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“Vejo Hitler como um ser humano, sem desculpar nada”

Também Goebbels afirmou: “Muito além de nossa capacidade de compreensão, o homem opera como instrumento da história, e não importa absolutamente se ele está ou não consciente disso. ”

Sim, está certo.

Eu temia que o senhor iria concordar com isso. Que diferença existe entre a sua compreensão e a de um Joseph Goebbels?

Isso mostra mais uma vez que Goebbels não se sentia como um perpetrador individual, mas como parte de um movimento pelo qual foi arrebatado. Mas não apenas Goebbels, todo o povo alemão foi também arrebatado. Quem é que seduziu quem? Foi o Führer que seduziu o povo ou foi talvez o povo que também o seduziu?

Por que essa pergunta é importante para o senhor?

Quando simplesmente nos confrontamos com essa pergunta ficamos num nível mais modesto. Em Strange meeting, um poema de Wilfried Owen, um homem, que na véspera apunhalara um inimigo de guerra, morre por sua vez e chega ao reino dos mortos. Os dois adversários se olham nos olhos e se perguntam: “O que foi tudo isso e para quê?” A frase final do poema diz: Let us sleep now - Vamos dormir agora. Então tudo passou. Essa atitude, de sentir-nos envolvidos em algo muito diferente do que habitualmente pensamos, torna-nos modestos, então cessa a arrogância. Nessa visão, perpetradores e vítimas, nazistas ou não, deixam de desempenhar papéis pessoais. Nesse movimento da história, todos eles se encontram num mesmo barco. Reconhecer isso, em última análise, é uma realização em termos religiosos.

Os ataques contra o senhor estão frequentemente num nível político-ideológico. Suas afirmações o convertem, para muitos olhos, num “Hellinger marrom”, até mesmo num antissemita.

Eu tentei desarmar isso, mas aqui se evidencia o que certa vez condensei num dito: “Um touro é cegado pelo seu próprio pano vermelho.” Quando as pessoas ouvem “enviado de Deus”, é o fim. Elas investem contra isso, sem se darem o trabalho de investigar ou de ler o que está por trás disso.

Por isso eu pergunto mais uma vez pelo contexto. As pessoas que foram longamente afetadas pelas consequências e pelas questões que a época nazista deixou nas almas leem o seu texto sobre Hitler com olhos diferentes daquelas que se engajaram politicamente pelas vítimas. Por que o senhor lança essas frases no espaço público de uma universidade, onde não há lugar para processos anímicos e ensaios filosóficos? Isso é provocador.

Quem precisa, então, desses insights?

Quem segura o pano vermelho não pode vê-los.

À medida que digo algo a respeito, algo se põe em movimento, mesmo que não se chegue a uma solução, mas a tranquilidade com que alguns se recostam e dizem: “Mas eu sou t~o bom” fica um tanto perturbada.

Como o senhor chegou a essa conclusão? Eu presumo que eles se sentem antes fortalecidos e se tornam inquisidores. Fica fácil para eles.

Fico pensando: o que se passa em quem combate isso? Deve ter ido de encontro a alguma coisa em sua alma, senão não o mobilizaria tanto. Nesse momento ele esbarrou num problema pessoal do qual tenta fugir. Por princípio, não me preocupo com o que ele faz com minhas palavras, pois com isso perderia a minha liberdade e também a minha capacidade de percepção. Por que devo constantemente estar fazendo sinais a alguém, se receio que ele os interprete erradamente?

parte de um conflito que deve ser carregado e não recuo.

O senhor é um desmistificador? Em relação à sua própria pessoa, gostaria de perguntar-lhe: que efeito o senhor produz com isso?

Ainda não está claro qual é o efeito que isso faz, está em aberto. Não o sabemos.

Contudo, existem efeitos. Nas escolas públicas de ensino superior da Baviera foram proibidas as constelações familiares. Coisa semelhante acontece em Hamburgo. Na Suíça o seu nome foi incluído na mesma lista que a seita do reverendo Moon. O método das constelações familiares foi colocado em dis- ponibilidade, pessoas cancelam suas inscrições em seminários porque têm medo. Isso não são efeitos? Isto é uma parte do conflito. Qual será o efeito definitivo, só se verá em vinte anos, e eu não me deixo dissuadir por esses argumentos mais aparentes.

Eu disse isso antes do filme Der Untergang10. Esse filme reacendeu a discussão, numa base mais ampla,

e é espantoso ver em que medida os alemães ainda estão fascinados por Hitler e quão pouco, no fundo, isso foi superado. Eu dou esta contribuição, de modo geral, para colocar esse campo em movimento e mostrar soluções.

O senhor assistiu a “Der Untergang”?

Não. Para mim esse capítulo está encerrado. Posso encarar Hitler como um ser humano, sem desculpá- lo de nada. No que ele fez, eu o vejo como alguém tomado a serviço. Um ponto chama a atenção, e o filme parece confirmar isso: ninguém conseguia esquivar-se de Hitler, não é incrível? Até o fim ninguém conseguiu esquivar-se dele. Speer ainda o visitou no bunker; ninguém ousava contradizê-lo - parecia realmente que estava em ação uma força poderosa, à qual todos estavam entregues. O fato de que Hitler sobreviveu aos inúmeros atentados, de que todos eles fracassaram, é também um sinal de que esse movimento precisava chegar até o seu inapelável fim. Nisso atuaram outras forças, mas não preciso ver o filme por causa disso.

O que atesta, em sua opinião, o fato de que tantas pessoas tenham visto esse filme?

A fascinação e, sobretudo, o fato de que a situação ainda não foi resolvida. Essas pessoas querem ver Hitler de um modo humano. Disso elas esperam alguma coisa, nisso reside a fascinação.

O que exatamente o senhor pretende dizer com isso?

Aí existe algo não resolvido. Isso explica para mim essa afluência, mostra também a fragilidade dos outros argumentos nas almas dos alemães, dessas desesperadas tentativas de recusar ver Hitler como um ser humano. Isso não tem força diante desse enorme interesse. Aí existe algo não resolvido. Dou minha contribuição para que isso seja visto dessa maneira, não preciso esconder-me.

Isso lhe custou a perda de muitas simpatias e deixou as pessoas muito inseguras.

Faz parte do processo. Os inseguros também são forçados a confrontar-se com isso. Não vou dispensá- los disso.

Muitas pessoas, inclusive de seu círculo mais próximo, teriam gostado que o senhor respondesse aos ataques contundentes e difamantes.

Sim, é claro, mas decidi não me manifestar a respeito. Não consinto em ser puxado ao nível dos agressores. Isto é tudo o que digo a respeito.

Qual é o seu lugar quando o senhor fala disso? O senhor o diz como um indivíduo ou como parte de um movimento?

Os insights que tenho, eu os vivencio como dádivas. Os efeitos que a técnica das constelações já produziu não decorrem de minha iniciativa. Também não exijo absolutamente nada, não faço publicidade. Isso se desenvolve do interior, a partir de uma força própria. Essa força não é minha, e quando escrevo esse texto sobre Hitler, como no livro Gottesgedanken (Pensamentos de Deus), ele também resulta de uma compreensão.