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1. Fundamentação Teórica

1.2. Definição de Conceitos

1.2.1. Evolução histórica dos conceitos:

1.2.1.5. Umberto Eco

Eco considera que apesar do conceito de metáfora ser estudado desde tempos remotos, quando os dicionários correntes a tentam definir ficam usualmente

atrapalhados (Eco, 1994: 206). São elucidativas as seguintes palavras do autor de O

prazer do texto:

“ Transferência do nome de um objeto a outro objeto por relação de analogia” (mas a relação de analogia é precisamente a relação metafórica); “substituição de um termo próprio por um termo figurado (sendo a metáfora espécie do género figura, define-se a metáfora como uma sinédoque);”similitude abreviada…” Estamos sempre nas definições clássicas (…); e para o resto têm-se nos melhores dos casos tipologias dos vários tipos de substituição, de animado a inanimado, de inanimado a animado e de inanimado a inanimado, quer em sentido físico quer em sentido moral; ou substituições praticadas sobre o nome, o adjetivo, o verbo, o advérbio (…)”.

Ao refletir-se sobre tudo o que se escreveu sobre este conceito ao longo da história, pouco se acrescentou aos conceitos definidos por Aristóteles. Eco (1994: 201) afirma-o perentoriamente: “ […] depressa nos damos conta de que dos milhares e milhares de páginas escritas sobre a metáfora, poucas acrescentam alguma coisa aos dois ou três conceitos fundamentais enunciados por Aristóteles”.

Eco insiste no valor cognitivo da metáfora. Ela não serve apenas para surpreender ou embelezar, mas mostra-nos novos aspetos das coisas, estimula a nossa reflexão de oposições e semelhanças entre as coisas e as unidades culturais. O pensamento do autor foca-se na dicotomia entre a metáfora e a metonímia em termos de fenómenos de “dicionário e enciclopédia”. O conhecimento “dicionarístico” diz respeito às características formais do objeto referido, ou seja, a forma como o objeto é identificado no mundo com identidade própria. O conhecimento enciclopédico é o conhecimento que se tem das situações contextuais possíveis, onde o objeto estabelece as suas relações, a partir das quais se afere o significado de uma palavra. Neste sentido ele afirma:

“ (…) um dicionário apenas revela as propriedades imediatamente descritíveis de um dado semema (a antiga retórica diria: o seu conteúdo concetual) ao passo que a enciclopédia releva também todos os conhecimentos acerca dos contextos onde o lexema definido virá a encontrar-se (e daí as contiguidades metonímicas, e as inferências em termos de conhecimento extralinguístico)” (Eco, 1994: 215).

Neste sentido, explicita que: “[…] as propriedades dicionariais são artifícios de economia metalinguística através dos quais se evita enunciar uma longa lista de propriedades enciclopédicas” (1994: 215 e 216). A propósito desta distinção, Miguens refere o seguinte:

“Recorde-se que com estes termos Eco pretende nomear antes de mais a diferença entre duas formas de análise semântica: de um lado temos traços ou propriedades semânticas imediatamente, e necessariamente descritíveis de uma determinada palavra, do outro lado temos descrições dependentes de conhecimentos quanto ao contexto”(Miguens, 2001-2002: 97).

Isso implica que as metáforas sejam fenómenos de enciclopédia. A este propósito refere Miguens (2001-2002: 97 e 98):

“As metáforas assim entendidas não são portanto (ou pelo menos não são necessariamente) fenómenos intencionais, voluntariamente provocados pelos falantes das línguas naturais, antes resultam da conjunção entre a natureza do texto, o conjunto de signos com que alguém se depara, e a estrutura da enciclopédia, i.e. a rede total de conhecimentos dessa pessoa. Elas são assim fenómenos pragmáticos, de contexto”.

Eco considera que falar de metáfora é falar da atividade retórica em toda a sua complexidade. Por isso é difícil considerá-la sem falar de sinédoque e de metonímia. Ao falarmos desta temática, de acordo com este autor, movimentamo-nos entre duas opções (1994: 201):

“a) a linguagem é por natureza, e originalmente, metafórica, o mecanismo da metáfora funda a atividade linguística e toda a regra ou convenção posterior nasce para reduzir e disciplinar (e empobrecer) a riqueza metafórica que define o homem como animal simbólico; b) a língua (e qualquer outro sistema semiótico) é mecanismo convencionado regido por regras, máquina previsional que diz que frases se podem gerar e que frases se não podem gerar, e quais das que se pode gerar são “boas” ou “corretas”, ou dotadas de sentido, e desta máquina a metáfora é a avaria, o sobressalto, o resultado inexplicável e ao mesmo tempo o motor de

renovação”.

Mas o mesmo Eco acrescenta:

“Se a metáfora funda a linguagem, não se pode falar da metáfora senão metaforicamente. Toda a definição da metáfora não poderá então ser senão circular. Se, pelo contrário, existe primeiro uma teoria da língua que prescreve os seus resultados literais, e desta teoria a metáfora é escândalo (ou deste sistema de normas é violação), então a metalinguagem teórica deve falar de alguma coisa para cuja definição não foi construída. Uma teoria denotativa da língua pode indicar os casos em que a língua é usada incorretamente e, contudo, parece dizer alguma coisa: mas atrapalha-se se tiver que explicar que coisa e porquê. Chega, por conseguinte, a definições tautológicas do tipo: “Tem-se metáforas todas as vezes que acontece algo de inexplicável que os utentes da língua advertem como metáfora” (Eco, 1994: 201).

Por isso é difícil definir o conceito de metáfora. Será que pertence à Linguística ou à Semiótica? À filosofia? Às Ciências Sociais? Parece claro que este processo cognitivo do ser humano é estudado por várias ciências, cada uma dando a sua contribuição e as suas conclusões devem estar cada vez mais imbricadas para melhor percecionarmos este fenómeno. Mas, e de acordo com este autor, de uma coisa há certeza (1994: 243):

“(…) o êxito da metáfora é função do formato sociocultural da enciclopédia dos sujeitos interpretantes. Nesta perspetiva só se produzem metáforas com base num rico tecido cultural, ou de um universo do conteúdo já organizado em redes de interpretantes que decidem (semioticamente) da similaridade e da dissimilaridade das propriedades”.

Para melhor produzir e compreender metáforas os sujeitos falantes precisam de estar rodeados de um rico tecido sócio-cultural. E conclui (1994: 244):

“(…) em todo o caso, pensou-se durante muito tempo que para compreender metáforas fosse preciso conhecer o código ( ou a enciclopédia): a verdade é que a metáfora é o instrumento que permite compreender melhor o código (ou a enciclopédia). É este o tipo de conhecimento que reserva”.

Para este autor, o verdadeiro conhecimento só se alcança através da metáfora, estando dependente não só da forma como os signos lexicais se organizam, mas também do conhecimento do contexto que o sujeito falante tem.