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Uma história conhecida por poucos

2 FORMAÇÃO DOCENTE

2.4 Uma história conhecida por poucos

Antes de instituir o Programa, tal como foi apresentado, aconteceram diversos fatos, entraves, empecilhos, alterações... Uma história anterior à efetivação do Programa... Acontecimentos que mudaram o rumo da proposta inicial. Vários professores comprometidos com a Educação em nosso país participaram desde o início, desde a semente proposta pelo então Ministro da Educação (atual senador) Cristóvam Buarque. Transcreve-se a seguir uma entrevista inédita realizada com o professor Dr. Romulo Campos Lins, que conta esta história tal como conhece:

Eu estava outro dia fazendo as contas, eu acho que o edital talvez tenha saído no final de 2003... Saiu um edital para selecionar propostas de trabalho e cada uma se transformaria em um Centro em várias áreas. Uma área, por exemplo, era a nossa – Educação Matemática, Científica e Ambiental, outra era Língua Portuguesa. Cada uma destas duas teria cinco Centros. Depois, tinha uma que era

engraçada, porque na minha cabeça ela misturava coisas estranhas, tipo Artes, Filosofia e Educação Física, mas isto eu não me lembro bem... Esta área teria 3 Centros. História e Geografia mais 3 Centros, e assim por diante. Mas era uma coisa nova, que fosse edital e que o MEC sempre chamava as pessoas. O edital convocava instituições – Universidades Públicas (estaduais, federais ou municipais) ou Fundações. Tenho quase certeza que não podiam ser particulares. Então houve uma seleção e com isso esses cinco Centros da nossa área, 5 de Língua Portuguesa, enfim... A UNESP/RC foi uma das selecionadas e eles compuseram a Rede Nacional de Formação Continuada, que tinha por objetivo implementar uma política de ação do governo federal no Ensino Fundamental e Médio que é o que não é da competência do governo federal. Então eles precisavam criar uma estratégia indireta de intervenção e a primeira estratégia que eles tiveram a ideia foi criar esta Rede que estava associada à ideia de oferecer parcerias para os Sistemas Educacionais – municípios e estados – com o financiamento do FUNDEF principalmente. Aconteceu o seguinte... Esse projeto inicial da Rede era fundamentado, ele se sustentava na proposta do então primeiro Ministro da Educação do governo do Lula, que foi o Cristóvam Buarque, que era a ideia de fazer a chamada certificação. Então os professores teriam que fazer exames para poder exercer a profissão. Inclusive você poderia ter até uma diferenciação, uma remuneração adicional para quem tivesse 'qualificação positiva'. A ideia era que o governo iria cobrar, via certificação, via prova, e diria para os professores: 'Nós estamos cobrando de vocês e aqui nós estamos oferecendo uma espécie de contrapartida que é essa Rede Nacional de Formação Continuada. Então, vocês agora façam parcerias com eles... tem dinheiro do FUNDEF e de outras fontes de financiamento... e vocês façam projetos de capacitação docente, tendo em vista esta certificação.' A ideia seria de que os municípios e estados fossem procurar os Centros, que eles tomassem iniciativa. E a gente usaria então nossos conhecimentos que estavam expressos nos projetos – que eram diversos, cada Centro tinha seu projeto... O da UNESP/RC, por exemplo, o centro dele era combinar em uma coisa só Educação Matemática, Científica e Ambiental. Em outras Universidades estas coisas eram desarticuladas, eram como se fossem 3 áreas dentro de uma. Então faríamos parcerias... Vamos supor que a prefeitura municipal de Campinas fizesse uma parceria com a gente para capacitação associada à certificação. Então

a gente faria um projeto especial para eles... do jeito que eles dissessem que queriam... eles apresentariam as necessidades e nós desenvolveríamos atividades, propostas para auxiliar nestas dificuldades. Nós teríamos um material básico, mas poderia ser perfeitamente pertinente produzir material novo, adaptado à necessidade deles. Poderia enfatizar mais a área de Ciência, de Matemática... O que aconteceu é que o Cristóvam foi 'derrubado' por causa, exatamente, da proposta de certificação. Quem derrubou o Cristóvam foi o corporativismo dos professores, que são uma categoria muito forte, embora pareça que não, mas politicamente é uma categoria muito forte, porque é muito grande, alcança o país inteiro, a população inteira. É difícil você encontrar uma casa que não tenha relação com o professor... Ou uma pessoa é professor, ou o filho estuda, ou a pessoa trabalha na casa de alguém que tem criança que estuda, enfim... O outro corporativismo foi do pessoal da Pedagogia, que resolveu fincar o pé, que esta não era uma atitude correta para intervir no Sistema... E todas as críticas que estamos acostumados... que prova não avalia... Aí o Cristóvam caiu e caiu a certificação. O que aconteceu é que a gente tentava 'vender' convênios e ninguém tinha interesse. Eles não tinham demanda, não tinham pressão, nada estava sendo cobrado deles. Os cinco Centros da nossa área poderiam oferecer convênio para o Brasil inteiro. Só que isso não funcionava porque alcançar os municípios era muito difícil. A gente se deu conta de que exigia uma estrutura profissional que nós não só não tínhamos, como não sabíamos como fazer funcionar, como não tinha dinheiro para fazer isso funcionar. Então, nós precisávamos de dinheiro para começar a ganhar 'contratos', para poder depois desses contratos manter uma equipe. Isso não funcionou e foi para todo mundo. Todo mundo estava 'quebrando a cara'. Quebrando a cara quer dizer 'ninguém estava conseguindo parcerias'. Um dia, isso eu não lembro se era gestão do Fernando Haddad ou se ainda era o Tarso. Um dia, nós fomos chamados para uma reunião em Brasília – os cinco Centros – e praticamente a gente recebeu a notícia de que uma ordem havia vindo do Gabinete da Presidência, que o MEC teria que fazer um projeto de grande alcance para trabalhar com professores de primeira à quarta séries do Fundamental, nas áreas de Matemática e Língua Portuguesa, com o objetivo de melhorar, em curtíssimo prazo, as notas do SAEB e o IDEB (Indice de Desenvolvimento da Educação Básica). Me lembro que chegaram a mencionar que o IDH seria uma referência. Que

