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Usando o Computador: Ambientes Gráficos e Planilhas

Capítulo 3 A Matemática Financeira do Ensino Médio

3.3 Usando o Computador: Ambientes Gráficos e Planilhas

Este é um momento oportuno para explorar os recursos computacionais disponíveis. O computador, enquanto recurso pedagógico, não deve ser visto como um fim em si mesmo, de modo que as atividades envolvendo seu uso fiquem desconectadas das atividades “tradicionais” [7]. Ao contrário, seu uso deve ser requerido sempre que o professor entender que há ali uma oportunidade de potencializar a aprendizagem. Especificamente neste momento, há duas possibilidades interessantes, distintas porém complementares: o uso de planilhas eletrônicas e o uso de ambientes gráficos.

Ambientes gráficos, como o Graphmatica [10], permitem explorar aspectos importantes de funções, que não são tão simples de serem observados usando somente papel e lápis. No caso da fórmula de juros compostos, t

i C

M = ×(1+ ) , supondo que o capital inicial seja uma constante, podem ser exploradas duas situações distintas: M em função de i e M em função de t. Diversas questões podem ser propostas:

Que tipo de função relaciona M e t?

A função que relaciona M e t é crescente ou decrescente? Em que situações? Qual a condição para que a função que relaciona M e i seja crescente em todo seu domínio?

Para que o uso do computador se justifique, as questões propostas devem ser suficientemente desafiadoras, de modo que os alunos não se sintam em condições de

43 respondê-las rapidamente sem seu uso, mas que tenham nele de fato um aliado útil, que possa ser usado para validar as hipóteses formuladas.

Ao fazer uso de recursos computacionais, características importantes das funções podem ser exploradas, articulando diferentes formas de representação, o que permite uma abordagem não apenas quantitativa, mas, sobretudo, qualitativa [7]. Por exemplo, quando do estudo da função exponencial, é provável que características como a monotonicidade tenham sido abordadas (com uma terminologia apropriada ao segmento). Mas outros aspectos da função exponencial, como a taxa de variação, embrião do conceito de derivada, talvez não tenham sido suficientemente explorados. Aqui esta discussão pode ser facilmente retomada, uma vez que os alunos disponham dos gráficos, objetivando inicialmente apenas intuir algo como “a função cresce cada vez mais rápido”. Além disso, ao traçarem diferentes gráficos em um mesmo sistema de coordenadas, eles podem apreciar o efeito causado por uma pequena variação na taxa de juros. No gráfico da Figura 10 plotamos as funções y=100×(1+0,01)x e

x

y=100×(1+0,015) . A análise dos gráficos da Figura 10 leva ao entendimento de que neste tipo de situação não só a taxa de juros é relevante, mas também o período da operação.

Figura 10

y = 100(1+0,015)x y = 100(1+0,01)x

44 Neste momento pode-se retomar também a diferenciação entre os regimes de capitalização, com o ambiente gráfico consistindo em um aliado importante para evidenciar aspectos relevantes, como o fato de o regime de juros simples gerar montantes maiores que o regime de juros compostos para períodos inferiores a uma unidade de tempo. Na Figura 11 se encontram os gráficos que fornecem o montante nos dois regimes (para um valor inicial de uma unidade monetária e taxa de 100% por período):

Figura 11

Um aspecto importante no uso de ambientes gráficos é a seleção adequada da janela de visualização. Como os valores são próximos, se as escalas dos eixos não forem selecionadas adequadamente, pode não ser possível visualizar o que se deseja.

Outra ferramenta que oferece aplicações pedagógicas interessantes são as planilhas eletrônicas, como o Microsoft Excel [9]. Embora estas planilhas disponibilizem funções específicas para Matemática Financeira, pedagogicamente vale a pena postergar seu uso por um tempo, a fim de explorar também as dificuldades que surgem, mesmo quando dispomos de recursos computacionais poderosos. No caso da fórmula de juros compostos especificamente, há uma situação que merece atenção: quando é desconhecido o tempo. Para nortear a discussão, vejamos um exemplo:

Capitalização Simples Capitalização Composta

45 Maria investiu R$ 10.000,00 em um fundo de investimentos e deseja fazer o resgate do seu capital quando ele atingir o montante de R$ 20.000,00. Se ela supuser uma taxa de juros de aproximadamente 1% ao mês, deve considerar que o dinheiro não será resgatado por pelo menos quanto tempo?

Ao substituírem os dados do problema na fórmula, os alunos terão a seguinte equação: n ) 01 , 0 1 ( 000 . 10 000 . 20 = × +

E após uma manipulação elementar obterão 1,01n =2. Neste momento, é razoável esperar que alguns alunos finalizem a resolução por tentativas, assumindo que a solução deve ser um número natural. Mas mesmo dispondo de uma calculadora perceberão este processo como ineficiente, oferecendo oportunidade de intervenção do professor. Por outro lado, é provável também que alguns se lembrem das técnicas de resolução de equações exponenciais e terão então a ideia de recorrer aos logaritmos. Mas mesmo este procedimento pode levar a algumas dificuldades. Pode, por exemplo, ocorrer o seguinte: 2 01 , 1 n = 2 log 01 , 1 log n = 2 log 01 , 1 log = ⋅ n 301 , 0 004 , 0 = ⋅ n 25 , 75 = n

No entanto, 1,0175 ≅ 2,11 e 1,0170 ≅ 2,01, de modo que 70 meses é a resposta mais adequada. Qual foi, então, a falha do procedimento? Como os valores usados foram obtidos pelos próprios alunos usando calculadoras, é de se esperar que eles percebam que o problema reside no uso de aproximações. Porém, reconhecer a necessidade de usar valores aproximados implica em reconhecer a importância de saber a natureza dos números com os quais opera. A ocasião permite retomar a discussão sobre conjuntos numéricos, uma vez que a extensão dos racionais para os reais, feita em algum momento do Ensino Fundamental, costuma se dar sem maiores justificativas.

46 Especificamente: log 2 e log 1,01 são números irracionais e na resolução acima fizemos uma aproximação por racionais. Mas como um aluno de Ensino Médio poderia justificar a afirmação “O logaritmo de 2 na base 10 é um número irracional.”? Embora seja um ponto delicado, não há razão para ser evitado. De alguma forma, será preciso estabelecer a continuidade da função logarítmica. De posse desta informação, o aluno pode concluir que log 2 é irracional usando uma prova por contradição. Em muitas ocasiões, premidos pelo tempo, omitimos até mesmo demonstrações de resultados importantes e que estão ao alcance dos alunos. Sobre este ponto, destacamos as recomendações do Professor Elon Lages Lima [11]:

“Provar o óbvio transmite a falsa impressão de que a Matemática é inútil. Por outro lado, usar argumentos elegantes e convincentes para demonstrar resultados inesperados é uma maneira de exibir sua força e sua beleza. As demonstrações, quando objetivas e bem apresentadas, contribuem para desenvolver o raciocínio, o espírito crítico, a maturidade e ajudam a entender o encadeamento lógico das proposições matemáticas.” (página 32)

De modo geral, sabemos que definir se um determinado número real é ou não racional não é uma questão simples. Mas alguns casos particulares simples são acessíveis a um aluno do Ensino Médio e o coloca em contato com técnicas importantes para atacar problemas matemáticos mais complexos.

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