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Áudio 11: “Manhã Chuvosa”: Composição aberta de Raul

5.3 TOMADA DE DECISÕES COMPOSICIONAIS

5.3.1 A utilização da voz no ato de compor

Para a efetivação das três composições propostas neste estudo, os pesquisados utilizaram-se tanto da voz quanto do instrumento de domínio como estratégias composicionais. As escolhas por uma ou por outra opção variaram segundo o quadro abaixo:

Quadro 4 - Os pesquisados e suas opções quanto à utilização da voz/instrumento

Pesquisado Composição Voz Instrument

o de domínio

Motivo da escolha

Rodrigo Composição 01:

Bossa Nova X Não podia tocar sax no horário que dispunha para compor, tendo em vista a Lei do silêncio.

Rodrigo Composição 02:

Choro X Apresentou dificuldades com o gênero do Choro, e por isso utilizou-se do saxofone.

Rodrigo Composição 03:

Composição Aberta

X Utilizou-se do instrumento de domínio, pois queria compor numa linguagem bem saxofonística.

Leandro Composição 01:

Bossa Nova X Compôs utilizando-se da voz, aproveitando-se dos momentos de trânsito.

Leandro Composição 02:

Choro

X X Durante a elaboração da parte A, não podia tocar sax no horário que dispunha para compor, tendo em vista a Lei do silêncio. Já a parte B foi elaborada em casa e com o instrumento.

Leandro Composição 03:

Composição Aberta

X X Compôs a melodia na voz e lapidou-a utilizando-se do instrumento.

Raul Composição 01:

Bossa Nova X Tinha pouco tempo disponível para compor e por isso utilizou-se apenas da voz.

Raul Composição 02:

Choro X Apresentou dificuldades com o gênero do Choro, e por isso utilizou-se do trompete.

Raul Composição 03:

Composição Aberta

X Compôs utilizando-se da voz, aproveitando-se dos momentos de trânsito.

Fonte: produção do próprio autor.

Percebeu-se, através do quadro acima, que a voz foi amplamente utilizada pelos pesquisados para o ato de compor, superando, inclusive, a utilização do instrumento de domínio de cada participante. A opção pela voz atribuiu-se, em um primeiro momento, a determinados fatores externos as suas ‘habilidades de cantar’, como a necessidade de manter silêncio, uma vez que o horário de execução da atividade impedia a utilização do instrumento.

Rodrigo - [...] já era 10 horas da noite e não dava para pegar o instrumento [...] Eu fiz [a composição] cantando uma melodia e escrevendo num programa de edição de partituras [...], fui cantando aquilo que era mais cômodo pro meu ouvido. Não observei os acordes da harmonia, apenas cantei intuitivamente (Entrevista semiestruturada realizada em 24 de abril de 2014).

Leonardo utilizou-se do recurso da voz pelo mesmo motivo que Rodrigo. Porém, antes de registrá-la, o músico testava a sonoridade da frase criada no saxofone.

Leonardo – [...] a primeira parte eu fiz cantando [...] eu cantava e depois passava para o instrumento para saber quais eram as notas, daí eu anotava numa pauta, a lápis. [Essa primeira parte] eu fiz cantando porque eu estava viajando. Estava num hotel e não queria atrapalhar ninguém. Já a segunda parte eu fiz em casa, assim, pude usar o instrumento (Entrevista semiestruturada realizada em 26 de junho de 2014).

Segundo Wilkins (2006), utilizar-se da voz durante o ato de compor configura-se num importante mecanismo na busca pela inspiração. A autora afirma que criar a melodia na voz e em seguida transportá-la para o instrumento constuma trazer ótimos resultados composicionais (WILKINS, 2006, p. 104).

Percebeu-se também, que outros impedimentos foram determinantes quanto à escolha da voz como estratégia composicional dos participantes. No caso específico de Leonardo, a ausência de computador em sua residência foi um fator decisivo:

Leonardo - [...] no instrumento eu não fiz muito, eu fiz mais cantando. Ficava escutando [através do celular], no carro e ficava cantando [...], aproveitei bastante os momentos de trânsito, enquanto dirigia, para cantar e experimentar melodias [...]. (Entrevista semiestruturada realizada em 03 de junho de 2014).

Para o trompetista Raul, a falta de tempo para compor foi um fator determinante quanto à opção de utilizar-se da voz:

Raul - [...] eu não usei o instrumento, usei só a voz para compor. Coloquei um fone de ouvido para escutar a parte rítmica e harmônica do Band-in-a-Box e usei as relações intervalares para escrever as notas que eu cantava. Fui anotando neste papel pautado [...] (Entrevista semiestruturada realizada em 08 de maio de 2014).

Raul - A composição aberta surgiu no ônibus, em uma manhã de chuva, num demorado percurso de casa até o trabalho, aqui na banda. Com caderno de música em mãos criei a melodia, cantando baixinho. Tinha em mente um Samba-Canção. Depois fui imaginando a harmonia e anotando no caderno junto à melodia

(Entrevista semiestruturada realizada em 18 de agosto de 2014).

Pôde-se perceber que a escolha da voz como estratégia composicional configurou-se, inicialmente, como uma necessidade, de acordo com os variados motivos acima mencionados. Porém, tal qual apontado por Wilkins, para Leonardo a voz foi considerada um fator de inspiração para o processo de composição de suas músicas.

Leonardo - Esse foi o jeito que eu melhor me adaptei para compor: cantar e buscar uma coisa melódica (Entrevista semiestruturada realizada em 18 de agosto de 2014). Leonardo - Fiquei surpreso, logo em minha primeira composição, quando mesmo diante das dificuldades [...] obtive êxito! Sem pensar na questão harmônica ou motivos rítmicos, sem improvisar e sem utilizar o instrumento, apenas com a voz e com minhas inspirações, compus uma melodia que me satisfez. Foi apenas solfejando, à noite, no silêncio, que minhas inspirações se afloraram. Não foi pensando em ninguém, ou em qualquer situação que tivesse passado, foram apenas inspirações. Confesso que não esperava um resultado tão animador, visto a falta de experiência no assunto (Portfólio).

Faz-se importante ressaltar que os instrumentistas participantes desta pesquisa atuam profissionalmente e possuem considerável experiência musical. Para compor utilizando-se da voz, não é necessário ter experiências enquanto cantor, porém, faz-se necessário que o músico já tenha desenvolvido certa percepção musical, tornando-o capaz de afinar escalas e intervalos utilizando-se da voz. Compor, como no caso de Raul, utilizando-se apenas de um caderno de música e de seus conhecimentos intervalares, poderia ser inviável a uma grande parcela de instrumentistas que ainda não adquiriram tais conhecimentos.

A seguir, apresentam-se os recursos tecnológicos utilizados pelos pesquisados no ato de compor.