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Capítulo II – Revisão Bibliográfica

2.9. Usinagem do Ferro Fundido Cinzento

A usinagem de ferro fundido pode variar desde muito fácil de usinar, como no caso do ferro fundido cinzento ferrítico (HB≈120), até muito difícil de usinar, como no caso do ferro fundido branco (HB≈550). É evidente, portanto, que como no caso dos aços a usinabilidade dos ferros fundidos vai depender da composição química e da microestrutura. A dureza do ferro fundido cinzento aumenta com o aumento da porcentagem de perlita e cementita e, portanto, aumenta o desgaste da ferramenta. Os flocos de grafita no ferro fundido cinzento diminuem a ductilidade do ferro, o que ajuda a quebrar os cavacos, dando um comprimento de contato cavaco-ferramenta pequeno, relativamente baixas forças de usinagem e potência consumida, baixas taxas de desgaste e altas taxas de remoção de material. O ferro fundido nodular é mais dúctil que os ferros fundidos cinzentos, oferecendo menores vidas do que os cinzentos, quando usinando com ferramentas de metal duro (MACHADO et al., 2009).

Para a usinagem de ferros fundidos, as ferramentas de metal duro (WC + Co) da classe K são as mais utilizadas, e a vida é geralmente limitada por desgaste de flanco. À velocidades de corte relativamente baixas (mas maiores que quando usinando aços) uma APC se forma e ela é mais estável e se destaca da ferramenta com uma frequência menor que a APC dos aços. Nestas condições, o desgaste por atrittion geralmente prevalece. À altas temperaturas ou em altas taxas de remoção do material a APC desaparece e a cratera e o desgaste de flanco se desenvolvem normalmente, por abrasão e difusão. A maior temperatura é observada na região próxima à aresta de corte, que em combinação com

altas tensões de compressão limitam a taxa de remoção de material, devido à deformação plástica da aresta de corte. Cerâmicas à base de alumina e as SIALONS têm sido cada vez mais utilizadas parta usinar ferros fundidos com sucesso (MACHADO et al., 2009).

A dureza não é um indicador de usinabilidade tão eficiente para o ferro fundido (como ocorre com os aços). Nesse caso, a microestrutura exerce papel mais preponderante. A seguir, é apresentada a influência de vários constituintes da matriz do ferro fundido sobre a vida da ferramenta (AFS, 2003).

a) Ferrita: é um constituinte essencialmente livre de carbono. Com exceção da grafita apresenta a dureza mais baixa, se comparada com os demais constituintes.

b) Perlita: é o mais comum constituinte nos ferros fundidos. Apresenta resistência e dureza média. É composta de uma estrutura fina, alternada de ferrita mole e carbonetos duros Essa estrutura pode variar entre fina e grossa. A estrutura fina é mais dura e é usinada a menores velocidades de corte. A perlita no ferro fornece a melhor combinação entre usinabilidade e resistência ao desgaste.

c) Martensita: é um constituinte de grande dureza. É formada mediante tratamentos térmicos nos ferros fundidos. Na condição dura não-revenida, a martensita é de difícil usinagem, porém, quando tratada posteriormente com um revenido, dá origem a uma estrutura contendo carbonetos esferoidais em uma matriz ferrítica, o que reduz a dureza e garante uma usinabilidade até mesmo melhor que a da perlita de mesma dureza.

d) Bainita: a estrutura bainítica é obtida após o tratamento térmico de austêmpera. Devido à maior dificuldade de ser usinada, geralmente são usadas velocidades menores que as usadas para a usinagem da martensita revenida de mesma dureza.

e) Austenita: é o principal constituinte dos ferros fundidos cinzentos com elevados teores de níquel e dos ferros dúcteis não-magnéticos. A austenita é um componente considerado como de dureza relativamente baixa e de usinabilidade similar à da ferrita. Porém, existem alguns tipos de ferros austeníticos com suficiente conteúdo de cromo para produzir carbonetos na sua microestrutura. A presença de carbonetos aumenta a dureza e diminui a usinabilidade em uma proporção maior.

f) Carbonetos: são constituintes extremamente duros, variando desde simples carbonetos de ferro até complexos carbonetos contendo elementos de liga. A presença de carbonetos em forma de finas camadas na estrutura perlítica, devido à facilidade de cisalhamento, não representa prejuízo na vida da ferramenta. Maiores quantidades de carbonetos no ferro fundido, como constituintes livres, causam diminuição da usinabilidade. Uma concentração de 5% de carbonetos livres pode significar uma diminuição significativa na vida da ferramenta. Os carbonetos podem estar presentes nas extremidades das peças fundidas devido ao rápido resfriamento dessas regiões.

