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UMA OBRA HUMANISTA

No documento 2008JeanJacquesDutraBerthier (páginas 64-81)

Há uma fatalidade que, tanto na vida como nos romances parece arrastar os homens.

Erico Verissimo

Em um aspecto geral o humanismo pressupõe uma concepção do humano como centro da vida e das relações entre os indivíduos e as sociedades. Para Paviani (2000), “ o ser um humano não é um adjetivo, uma qualidade, mas um modo fundamental de existir no mundo”106. Nesse sentido, pode-se afirmar que todos os homens são iguais e estão sujeitos aos mesmos direitos e deveres fundamentais. Para Bombassaro (2000), “a unidade do humanismo efetiva-se na multiplicidade de suas realizações.”107

O romance

O prisioneiro

traz à discussão, a propósito da guerra que se desenrola no sudeste asiático, não só o problema político específico e a permanente incapacidade de solução para uma questão tão antiga, mas também o absurdo que significa a guerra no plano de uma necessidade, declarada ou oculta, e na manutenção de uma prática que, ironicamente, tem por fim assegurar o fenômeno que se chama “civilização”. Conscientemente, Erico diz que “não é ingênuo nem pretensioso a ponto de esperar que um romance seu possa ter a força de alterar o curso da História ou mesmo de influir na solução dos muitos e complexos problemas do homem moderno”,108 mas não deixa de

buscar com a publicação do texto uma forma de alertar o leitor para as atrocidades cometidas em nome de valores questionáveis.

106PAVIANI, Jayme. O humanismo latino no processo de globalização. IN:

Globalização e Humanismo

Latino

. EDIPUCRS: Porto Alegre, 2000. p.27.

107BOMBASSARO, Luiz Carlos. O humanismo latino no processo de globalização. IN:

A dignidade

humana na era da globalização

. EDIPUCRS: Porto Alegre, 2000. p.213.

Na tentativa de organizar a produção em prosa da literatura brasileira posterior ao decênio de 1930, Alfredo Bosi (1999) propõe um esquema que a divide em quatro tipos de romances, quais sejam:

romances de tensão mínima

,

romances de tensão

crítica

,

romances de tensão interiorizada

e

romances de tensão transfigurada

. Para tanto, utiliza como fator determinante nessa classificação a representação do

herói

, ou como ele mesmo coloca, do

anti-herói

romanesco mas exatamente do seu crescente grau de tensão com o mundo. O autor faz uma advertência no sentido de que há modos diversos entre os autores de apreender o

ambiente

e de ficcionalizar as

ações

.

Dentre os quatros tipos propostos, o de maior interesse é o

romance de tensão

crítica

pois é sob a égide deste tipo de romance que se pode ampliar a compreensão da obra de Erico Verissimo. Embora haja a presença do conflito nos quatro tipos de romance concebidos por Alfredo Bosi, no primeiro

de tensão mínima, esse conflito

configura-se em termos de oposição verbal, sentimental quando muito: as personagens

não se destacam visceralmente da estrutura e da paisagem que as condicionam

109.

Coincidindo com a maturidade do escritor, tem-se uma nova conformação narrativa, resultando então no que Alfredo Bosi (1999) chamou de

romances de tensão

crítica.

Neles, a permanência do conflito é inconteste, mas assume nova feição. O herói, pedra angular da classificação, passa a opor-se e a resistir

agonisticamente às pressões

da natureza e do meio social, formule ou não ideologias explícitas, o seu mal-estar

permanente

.110 Nesses romances, muda o perfil do herói e também dos fatos que compõe o contexto narrativo. Ainda segundo Bosi, desenvolvendo a idéia do

romance

de tensão crítica

, tem-se que :

os fatos assumem significação menos “ingênua” e

servem para revelar as graves lesões que a vida em sociedade produz no tecido da

pessoa humana: logram por isso alcançar uma densidade moral e uma verdade

histórica muito mais profunda.

