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Existem basicamente três sistemas de apreciação das provas que podem ser adotados pelos ordenamentos processuais:

a) sistema da prova legal, compreendido como aquele em que a lei estabelece detalhadamente o valor a ser atribuído a cada meio de prova;

b) sistema da valoração secundum conscientiam, o qual consiste em atribuir ao juiz integralmente a liberdade de avaliação das provas. A decisão do juiz pode ser fundamentada na prova existente nos autos, a decisão pode ser formada sem a existência de prova e até mesmo contra a prova.

       

c) sistema da persuasão racional, que consiste em o juiz formar livremente o

seu convencimento, observando os critérios racionais que devem ser indicados51.

No ordenamento jurídico brasileiro foi acolhido o sistema da persuasão racional ou do livre convencimento, consagrado no artigo 131 do Código de Processo Civil.

Diz o artigo 131 do Código de Processo Civil que:

Art.131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na decisão, os motivos que lhe formaram o convencimento.

E o artigo 157 do Código de Processo Penal dispõe que: “Art. 157. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova”.

Observa-se que a persuasão racional compreende o convencimento elaborado com liberdade intelectual, em que se apóia na prova constante dos autos sendo avaliada segundo critérios críticos e racionais capazes de fornecer a motivação que conduzam o juiz à conclusão. A liberdade de convicção do juiz não significa a faculdade de apreciação que atinja as fronteiras do arbítrio. O juiz precisa indicar os motivos de fato e de direito para fundamentar sua decisão.

A valoração da prova compreende a atividade intelectual desenvolvida pelo juiz por meio do qual confronta as afirmações das partes com os meios de prova constantes nos autos, visando a verificar sua veracidade52.

 

51 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, op.

cit., 2007. p. 375.

BRASIL DE 1988 APLICÁVEIS À PROVA

Os princípios constitucionais processuais que estão relacionados à prova encontram-se inseridos no Título II, que trata dos Direitos e Garantias fundamentais, precisamente no artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, bem como em outros dispositivos constitucionais.

O Artigo 5º, § 2º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, estabelece que os direitos e garantias expressos na Carta Magna não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que seja parte a República Federativa do Brasil.

Robert Alexy esclarece que os princípios são "mandamentos de otimização", compreendendo como "normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes". Os princípios são caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, sendo que a medida necessária de seu cumprimento depende não somente das possibilidades reais, mas também das jurídicas, em que o âmbito é determinado por princípios e regras opostos. E as regras "são normas que só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então há que se fazer exatamente o que ela exige, nem mais, nem menos. Portanto, as regras contêm determinações no âmbito do fático e juridicamente possível.”1

Paulo Bonavides considera que os princípios são normas-chave de todo o sistema jurídico2.

      

1 ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios

Constitucionales, 1993. p.86-87.

Os princípios indicam os critérios a ser seguidos para que se obtenha uma decisão, podendo acontecer que um determinado princípio venha prevalecer em alguns casos e seja preterido em outros casos, o que não compreende a sua exclusão. Portanto, poderá acontecer a ponderação de valores dependendo do caso apresentado.

Interessante frisar o pensamento de alguns doutrinadores em relação aos direitos e garantias fundamentais, haja vista que nesta seara estão inseridos os princípios constitucionais relacionados à prova no processo.

O Constituinte Originário elencou vários direitos e garantias fundamentais, dos quais se pode observar que alguns são aplicáveis à prova, inclusive alguns são compreendidos por doutrinadores como princípios constitucionais do processo aplicáveis à prova.

Vale salientar o entendimento do professor Marcelo Lima Guerra:

[...] uso de terminologias como ‘garantias’ ou ‘princípios’ pode ter o inconveniente de preservar aquela concepção das normas constitucionais, sobretudo aquelas relativas aos direitos fundamentais, que não reconhece a plena força positiva de tais normas, em suma, a aplicação imediata. Dessa forma, revela-se extremamente oportuno procurar substituir essas expressões terminológicas pela expressão ‘direito fundamentais’, de modo a deixar explicitado a adoção desse novo marco teórico-dogmático que constitui o cerne do constitucionalismo contemporâneo, a saber, a teoria dos direitos fundamentais3.

