• Nenhum resultado encontrado

A cidade de Parnaíba procurou, ao longo do final do século XIX e início do XX, firmar-se como símbolo de desenvolvimento, potência e progresso, como exemplo de cidade que desejava acertar o caminhar com sua própria história. Dentro dos seus espaços de sociabilidade, equilibrar-se na gangorra que é a modernidade, permite-nos advertir da transitoriedade típica desse periodo que, num ir e vir incessante, aponta para uma novidade que é sempre igual. Buscava-se o modo vida moderno, que a tudo impregna, seduz, fascina e atrai.

Em termos de arrecadação, a cidade de Parnaíba, com intenso comércio de exportação e importação, tornou-se a segunda maior economia do estado. A cidade jactava-se por ter um número de estabelecimentos comerciais de maior destaque e em maior número do estado do Píaui. Sua força econômica, em meados da década de 1920, era largamente atestada em todos os índices econômicos a que tivemos acesso em nossa pesquisa. Era urgente, então, destinar recursos públicos ou privados para o melhoramento das vias urbanas, que impediam o avanço e o progresso local. As finanças municipais, sempre insatisfatórias, necessitavam de uma ajuda do

governo federal ou estadual na forma de empréstimos para custear as obras de infraestrutura urbana.

Os responsáveis pela administração do município de Parnaíba procuravam o progresso da cidade em todas as esferas sociais e econômicas. O intelectual e escritor Vicente Araújo produziu um artigo no Almanaque sobre os avanços que Parnaíba vivenciou, fruto do trabalho de seus habitantes e das atividades marítimas desenvolvidas no Porto das Barcas:

Do Piauí, é ela o ponto principal de comércio; e é nisto que está todo o seu futuro e valor. A sua vida é quase que completamente comercial [...] Protegida pelo cais Afonso Pena, é o atracadouro das numerosas embarcações que por intermédio de Parnaíba, ligam o Piauí aos outros pontos do País. (1932, p.71)

Essas numerosas embarcações citadas pelo autor movimentavam boa parte da economia e direcionavam as atividades comerciais para a beira do cais. Muitos trabalhadores dependiam desse comércio para sobreviver. Alguns historiadores piauienses como Mary Angélica, Iweltman Mendes, Maria Mafalda e Teresinha Queiroz produziram trabalhos relacionados ao Porto das Barcas. Também literatos piauienses, como Assis Brasil21, dedicaram alguns de seus livros a descrever o ambiente e o intenso movimento de mercadorias no cais de Parnaíba.

21 Francisco Assis Almeida Brasil (Parnaíba, 1932) é um escritor brasileiro, membro da Academia

Piauiense de Letras. Romancista, cronista, crítico literário e jornalista, atuou como crítico literário na imprensa brasileira, especialmente no Jornal do Brasil, Diário de Notícias, Correio da Manhã e O Globo, assim como nas revistas O Cruzeiro, Enciclopédia Bloch e Revista do Livro. Possui mais de 100 obras publicadas, entre elas Beira Rio Beira Vida, 1965; A Filha do Meio Quilo, 1966; O Salto do Cavalo Cobridor e Pacamão (Tetralogia Piauiense); Os que Bebem como os Cães (Ciclo do Terror); Nassau, Sangue e Amor nos Trópicos, Jovita e Tiradentes (romances históricos).

Imagem 03: Resumo da Exportação do Porto de Parnaíba do ano de 1924. Fonte – Almanaque da Parnaíba, 1925, p. 35.

A partir da imagem acima, podemos ter uma noção dos principais produtos exportados para a Europa e Estados Unidos, cujos principais portos eram, respectivamente, Liverpool, na Inglaterra, e Lisboa e Porto em Portugal. Percebemos, ainda, que a amêndoa de babaçu era o principal produto exportado para a Europa. Já a cera de carnaúba, que interessa particularmente aos Estados Unidos, mesmo ocupando o quarto lugar em quantidade de toneladas exportadas, aparecia como o segundo em rendimentos, o que demostra seu alto valor agregado na década de 1920.