g) Esteadita: é um constituinte duro, formado pela presença de fósforo no ferro fundido. Com um conteúdo de fósforo inferior a 0,2%, não exerce um efeito significativo na vida da ferramenta. Para concentrações da ordem de 0,4%, a usinabilidade é comprometida em operações críticas tais como rosqueamento. Maiores quantidades de fósforo reduzem significativamente a vida da ferramenta.

h) Estrutura mista na matriz: formada por dois ou mais constituintes, provoca efeito intermediário na vida da ferramenta, comparado ao efeito devido a cada um dos componentes isolados. No entanto, o efeito combinado não é proporcional às quantidades relativas de cada constituinte.

Em dissertação de mestrado, Santos (1999) estudou a furação de ferro fundido cinzento com brocas de metal duro integral no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Usinagem (UFU) da Universidade Federal de Uberlândia. As ferramentas para os ensaios foram fornecidas por 5 diferentes fabricantes, e 5 tipos apresentam canal para injeção de fluido de corte. As ferramentas foram divididas em dois grupos, de acordo com a presença ou não dos canais internos para injeção de fluido de corte. A Tab. 2.5 mostra o tipo, as características e o código de identificação dessas ferramentas.

Tab. 2.5 – Ferramentas utilizadas nos ensaios

Brocas sem canal interno para injeção de fluido de corte

Brocas com canal interno para injeção de fluido de corte

Código Características Código características

AS Canais helicoidais Sem revestimento Ângulo de ponta: 130º Comprimento de hélice: 60 mm Ângulo de hélice: 10º AF Canais retos Sem revestimento Comprimento de hélice: 60 mm ASTiNAl Canais helicoidais Revestimento de TiNAl Ângulo de ponta: 130º Comprimento de hélice: 60 mm Ângulo de hélice: 40º AFTiN Canais helicoidais Revestimento de TiN Comprimento de hélice: 65 mm Ângulo de hélice: 35º BSTiNAl Canais helicoidais Revestimento de TiNAl Ângulo de ponta: 140º Comprimento de hélice: 60 mm Ângulo de hélice: 40º BFTiN Canais helicoidais Revestimento de TiN Comprimento de hélice: 65 mm Ângulo de hélice: 35º CS Canais helicoidais Sem revestimento Ângulo de ponta: 140º Comprimento de hélice: 40 mm Ângulo de hélice: 25º CFTiN Canais helicoidais Revestimento de TiN Comprimento de hélice: 50 mm Ângulo de hélice: 25º ESTiN Canais helicoidais Revestimento de TiN Ângulo de ponta: 130º Comprimento de hélice: 25 mm Ângulo de hélice: 40º DFTiN Canais helicoidais Revestimento de TiN Comprimento de hélice: 60 mm Ângulo de hélice: 25º Ângulo de ponta: 130º

Para as condições de corte adotadas nos ensaios classificatórios, a ferramenta classificada como ASTiNAl foi que apresentou os melhores resultados nos critérios de maior

número de furos gerados, textura superficial e estabilidade dimensional dos furos ao longo da vida da ferramenta. Este resultado mostrou que o revestimento de TiAlN é uma boa alternativa para furação a seco do ferro fundido cinzento, principalmente a altas velocidades de corte.

O revestimento de TiN foi determinante no aumento da vida das ferramentas utilizadas com injeção de fluido de corte através dos canais internos. Estas sempre superaram as ferramentas não revestidas.

A vida da ferramenta classificada como ESTiN, utilizada no corte a seco, comparada à

vida das ferramentas revestidas com TiN com fluidos aplicados nos canais internos, mostraram que o fluido de corte contribuiu fortemente para o aumento da vida das ferramentas. Este resultado, contudo, deve ser restrito às condições de corte adotadas, uma vez que a ferramenta ESTiN apresentou aumento significativo de vida, quando maiores

valores de avanço foram adotados, na condição a seco.

As ferramentas classificadas como CFTiN e DFTiN apresentaram as menores

diferenças entre os diâmetros máximos e mínimos medidos na entrada, no meio e na saída dos furos. Uma qualidade IT 6 foi conseguida com estas ferramentas.

