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A problemática do uso parcial de uma marca coloca-se em virtude de ser prática recorrente o registo ser feito visando vários produtos e/ou serviços.

Verificando-se esta situação, questiona-se qual o efeito que terá para a marca o uso relativamente a apenas alguns dos produtos/serviços para a qual está registada. Nomeadamente importa determinar se o uso parcial é suficiente para obstar à declaração de caducidade do registo da marca por falta de uso e qual o efeito que o uso de alguns produtos tem nos que não são usados.

Teoricamente, são apontadas algumas soluções para dar resposta a este problema125.

Fundamentalmente, estas teorias reconduzem-se a dois possíveis posicionamentos sobre a questão. Uma dessas soluções, mais permissiva, permite estender os efeitos do uso a todas as classes ou produtos para os quais a marca se encontra registada. Esta solução, como facilmente se compreende, favorece os interesses do titular da marca, uma vez que, para manter o registo da sua marca tal qual foi registada, basta o uso de uma parte dos produtos para qual a

registou126. A outra das soluções caracteriza-se como uma solução mais restrita, uma vez que

limita os efeitos do uso aos produtos que efetivamente foram usados. Nesta solução encontram- se salvaguardados os interesses dos concorrentes que, assim, em caso de não uso, terão mais possibilidade de escolha do sinal para distinguir os seus produtos.

123 Para uma visão mais desenvolvida desta recomendação e sua análise, veja-se GARCIA VIDAL, «A Recomendação Conjunta da

União de Paris e da OMPI sobre a protecção das marcas e outros direitos de propriedade industrial sobre sinais na Internet» (traduzido por LUIS COUTO GONÇALVES), in: Scientia Ivridica, Tomo LII, pp. 317 e ss.

Em apoio a esta recomendação, veja-se a resolução à questão Q168 da AIPPI, na reunião do seu Comité Executivo que decorreu em Lisboa em 21 de junho de 2002, disponível em https://www.aippi.org/download/commitees/168/RS168Spanish.pdf.

Veja-se também, com algum interesse, ADELAIDE MENEZES LEITÃO, «Palavras-chave, publicidade, uso da marca e concorrência desleal», in: Direito Industrial, vol. VIII, APDI/Almedina, 2012, pp. 9 e ss; J. OLIVEIRA ASCENSÃO, «As funções da marca e os descritores (metatags) na internet», in: Direito Industrial, Vol. III, APDI/Almedina, 2003, pp. 5 e ss.

124 Para um estudo desenvolvido da territorialidade do uso da marca, incluindo o uso na internet, aconselha-se a leitura das obras aqui

referidas.

125 Para uma visão das várias teorias possíveis, cfr. MARIA MIGUEL CARVALHO, «O uso obrigatório da marca registada», cit., pp. 685

e ss; ELENA DE LA FUENTE GARCIA, El uso de la marca y sus efectos jurídicos, Marcial Pons, Madrid, 1999, pp. 233 e ss; e, ALBERTO CASADO, «Obligación de uso de la marca», pp. 401 e ss.

126 FELIPE PALAU RAMÍREZ, La obligación de uso de la marca, cit., pp. 125 e ss e JUAN FLAQUER RIUTORT, El uso obligatorio de la

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A Diretiva de marcas refere em duas normas o uso parcial. O art. 11.º, n.º 4 da DM preceitua que “Se a marca anterior apenas tiver sido utilizada para uma parte dos produtos ou serviços para os quais foi registada, considera-se que, para efeitos de aplicação dos números precedentes, está registada apenas para essa parte dos produtos ou serviços”; e o artigo 13.º do mesmo diploma consagra que “Quando existam motivos para recusa do registo de uma marca ou para a sua extinção ou nulidade apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que o registo da marca foi pedido ou efetuado, a recusa do registo, a sua extinção ou a nulidade abrangerão apenas esses produtos ou serviços”. Daqui resulta que a DM adota uma conceção mais restrita relativamente ao uso parcial, ou seja, o uso parcial só projeta os seus efeitos nos produtos efetivamente usados.

