificada. Esta concepção tem sido amplamente discutida e os dois loci classici a este respeito são The Problems

of Philosophy, de Russell, e, de Edmund Gettier, o artigo Is Justi-

fied True Belief Knowledge? Este artigo marcou época e provo2 -

cou inúmeras reações dos epistemólogos profissionais; o capítu- lo 12 do livro de Russell, fundamentalmente, antecipa a mesma discussão.

Basicamente, duas linhas de argumentação foram tomadas por aqueles que assumiram como tarefa da epistemologia supe- rar o desafio lançado por Gettier. Em primeiro lugar, surgiram abordagens alternativas, em grande medida fundamentadas em determinadas formas pós-quinianas de naturalismo; segundo, aquelas abordagens que, retomando o ponto de vista da episte- mologia tradicional, procuravam reconstruir esse domínio de investigação. Em ambos os casos, contudo, em geral, trata-se de complementar a discussão de Gettier, atentando para determi- nados aspectos que ele não levou em conta em sua discussão e que, por sinal, também não eram contemplados pelos epistemó- logos tradicionais. Como exemplo da primeira via de investiga- ção, entre muitos outros, vale citarmos as discussões de Alvin Goldman. Quanto à segunda abordagem acima citada, há as discussões de Susan Haack. As análises de Haack se concentram na oposição entre fundacionismo e as teorias da coerência, pro- pondo como alternativa o que ela denomina funderentismo. 3

Para estes dois autores, trata-se de argumentar que há cir- cunstâncias em que podemos dizer que temos crenças verdadei- ras e justificadas, mas não diríamos, mesmo assim, que são ca-

Cf. RUSSELL, 1980 e GETTIER, 1963.

2

Cf. GOLDMAN, 1967, 1985, 1986 e 1994. Cf. ainda HAACK, 1995

3

sos de conhecimento. Em nossa apresentação abaixo, seguire- mos de perto a apresentação do problema feita por Gettier, dan- do um exemplo semelhante àqueles que ele apresenta em seu artigo. Um pressuposto fundamental dessa discussão é que po- demos obter conhecimento também por meio de inferências; para tanto, valem as formas inferenciais clássicas usuais. Não vamos aqui questionar esse pressuposto, uma vez que isso não afeta fundamentalmente nossa discussão.

De fato, podemos distinguir o conhecimento por inferência, que é indireto, do conhecimento direto, digamos, que podemos obter, por exemplo, por meio dos dados dos sentidos. Outro exemplo relevante seria o de uma operação matemática simples. O que entendemos aqui por conhecimento direto se aproxima da noção de conhecimento por familiaridade (acquaintance), de Russell, em oposição ao conhecimento por descrição. O conhe- cimento por descrição, sendo indireto, assim como o conheci- mento por inferência, juntamente com este último, constituiria outra categoria, separada do conhecimento direto. Em qualquer dos casos, contudo, trata-se de processos de formação e fixação de crenças e, independentemente de ser este um processo direto ou indireto, é a produção de crença que nos interessa na discus- são abaixo.

3.1.1 Os requisitos para haver conhecimento

Suponhamos então que dois indivíduos, José e Pedro, sejam suspeitos de terem cometido um crime e que um detetive polici- al tenha investigado o caso e comunicado ao delegado de polí- cia sua conclusão. O detetive, contudo, tendo desejado colocar o delegado em má situação, mentiu, dizendo que Pedro era o culpado, ao passo que, de fato, o culpado era José. Em seu rela- to, o detetive também comentou que Pedro possuía uma arma calibre 38, fabricada em 1965. O delegado então convocando os dois suspeitos, diante deles e querendo dar um tom dramáti-

co a sua revelação, diz-lhes que o culpado era aquele dos dois que possuía uma arma de calibre 38, fabricada em 1965. Por coincidência, ambos os suspeitos possuíam uma arma como tal (o que o detetive não apurou – ele apurou apenas que Pedro possuía tal arma). E, diante da revelação do delegado, cada um dos suspeitos pensou que era dele que o delegado es- tava falando, obviamente. Entretanto, sendo mais inseguro, José se precipitou e confessou o crime. Diante disso, de forma opor- tunista, o delegado tomou sua confissão por escrito e encerrou a investigação, liberando Pedro. Apesar das informações erradas que tinha recebido do detetive, o delegado prendeu o verdadei- ro culpado.

Neste caso, o delegado tinha uma crença verdadeira e justifi- cada de que o culpado possuía uma arma 38 de 1965, mas não podemos dizer que ele realmente tinha conhecimento disso. 4

De maneira oportunista e desconsiderando o que o detetive lhe dissera (mentindo deliberadamente), o delegado aceitou a con- fissão e, podemos dizer, fingiu que o que sabia era isso mesmo, embora o que ele realmente pensasse (erroneamente) era que Pedro era o culpado. Não obstante isso, esse caso atende aos requisitos da concepção tradicional do conhecimento. Vejamos como.

Para a epistemologia tradicional, se o conhecimento é crença verdadeira e justificada, então temos conhecimento se três re- quisitos são preenchidos:

(a) a crença é verdadeira,

(b) certo indivíduo possui tal crença, e (c) ele está justificado em possuir tal crença.

O leitor pode notar, obviamente, a semelhança desse exemplo com 4

aqueles discutidos por Gettier em seu artigo, sobretudo com aquele a respeito de Smith e Jones, que concorriam a um emprego.

O delegado tinha a crença de que o culpado possuía uma arma 38, fabricada em 1965. Tal crença era verdadeira, pois ambos os suspeitos possuíam uma arma assim e, logo, isto era verdadeiro em relação a Pedro também, que o delegado julgava ser o culpado. O delegado estava justificado em pensar isso porque confiava no detetive que lhe disse tal coisa, embora este mentisse. Como sabemos, de fato, José era o culpado e, por coincidência, também possuía uma arma 38 de 1965. Este fato, não sendo de conhecimento do detetive, não foi revelado ao delegado, que não tinha, portanto, a intenção de provocar uma reação de José, mas, ao contrário, de Pedro.

Vale assinalarmos que, neste caso, a crença verdadeira e jus- tificada do delegado, a crença que está em questão, é aquela sobre o culpado possuir uma arma 38 de 1965 e não a de que o culpado era Pedro. Esta última, que o delegado também possuía, não é verdadeira; por isso não atende aos requisitos da concep- ção tradicional; ela não serve para a problematização que dese- jamos fazer, seguindo Russell e Gettier. A outra crença, contudo, atende a tais requisitos e, como insistem tanto Gettier, quanto Russell, sentimo-nos muito desconfortáveis em aceitar que, na- quele caso, estamos diante de um caso de conhecimento.

3.1.2 Diagnósticos para o nosso desconforto

O desconforto diante do resultado acima apresentado foi di- agnosticado por diversos autores de maneiras diferentes, entre eles Alvin Goldman, que afirma que, de fato, devemos acrescen- tar aos três requisitos acima enunciados um quarto ponto:

(d) a crença é produzida por um mecanismo confiável de produção de crenças.

Neste caso, poderíamos dizer que a falha em nosso exemplo está no fato de que o detetive mentiu ao delegado, isto é, este

não obteve sua crença por meio de um mecanismo confiável. De fato, podemos generalizar o ponto levantado por Goldman e dizer que não se trata apenas de mecanismos de produção de crenças, mas de meios em geral, ou estratégias, ou métodos, ou procedimentos investigativos que produzam, fixem ou confir- mem nossas crenças.

