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1.1 A E XPERIÊNCIA NA P ERSPECTIVA S ÓCIO A NTROPOLÓGICA DE D EWEY

1.1.2 A Vida Humana

No livro Educação e Democracia, o primeiro princípio teórico que Dewey (1959) busca elucidar é o princípio da renovação da vida. O autor explica que os seres vivos estabelecem uma relação intrínseca com o ambiente em que vivem, visto que cada um, para seu próprio crescimento, sobrevivência e conservação, aproveita as energias disponíveis – como luz, ar, água, matérias do solo, etc. – transformando os meios e renovando-se constantemente. Em suas palavras, “A mais notável distinção entre os seres vivos e inanimados é que os primeiros se

conservam pela renovação. [...]. A vida é um processo que se renova a si mesmo por intermédio da ação sobre o meio ambiente” (DEWEY, 1959, p. 1).

Embora esta autorrenovação da vida seja indefinida, tendo em vista que todos os seres nascem e morrem, Dewey (1959) nos explica que é pela dependência das necessidades pessoais de subsistência que os seres vivos estão continuamente se readaptando ao ambiente, e consequentemente propiciando o surgimento de outras espécies mais adaptadas aos obstáculos enfrentados pelas espécies precedentes. Nesse sentido,

Ao passo que se extinguem algumas espécies, surgem outras mais aptas a se utilizarem dos obstáculos contra os quais as extintas lutavam em vão. A continuidade da vida significa uma contínua readaptação do ambiente às necessidades dos organismos vivos (DEWEY, 1959, p. 2).

Diante deste ponto de vista darwinista, onde não existem dicotomias, os seres humanos estão no mundo, primeiramente a partir de uma condição natural de sua espécie em interação com as demais, e por tal razão fazem parte da natureza. Contudo, considerando que a luta pela sobrevivência é natural em todas as espécies de seres vivos, as ações dos seres humanos no mundo também são naturais, pois estes estão tentando se readaptar aos obstáculos e às mudanças do mundo, em busca de sobrevivência.

As atividades pessoais estão intimamente relacionadas às mudanças das coisas, e, o bem-estar das pessoas e o progresso social se correlacionam com os procedimentos dos indivíduos em relação a estes objetos. Segundo Dewey (1959, p. 61), “Um futuro abstrato e indefinido é o que prepondera, com tudo o que ele subentende. Em detrimento das energias e oportunidades atuais”, sendo assim, conforme Carvalho (2011, p. 53), que nos aclara o tema, “A sociedade, assim como os indivíduos, não é estática, nem fixa e muito menos imutável”. Diante de tal perspectiva, o futuro é incerto e tudo está constantemente mudando.

Todavia, quando tomamos o ser humano como um objeto de reflexão, precisamos nos lembrar de que primeiramente ele nasce como um ser “criança”. Dewey (1959) nos explica que a criança é um ser imaturo. Entretanto, ele nos adverte que não devemos conceber essa noção de imaturidade de maneira a concentrar nossas atenções naquilo que a criança ainda não tem, em razão de que somos levados a uma concepção equivocada de crescimento. A partir desta noção

equivocada, tendemos a considerar o ser humano como um ser limitado, de maneira que a criança que atinja a maturidade termine o seu crescimento e não se desenvolva mais. Entretanto, ao considerarmos a imaturidade como algo absoluto (independente de existir na criança ou no adulto), ao invés de relativo, esta adquire a significação de uma aptidão positiva para o “desenvolver-se”, visto que a imaturidade se expressa sim pela dependência e pela plasticidade.

A concepção de “plasticidade”, de acordo com o autor, se entende como a capacidade que o sujeito tem em “[...] poder modificar seus atos tendo em vista os resultados de fatos anteriores, o poder de desenvolver atitudes mentais” (DEWEY, 1959, p. 47), ou seja, é uma aptidão natural para o crescimento e para o contínuo progresso. O indivíduo só pode adquirir bons hábitos por meio da plasticidade - quando este aprende a variar um ato que aprendera pelos seus fatores de acordo com as circunstâncias em que se encontre no momento.