111

Nessa perspectiva, a obra

O prisioneiro

traz uma nova verdade sobre o humano. Já não há mais a possibilidade de uma convivência pacífica e indolor com o meio. Há, isto sim, um confronto, uma tomada de posição, explícita ou não, que coloca os heróis

109BOSI, Alfredo. op. cit. p.392 110Idem. Ibidem. p. 392. 111Idem. Ibidem. p.393.

desse romance em constante desequilíbrio com o mundo que os cerca. Com isso, os fatos, ou as ações passam a ser representativos desse desconforto, pressupondo a necessidade de uma leitura criteriosa e atenta para o entendimento da amplitude da sua dimensão.

O conteúdo político, presente em

O prisioneiro

, obedece a uma lógica que coloca em xeque o lugar do humano. Fecha-se o círculo da crise da liberdade. Finais trágicos – o desaparecimento e a morte – é o que encontram tais personagens, convergindo para uma espécie de impotência e fracasso frente aos problemas que tentaram superar ao longo da narrativa. Uma vez que se considera a personagem como representação do humano, os dramas experimentados por tais personagens alimentam uma certa descrença em relação ao lugar do homem na sociedade dita civilizada. A leitura de

O prisioneiro

propicia momentos de reflexão sobre as impossibilidades e impedimentos de uma ausência de liberdade, mesmo que os regimes de Estado insistam em se intitular democráticos ou libertários.

Dando uma dimensão detalhada de sua circunstância pessoal, Erico Verissimo se dispõe a fazer uma confissão como se, com isso, “fosse capaz de libertar-se ou aliviar-se de um remorso”, num discurso que, dirigido a um outro, é também uma forma de aproximar-se de si mesmo, de rever comportamentos e refletir sobre o modo eles se mostram na sua escrita literária. Diz o autor:

Sou um sujeito perseguido por um sentimento de responsabilidade e culpa. Não consigo ficar indiferente nem calado diante da injustiça social ou individual (falo em justiça), nem diante da brutalidade das ditaduras. É por isso que, quando menoseuespero, o inconsciente me atira os elementos com que acabo escrevendo livros...112

O idealismo do autor gaúcho é, necessariamente, uma atitude que se volta para o homem na busca de ideais realizáveis ou não, porém antevistos e imaginados como de alguma maneira exeqüíveis. É, portanto, um

idealismo humano

, pois leva em conta a ação do homem, particularmente a ação do homem em sociedade.

112BORDINI, Maria da Glória. (0rg.). A liberdade de escrever: Erico Verissimo. Porto Alegre: Ed. Da

Nessa medida, é possível, mais que inferir, concluir que um romancista como Erico Verissimo não pode senão ser um inconformista, um sujeito que vive e atua num contexto que lhe diz respeito, e no qual se insere como parte da “engrenagem”, a qual não apenas vislumbra, mas de alguma maneira, busca modificar. Tal condição é expressa pelo escritor em

A liberdade de escrever

:

Não vejo como um romancista que escreve sobre estes nossos tempos, possa deixar de focar os problemas sociais e políticos que lhe estão saltando na cara, todos os dias113.

Um romance, no entanto, mesmo enfocando os problemas sociais e políticos de todos os dias, não os resolve, porque o seu objetivo não é esse. O romance, ou melhor a literatura, tem como mote a recriação desse universo conhecido pelo leitor, mas não atua diretamente na sua transformação, inscrevendo-se verdadeiramente na consciência daquele que a lê. Erico Verissimo deixa claro qual é a verdadeira função de uma romancista:

A missão do romancista é a de, ao contar suas histórias, ser fiel a si mesmo e a de resistir a todas as formas de totalitarismo, a de repelir qualquer forma de censura e opressão, a de ajudar a manter a dignidade da pessoa humana, a de dar a sua contribuição pessoal para uma interpretação do mundo, da vida ou do meio em que vive, e a de não esquecer nunca que é um artista e não um bobo da corte da burguesia nem um “cachorro de Pavlov” da literatura. 114

O caráter de ocultação dos reais significados da guerra vai merecer, em

O

prisioneiro,

um tratamento diferenciado no que se refere à estruturação do romance, particularmente em relação ao lugar onde se desenrolam as ações: em tempos e espaços indefinidos. Nesse espectro inominável da guerra, as personagens, as figuras humanas imaginadas pelo autor, também sofrerão uma metamorfose: mesmo impessoalizadas, elas assumem um papel definitivo no desenvolvimento da história. Pode-se pensar que o universo liberado pelo texto, impedido de nomeação, se desvincula de suas instâncias iniciais – nomes, lugares, datas, situações – consistindo-se num corpo suscetível de

113Idem. p. 63.

apontar para além de si mesmo, até o mundo da experiência cotidiana, dos sentidos comuns aos homens, porque fala verdadeiramente de sua humanidade.