Como veremos abaixo, no caso do presente exemplo, trata-se de um processo imperfeito de averiguação, isto é, há uma falha contextual naquele sistema de investigação policial, que consis- te no fato de que o detetive mentiu para o delegado, o que não deveria ocorrer se tal sistema funcionasse corretamente. De fato, um sistema de investigação policial pressupõe que os indivíduos que colaboram neste tipo de empreendimento não mintam uns para os outros e, se o fizerem, que haja procedimentos suple- mentares de segurança, capazes de corrigir esse tipo de distor- ção.

Embora haja certa contribuição dada pela análise de Gold- man, em complementação àquela de Gettier, a nosso ver, a principal falha ainda não foi identificada. Em nossa opinião, o problema acarretado pela epistemologia tradicional reside na separação dos contextos de descoberta (ou produção) e de justi- ficação (ou prova). De fato, isto está implícito na análise de 5

Goldman, na medida em que ele adere a um tipo de naturaliza- ção da epistemologia.

Para a epistemologia tradicional, devemos nos ocupar do contexto de justificação e os três requisitos apontados por Getti- er dizem respeito a tal contexto. O que devemos discutir, se- gundo o epistemólogo tradicional, é se uma crença (ou teoria), depois de formulada ou verbalizada, recebe apoio ou justifica-

A distinção é lugar comum sobretudo entre os filósofos da ciência, 5

sendo sustentada notadamente por Carnap e por Popper. Contudo, sua formulação mais conhecida é aquela oferecida por Hans Reichenbach (1938).

ção e, portanto, se pode ser validada por meio de procedimen- tos puramente lógicos. Este é, sem dúvida, o caso da crença do delegado de que o culpado possuía uma arma 38 de 1965. Do ponto de vista meramente comportamental, isto é, do ponto de vista de um expectador que não sabe que o delegado se referia a Pedro e não a José, é preciso reconhecer o episódio como um episódio de conhecimento. Mas, para o próprio delegado, que sabia estar se referindo a Pedro e não a José, isso é inaceitável. O próprio conhecimento que o delegado possui de sua intenção de se referir a Pedro e não a José, contudo, está fora do âmbito de análise admitido pela epistemologia tradicional, que se res- tringe ao contexto de justificação. Considerar a intenção do de- legado pertenceria ao contexto de descoberta e não ao de justi- ficação. Nosso desconforto com tal exemplo deriva do fato de que estamos misturando informações relativas a ambos os con- textos. Sem a informação de que o delegado pretendia provocar uma reação de Pedro e não de José, não teríamos dúvidas em dizer que estamos diante de um caso de conhecimento, isto é, de um caso de crença verdadeira e justificada.

Suponhamos então que o delegado não revele seu engano. Suponhamos que tivéssemos de relatar o mesmo episódio sem a informação que supostamente temos de que ele se referia a Pe- dro e não a José. Suponhamos, enfim, que nos coloquemos no lugar de um expectador que não possui tal informação. Este pode ser o caso, por exemplo, do escrivão, que anotava os de- poimentos naquela ocasião. Para ele, sem dúvida, a aparente crença verbalizada pelo delegado de que o culpado possuía uma arma 38 de 1965 era verdadeira e justificada. Nada naque- le contexto, uma vez analisado por meio dos padrões da epis- temologia justificacionista tradicional, poderia levar o escrivão a pensar o contrário.

É apenas o fato de que, em nosso exemplo, assim como na- queles de Gettier e de Goldman, temos informações que trans- cendem tal situação que nos permite dizer que, mesmo aten-

dendo aos requisitos da epistemologia tradicional, não estamos diante de um caso de conhecimento. Mas as informações que temos (por exemplo, que o detetive mentiu, que o delegado ten- cionava apontar Pedro e não José etc.) são todas informações relativas ao contexto da produção da crença, isto é, do contexto de descoberta e não do contexto de justificação.