Por conseguinte, em relação à concepção antropológica de desenvolvimento, a dependência e o desenvolvimento de aptidões são fatores que se dão simultaneamente. Assim como uma criança depende de outros seres humanos para conseguir crescer e se desenvolver, o adulto continua dependendo de outros seres humanos para viver e continuar crescendo em diversos aspectos de sua vida. Para o autor, a dependência subentende a interdependência, visto que quando o indivíduo é muito independente, ele torna-se menos social, em razão de não precisar das pessoas. Nas palavras de Dewey (1959, p. 47), “Sob o ponto de vista social, a dependência denota, portanto, mais uma potencialidade do que uma fraqueza”. Por conseguinte, para o filósofo, o ser humano é um ser que se encontra em um estado de contínuo crescimento, ao passo que é um ser social, dependente de outros.

Por consequência, notamos que, para o autor, o homem também é um ser dotado de capacidade para aprender. Desta maneira, ele explica que, o ser humano, desde criança começa a aprender a partir da experiência:

À medida que a criança aprende a pegar, a engatinhar, a andar e a falar, o conteúdo intrínseco dessas experiências se amplia e se aprofunda. O conhecimento adquirido com essas experiências entra em conexão com novos objetos e novos acontecimentos que requerem novas capacidades, ao mesmo tempo em que o exercício dessas capacidades refina e amplia o conteúdo dessas experiências (DEWEY, 2010, p. 76).

É por tal razão que Dewey (1959, p. 168, grifos do autor) menciona que “O estágio inicial do ato de pensar é experiência”. Deste modo, aqui já notamos uma diferença que, para o filósofo, distingue o ser humano dos demais animais diante de sua capacidade de experienciar e de pensar. Dewey (1959, p. 159, grifos do autor) concebe o ato de pensar como “[...] o esforço intencional para descobrir as relações especificas entre uma coisa que fazemos e a consequência que resulta, de modo a haver continuidade entre ambas”. Assim, é o pensamento que proporciona significação às experiências vividas.

Considerando que para Dewey (1959, p. 48) “[...] o ser humano adquire o hábito de aprender. Aprende a aprender”, a capacidade de aprendizagem é natural e intrínseca ao ser humano. Assim, a defesa do autor é que o prolongamento da infância na vida dos indivíduos, no sentido da dependência e da plasticidade, propicia um maior impulso para o progresso social. Isso porque, além de contribuir com a manutenção das simpatias sociais, os estímulos que as pessoas recebem auxiliam-nas a serem previdentes e formularem melhor os planos para o futuro, perante a necessidade de aquisição de novas aptidões em decorrência das constantes mudanças do mundo.

À vista disso, a vida é desenvolvimento e crescimento, e por este raciocínio, podemos entender que o fim do progresso educativo é ele mesmo, visto que o crescimento não para, pois existe “[...] modos de desenvolvimentos adequados a condições diferentes” (DEWEY, 1959, p. 54) dos adultos e das crianças – por exemplo, é comum ouvirmos que a criança deve desenvolver-se para se tornar adulta, e o adulto deve desenvolver-se para se reaproximar da infância, em relação à curiosidade, de simpatia, de sinceridade e etc.

O que diferencia a criança do adulto, é que o último, como um indivíduo mais experiente, aprende a utilizar-se de suas aptidões no meio em que vive. Nas palavras de Dewey (1959, p. 53):

A criança é possuidora, por certo, de aptidões especiais: desprezar esta circunstancia é mutilar ou deformar os órgãos de que depende seu desenvolvimento. Mas, por seu lado, o adulto utiliza-se de suas aptidões para transformar o ambiente em que vive, ocasionando com isso o aparecimento de novos estímulos que reorientam suas energias e as mantêm em desenvolvimento.

O adulto tem um maior domínio sobre o meio ambiente, o qual desenvolveu a partir das experiências que vivenciou durante seus anos de vida. Os conhecimentos adquiridos a partir de suas experiências lhe auxiliaram a resolver seus problemas de maneira mais qualitativa, por meio da inteligência. Eis uma das principais razões pela qual a experiência, na visão do autor, deve ser o centro do processo de ensino- aprendizagem e, nesse sentido, também é um importante conceito a ser analisado nas relações que se estabelecem na interação mútua entre professores e alunos.

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