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1. O COMPARTILHAMENTO DE RECURSOS NATURAIS ENTRE ESTADOS E OS

1.3. UNITIZAÇÃO E JOINT VENTURES

A instrumentalização das mencionadas vantagens oferecidas pela unitização das atividades de petróleo e gás quando se encontram compartilhados direitos exploratórios e de produção acerca dessas operações se cristaliza através de um acordo formalmente estabelecido e pactuado entre os entes envolvidos, sejam eles pessoas físicas proprietários dos imóveis contíguos, sejam concessionários, licenciados ou autorizados pelo poder estatal a proceder a consecução dessas atividades, sejam ainda Estados soberanos que dividem entre si reservas e campos petrolíferos e gasíferos, detendo conjuntamente, e não separadamente, direitos correlatos de aproveitar econômica os frutos que se oferecem.

Ditos acordos internacionais, conforme já se destacou anteriormente53, tanto podem

se efetivar entre países que possuem suas fronteiras convencionalmente delimitadas, quanto entre outros que não possuem definição quanto à matéria. Todavia, em ambos os casos destaca-se uma semelhança: os acordos formulados encartarão dispositivos típicos e outros especiais das reconhecidas joint ventures empresariais.

Bernard Taverne, em análise comparativa do instituto internacionalmente conhecido das joint ventures com as instituições criadas pelos Acordos de Unitização, considera existir um relacionamento estreito, em termos jurídicos entre as joint ventures e os Acordos de Unitização a fim de operar toda a área unitizada54. Percebe-se, pois, que semelhanças patentes se verificam, como, por exemplo, a reunião de empresas para um fim comum de operação da

53 Tema fartamente discutido no item anterior, o 1.2. supra.

54 TAVERNE, Bernard. Co-operative Agreements in the Extractive Petroleum Industry. Londres: Kluwer

área.

As joint ventures se encontram inseridas em um contexto contemporâneo de globalização econômica e de transnacionalização das empresas, o que finda por acarretar a observância do mercado com um nível bastante elevado de exigência e de concorrência, estimulando, assim, a conclusão de novas formas associativas para a conquista, ou mesmo a manutenção de áreas de atividade. A tecnologia em constante processo de aprimoramento, aliadas à constante necessidade de vultosos investimentos em pesquisas com setores estratégicos, tendo como característica intrínseca o elevado risco dos mesmos, e ao imenso volume de informações que as atividades econômicas globais carregam, encontram na cooperação entre entes, privados e públicos, a forma ideal para que objetivos comuns sejam atingidos mais facilmente e de uma melhor maneira.

Foi assim que a partir de uma forma de associação empírica, aplicada em alguns campos do direito interno anglo-saxão, atingindo, posteriormente, a universalidade de seu uso nos negócios internacionais, a joint venture se origina55, demonstrando ser um exemplo da mescla da criação civilística e do interesse prático e consuetudinário da common law. E essa utilização do instituto em si nos negócios internacionais veio a se promover por meio das indústrias petrolíferas e minerais.

As joint ventures possuem como características naturais que as identificam a sua origem contratual e, portanto, formal, apresentando objetivos comuns em um determinado prazo de duração, bem como serem dotadas de natureza associativa e cooperativa, partilhando os meios, os riscos e os benefícios de forma proporcional, mas sempre conjuntamente.

55 BAPTISTA, Luiz O. e DURAND-BARTHEZ, Pascal. Les associations d’enterprises (joint ventures) dans

Le commerce international. 24. Ed., FEC, 1991, p. 3 apud BASSO, Maristela. Joint Ventures: manual prático das associações empresariais. 3ª Ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 102.

Poder-se-ia dizer que as joint ventures possuem as seguintes características gerais: 1. Caráter ad hoc; 2. Comunidade de interesses; 3. Existência dos lucros, submissão às perdas; 4. Faculdade para representar e obrigar os demais co-ventures; 5. Busca de um objetivo comum; 6. Controle conjunto (gestão comum); e 7. Dever de não-concorrência (lealdade)56. Assim

sendo, demonstra-se a imbricação tênue que reside entre os institutos jurídicos tradicionais da

joint ventures e os acordos internacionais de unitização da produção de petróleo e gás.

Importante salientar que estas associações comerciais não possuem um modelo unitário que é seguido, seja nacionalmente ou internacionalmente. É um instituto que se encontra em plena evolução e se adéqua a todo e qualquer empreendimento ou atividade econômica que por qualquer motivo se veja melhor conduzida por meio de um instrumento cooperativo entre dois ou mais partícipes, da qual o primitivo efeito seria a criação de meios para facilitar a união de interesses ou a troca de seus recursos.