Goldman está certo ao dizer que não devemos nos confor- mar com a separação dos contextos e que, em nossas análises, temos de considerar os mecanismos de produção de crenças. Mas isso apenas não basta. Pois o mecanismo pode ser confiável sem que estejamos cientes disso. Para sabermos que um meca- nismo de produção de crenças é confiável, é preciso termos in- formações relativas ao contexto de descoberta. O que temos de fazer, de fato, é constatar que o processo todo relativo ao episó- dio suposto que narramos é um processo de investigação e que a falha está no modo em que ele foi conduzido, como assinala- mos acima e como ainda comentaremos mais detalhadamente adiante.

A separação dos contextos certamente nos impede de ver isso, mas simplesmente acrescentar outros critérios não vai re- solver o caso. A nosso ver, o que é preciso fazer é empreender uma análise da pragmática daquele processo de investigação. A investigação do crime não terminou na investigação preliminar do detetive, que comunicou (embora mentindo) suas conclusões ao delegado. Este último, ao convocar os dois suspeitos, conti- nuou a investigação e, de fato, retificou o erro ou a mentira do detetive, por uma feliz coincidência.

Portanto, o que temos de fazer em casos como este é analisar o processo todo de investigação. Ora, isso não é visto nem por Russell, nem por Gettier, nem por Goldman. Desfazer a separa- ção dos contextos significa encontrar na investigação elementos de ambos os contextos e percebermos que a investigação já contém os dispositivos de validação que a epistemologia tradi- cional retratou nos requisitos acima mencionados.

O resultado das considerações acima é que a epistemologia não deve se ocupar de uma análise do conhecimento, mas antes e fundamentalmente, de uma análise da investigação. Nos ter- mos que desejamos descrever mais detalhadamente neste capí- tulo, ela deve produzir – pelo menos preliminarmente – uma análise da pragmática da investigação, que será retratada aqui como um processo de averiguação.

Antes de chegarmos a isso, contudo, é preciso dizermos uma palavra também sobre as teorias da investigação produzidas no âmbito da filosofia da ciência. Sendo produzidas mediante a separação dos contextos, tais teorias deixam de perceber que os próprios mecanismos de validação estão incluídos na pragmáti- ca da investigação ou, se desejarmos utilizar ainda os termos da epistemologia tradicional, no próprio contexto de descoberta.

3.2 As teorias da investigação e do método

As abordagens epistemológicas restritivas ao contexto de justifi- cação, no domínio da filosofia da ciência, sempre procuraram tomar em consideração as regras metodológicas que, em seu conjunto, constituiriam um procedimento lógico de justificação ou validação, isto é, que ofereceriam critérios para demarcar o conhecimento científico de outras formas de conhecimento. O positivismo lógico, sobretudo nas obras de Carnap, e o racionalismo crítico de Popper são exemplos clássicos desse tipo de abordagem e, de fato, são as duas abordagens mais co- nhecidas e discutidas na filosofia da ciência. Para eles, uma teo- ria da ciência é uma teoria do método adequado para justificar ou, como diz Carnap, reconstruir racionalmente o conhecimen- to científico já produzido e legitimar uma parte dele, ao mesmo tempo que elimina outra, que não pode ser justificada pelos mesmos procedimentos. Como é bem conhecido, em ambos os casos, o conhecimento que não pode ser legitimado pela meto-

dologia escolhida é dito metafísico, embora, para Popper e Car- nap, por diferentes motivos e recorrendo a diferentes princípios metodológicos.

Carnap, na verdade, elaborou duas versões de sua teoria da justificação, a primeira, nos anos 1920, verificacionista, conten- do duas fases, uma fenomenalista (no Aufbau e em Pseudopro-

blems in Philosophy), outra fisicalista (em The Unity of Science e

outros escritos, como o artigo Psychology in the Language of Physics). A segunda versão – confirmacionista – da teoria foi apresentada a partir do texto Testability and Meaning e inclui as investigações de Carnap sobre a lógica indutiva como um pro- cedimento de validação, tal como ele discute no livro The Logi-

cal Foundations of Probability e em escritos posteriores. 6

Vamos discutir a primeira teoria, fundamentada na lógica de- dutiva clássica, deixando de lado o aspecto epistemológico e metafísico que diz respeito à questão entre o fenomenalismo e o fisicalismo. Em seguida, vamos discutir a teoria de Popper, do mesmo modo, fundamentada na lógica dedutiva clássica e apre- sentada em detalhes pelo próprio autor no livro The Logic of Scientific Discovery. 7

