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4.2 Fernando Lugo: a quebra da hegemonia colorada

4.2.2 UNASUL, MERCOSUL e Paraguai: o impeachment de Lugo e a volta dos

ressentimentos históricos

Quando iniciou seu mandato, Fernando Lugo se deparou com um Estado extremamente fragilizado, suas instituições estavam no poder de uma elite política com uma forte rede de clientelismo que exercia poder em todo o território paraguaio, reflexos da herança da ditadura de Strossner. Diante desse legislativo e dos grupos de interesse privado, dificilmente o executivo teria alguma autonomia para atuar (CARDOSO, 2010). Além das elites, a cúpula militar ainda exercia grande influência na política do país, e não olhava com bons olhos para o novo governo. Mesmo promovendo uma série de mudanças internas, chegando até mesmo a mudar a cúpula militar cinco vezes (ABDUL-HAK, 2013), e ainda conceder ministérios para grupos rivais de seu vice (CARDOSO, 2010) para diminuir seu poder de influência, já que Federico Franco também passou a conspirar contra o governo Lugo, era iminente que a força política de Fernando Lugo fracassasse e um novo golpe acontecesse. Como aponta Cardoso (2010, p. 152), “o descontentamento popular cria um clima politicamente instável” e o Partido Colorado soube

aproveitar dessa insatisfação da população para levar adiante mais um golpe político na história paraguaia.

O não cumprimento das promessas de campanha, principalmente a questão da reforma agrária está diretamente ligado ao fato da pouca autonomia do presidente diante do legislativo, de maioria do Partido Colorado. Ou seja, as medidas que Lugo gostaria que implementassem em seu governo acabavam sendo barradas no congresso que não estava interessado em mudar a realidade social e econômica do país (CARDOSO, 2010).

Atendiendo a lo anterior, resulta fácil reconocer algunos de los elementos que se presentaron en la destitución de Fernando Lugo: a) una frágil coalición, indisciplinada y con intereses opuestos; b) un Congreso proactivo que activó la figura del juicio político tras muchas amenazas4 y; c) un cierto descontento o desencanto entre la sociedad, derivado de la corrupción y la tibia actuación gubernamental en torno a los problemas sociales y a la reforma agraria que se presentaron en su momento como los principales retos del gobierno (VILLAGRA; DELGADILHO, 2012, p. 5).

Esse não cumprimento serviu como brecha para uma possível destituição por mau desempenho de suas funções como presidente. Antes do processo oficial, Lugo já lidava com a iminência do golpe, já que diversas reuniões com partidos de oposição e até mesmo com membros do partido liberal – como seu próprio vice - que apoiaram Lugo nas eleições já estavam ocorrendo às escondidas (CARDOSO, 2010). O episódio que pôs em xeque seu governo foi o acidente em Curuguaty, em junho de 2012, quando houve um confronto entre as forças policiais paraguaias e alguns campesinos que estavam protestando contra a reintegração de posse de uma propriedade pertencente a um membro do Partido Colorado. Nesse confronto, a polícia, treinada pelo exército dos Estados Unidos, acabou se desentendendo na negociação com os líderes campesinos e houve um tiroteio, deixando um saldo de 17 mortos, sendo 6 policiais e 11 campesinos (SEVERO, 2017). Alegando o não cumprimento de suas funções, principalmente em manter a ordem no país, o Partido Colorado rapidamente votou para o impeachment de Fernando Lugo e em menos de três dias, sem sequer ter tido tempo para a defesa, houve a deposição e quem assume a presidência do país é seu vice, Franco.

A notícia da destituição de Lugo não foi bem recebida pelos outros países, sobretudo por Brasil e Argentina. A destituição foi considerada um golpe parlamentar e, como acordado pelo Tratado de Ushuaia I, só poderiam fazer parte do bloco países cujo regime fosse a democracia. Assim como em 1996, Brasil e Argentina interferiram na crise política paraguaia, dessa vez

tomando a decisão – em conjunto com os outros membros dos blocos – que o Paraguai estaria suspendo da UNASUL e do MERCOSUL até que sua situação fosse regularizada. O Paraguai não concordou com a decisão e naquele momento os ressentimentos históricos para com seus dois maiores vizinhos voltaram, gerando uma crise política que colocaria à prova a efetividade das organizações regionais, sobretudo a UNASUL, em estabelecer uma zona de paz, segurança e cooperação, além do próprio fortalecimento da democracia (UNASUL, 2008).

Tendo em vista essa crise política e o ressentimento com as potências regionais, é notório que Federico Franco aproveitou para voltar a estreitar relações com os Estados Unidos, e buscar novas formas de inserção internacional, a exemplo do ingresso na Aliança do Pacífico (GEDES, 2012), bloco formado por Chile, Colômbia, México e Peru com fins comerciais. Concomitantemente, Federico Franco também declarou a existência de uma grande quantidade de petróleo na região do Chaco (GEDES, 2012), o que certamente acabou preocupando Brasil e Argentina com uma possível ingerência estadunidense em busca desse recurso estratégico.

Além do receio com uma nova intervenção dos Estados Unidos, Brasil e Argentina eram bastante criticados por não conseguirem resolver a crise política paraguaia, o que aumentou ainda mais com a entrada da Venezuela no MERCOSUL. O Paraguai não aceitava a decisão de suspensão do bloco pela cláusula democrática e pouco tempo depois a entrada da Venezuela no MERCOSUL, outro país que aos olhos do Paraguai, não era um governo democrático. Esse questionamento deixou evidente que Brasil e Argentina não se preocuparam com a situação política da Venezuela, mas no interesse estratégico da entrada desse país no MERCOSUL. Por outro lado, também declararam que assim que a situação do Paraguai fosse normalizada, ou seja, quando convocassem novas eleições e o novo presidente assumisse, as suspensões dos blocos seriam retiradas. E assim foi feito com a eleição de Horácio Cartes, em 2013.