De um modo geral, a tendência da dimensão do diâmetro dos furos é reduzir ao longo da vida da ferramenta. Esta tendência é menos marcante no caso da ferramenta ASTiNAl.

A potência consumida na furação mostrou-se fortemente dependente da geometria e do grau de desgaste da ferramenta, aumentando com o aumento dos ângulos de hélice e de ponta e com o desgaste.

Em outro trabalho, Santos (2002) estudou a influência de diferentes revestimentos e aplicações de fluidos de corte no desempenho de brocas de aço rápido e metal duro na furação de ferro fundido cinzento. Os resultados mostraram a influência dos revestimentos e dos fluidos de corte na vida das ferramentas de ambos os materiais, na qualidade dimensional dos furos e nos mecanismos de desgaste. Os coeficientes de desgaste apresentaram boa correlação com o número de furos por espessura de revestimento, principalmente para brocas de metal duro.

No corte a seco as brocas de aço rápido revestidas apresentaram superior desempenho ao das ferramentas não revestidas. A aplicação de mínima quantidade de fluido fez com que as ferramentas com revestimento multicamadas de TiN e TiAlN apresentassem melhor desempenho em relação às demais.

As brocas de metal duro, com base na análise estatística, não apresentaram diferenças de desempenho, o que pode ser atribuído ao fato de a deformação plástica das arestas de corte ser mecanismo de desgaste predominante, Na furação com mínima quantidade de fluido as ferramentas revestidas apresentaram desempenho superior ao das ferramentas não revestidas.

A aplicação de mínima quantidade de fluido foi responsável pelo melhor desempenho das ferramentas em relação ao corte a seco para todas as ferramentas testadas.

Em trabalho recente, Barbosa (2009) estudou a furação de ferros fundidos austemperados e nodular perlítico também no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Usinagem (UFU) da Universidade Federal de Uberlândia. Os resultados mostraram que o ADI (Ferro Fundido Austemperado)da classe 800-10 (207 HB) apresentou melhor usinabilidade, seguido pelo ferro fundido nodular FE70003 (263 HB). O ferro fundido austemperado da classe ISO 1.050-6 (288 HB) se mostrou como o material mais difícil de usinar. Observou-se que a usinabilidade dos ferros fundidos estudados está diretamente relacionada com os diferentes tratamentos térmicos a que estes foram submetidos, conferindo diferentes microestruturas que por sua vez promovem alterações nos valores de dureza.

Em trabalho realizado, Mocellin (2002) afirma que tendo em vista as vantagens a serem obtidas com a utilização do ferro fundido vermicular em blocos de motores, em 1996 começaram as primeiras tentativas de introduzir este material em linhas transfer de usinagem em substituição aos ferros fundidos cinzentos. Porém, as altas velocidades de corte usuais nos cinzentos não puderam ser utilizadas nos vermiculares, principalmente em algumas operações críticas de usinagem, tais como o mandrilamento de cilindros, devido ao acentuado desgaste dos insertos de PCBN (Polycrystalline Cubic Boron Nitride – Nitreto de Boro Cúbico Policristalino), quando aplicados ao vermicular. Os resultados da usinabilidade das peças de vermicular em linhas transfer são apresentados na Fig. 2.39.

Figura 2.39 - Comparação entre usinabilidade de ferro fundido cinzento e vermicular (REUTER et al., 2000 apud MOCELLIN, 2002)

Em pesquisa de dissertação de mestrado, Bossardi (2008) fez uma análise comparativa dos meios lubri-refrigerantes na furação do ferro fundido vermicular com brocas helicoidais de metal duro revestidas com TiAiN. Ele conclui que a presença do aditivo EP proporcionou um baixo coeficiente de atrito e que o mesmo ocorre através de reações químicas que reagem em altas temperaturas (200 a 1000ºC) na região de corte, reagindo triboquimicamente com o metal exposto durante o processo mecânico, desenvolvendo uma boa aderência e formando uma camada protetora entre a peça e a ferramenta de corte. Andrade (2005) analisou a furação do ferro fundido vermicular com brocas de metal-duro com canais retos revestidas com TiN e TiAIN em dissertação de mestrado. Segundo o autor, a pesquisa serviu como base para especificações de revestimentos adequados para brocas na furação de blocos vermiculares, através dos quais se obteve redução de custos de 25% aproximadamente neste tipo de processo.

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