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Uma perspectiva sócio-histórica do gênero crônica de jornal

3 AS METÁFORAS CONCEPTUAIS: EXPERIENCIALISMO, MENTE E MUNDO

4.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DO GÊNERO TEXTUAL: A CRÔNICA

4.2.1 Aspectos conceituais e empíricos relativos às concepções do gênero

4.2.1.1 Uma perspectiva sócio-histórica do gênero crônica de jornal

O termo crônica de hoje aparece nos jornais da Paraíba do século XIX como

chronica, conforme podemos constatar no gênerotextual, Anúncio, retirado do jornal da então Província: O Correio Official do Estado da Parahyba do Norte , em Parahyba do Norte 16 de Maio de 1892.

Figura 10 - Anúncio de Crônica

Fonte: Correio Official do Estado da Parahyba do Norte (1892)

Com base em Arrigucci (1987), o termo em monta remete à noção do tempo, como se nota no registro o etmo chronos do grego. Ao avaliar o termo, podemos notar que se trata de uma ação no tempo, numa memória sociocultural, que faz trazer e colocar à cena as atividades sociais, no âmbito da experiência vívida. Dessa feita, percebemos que se trata de um texto que tem um caráter histórico pela sua propriedade, isto sem esquecer que oscila entre uma ordem híbrida do tipo literária e jornalística.

Um outro aspecto relevante é que ela é histórica e reconhecida pelos leitores sociais, em especial, através do texto o Livro Sagrado, as obras Clássicas, e agora, destacamos o suporte comunicativo Jornal. O mesmo Arrigucci nos mostra que tal gênero supõe uma sociedade para qual importa a experiência progressiva do tempo,

não apenas um tempo cíclico, ou repetitivo, mas um tempo implicado numa forma narrativa. Na crônica, o ato de narrar os acontecimentos faz resgatar as experiências vívidas na tradição de uma época, de uma gente, de uma ideologia. Tal prática discursiva e comunicativa faz do cronista um artesão, um historiador, um crítico (literário) ao transformar a experiência dessa gente vívida através do gênero em fato histórico.

As crônicas, que aparecem no jornal da província, não têm um único cronista, mesmo se tratando do mesmo jornal da mesma década. Vê-se que há uma variação de autor. Este, ora assina pelo seu dizer, ora pseudonomiza, ora não assina. Assim, como vemos que não é um texto freqüente nos periódicos daquela época, o que justifica a escassez de textos colhidos para a constituição do corpus da pesquisa desse século XIX.

Com base nos estudos de Cândido (1992), tal prática social e comunicativa nesse século não tinha ainda uma configuração, quanto à definição de gênero textual, como se apresenta hoje, como um produto moderno sempre presente nos jornais, entre outros suportes de comunicação, de modo que, muitas vezes, tomavam-na como um gênero folhetinesco, como conto, ou até mesmo como texto de opinião. No jornal, tal opinião se difunde por meio de uma ficção fantasiosa, como uma invasora do mundo real, uma espécie de “motor de arranque” do cotidiano, cuja estratégia é a metáfora que faz entrar o pensar social no mundo dos significados socioculturais, pelos atos de fala, pela crítica sutil, meio “à toa”. Quanto a esses aspectos, a análise evidencia, nesse gênero, os aspectos de pensar o mundo socialmente, conforme os significados socioculturais, pontuados nas expressões linguísticas guiadas pelas metáforas conceptualizadas nesse mundo.

É relevante compreender que essa língua(gem) histórica estrategizada, diante de um contexto histórico, mostra que há a questão da historicidade dessa língua nesse gênero, nas tradições discursivas. Tratar desse ponto é trazer à tona os estudos históricos da língua, os fatores da mudança da língua no tempo, tendo em vista que tal uso remete ao conhecimento do domínio da língua nesse século, visto que a crônica tem uma disposição estrutural funcional, cuja relação entre oralidade e escrita é bem evidente, o que nos faz conhecer o sistema da língua nessa fase histórica; alem do mais pode servir para se analisar e explicar as metáforas conceptuais nas crônicas que foram selecionadas.

Com base nisso, deve-se esclarecer que não é nossa pretensão acompanhar o passo a passo dos falares parahybanos, quanto ao uso ortográfico de uma história social e uso linguístico, mas pontuar, através desse registro, as construções metafóricas configuradas nesse uso. Como se sabe, a história da língua também permite entrar na história social das gentes, dos grupos sociais, quanto ao pensar uma época, este manifestado no jornal.

Gomes (2007) nos mostra que esse século XIX trouxe um cenário de lutas políticas em busca de urbanização, com a chegada dos imigrantes, o que contribuiu para o avanço de questões socioeducacionais, sociopolíticas e culturais. Dessa forma, o jornal recebeu beneficio de obter mais leitores. Tal fato também evidenciou o registro da língua, como diz Mattos e Silva (2002). Foi um período significativo na história da Língua Portuguesa do/no Brasil. Muito embora, resta esclarecer que, conforme está registrado nas estruturas linguísticas, em nosso corpus, não havia uma regularidade, ou um critério para um registro formal, o que suscitava uma reforma ortográfica. Havia uma presença marcante de uma mixagem da língua latina, francesa e portuguesa de Portugal.

Figura 11 - Crônica: O Natal

Fonte: - Verdade. Cidade D’areia, Província da Parahyba do Norte Anno I, 1888.

Através da figura acima, constamos nas crônicas que, naquele contexto, o espaço dos falantes passava por uma variação cultural exacerbada, isto é, uma mesma língua se marcava pelo uso, ora do clássico e ora do não-clássico, pelos falares e expressões dos imigrantes que estavam chegando ao Brasil.

Acerca desse uso, Castilho (2001) assegura que o século XIX é um período histórico da língua por guardar muitas revelações acerca das tradições comunicativas e discursivas, por meio das tradições de uma época em que os usos deixaram ora mudança, ora permanência. Quanto à dimensão estrutural do gênero, a organização discursiva não apresentava diferença quanto às crônicas registradas nos jornais de hoje. Uma das características divergentes é a extensão de algumas crônicas que, se longas e, ainda sem o título, nomeadas apenas pelo gênero. Em

algumas crônicas, aparece, no periódico da província parahybana, o título em grande destaque: CHRONICA. De um modo geral, aquelas crônicas assemelham-se às de hoje, mas sem a titulação do texto tematizando o gênero. Quanto à estrutura composicional, comprovou-se haver certo padrão de regularidade, tanto nessa estrutura como nas formas de conduzir o discurso, seja pelas colocações de pontos de vista, seja pelas expressões metaforizadas.

Quanto à dimensão temática, a crônica “de então” se propunha aos mesmos fins: trazer à reflexão uma questão, um fato do momento, como: A seca, O coqueiral,

O sal, e, muitas das vezes, a temática não estava à amostra pelo título, conforme já

dito acima, pois constava o nome do gênero. Como prática de ato de linguagem, ela reflete as tendências sócio-ideológicas e, ao mesmo tempo, dá abrigo à memória cultural, tem caráter subjetivo e atua de público na incorporação dos traços culturais da sociedade em vigência. Diante disso, ainda é mister mostrar que atua nas emoções, no ato de cidadania, de modo que o leitor mergulha (in)conscientemente nas discussões sociais. E, de modo pragmático, leva o leitor a ler o jornal cotidianamente. Com isso, vemos que o gênero atrai o leitor em busca de interação e de reflexão daquele dizer.

4.3 LINGUAGEM METAFÓRICA DA CRÔNICA DE/NO JORNAL: PROPRIEDADE