Nesta senda, o art. 269.º, n.º 6 do CPI estabelece que “Quando existam motivos para a caducidade do registo de uma marca, apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi efectuado, a caducidade abrange apenas esses produtos ou serviços”, adotando, por isso, também a solução mais restritiva. Assim, em caso de uso parcial, só se obstará à caducidade do registo por falta de uso relativamente aos produtos efetivamente

usados127-128.

Por outro lado, também para as marcas de prestígio (art. 242.º do CPI) pode dar-se a

caducidade para parte dos produtos/serviços para as quais estão registadas129,130.

127 “Assim, se a marca é registrada para produtos lácteos ou seus derivados, mas tem sido explorada para designar queijos, a

caducidade pode ser aplicada para outros produtos lácteos, incluindo leite e manteiga, mesmo que sejam produtos similares”, JÉRÔME PASSA, Droit de la propriété industrielle, cit., p. 242.

Defendendo uma flexibilização de acordo com uma solução, de origem alemã, restritiva lato sensu, atribuindo os efeitos do uso aos produtos com os quais haja um risco de confusão, veja-se MARIA MIGUEL CARVALHO, «O uso obrigatório da marca registada», cit., p. 687; MANUEL LOBATO, Comentario a la Ley 17/2001, de Marcas, cit., p. 674; e, CARLOS FERNÁNDEZ-NÓVOA, Tratado sobre derecho de marcas, cit., p. 609.

128 Para maiores desenvolvimentos sobre o uso parcial, veja-se MARIA MIGUEL CARVALHO, «O uso obrigatório da marca registada»,

cit., pp. 685 e ss; JUAN FLAQUER RIUTORT, El uso obligatorio de la marca registrada, cit., pp. 103 e ss; FELIPE PALAU RAMÍREZ, La obligación de uso de la marca, cit., pp. 125 e ss; FERNANDO CARBAJO CASCÓN, «Uso de la marca», cit. pp. 640 e ss.

Ainda que relativamente ao direito espanhol pretérito, tem interesse a consulta de ELENA DE LA FUENTE GARCIA, El uso de la marca y sus efectos jurídicos, Marcial Pons, Madrid, 1999, pp. 233 e ss; CONCEPCIÓN SAIZ GARCÍA, El uso obligatorio de la marca (nacional y comunitaria),cit., pp. 165 e ss; e, CARLOS FERNÁNDEZ-NÓVOA, «El uso parcial de la marca registrada (Comentario a la Sentencia de la sección primera de la audiência provincial de Pamplona de 5 de julio de 1996)», in: Actas de Derecho Industrial y Derecho de Autor, Tomo XVII, 1996, pp. 263 e ss.

129 Neste sentido, LUIS M. COUTO GONÇALVES, Manual de Direito Industrial – Propriedade industrial e concorrência desleal, cit., p.

264. Como nos dá conta o autor, também a sentença do Tribunal de Comércio de 13/07/2002, não obstante qualificar a marca Hermès como de grande prestígio, se pronunciou pela caducidade parcial do registo daquela marca (Ibidem).

Em sentido contrário, v. VANZETTI, “Sul ravvicinamento delle Legislazioni degli Stati Membri in Materia di Marchi d’Imprensa- Commento”, apud LUIS M. COUTO GONÇALVES, Manual de Direito Industrial – Propriedade industrial e concorrência desleal, cit., pp. 264-265, nota de rodapé 680.

Tenha-se em atenção que, no que respeita à marca de prestígio, trata-se de um aspeto que, ao nível do direito europeu, apresenta bastantes divergências na sua previsão, como realça LUIS M. COUTO GONÇALVES, Manual de Direito Industrial – Propriedade industrial e concorrência desleal, cit., pp. 261 e ss. Assim, a análise da bibliografia indicada deve ter em conta este aspeto, uma vez que, em França, se enquadra a questão no âmbito da responsabilidade civil.

Deste modo, na reunião do Comité executivo da AIPPI de Barcelona, os vários grupos nacionais apresentaram uma resposta comum (Anuário 1990/IV, disponível em: https://www.aippi.org/download/yearbooks/Annuaire%201990_IV.pdf). O grupo português (p. 189, ponto 7) e o italiano (p. 144, ponto 7) consideraram a não aplicação da caducidade por falta de uso à marca de prestígio; o grupo alemão (p. 15, ponto 2.

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