3.2.1 O sistema construcional

A ideia fundamental de Carnap no Aufbau é a de um sistema construcional no qual os conceitos (ou objetos) de todos os ra- mos das ciências possam ser construídos a partir de conceitos básicos. O sistema apresentado no Aufbau é fenomenalista e elege como objetos básicos aqueles do nível autopsicológico, isto é, as experiências elementares de um sujeito. O sistema possui outros três níveis superiores de objetos: físicos, heteropsi- cológicos e culturais, como se segue:

Cf., respectivamente: CARNAP, 1969, 1934, 1996, 1936–37 e 1962. 6

Cf. POPPER, 1959. 7

O nível de objetos físicos corresponde às ciências da nature- za, incluindo as disciplinas físicas e químicas e também a biolo- gia. O nível de objetos heteropsicológicos corresponde às disci- plinas que enfocam os fenômenos sobre as outras mentes, loca- lizando-se ali a psicologia, portanto. Ao nível dos objetos cultu- rais correspondem as ciências humanas em geral, como a histó- ria, a economia, a sociologia etc.

O processo de validação fundamentado no sistema constru- cional consiste em avaliar se um objeto de um dos níveis supe- riores pode ser reduzido a objetos dos níveis inferiores, chegan- do ao nível fundamental dos objetos autopsicológicos. O pro- cesso de redução ou verificação consiste em traduzir todos os enunciados a respeito de objetos de um nível superior para enunciados sobre objetos dos níveis inferiores e, em última ins- tância, para enunciados do nível fundamental.

Assim como a teoria de Popper, a teoria de Carnap pressupõe que a validação (neste caso, a verificação) seja um procedimen- to epistemológico a ser aplicado ao conhecimento já dado, des- considerando, portanto, o contexto de descoberta ou invenção de teorias. Assim sendo, a teoria de Carnap não é propriamente uma teoria da investigação, tal como este tipo de teoria é apre- sentada em autores clássicos neste domínio, como Francis Ba- con e John Stuart Mill, mas uma teoria do método adequado de justificação, validação ou, como Carnap prefere dizer, recons- trução racional do conhecimento já dado.

3 Objetos culturais

2 Objetos heteropsicológicos

1 Objetos físicos

A teoria de Popper é menos formalizada, mais intuitiva e está mais próxima dos empreendimentos clássicos como aqueles de Bacon e Mill. Mas, assim como em Carnap, em Popper, em pri- meiro lugar, trata-se de validar o conhecimento científico, isto é, de aplicar critérios que permitam declarar que uma teoria é ci- entífica. Tais critérios estão consolidados nos métodos por eles elaborados. Parte dos problemas relativos à verificação e à con- firmação já foi tratada no capítulo precedente. Vamos aqui ape- nas discutir os aspectos lógicos dos métodos de validação apre- sentados por esses autores.

3.2.2 A falseabilidade de teorias

O método de Popper também está inteiramente restrito à ló- gica dedutiva clássica, sendo baseado fundamentalmente na forma inferencial do modus tollens. Seja H uma hipótese e C um enunciado que relata uma consequência observacional que pode ser deduzida de H. Se tal consequência não se dá, isto é, se C é falsa, então, pela lógica clássica, concluímos que ¬C é verdadeira e, se o modus tollens também vale, então isso impli- ca que H também seja falsa, pois temos:

H → C ¬C ————

¬H.

No mesmo espírito da epistemologia tradicional, a teoria de Popper também pressupõe, portanto, que temos conhecimento

No documento Verdade e Investigação (páginas 160-200)

Documentos relacionados