O prisioneiro

, esteticamente, é uma metáfora do desencadeamento da guerra. Para Erico Verissimo, o romance é o seu modo de fazer a arte particular da vida concreta, já que, segundo Friedrich Schelling apud Adorno & Horkheimer (1991)115 “a arte entra em ação quando o saber desampara os homens”. Nada provoca mais desamparo do que a guerra, e com ela é conduzido o texto de Erico Verissimo. O autor gaúcho preconizava um compromisso social, algo que Luckás apud Lima (1975), afirma “que a tarefa do artista é descobrir o problema (da alienação) por meio da forma artística.”116 A literatura vinculada ao que acontece na contemporaneidade corrobora o que Alfredo Bosi afirma em

Narrativa e resistência

de 2002:

A escrita resistente não resgata apenas o que foi dito uma só vez no passado distante. Também o que é calado no curso da conversão banal, por medo, angústia ou pudor, soará no monólogo narrativo, no diálogo dramático. E aqui são os valores mais autênticos e mais sofridos que abrem caminho e conseguem aflorar à superfície do texto ficcional.117

Erico reconhece que a literatura afeta o leitor no plano das emoções, onde ela pode ser mais sentida como entidade viva. Isso é comprovado quando, durante sua viagem à Grécia, em Micenas, recordando Clitemnestra e o assassínio de Agamenon, Erico se refere a Aristóteles e interpreta assim sua teoria de catarse: “a tragédia nos purifica através da piedade e do temor reverente”, acrescentando que “os homens libertaram-se de si mesmos depois que compreenderam juntos o sofrimento universal da vida”.118

115ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max.Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,

1991. p. 32.

116LIMA, Luiz Costa.A análise sociológica. In:___. Teoria da literatura em suas fontes. Rio de Janeiro,

Francisco Alves, 1975. p. 301.

117BOSI, Alfredo.Narrativa e resistência. In:Literatura e resistência. São Paulo: Companhia das Letras,

2002. p. 62.

118 BORDINI, Maria da Glória. A criação literária em Erico Verissimo. Porto Alegre: L&PM,

Localizada nas fronteiras do humanismo burguês, a sua literatura jamais abandonou o tema central da liberdade do indivíduo e, observando a divisão entre o “social” e o “humano”, chegou a esta amarga parábola de

O prisioneiro

a qual projeta simbolicamente a solidão do homem diante das ruínas que ele mesmo espalhou. Para Flávio Loureiro Chaves:

Em Erico Verissimo a praxis literária culmina no compromisso com o próprio mundo em crise para renunciar à neutralidade da linguagem, definido uma expressão que, se não é partidária em nenhum momento, vem a ser histórica e política no cerne da sua motivação. O ato de “contar a história” não nega o mundo: narra-o na existência de criaturas fictícias, procurando divisar a liberdade humana que algum dia existiu.119

O escritor propicia uma forma de relevo aos dramas humanos, os quais, embora aconteçam em algum lugar com personagens sem nomes, reduzidas a meros cargos e funções, remete a uma espécie de abstração da realidade para se pensar as suas peculiaridades: as suas normas e valores, o lugar do homem nesse universo, a sua existência particular como função social.

A teórica Maria da Glória Bordini aponta o compromisso de Erico Verissimo como escritor em

O prisioneiro

:

O confronto final que a tematização da criatividade recebe nos últimos romances de Erico é do compromisso social do artista de sua atuação na vida pública. EmO arquipélago, já se caracterizava o artista iniciante como um alienado, que só encontra seu vínculo como os outros homens ao aliar sua arte aos problemas humanos de sua gente, não programaticamente, mas ao admitir a pluralidade de possibilidades de viver e ao negar-se a rezar pelas cartilhas de partidos políticos. Trata-se da recusa às hegemonias como garantia da sanidade da arte. Através das várias figuras de intelectuais e artistas que povoam os últimos romances, reafirma-se que criar é desreprimir, o que não se obtém pela força. Esta, ao contrário, operando pelo princípio da instalação de líderes autocráticos no poder, à cassação do trabalho crítico, que bane um sociólogo pela sua busca de objetividade e admite a tortura de um guerrilheiro pelo exército invasor, emO prisioneiro.120

119CHAVES, Flávio Loureiro. op. cit. p. 106. 120BORDINI, Maria da Glória. op. cit. . p. 257.

