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2.1 Ventilação Natural nas Edificações

2.1.1 Ventilação para fins de conforto térmico

Uma importante função da ventilação natural é promover a sensação de conforto térmico dos usuários1. As condições para obtenção de conforto através do resfriamento passivo das edificações dependerão do contexto climático onde se inserem.

Conforme citado anteriormente, em climas quentes e úmidos, que se caracterizam por temperaturas relativamente altas e precipitação abundante, a ventilação natural muitas vezes é a principal estratégia para promoção do conforto, pois contribui para a sensação de refrescamento. O movimento do ar ajuda na promoção de conforto térmico por causa da evaporação do suor da pele e das trocas térmicas por convecção que ocorrem entre a corrente do ar e o corpo humano (AYNSLEY et al, 1977; BITTENCOURT, 1993). Portanto, edificações porosas com estratégias de ventilação cruzada e ventilação na altura do usuário, por exemplo, devem ser priorizadas em cidades com este perfil climático.

Por outro lado, em regiões de clima temperado, com estações bem definidas e grandes variações de temperatura, a ventilação natural deve ser seletiva com uso de estratégias arquitetônicas que permitam a porosidade da edificação para aproveitamento dos ventos em dias quentes, sem comprometer seu isolamento em dias frios, proporcionando aos usuários conforto térmico.

Para Givoni (1992), a ventilação natural pode promover conforto térmico de duas formas: através do resfriamento fisiológico direto, ao aumentar a velocidade do ar no interior de um edifício ou através do resfriamento da massa edificada, que pode ser obtido pela

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O conforto térmico pode ser definido como um estado de satisfação com o ambiente térmico onde o indivíduo se insere (ASHRAE, 1992). Depende de fatores humanos como o metabolismo e a vestimenta, bem como de fatores climáticos, como temperatura, umidade e velocidade do ar, por exemplo. Segundo a ASHRAE, a adaptação térmica humana é composta por três fatores: comportamental, fisiológico e psicológico (ASHRAE RP-884, 1997).

ventilação noturna, quando um edifício é ventilado durante a noite, visando remover a carga térmica absorvida durante o dia.

Segundo Santamouris e Wouters (2006) pessoas que vivem em edifícios ventilados naturalmente são capazes de controlar melhor o seu ambiente e se adaptar mais facilmente a variabilidade climática e possíveis mudanças de temperatura. Além disto, apresentam um intervalo maior de preferência de temperaturas e velocidades do ar.

A sensação térmica dos usuários depende do efeito combinado de diversos fatores, tais como, temperatura do ar, umidade relativa do ar, velocidade do ar, temperatura radiante e também das variáveis humanas como a vestimenta e a atividade desenvolvida pelo usuário, dentre outras. O BRE – Building Research Establishment sugere que os valores de temperatura do ar sejam corrigidos em função da velocidade do ar e das variáveis humanas: vestimenta e atividade, conforme Tabela 1 a seguir.

Tabela 1 – Temperaturas globais de conforto (ºC) de acordo com atividade e vestimenta, e correções para quando há movimento do ar.

Atividade

Vestimenta Dormindo Sentado Em pé Ativo

Nenhuma 31 29 25 23*

Leve 29 26 21 18*

Normal 27 23 17 13*

Movimento do ar (m/s) Correção a ser adicionada (ºC)

0.2 0.5 1.0 1.0 1.5

0.4 1.0 1.5 2.0 3.0

0.7 1.5 2.0 3.0 4.0

1.0 1.5 2.5 3.5 5.0

*Estimativa sujeita a alguma incerteza

Fonte: BRE (1979 apud BITTENCOUT, 1993).

Outros estudos ainda têm sido desenvolvidos no intuito de identificar as faixas de velocidade do ar em que os usuários se dizem mais confortáveis (TANABE, 1988, TOFTUM, ZHOU, MELIKOV, 1997, NICOL, 2004; ARAÚJO, 1996; ARAÚJO, 2008; CANDIDO et al, 2008).

A maioria destes estudos expressa a sensação de conforto como uma temperatura efetiva ou operativa2, que é determinada a partir da temperatura do ar, umidade, radiação e movimento do ar.

O diagrama psicrométrico dos irmãos Olgyay desenvolvido na década de 1950 serviram como base para diversas pesquisas posteriores, como a de Koenigsberger (1974) que sugere a extensão do limite superior da zona de conforto a partir do aumento da velocidade do ar (Figura 2).

Figura 2 – Carta Bioclimática para climas quentes. .

Fonte: SACRAMENTO, 2012, adaptado de SZOKOLAY, 2004.

Givoni (1976) adaptou o diagrama de Olgyay para países em desenvolvimento e considerou edificações ventiladas naturalmente, sugerindo alternativas para as horas de desconforto por frio ou por calor. A carta bioclimática de Givoni possui doze zonas sendo a zona 1 a zona de conforto térmico. As demais zonas correspondem à possibilidade de extensão da zona de conforto em consequência da adoção de estratégias de projeto indicadas, como a ventilação natural, por exemplo.