teria que existir interesse, se possível em melhorar o IDH de certas regiões. Quando eles falaram isso, as áreas selecionadas para ter o Pró-Letramento – vou te dar só alguns exemplos – Vale do Jequitinhonha, não era o estado de Minas Gerais, era o Vale do Jequitinhonha, e isso me chamou muito a atenção; o estado do Piauí era outro, mas o Piauí é um estado terrivelmente pobre; acho que Tocantins também... estados da região Norte... Sul e Sudeste não tinha praticamente nada, só o Vale do Jequitinhonha, talvez o Vale do Ribeira também... Eram regiões consideradas abandonadas, regiões pobres e com muito déficit, que não se costumava prestar muita atenção nelas. Eles falaram que tinha que ser um esquema multiplicativo porque iria ter que alcançar muitos professores e a ideia é que fossem parcerias. Então, nós não iríamos trabalhar diretamente com os tutores do Piauí. Nós formaríamos uma equipe de pessoas do Piauí, trabalharia com eles e eles é que iriam trabalhar com os tutores do Piauí e esses tutores por sua vez iriam trabalhar com os cursistas. Porque a ideia original seria não só fazer a formação dos cursistas na ponta, mas fazer uma espécie de transferência de tecnologia de formação. Nós iríamos passar para esta equipe parceira no estado, ou na região. Essa equipe poderia ser da Universidade, da Secretaria de Educação, ou uma combinação dos dois, poderia ser uma equipe montada a partir de pessoas físicas... como eles quisessem, não era um convênio Institucional. Ninguém fez isso. Eu acho que o único caso que eu conheço, que foi feito, foi a gente que fez no Paraná. A equipe era toda do Paraná e operava com total independência. O resto... o Rio de Janeiro a equipe deles é que ia dar curso. A gente tentou fazer no Piauí, mas não conseguiu montar uma equipe por desconhecimento local. Se fosse hoje em dia eu já teria uma equipe tranquilo, que é o pessoal da Secretaria Municipal de Teresina, mas na época não. A própria UNESP fez Amazonas, São Paulo – São Paulo tudo bem que seríamos nós mesmos. Mas os outros grupos, por exemplo, a UNISINOS foi fazer Bahia. Nós é quem iríamos fazer lá, já tínhamos um grupo todo acertado, eu tinha conversado com as pessoas e seria uma equipe toda baiana – eles têm muita experiência nesta área lá – aí a UNISINOS assumiu e decidiu que eles mesmos iriam fazer a formação. Então aconteceu exatamente o que não era para acontecer, um boicote da ideia da Rede, da ideia da transferência da capacidade de formação. Então, o espírito do projeto, para o MEC, na verdade nunca cobrou esta transferência, ele queria ver os resultados. E como começou

a chover resultados o MEC jamais cobrou. Esse é um aspecto que merece um doutorado. A princípio era para ter cooperação, a solicitação deveria vir dos professores, mas não aconteceu. Era para ter cooperação na elaboração do projeto, na escolha de tudo desde o começo, o que seria, como seria... A criação do material base foi feita exclusivamente pelos Centros. Eles (o MEC) falaram para a gente: 'Vocês têm que produzir um material em tanto tempo'. Esse material fomos nós quem concebemos a estrutura dele e fomos nós que fizemos uma divisão do território – dois Fascículos para cada Centro. Fizemos uma proposta para o MEC de quanto pagariam por cada Fascículo e acabou, foi isso. Não teve discussão entre os Centros, nem mesmo pessoas do mesmo Centro chegaram a opinar na construção do Fascículo por seus pares. O material acabou ficando, cada Fascículo, com a concepção dos próprios autores. Então, o espírito da Rede nunca de fato foi contemplado, infelizmente2. (informação verbal)

Diante do exposto, passa-se a descrever o material-base utilizado em Rede Nacional para o desenvolvimento do Programa.

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