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CAPÍTULO III – MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS SOBRE A PULVERIZAÇÃO AÉREA DE AGROTÓXICOS

3.2. No campo dos movimentos sociais

3.2.1. Via Campesina

Atualmente, a Via Campesina pode ser considerada um dos principais movimentos camponeses em atividade no mundo. Vem se destacando no cenário internacional com suas ações e propostas que confrontam os centros de decisão política na agricultura, como a Organização Mundial de Comércio (OMC), o Banco Mundial e as empresas transnacionais (Fernandes, 2012). Segundo Fernandes (2012) a proposta de criar a Via Campesina surgiu quando os líderes de movimentos camponeses de diversos países reuniram-se no II Congresso da Unión Nacional de Agricultores y Granaderos (UNAG), em 1992 na cidade de Manágua, na Nicarágua. No mesmo Congresso surgiu a proposta de se criar um projeto coletivo com o intuito de confrontar o modelo econômico neoliberal e suas instituições símbolo, como a OMC, compreendendo que as mazelas que persistem no campo são decorrentes do sistema econômico em questão.

A Via Campesina é definida como movimento internacional articulador de movimentos camponeses. Ao todo, articula 164 organizações de 73 países, contando com mais de 200 milhões de camponeses, pequeno e médios produtores, povos sem terra, indígenas, migrantes e trabalhadores agrícolas (VIA CAMPESINA, 2017). De acordo com Ribeiro (2015), os temas abordados pelo movimento são: reforma agrária, soberania alimentar, gênero, biodiversidade e recursos genéticos, direitos humanos e agricultura camponesa sustentável. Entre essas, a soberania alimentar constitui-se como a principal

bandeira do movimento por contrapor-se com a ideia de segurança alimentar, defendida principalmente pela FAO, conforme explica o movimento:

O direito dos povos, comunidades, e países de definir suas próprias políticas sobrea agricultura, o trabalho, a pesca, a alimentação e a terra que sejam ecologicamente, socialmente, economicamente e culturalmente adequados às suas circunstâncias específicas. Isto inclui o direito a se alimentar e produzir seu alimento, o que significa que todas as pessoas têm o direito a uma alimentação saudável, rica e culturalmente apropriada, assim como, aos recursos de produção alimentar e à habilidade de sustentar a si mesmos e as suas sociedades (VIA CAMPESINA, 2002, não paginado, apud RIBEIRO, 2015).

Com base na dimensão internacional da Via Campesina, optou-se por um recorte em escala nacional, de acordo com Batista (2013) e Ribeiro (2015) para evidenciar as organizações que representam a Via Campesina no Brasil:

 Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas (CONAQ): Luta central em defesa do reconhecimento e acesso dos territórios quilombolas e a ampliação e reafirmação das políticas públicas (RIBEIRO, 2015).

 Comissão Pastoral da Terra (CPT): seu objetivo é apoiar e assessorar os movimentos camponeses em suas lutas; tem sua luta centrada em três eixos: água, reforma agrária e permanência no campo (CANUTO, 2012).

 Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB): composta por estudantes de agronomia que buscam defender os interesses da classe trabalhadora. Seu objetivo é auxiliar os camponeses na assessoria técnica (FEAB, 2010).

 Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB): é formado por

“populações tradicionais, como ribeirinhos, pescadores, indígenas, quilombolas, trabalhadores rurais, camponeses proprietários de terras ou não, e populações urbanas afetadas de alguma forma pela construção de barragens” (FERREIRA, 2012, p.489 in RIBEIRO, 2015).

Ainda com os autores, o movimento é uma reação às consequências do tratamento pelas empresas construtoras e governos com a construção de barragens.

 Movimento de Mulheres Camponesas (MMC): criado em 2004, organizado por mulheres camponesas que buscam lutar pela inserção das mulheres na participação política na sociedade, pelo fim de violência contra a

mulher (PALON; DARON, 2012). Segundo a página online do MMC, o movimento se identifica pela produção de alimentos saudáveis, pela construção de um projeto de agricultura ecológico e pela luta pela libertação da mulher.

 Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA): movimento composto por camponeses que buscam melhoria na produção de alimentos, permanência no campo e o resgate da luta camponesa (RIBEIRO, 2015)

 Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP): formado por pescadores que lutam por direitos pela preservação das águas e dos ecossistemas marinhos.

 Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST): caracteriza-se como um dos principais movimentos sociais que lutam pela terra, desde a reforma agrária, permanência na terra e meios de produção não dependente de grandes empresas.

E ainda muitos outros movimentos e instituições compõe a vasta lista de organizações que apoiam e participam da Via Campesina, como Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal (ABEEF), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Associação Brasileira dos Estudantes de Filosofia (ABEF), Levante Popular da Juventude, a Consulta Popular, a Regional das Associações dos Centros Familiares de Formação por Alternância do Espírito Santo (RACEFFAES), entre outros.

Uma das mobilizações lideradas pela Via Campesina é a luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos, iniciada em todo país no ano de 2011. Na reportagem feita por Flávia Bernardes, em 18 de outubro de 2011, publicada na página online da Campanha permanente contra os agrotóxicos e pela vida22, intitulada “Projeto de Lei proibindo pulverização aérea com agrotóxico é discutido em São Mateus”, é retratado o apoio ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no Espírito Santo. A autora da reportagem explica que, “junto à Via Campesina, além dos agricultores familiares, lutam contra a pulverização aérea com agrotóxico as comunidades atingidas pelo problema, representantes das igrejas e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)”.

Segundo a reportagem, a pulverização aérea potencializa os malefícios dos agrotóxicos que atingem tanto agricultores quanto moradores da cidade

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Disponível em: <http://contraosagrotoxicos.org/projeto-de-lei-proibindo-pulverizacao-aerea-com- agrotoxico-e-discutido-em-sao-mateus/>. Acesso em: 09 de setembro de 2017.

que consomem alimentos contaminados, gerando problemas como intoxicações agudas e crônicas, a má formação fetal e distúrbios endócrinos, neurológicos e respiratórios gerados pela manipulação, aplicação e consumo de agrotóxicos.

Segundo Bernardes (2011), “a medida é uma solicitação dos agricultores familiares que iniciaram em abril deste ano a Campanha Nacional contra o uso de agrotóxico na produção de alimentos, encabeçada em todo o País pela Via Campesina”. Além de ser um movimento que lidera reivindicações populares direcionadas ao campo, a Via Campesina caracteriza-se como movimento social de articulação junto a outros movimentos sociais, ocupando territórios em todo o mundo, compreendida por Fernandes (2005) como um movimento social de mobilização popular e de interferência direta na dinâmica da territorizalização.