Esta estratégia é recomendada para a maioria das cidades brasileiras em alguma época do ano, para Belém, por exemplo, cidade de clima quente e úmido, a ventilação natural é recomendada para 89% das horas desconfortáveis. Já para Porto Alegre, no Sul do país, 23,4% das horas do ano seriam mais confortáveis se a ventilação natural fosse implementada

2 Temperatura Operativa é a temperatura uniforme de um ambiente radiante negro hipotético, onde um ocupante

poderia trocar a mesma quantidade de calor por radiação e convecção que no ambiente real. Pode ser calculada com suficiente aproximação como sendo o valor médio entre a temperatura do ar e a temperatura média radiante (LAMBERTS et al, 2013)

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como estratégia de projeto nas edificações, com base na Carta bioclimática de Givoni (Figura 3).

Figura 3 – Carta Bioclimática de Givoni para Porto Alegre-RS e Belém-PA, respectivamente.

Esta estratégia é recomendada também em outras cidades de clima quente como Maceió em 75% das horas do ano, Natal em 83,5% e Fortaleza em 85,8% das horas anuais. E também em cidades de outras regiões brasileiras como Brasília em 15% das horas doa no, Florianópolis (36,4%) e Rio de Janeiro (61%) o que demonstra a importância desta variável na promoção do conforto térmico dos usuários no interior das edificações.

Fonte: UFSC/LABEEE, 2010. 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 0 5 10 15 20 25 30 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 TBS [°C] TBU [°C ] U [g /k g ] UR [%]

UFSC - ECV - LabEEE - NPC

ZONAS: 1 1. Conforto 2 2. Ventilacao 3 3. Resfriamento Evaporativo 4 4. Alta Inércia Térmica p/ Resfr.

5 5. Ar Condicionado

6 6. Umidificação

7 7. Alta Inércia Térmica/ Aquecimento Solar

8 8. Aquecimento Solar Passivo

9

9. Aquecimento Artificial 10

10.Ventilação/ Alta Inércia

11 11.Vent./ Alta Inércia/ Resf. Evap.

12 12.Alta Inércia/ Resf. Evap.

10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 0 5 10 15 20 25 30 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 TBS [°C] TB U [°C ] U [g /k g ] UR [%]

UFSC - ECV - LabEEE - NPC

ZONAS: 1 1. Conforto 2 2. Ventilacao 3 3. Resfriamento Evaporativo 4 4. Alta Inércia Térmica p/ Resfr.

5 5. Ar Condicionado

6 6. Umidificação

7 7. Alta Inércia Térmica/ Aquecimento Solar

8 8. Aquecimento Solar Passivo

9

9. Aquecimento Artificial 10

10.Ventilação/ Alta Inércia

11 11.Vent./ Alta Inércia/ Resf. Evap.

12 12.Alta Inércia/ Resf. Evap.

Uma pesquisa realizada por Fanger (1972) relacionou as variáveis humanas metabolismo e vestimenta e as variáveis ambientais: temperatura do ar, temperatura radiante média, velocidade do ar e umidade para estabelecer o voto médio predito (PMV) e o percentual de pessoais insatisfeitas (PPD) (Figura 4). O modelo de Fanger foi realizado com base em experimentos extensivos com usuários em ambientes controlados na Dinamarca e sua influência nos estudos de conforto térmico é mundialmente reconhecida, sendo utilizado em normas como a ASHRAE Standard 55, CEN CR 1752 e a ISO 7730.

Figura 4 – Escala de conforto de Fanger (PMV/PPD).

Fonte: Figueiredo (2007) apud Sacramento, 2012. Entretanto, Candido et al (2008) constataram que:

As with any theory, model or index, Fanger‘s legacy has been both widely supported and widely criticized. In his dissertation, Fanger stated that the PMV model was derived in laboratory settings and should therefore be used with care for PMV values below -2 and above +2. Especially on the hot side, Fanger foresaw significant errors. But probably the most important criticism is the concept of a universal ―neutral‖ temperature.

Neste sentido, o modelo adaptativo de conforto (Figura 5) considera a ação do usuário no meio, de forma a torná-lo mais agradável e, por isto, este modelo se torna mais adequado às regiões de clima quente e úmido e especialmente às edificações ventiladas naturalmente. É um modelo de conforto no qual a física e a fisiologia humana interagem com a percepção térmica (BRAGER; DE DEAR, 1998).

Além disto, ―a abordagem adaptativa é baseada em estudos de campo sobre o conforto térmico e demonstra que as pessoas são mais tolerantes às mudanças de temperatura‖ (DARBY; WHITE, 2005 apud SACRAMENTO, 2012).

Figura 5 – Modelo adaptativo de conforto.

Fonte: DE DEAR; BRAGER,1998.

Destaca-se a importância dos estudos mais recentes de conforto térmico que têm avaliado as preferências dos usuários em cidades de climas tropicais, aproximando os índices desta realidade climática, já que as pesquisas iniciais ocorreram em climas temperados. Apesar de não haver consenso entre os pesquisadores acerca da velocidade do ar mais confortável, a pesquisa de Candido et al (2008) sugere a aceitação de limites mais altos de velocidade do ar, que por sua vez, depende da configuração das aberturas das edificações, destacando a importância dessas aberturas na obtenção de conforto térmico em regiões de clima quente e úmido.

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