Mesmo que se constituísse apenas como um cenário eventual, esse país imaginário criado por Erico Verissimo mimetiza uma realidade que muito se aproxima dos acontecimentos que envolveram os Estados Unidos e Vietnã. Numa perspectiva que retoma o ambiente de tortura e devastação do início do século XX, com seus inúmeros conflitos, o desenvolvimento da indústria bélica e das táticas militares, além da guerra e das ideologias,

O prisioneiro

deixa entrever uma situação que, ao mesmo tempo, remete para a idéia do “testemunho de destruição” e do resultado de uma “tomada de consciência”, que não se deixa limitar pelo espaço que a gera.121A representação da destruição e do esfacelamento das relações mostra um caminho de reflexão sobre tais acontecimentos, salientando-se perante uma camada da sociedade que parece indiferente à história. Conforme afirma o escritor, em uma entrevista a Adolfo Braga, em 1967:

Com O prisioneiro, pretendo aplicar ao leitor, supondo-o indiferente à realidade atual, um tratamento de choque, para que ele compreenda que estamos caminhando para o suicídio atômico. Procurei deixar queos personagens vivessem a sua vida, ao mesmo tempo em que os fixei como peças da grande Engrenagem (sim, até mesmo no sentido sartriano). Não gostaria que ele fosse olhado apenas como um livro político. Ele é um brado a favor dos direitos do homem .122

O que se percebe na leitura de

O prisioneiro

é que, de fato, aos acontecimentos que marcaram a guerra no Vietnã são elaborados de modo a não encobrir os danos causados, por exemplo, pela intervenção militar norte-americana, durante a qual foi lançada uma quantidade maior de bombas do que todas as da Segunda Guerra Mundial. Referindo elementos como as experiências químicas ou biológicas feitas nos Estados Unidos nesse período, Erico Verissimo, por outro lado, buscou o priorizar o plano existencial em que se encontram as personagens, utilizando-se dos diálogos entre elas, de suas dúvidas e dramas para elucidar o fio que as conduz até o paradigma existencial em que se encontram: o das suas identidades.

A violência, na perspectiva do autor não se restringe apenas à denúncia dos horrores da guerra, evidenciando-se a imagem de contradição representada pelo Tenente, mas igualmente pela Professora. O romance engloba, a um só tempo, o

121ADORNO, Theodor.Prismas. São Paulo: Ática, 1998. p. 13. 122BORDINI, Maria da Glória (Org). op. cit. p.30.

reconhecimento das atividades da Ku Klux Klan, uma organização racista norte- americana, bem como a influência da guerra sobre os países envolvidos direta ou indiretamente – já que, sem nomear a guerra, ele pode referir-se a todas as guerras – além, finalmente, de metaforizar as inúmeras “prisões” a que o homem está sujeito.

O Tenente, segundo Flávio Loureiro Chaves, “é uma personagem que representa o horror moderno, simultaneamente a violência e a impotência dos homens transformador em número, que perderam a ‘linguagem’ e já não têm um passado.”123Ele já não luta pela idéia da liberdade porque, fruto da civilização onde o humano se degradou, nunca a possui.

Uma perda de liberdade que o teórico Erich Fromm em

O Medo à Liberdade

assim expõe:

A existência humana tem início quando a falta de fixação das ações pelos instintos ultrapassa certo ponto; quando a adaptação à natureza perde seu caráter coercivo; quando o modo de agir não mais é estabelecido por mecanismos recebidos através da hereditariedade. Por outras palavras, a existência humana e a liberdade são desde o início inseparáveis.124

Com suas histórias pessoais marcadas por circunstâncias avassaladoras, o Tenente, o Coronel, a Professora remetem a “personagens” ideais, abstratos, na medida em que a realidade mesma só nos apresenta tenentes, coronéis e professoras peculiares. A guerra, no entanto, não é uma abstração, é um fato político que os homens transformam em realidade, numa espécie de instituição social absurda.