Destarte, entende-se por joint venture, um contrato entre pessoas físicas e/ou jurídicas, com a finalidade de empreender determinada atividade ou projeto em conjunto, com limitação do tempo de duração, assumindo e repartindo os riscos, os lucros e as perdas que porventura surjam. Doutrinariamente, alguns autores já vieram a definir o que entendem por este instituto jurídico, porém genericamente as definições se assemelham. Rasmussen define-a como uma fusão de interesses entre uma empresa com um grupo econômico, pessoas jurídicas ou pessoas físicas que desejam expandir sua base econômica com estratégias de expansão e/ou diversificação, com o propósito explícito de lucros ou benefícios, com duração permanente ou a prazos determinados57. Já José A. Engrácia Antunes58 as definem como acordos comerciais entre empresas, vocacionados à realização das mais variadas formas de

56 BASSO, Maristela. Op cit. p. 120.

57 RASMUSSEN, U. W. Holdings e joint ventures. São Paulo: Aduaneiras, 1991, p. 177. 58 ANTUNES, José A. Engrácia. Os grupos de sociedades. Coimbra: Almedina, 1993, p. 71-72.

colaboração e inter-relação econômica.

Existe, sem dúvida, uma tendência global da indústria do petróleo de se reunir em torno de uma figura jurídica apenas, diversas companhias petrolíferas, formada através de um contrato entre elas, a fim de empreender esforços conjuntos em torno de objetivos comuns, como, por exemplo: a entrada na concorrência em rounds licitatórios de forma conjunta; a pesquisa e/ou a produção, exploração e explotação de um campo; e a operação de uma área total que abranja duas ou mais concessões, licenças ou propriedades para a exploração de petróleo e/ou gás por essas pessoas detentoras desses direitos. O primeiro caso refere-se aos

joint bidding agreements (acordos de participação conjunta em licitações de blocos), o

segundo aos joint operating agreements (os JOAs – os acordos de operações conjuntas) e o terceiro aos Acordos de Unitização.

No caso em comento, qual seja, o da produção compartilhada de petróleo e gás entre países, não poderia ser outra a figura contratual imaginada para subsidiar o transcorrer das relações jurídicas que advirão deste contexto fático. As joint ventures oferecem toda a fundamentação finalística da qual os acordos de unitização internacional fazem questão, posto que a criação de um ambiente cooperativo, com vistas à realização de finalidades econômicas e baseados em um sistema de determinação do percentual cabível a cada parte para se enxergar os ônus e os bônus completos da operação, é exatamente um dos pilares que movem estes institutos comerciais.

Obviamente, por se tratarem de acordos internacionais entre sujeitos de Direito Internacional Público, e não entre entes privados (pessoas jurídicas de diferentes países), as diferenciações existem, sendo elas caracterizadoras da especialidade, por conseguinte, que os tratados internacionais em foco detêm. Não obstante os acordos internacionais de unitização serem pactuados entre Estados soberanos, outros acordos de unitização, estes entre entidades privadas, farão parte acessoriamente do tratado internacional assinado e ratificado. Tais

acordos servirão para operacionalizar as atividades dentro da área unitizada, a fim de que possibilite que cada país possa, em conformidade com o seu ordenamento jurídico interno, determinar quem deve participar deste instrumento contratual privado, documento acessório ao tratado internacional de unitização.

Neste diapasão, os acordos de unitização, sejam eles nacionais ou internacionais, criam uma figura do gênero joint venture com o fito de operar sobre uma área que detém os direitos de exploração por duas ou mais pessoas. As características gerais desse gênero de

joint venture, como um dos mecanismos corporativos mais utilizados para a realização e

consecução dos objetivos comerciais das empresas petrolíferas, são plenamente inter- relacionados com os da unitização, quais sejam, a busca de objetivo comercial comum; seu caráter ad hoc; a partilha de riscos e recompensas; e o controle conjunto das operações, entre outros.

Ocorre que tais feições jurídicas se diferenciam na medida do grau de especificidade que detém os acordos de unitização para gerar as obrigações entre as partes advindas de situações específicas. Muitas disposições se assemelham e coadunam-se, contudo, outras são bastante particulares e não encontram substrato nas joint ventures ordinárias, se é que assim se pode chamar o gênero.

Deste modo, pode-se afirmar que os acordos de unitização criam espécies de joint

ventures moduladas e estruturadas nomeadamente para a situação que enseja o

desenvolvimento desses acordos, na medida em que convergem os interesses necessários da cooperação internacional entre os Estados, nos casos de constatação do compartilhamento de reservatórios e/ou campos de petróleo e/ou gás, para a formalização de instrumento jurídico que norteie todas as operações.