De acordo com o professor do curso de Economia da Universidade federal do Piauí – Campus Ministro Petrônio Portella - Francisco Silva Filho, em seu artigo Evoluções e rumos da economia parnaibana, a cidade de Parnaíba vivenciou três fases distintas no seu processo de industrialização, que se inicia com as charqueadas

de Simplício Dias, até o período das indústrias. Seu equívoco temporal foi estabelecer a década de 1930, afinal a cidade já contava com várias indústrias na década de 1920, como aponta o próprio Almanaque e vários jornais da época. Vejamos:

[...] a fase atribuída aos negócios do português Simplício Dias da Silva [...], o período pertinente às atividades do português Francisco Cortez [...]e a etapa relativa às indústrias [...] que se iniciaram em 1930 [...]. Apesar das poucas indústrias existentes no município, essas tiveram importância ímpar no desenvolvimento econômico da região. (Almanaque da Parnaíba 1994, p. 61-62)

De acordo com o Almanaque da Parnaíba de 1927, deparamo-nos, por exemplo, com o registro das indústrias que surgiram na região de Parnaíba:

as indústrias de maior vulto são: Fábrica Cortez para extração do óleo do babaçu e fabricação de sabão; Usina São José de beneficiar algodão; Fábrica Aliança para beneficiamento de cereais; Fábrica Estrela, de fabricação de sabão; Fábrica de Mosaicos; Há ainda outras de sabão, bem como curtumes, calçados, chapéus, vimes, etc., em pequena escala.(1927, p. 83)

E, a partir deste processo de industrialização e exigência de uma mão de obra para o manuseio das máquinas, cada vez mais aumentava a procura por cursos profissionalizantes e a necessidade de um maior número de escolas e professores com formação específica para o exercício do magistério. Isso fez crescer o número de matrículas nas escolas. Verificaram-se também modificações sociais e culturais, as quais culminaram com uma maior estratificação social e o surgimento de uma nova “burguesia industrial”.

Parnaíba foi uma cidade que cresceu rapidamente, alavancada pela exportação de produtos de interesse no mercado internacional, como o babaçu e a cera de carnaúba. Por ser acessível, isto é, uma cidade no centro do comércio naval piauiense, bem servida por uma ferrovia que ligava o norte ao centro do estado, aparecia como uma cidade em metamorfose, uma metrópole em brotamento. Esse crescimento também se referia à ascensão cultural, dada pela proliferação de livrarias, tipografias, jornais, negócios, aumentando o número de “editores". Registrou-se um movimento sutil de escritores, reconhecidos ou não, ilustrando essa mudança.

Apresentamos abaixo os principais jornais e revistas lançados em Parnaíba entre os anos 1900 e 1928, no contexto de uma economia aquecida:

"O PIAUHYENSE" — Publicação trimensal 1900. "O NORTISTA" — Publicação semanal. Foi, talvez, o melhor jornal publicado em Parnaíba, tanto pela sua feição material, como pela magnitude dos seus artigos, destacando-se a campanha em torno da reivindicação do delta do Parnaíba, 1901."A JUVENTUDE" — Periódico literário e noticioso, 1902. "O LIBERTADOR" — Redatores diversos, publicação semanal, 1902. "PARNASO" — Redator J. Campos Véras, 1902. "O

POPULAR" — Órgão da Pharmacia Popular, Tiragem de mil exemplares. Distribuição gratuita. Única Pharmacia que possui um jornal no norte do Brasil, 1902. "RONDA" — Periódico humorístico, 1904. "A TRIBUNA" -- Órgão imparcial 1905/ 1907.