A posição autoral, mesmo que sob a vigência de um governo ditatorial e, portanto, autoritário em seu âmago, é de compromisso. O autor gaúcho, ao publicar

O

prisioneiro

, assume responsabilidades face à sociedade a seus leitores. A publicação de

O prisioneiro

é uma atitude política que pretende interferir diretamente sobre o momento histórico da sociedade em que a literatura é produzida, mas que se dirige, sobretudo, para a recuperação do humano.

123CHAVES, Flávio Loureiro. op. cit. p. 102.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A obra literária

O prisioneiro

apresenta não só a questão da guerra e da política internacional, sob diferentes perspectivas, mas também evidenciam os aspectos humanos subjacentes a questões como as relações cotidianas, a ideologia, a moral e a ética da sociedade contemporânea, visando reconhecer em todos os seres representados a idéia de que os homens são iguais – são humanos, independentemente de onde vivam, do quão ricos ou poderosos sejam.

Desse modo, o romance

O prisioneiro

traz à discussão, a propósito da guerra que se desenrola no sudeste asiático, não só o problema político específico e a permanente incapacidade de solução para uma questão tão antiga, mas também o absurdo que significa a guerra no plano de uma necessidade, declarada ou oculta, e na manutenção de uma prática que, ironicamente, tem por fim assegurar a ordem no que se chama de civilização.

A obra

O Prisioneiro

segue o estilo realista. O realismo, enquanto estilo de época, traz uma nova ordem de pensamento e de representação. Embora esteja datado historicamente - mais precisamente no século XIX – e restrito a um determinado período da história da literatura, a concepção estética herdada do realismo repercute muito além dessas fronteiras temporais. É o que se pode observar no fazer literário de Erico Verissimo, especialmente no tocante ao romance abordado neste trabalho. O realismo social de Erico Verissimo se manifesta a partir do modo como compreende a realidade e sentido da literatura, pois para ele, o escritor tem um compromisso não só com o destino da própria arte, mas também com questão política, através da qual se integra no contexto de normas ideais e coletivas de comportamento.

No romance do autor gaúcho, verifica-se a preocupação em estabelecer uma verdade baseada na observação e na descrição material das suas condicionantes. O

narrador em 3ª pessoa é mantido à distância, tem preservado seu ânimo inalterável sendo que os dramas passam a ser encenados pelas próprias personagens que os dimensionam humana e universalmente. Esses, entre outros aspectos que são analisados subseqüentemente, autorizam a leitura dos romances como de estatuto realista, em função de que trazem consigo as prerrogativas de composição do realismo, embora Erico Verissimo não tenha admitido que o realismo e até própria noção de mimese são um enquadramento da vida por um certo tipo de consciência histórica.

Erico Verissimo escolhe a guerra no sudeste asiático como tema circunstancial para examinar problemáticas como a violência, a violação dos direitos humanos, dos preconceitos e das atitudes arbitrárias que se perpetuam ao longo do tempo e, ainda, não encontram solução na sociedade moderna, pelo contrário permanecem mais acirradas.

Na composição da narrativa que tematizou o conflito e as suas origens, o autor opta pela parábola como forma pra universalizar e ampliar o campo de discussão em torno desses tópicos, cujas manifestações são recorrentes em várias partes do mundo, envolvendo povos distintos e vários momentos da história do homem. Assim, sem localizar no Vietnã e sem nomear as personagens, seu texto torna-se emblemático de todas as outras guerras de intervenção. É um conflito onde não há culpados nem inocentes. Todos estão encarcerados, sem possibilidades de opção. O Tenente, que no final da trama enlouquece, percebe que já não luta pela idéia de liberdade porque nunca a possuiu devido a uma civilização onde o ser humano se degradou.

O prisioneiro

não se torna, em momento algum, uma história abstrata ou moralista. O cenário e as ações são claramente uma representação da guerra do Vietnã,

No documento 2008JeanJacquesDutraBerthier (páginas 64-81)

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