Interessante esclarecer que, didaticamente, alguns doutrinadores apresentam uma distinção entre as expressões “direitos do homem”, “direitos humanos” e “direitos fundamentais”. Nessa perspectiva, “os direitos do homem” apresentam-se no sentido de direitos naturais, mas ainda não positivados; “os direitos humanos” seriam os positivados no âmbito do direito internacional; e “os direitos fundamentais” seriam os direitos reconhecidos ou outorgados e protegidos pelo direito constitucional interno de cada Estado4.

Gilmar Ferreira Mendes explica que:

      

3 GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 65

4 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 5. ed. rev. atual. e ampl. Porto

Os direitos fundamentais são, a um só tempo, direitos subjetivos e elementos fundamentais da ordem constitucional objetiva. Enquanto direitos subjetivos, os direitos fundamentais outorgam aos titulares a possibilidade de impor os seus interesses em face dos órgãos obrigados. Na sua dimensão como elemento fundamental da ordem constitucional objetiva, os direitos fundamentais - tanto aqueles que não asseguram, primariamente, um direito subjetivo quanto aqueloutros, concebidos como garantias individuais - formam a base do ordenamento jurídico de um Estado de Direito democrático5.

Segundo Canotilho, os direitos fundamentais compreendem:

A função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico- subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa)6.

Observa Canotilho que os direitos fundamentais como função de direitos de defesa dos cidadãos podem ser vistos sob dois aspectos: o primeiro num plano jurídico-objetivo; e o outro, no plano jurídico-subjetivo. O plano jurídico-objetivo constitui-se de normas que apresentam competência negativa, haja vista que buscam inibir as ingerências dos poderes públicos na esfera jurídica individual. No plano subjetivo, constitui-se no poder de executar positivamente os direitos fundamentais, inclusive de exigir omissões dos poderes públicos, buscando evitar

que estes, por meios de seus agentes, pratiquem condutas lesivas7.

José Adércio Leite Sampaio expõe que:

Se temos em mente o fato de que o direito moderno só existe na tensão entre faticidade (ou seja, entre o caráter histórico e contingente do direito moderno que o liga, indissoluvelmente, ao fato de ser um sistema de ação que recorre inclusive à força para sua concretização e, assim, à política) e validade (ou seja, a dimensão de justificação racional do direito moderno, que o liga, indissoluvelmente, à exigência de sua fundamentação, vale dizer, às questões acerca da sua legitimidade e justiça, e assim, à moral moderna), então podemos dizer que os Direitos Fundamentais são os direitos que os cidadãos precisam reciprocamente reconhecer uns aos outros, em dado momento histórico, se quiserem que o direito por eles produzidos seja legítimo, ou seja, democrático8.

      

5 MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de

direito constitucional. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004. p.46.

6 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 3. ed. Coimbra -

Portugal: Almedina, 1999. p. 383.

7 CANOTILHO, J. J. Gomes, op. cit., 1999. p.383.

8 SAMPAIO, José Adércio Leite. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo

Cumpre esclarecer que os direitos e garantias fundamentais não podem servir de escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas, nem como argumento para afastamento ou redução da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, tendo em vista a inserção de desrespeito do Estado de Direito9.

Ruy Barbosa, citado por Uadi Lammêgo Bulos, expõe que direitos não se confundem com garantias, porque:

No texto da lei fundamental, as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem direitos; estas, as garantias: ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia com a declaração do direito10.

As garantias visam a instrumentalizar e a assegurar direitos, podendo assumir a forma de princípios ou de regras, por meio dos quais se positivam e se expressam11.

Pode-se mencionar que estão previstos explicitamente no Art. 5º da Carta Magna de 1988 e são aplicáveis à prova o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, o princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade e o da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos.