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VIOLÊNCIA ENTRE PARCEIROS ÍNTIMOS NA GRAVIDEZ

PARTE I – CONCEPTUALIZAÇÃO DA VIOLENCIA E IMPACTO NA SAÚDE

I.2. VIOLÊNCIA ENTRE PARCEIROS ÍNTIMOS NA GRAVIDEZ

As prevalências de VPI na gravidez têm sido alvo, nos últimos 30 anos, de extensa investigação internacional, a qual permite ter uma noção da dimensão do problema à escala global. Apesar do seu registo estar ainda condicionado, quer por condições técnicas ou tabus sociais, quer por dificuldades em as vítimas expressarem o problema, os dados encontrados na investigação ajudam a traçar um perfil. Contudo, as diferenças encontradas nos instrumentos de medida da violência, nas amostras populacionais e nos métodos de estudo, têm dificultado a comparação de dados, as conclusões e generalização de resultados.

Numa revisão de estudos entre 2005 e 2010 foi verificado que na Europa (em que estava incluído um estudo realizado em Portugal), a percentagem de violência psicológica por

parceiro íntimo durante a gravidez, foi a que mais se verificou entre 4,8% e 26,7%, seguida da violência sexual entre 1% e 9,7% e da violência física entre 0,7% e 9,7%. Nos Estados Unidos da América, a prevalência de violência física variou de 2% a 27,9% e na América Latina verificaram-se valores de violência física entre os 3,7% e os 35,8 (Bowen et al.,2005; Karaoglu et al.,2005; Topbas et al.2008; Rodrigues et al.,2008; Bullock et al., 2006; Bailey & Daugherty, 2007; Doubova, Pámanes-González, Billings, & Torres- Arreola, 2007; Mattar et al., 2007; Moraes et al., 2010).

Em outra revisão de estudos, entre 2007 e 2012, realizada por Puccia & Mamede (2012), foram encontradas prevalências na gestação entre 3,2% e 43,1%. Foram observadas taxas elevadas e variáveis de violência psicológica na gestação entre 16% a 46,9%, violência física entre 3,6% e 21% e a sexual entre 3% e 9,1%.

Os estudos de revisão anteriores mostram, a continuação de taxas de prevalência de VPI durante a gravidez ao longo dos anos, sugestivas de preocupação. Em estudos mais recentes continua-se a verificar elevadas prevalências de VPI durante a gravidez, que dependendo de amostras e métodos de colheitas de dados diversos, revelam uma dimensão de VPI na gravidez compreendida entre 1,5% e 61,8%. De entre estes estudos salienta-se prevalência de violência psicológica compreendida entre 1% e 97,1%, de violência física compreendida entre 0,4% e 82% e de agressão sexual entre 0,1% e 45%. (Scribano et al., 2013; Viellas et al., 2013; Creedy et al., 2013; Alhusen et al., 2014; Kita et al., 2014; Rodrigues et al., 2014; Finnbogadóttir, 2014; Oliveira et al., 2015; Sgobero et al., 2015; Fonseca-Machado et al., 2015; Van Parys et al., 2015; Okada et al., 2015).

Em Portugal foram encontrados escassos estudos sobre a VPI na gravidez. Um estudo de Rodrigues et al. (2008) revelou prevalência de violência física durante a gravidez entre os 8,4%. Outro estudo de Almeida (2013) encontrou prevalência de VPI durante a gravidez de 58,2% com pelo menos um episódio de qualquer tipo de violência, nomeadamente 59,3% de agressão psicológica, 17,9% de agressão física, 24,6% de coerção sexual. Em outro estudo foi encontrada prevalência de 43,4% dos três tipos de violência (física 21,9%, psicológica 43,2% e sexual 19,6%) durante a gravidez (Almeida, 2014).

Alguns estudos têm analisado a gravidez como estímulo para a violência, nos quais têm sido encontrados indícios que reforçam a ideia de que a gravidez poderá representar um fator de risco para a violência doméstica, que pode ter início na gestação ou alterar o

padrão quanto à sua frequência e gravidade neste período (Puccia & Mamede, 2012). Neste caso, a gravidez pode não surgir como fator protector (Okada et al., 2015). Contudo a investigação ainda não é esclarecedora, apontando para a possibilidade de outros fatores contribuírem para a proteção ou estímulo da violência,

De facto, alguns estudos revelam evidência de que a frequência e severidade do início da violência por parceiro íntimo são mais elevadas durante a gravidez (Burch & Gallup (2004), assim como uma degradação da convivência com o companheiro durante a gravidez. No estudo de Oliveira et al. (2015) entre as mulheres que sofreram VPI na gravidez, a maioria (81%) afirmou que a relação com o companheiro na maioria das vezes era boa, mas quando questionadas sobre a convivência com o companheiro na gestação, 41,3% relataram que a relação piorou, 30,2% afirmaram que não houve mudança e 28,6% afirmaram que a relação melhorou.

Contudo em outro estudo (Finnbogadóttir et al., 2014) foram encontradas prevalências muito baixas de violência durante a gravidez (1,5%), apesar de mais mulheres terem reportado história de abuso emocional, físico e sexual no último ano perpetuadas pelo seu companheiro, podendo estes resultados estarem associados ao fator protector da gravidez para mulheres que vivem em relações violentas. Em outro estudo (Idoko et al., 2015) das participantes que tinham experienciado algumas formas de violência, 20% referiram ter decrescido durante a gravidez, 11% ter aumentado, e não houve alterações em 69%. Das diferentes formas de violência, outro estudo (Silva et al., 2011) evidenciou que a violência física durante a gestação diminuiu em metade comparativamente com a anterior à gravidez e a violência psicológica foi a de maior prevalência durante a gestação.

As intervenções em saúde durante o período pré-natal também surgem como fator que poderá fazer oscilar os valores da prevalência da VPI antes, durante e após a gravidez. Para mães visitadas no domicílio por enfermeiras de saúde pública foram verificadas prevalências de VPI durante a gravidez mais baixas comparadas com período anterior e depois da gravidez. Nos últimos 12 meses antes da gravidez e envolvimento no programa de visita domiciliária a VPI foi estimada em 8,1%. Longitudinalmente, 4,7% das mulheres reportaram VPI nas primeiras 36 semanas de gestação (Scribano et al., 2013).

Recentemente, estudos tentam compreender se haverá diferença entre ser apenas vítima, ser apenas perpetuador ou participante em violência recíproca, com o perfil de risco na

gravidez e os resultados da gravidez. Foi encontrada evidência de que na relação a mulher poderá também ser a perpetuadora de violência ou haver violência recíproca (Shneyderman & Kiely, 2013), sendo que 5% das mulheres eram apenas vítimas, 12% eram apenas perpetuadoras, 27% participantes em violência recíproca. Estas diferentes formas de conflituosidade entre o casal mantiveram a tendência para comportamentos de risco na gravidez e resultados negativos perinatais.

As prevalências mostram que a VPI durante a gravidez é comum e que a sua severidade difere de estudo para estudo, sendo que durante a gravidez a mulher poderá se encontrar em grande perigo. As mulheres abusadas durante a gravidez estão em mais alto risco de maior violência e complicações na gravidez, o que pode prejudicar a sua saúde e a do feto (Bianchi et al., 2014).

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