"NORTE PIAUHY" — Semanário independente, político e noticioso, 1907. "11 DE JUNHO" — Jornal de propaganda da Escola de Aprendizes Marinheiros, 1908. "O PLECTRO" — Quinzenário independente, literário e noticioso, 1908. "SEMANA" — Redatores diversos de 1910.

Doze jornais se destacaram na primeira década do século XX, quais sejam:

"AURAS DO NORTE" — Quinzenário crítico, literário e noticioso, 1911. "CIDADE DA PARNAHYBA" — Órgão político, comercial e noticioso do Partido Coligado Parnaibano, 1912.

"REBATE" — Órgão do P. R. C. Parnaibano, 1912. "CAMBIRIMBA" — Periódico indisciplinado crítico, literário, noticioso, 1912. "O

POPULAR" — Órgão literário e noticioso, publicação semanal, 1912. "O ANNO BOM" — Periódico noticioso, literário, comercial e humorístico. Circulara em dias festivos, 1913. "POLYANTHÉA" — Homenagem ao deputado Joaquim Pires, pelo seu aniversário, 1913. "MUNICIPIO" — Órgão do P. R. C. Parnahybano, 1913. "JORNAL DO

COMMERCIO" — Órgão de propaganda, noticioso, independente e imparcial. Propriedade da Alfaiataria Smart, 1914. "AGULHA" Periódico critico, humorístico e noticioso, 1914. "JORNAL INFANTIL" — Diretor Lincoln Guimarães, 1914. "O PHAROL" — Órgão da Loja Maçônica Fraternidade Parnahybana, 1914. "A ORDEM" — Órgão de uma facção do P. R. C. Publica-se semanalmente 1914/ 1916. "O

SPORT" Jornal de propaganda esportiva, 1914. "A CRUZ" — Órgão da ação social 1915. "A CHIBATA" — Jornal crítico e noticioso. Propriedade de uma sociedade anônima, 1915. "O MENSAGEIRO

CHRISTO" — órgão de propaganda protestante, 1915. "A GUERRA" — órgão da Liga Pro-Germânia, 1916.

"A SEMANA" — Jornal independente e noticioso, 1916. "O

MOMENTO" — Órgão literário e noticioso, 1917. “O IMPARCIAL” —

Publicação bi-semanal, 1917. "PARNAHYBA" — 1918.

"O CONSOLADOR" — Órgão do Centro Espirita "Perseverança no Bem". Distribuição gratuita, 1919. "O CHROMO" — Pequeno jornal literário, 1919."O ARTISTA" — Órgão da sociedade "União Progressista dos Artistas Mecânicos e Liberais". Publicação semanal, 1919. "O NORTISTA" — Órgão de propaganda comercial e desportiva, 1919. “TRIBUNA" — Órgão do Bloco Republicano Piauiense, 1919.

Vinte e oito jornais marcam a segunda os anos 1910:

"A BOA SEMENTE" — Órgão do Centro Católico, 1920. "A

PROPAGANDA" — Órgão do Comercio Piauiense. Publicado sob os auspícios da Associação Comercial de Parnahyba, 1920. "O

TRABALHO" — Órgão artístico, propagandista, literário e noticioso, 1920. "O MARITIMO" — Órgão das classes marítimas de Parnahyba, 1921. "POLYANTHÉA" — comemorativa do aniversario natalício do Sr. Francisco de Moraes Correia, 1921. "O PERDÃO” — Órgão de propaganda espírita, 1921. "A PATRIA" — Órgão do Colégio "19 de Outubro", 1921. "A CAMPANHA” — Órgão de propaganda das candidaturas Nilo—Seabra, 1921. "A IMPRENSA" Órgão de interesses gerais, 1921. "JORNAL DO COMMERCIO" — Órgão da Associação Comercial, 1922. "A CONQUISTA" — Órgão do Grêmio Literário Coelho Netto, 1922. "19 DE OUTUBRO" — Da Comissão Promotora das Festas, de 19 de Outubro. Distribuição gratuita, 1922."GAZETA DA PARNAHYBA" — Redatores Merval Véras, Castro Cavalcante e Edison Cunha, 1923."O CONSOLADOR" Órgão do Centro Espirita "Perseverança no Bem", 1923. "A NOTÍCIA— Órgão literário e noticioso, 1923. "A TRIBUNA" — Órgão político e noticioso 1924. "A RAZÃO” — Propriedade e redação de José de

Sousa Brandão e Vicente Jusselino, 1924. "ALCYON" — Jornal literário e noticioso, 1926. "MOCIDADE JORNAL" — Órgão da Mocidade Parnahyba, 1926. "PALACE-JORNAL" — Propriedade de Nastablo Ramos, Redatores Torres Raposo, R. Petit e Miguel Oliveira, 1926. “A TELA" — Propriedade de Ferreira & Filhos 1926. "O DIA" — Órgão da Dissidência, Jornal político e noticioso, 1927. "O

INDEPENDENTE" — Órgão da propaganda política pró Helvécio Coelho Rodrigues, 1927. "A VERDADE" — Jornal político, de vida efêmera, 1927. "POLYANTHÉA" — homenagem a Francisco de Moraes Correia, 1927. "A PRAÇA" — Órgão da Associação Comercial dos Varejistas. Diretor: Edison Cunha. Gerente: Benedicto dos

Santos Lima. Secretario: Ranulpho Torres Raposo de 1927. "O POPULAR" — Órgão independente e noticioso. Propriedade de uma sociedade anônima, 1928.

Vinte e sete jornais circulavam em Parnaíba na década de lançamento do Almanaque da Parnaíba. Isso mostra a capacidade de absorção literária na cidade e demonstra, ainda, a vontade da elite intelectual em promover a literatura em seus mais diversos aspectos. Todos esses periódicos da imprensa das épocas citadas acima revelam também o clima de leitura e criatividade em que a cidade vivia mergulhada. Percebemos que foram muitos os jornais e revistas que circularam durante esses anos. Os jornais seguiam as mais diversas linhas de conteúdo: noticiosos, culturais, publicitários, católicos, comerciais, literários, estudantis, classistas, espíritas. Fato era que o parnaibano possuía acesso à cultura letrada, mantinha-se informado e seduzido pelo prazer de ler.

Nas redações improvisadas, trabalhavam alguns dos expoentes da cultura parnaibana como Adonias (ilustrador), Alarico da Cunha, Padre Antônio Sampaio, Benedito Jonas Correia, Benedito de Moraes Freire, Benedito dos Santos Lima, Edison Cunha, Jesus Martins, João de Deus, José Euclides de Miranda, Nestablo Ramos, Nestor Véras, Padre Roberto Lopes, R. Petit, Ranulpho Torres Raposo, Raul Primo, Thomaz Catunda, enquanto Cristino Félix de Melo e Edméa Ferraz montavam os espetáculos da Sociedade Dramática. É perceptível, nessas pequenas listagens, que mal aparecem sobrenomes de grandes industriais, tampouco de comerciantes.

Para a formação intelectual da juventude, foram preponderantes os papéis dos professores e dos grêmios literários, da Biblioteca Pública e do cinema. Entre os professores, podemos citar: Alfredo Amstein, Benedito Jonas Correia, João Campos, José Rodrigues e Silva, José de Lima Couto, Joaquim Custódio, José Euclides. Segundo vários autores do anuário, esses nomes deixaram marcas indeléveis em sua formação acadêmica. Além disso, os grêmios das escolas parnaibanas publicavam seus jornais literários e uma revista anual. Eram publicações que prezavam pela qualidade gráfica, como as revistas Argos, do Ginásio São Luís Gonzaga, e Raios de Luz, do Colégio das Irmãs. Nelas, com maior colaboração de alunos que de professores, exibia-se literatura estudantil e percepções da cidade.